Acórdão nº 1250/15.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Dezembro de 2020
Magistrado Responsável | ANA PAULA MARTINS |
Data da Resolução | 10 de Dezembro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I - RELATÓRIO J...
, melhor identificado nos autos, instaurou, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, acção administrativa comum contra o Estado Português, pedindo a condenação deste a pagar ao autor a quantia total de €5.500, a título de indemnização por danos patrimoniais (500,00€) e por danos não patrimoniais (5.000,00€), sofridos pelo autor, acrescida dos juros vincendos até seu efectivo e integral pagamento.” Por despacho saneador - sentença, de 07.05.2019, o Tribunal a quo, depois de julgar improcedente a excepção de incompetência em razão da matéria, suscitada pela Entidade Demandada, julgou improcedente a acção e, em consequência, absolveu do pedido o Réu Estado Português.
Inconformado com a referida sentença na parte em que julgou improcedente a acção, veio o Autor interpor recurso da mesma.
* Nas respectivas alegações, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: 1. “O aqui Recorrente interpôs uma acção administrativa comum contra o Estado Português, fundando a sua pretensão no instituto da responsabilidade civil extracontratual do Estado, por danos ilicitamente causados pela administração da justiça; 2. Os danos ilicitamente causados pela administração da justiça não se reconduzem, apenas e tão-só, e naquela que é a muito modesta perspectiva por parte do aqui Recorrente, à violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável, senão considere-se o que se estabelece no artigo 12º da Lei nº 67/2007 de 31 de Dezembro, pela forma clara e inequívoca com que está redigido; 3. Não é, pois, exacto afirmar que o aqui Recorrente funda a sua pretensão no instituto da responsabilidade civil extracontratual do Estado por danos resultantes do exercício da função jurisdicional em razão da decisão proferida no processo-crime nº 5828/12.6TDLSB.L1, pois que, com todo o respeito, e que é muito, uma vez lida e devidamente interpretada a sua petição e a documentação que à mesma seguiu anexa, é inequívoco que o aqui Recorrente funda a sua pretensão na responsabilidade extracontratual do Estado pelos danos ilicitamente causados pela administração da justiça; 4. Ora, naquele que é o muito modesto entendimento por parte do aqui Recorrente, a douta sentença recorrida é nula, na medida em que o Tribunal a quo deixou de se pronunciar acerca de questão que lhe foi submetida para apreciação e decisão, o que aqui se não pode deixar de invocar, sobretudo face ao que foi dado como provado nas alíneas g), h), e q) da fundamentação de facto, por confronto com o que decorre da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho; 5. Ou seja, o Tribunal a quo deu como provado que o aqui Recorrente beneficiou, naquele processo nº 5828/12.6TDLSB, de apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento de taxas de justiça e demais encargos com o processo e nomeação e pagamento de honorários a Patrono, assim como deu como provado que foi admitida a sua intervenção como assistente e que após ter sido notificado do despacho de arquivamento e para, querendo, requerer abertura de instrução, a Patrona que lhe havia sido nomeada pediu escusa em 24/10/2012 sem que a Ordem dos Advogados lhe tivesse nomeado outro Patrono em substituição; 6. O Tribunal a quo desconsiderou por completo, naquele que é o muito modesto entendimento por parte do aqui Recorrente, que na alínea b) do nº1 do artigo 287º do Código de Processo Penal se encontra expressamente enunciado que o requerimento de abertura de instrução só pode ser efectuado pelo assistente e, por sua vez, que decorre do disposto no nº 1 do artigo 70º do Código de Processo Penal que os assistentes são sempre representados por ADVOGADO! 7. A administração da justiça, na perspectiva do funcionamento do sistema do Acesso ao Direito e aos Tribunais, encontra-se disciplinada, entre outras normas reguladoras desta matéria, na Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, com as alterações entretanto introduzidas, a mais recente pelo DL nº 120/2018, de 27/12; 8. Assim, nesta perspectiva da responsabilização do Estado pelos danos ilícitos causados pela administração da justiça o Tribunal a quo não poderia ter deixado de analisar e de se pronunciar, por referência à matéria de facto, quanto ao que se estabelece no nº 1 do artigo 2º da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, o que não fez e o que aqui se não pode deixar de invocar; 9. Porquanto, estabelece-se no nº 1 do artigo 2º da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, que «O acesso ao direito e aos tribunais constitui uma responsabilidade do Estado, a promover, designadamente, através de dispositivos de cooperação com as instituições representativas das profissões forenses», o que não é despiciendo na análise dos requisitos ou pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado Português, nomeadamente no que toca ao requisito ou pressuposto da ilicitude, e o que aqui se não pode deixar de invocar, por se considerar que o Tribunal a quo deixou de se pronunciar quanto a esta questão, o que consubstancia uma nulidade; Sem condescender, 10. Naquele que é o muito modesto entendimento por parte do aqui Recorrente o Tribunal a quo incorreu num erro de julgamento, na subsunção dos factos ao direito aplicável, na medida em que a matéria de facto que foi dada como assente e provada deveria ter sido merecedora de outro enquadramento jurídico, pois que deveriam ter sido dados como demonstrados os requisitos ou pressupostos de que se mostra dependente a responsabilização civil extracontratual do Estado Português; 11