Acórdão nº 288/08.9BEBJA de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Fevereiro de 2021
Magistrado Responsável | SOFIA DAVID |
Data da Resolução | 18 de Fevereiro de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I - RELATÓRIO O Ministério Público (MP) vem interpor recurso da sentença do TAF de Beja, que julgou improcedente a acção onde aquele peticionava para:”- Ser declarado nulo e de nenhum efeito os seguintes actos administrativos praticados no âmbito do Pedido de Informação Prévia n.º 17/2005 e do Processo Camarário de Licenciamento de obras de construção n.º 110/05, datado de 12/01/2007, com fundamento na violação das disposições legais e regulamentares indicadas: a) Despacho do Sr Presidente da Câmara Municipal de Mértola, de 13/06/2005, que aprovou o projecto de arquitectura de um condomínio privado requerido por L......., no âmbito do pedido de Informação Prévia n.º 17/2005, b) Despacho do Sr Presidente da Câmara Municipal de Mértola, de 20/02/2006, que aprovou o projecto de arquitectura requerido por L....... e com a concordância de A......., no âmbito do Processo Camarário n.º 110/05, c) Despacho do Sr. Presidente da Câmara Municipal de Mértola, de 12/01/2007, que aprovou as obras de construção (Processo 110/05) em nome de L....... e que resultou na emissão de Alvará de obras n.º 7/07, em nome da contra-interessada “S....... Ldª, datado de 18/01/2007, d) Eventual despacho que venha a ser proferido entretanto no sentido de emitir a licença de utilização, com todas as legais consequências, como seja nulidade de todos os actos subsequentes, e que permitiram o licenciamento da construção da obra que veio a ser titulada pelo respectivo Alvará e ainda a nulidade da constituição da futura propriedade horizontal, caso ainda não esteja constituída, ou, no caso de já estar constituída, a declaração do título que a constituiu; e II) – Ser declarada nula a anexação/emparcelamento dos prédios acima identificados e repostos os dois prédios/parcelas no estado em que se encontravam, bem como, consequentemente, ser declarada a nulidade dos actos de registo do prédio e cancelados os mesmos, por violação da al. i) do art.º 2.º do RJUE, nos termos dos artigos 16.º e 17.º do Código do Registo Predial.
e ainda, III) Ser imediatamente suspensos os trabalhos de construção em face das referidas nulidades e nos termos do e para os efeitos do disposto no art.º 69.º, n.º 2, conjugado com o art.º 103.º, ambos do RJUE; IV) Ser determinada a cassação do alvará, caso sejam declaradas nulas as decisões – como seja a da declaração de nulidade da licença – art.º 79.º do RJUE; V) Ser determinada a reposição dos terrenos no estado em que se encontravam antes da construção da referida obra, ou, quanto muito e apenas por mera cautela, que seja corrigida a situação de acordo com os parâmetros legais constantes nas normas violadas.” Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões:” 1.ª — A sentença reconheceu que, à luz da redacção da al. i) do art. 2.º RJUE vigente à data da prática dos actos impugnados, a anexação de dois prédios, com as descrições ....... e 2384, para formação de um outro, com a descrição ......., no qual foi executada a operação urbanística de construção de um “condomínio privado” composto por 13 apartamentos, traduziu-se numa acção de loteamento-emparcelamento.
-
— Apesar de ter dado como provado que essa modalidade de loteamento nunca foi licenciada ou autorizada e que as obras de conclusão do condomínio, objecto de licença concedida no processo n.º 110/2005, foram concluídas em 2009, julgou a acção improcedente.
-
— Para tanto, argumenta-se que a aprovação do pedido de informação prévia n.º 17/2005, relativo às mencionadas obras, não conferiu ao requerente o direito à “criação de um novo lote sem a prévia operação de loteamento” e, por outro lado, que os vícios autónomos imputados pelo autor à concessão da licença de construção no lote não procedem, por não ocorrer ofensa dos parâmetros urbanísticos impostos pelos planos municipais.
-
— A incongruência desta fundamentação é inultrapassável, pois o tribunal reconhece a existência de um loteamento concretizado à margem da lei, mas não declara a sua invalidade, em virtude de ter procedido a uma análise estanque — e, para mais, errónea — dos actos praticados nos procedimentos de informação prévia e de licenciamento subsequente, deixando escapar que em nenhum deles o loteamento foi requerido, apreciado e permitido, para além de que o autor não restringiu o vício de falta de licença/autorização daquela operação a um só desses procedimentos.
-
— Acresce que a aprovação da informação prévia comporta um acto implícito de concordância com o emparcelamento de dois prédios, à margem do controlo prévio do município, visto que o requerente revelou que, “após a aprovação da informação prévia e antes da elaboração do projecto de licenciamento, proceder-se-á à anexação dos dois prédios urbanos”, pela técnica da simples fusão das matrizes e das descrições prediais, e o órgão administrativo aceitou o pedido nesses termos.
-
— O presidente da câmara municipal permitiu, implicitamente, a construção de um condomínio privado num lote resultante de um emparcelamento de dois prédios, sendo certo que o município nunca autorizou ou licenciou esta última operação, o que viola as normas do RJUE reguladoras dessa modalidade de transformação fundiária, máxime quanto a cedências, compensações, áreas para espaços verdes e de utilização colectiva, infra-estruturas e equipamentos (artigos 2.º/i) e 41.º e seguintes), o que gera nulidade (art. 67.º).
-
— A declaração dessa sanção não é inútil, em resultado da eliminação, pela Lei n.º 60/2007, do emparcelamento do âmbito da noção de loteamento, pois a execução da correspondente sentença terá de atender às normas vigentes no presente, em que avultam as reguladoras dos condomínios, justamente introduzidas pela dita Lei (v.g. n.º 5 do art. 57.º).“ O Recorrido Município de Mértola nas contra-alegações formulou as seguintes conclusões: “a) À data do pedido de emissão da licença de construção, a requerente – aqui contrainteressada – fez prova da titularidade do prédio urbano, confiando o Recorrido na validade do mesmo; b) Ademais, como bem refere, a contrainteressada, independentemente de existirem duas descrições prediais, os dois prédios sempre funcionaram como um todo, e por isso mesmo, antes da operação urbanística em crise, tinham já sido implantados dois edifícios em simultâneo e de forma contínua; c) Assim, tratando-se de um mesmo prédio (mas com duas descrições prediais) deve ser aplicado o entendimento defendido pela doutrina que estariam excluídos do procedimento de controlo prévio, devendo ser feita apenas uma retificação pela conservatória através da anexação dos dois registos; d) Justamente o que aconteceu, motivo pelo qual a conservatória procedeu ao registo da anexação, sem um título da operação de emparcelamento; e) À situação dos autos, as disposições do PDMM são aplicadas apenas a título subsidiário, relevando em matéria de índices de construção o previsto no PGUM, nos termos e para os efeitos do artigo 29º do PDUM e por se tratar de um plano mais concreto e com mais detalhe, que se sobrepõe àquele; f) Ora, atualmente é pacífico que o ato de aprovação do projeto de arquitetura não tem efeitos permissivos, por não ser ele que consente a realização da obra particular, mas define os concretos parâmetros urbanísticos da obra a levar a cabo, sendo nessa medida constitutivo de direitos para o seu destinatário e não podendo ser revogado com fundamento na posterior aprovação de um plano incompatível; Para além disso, a verdade é que o Recorrido deu integral cumprimento ao disposto no nº 3 do artigo 117º do anterior Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, aprovado pelo Decreto-Lei nº 380/99, de 22 de setembro, na redação conferida pela Lei nº 58/2005, de 29 de dezembro, o qual estabelecia que caso as novas regras urbanísticas [constantes da revisão do plano] não entrem em vigor no prazo de 150 dias desde a data do início da respetiva discussão pública, cessa a suspensão do procedimento, devendo nesse caso prosseguir a apreciação do pedido até à decisão final de acordo com as regras urbanísticas em vigor à data da sua prática – a discussão pública da revisão do plano teve início em 01.10.2003 e o licenciamento data de 12.01.2007; h) A interpretação do artigo 4º do PGUM deve ser no sentido de que parte da Zr2 se encontra no perímetro de proteção dos monumentos nacionais e sujeita a parecer da autoridade competente e responsável pela conservação do património cultural, quando integrada na Zr1 (e, portanto, no âmbito de aplicação do Plano de Pormenor de Salvaguarda e Valorização do centro Histórico da Vila de Mértola) ou quando abranja a classificação dos vestígios da basílica páleo-cristã. É isso que resulta do texto legal, quando exige a confirmação de que para a aplicação daquele regime a operação urbanística se insira naquela zona de proteção. Fora destes casos, será aplicável apenas o disposto no nº 1 quanto à densidade (20 fogos/ha), uso (habitação e comércio de apoio), tipologia (banda contínua) e cérceas: dois pisos acima da rua, não carecendo as licenças de construção de parecer prévio da Direção-Geral do Património Cultural; i) Ainda que se considerem os atos ilegais, sempre se deveria entender que à situação dos autos deve ser aplicado o instituto dos efeitos putativos dos atos nulos. A atribuição de efeitos putativos não se consubstancia como uma forma de sanar um ato nulo, mas sim de atribuir verdadeiros efeitos ao tempo decorrido, efeitos merecedores de proteção jurídica; j) No nosso caso, não só a obra se encontra concluída, como o respetivo alvará de utilização já foi emitido, estando neste momento as 12 frações habitadas, sendo que uma eventual declaração de nulidade dos atos agora em crise não é imputável aos terceiros adquirentes, considerando-se, portanto, de boa-fé, cujos direitos e interesses devem ser tutelados. Não...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO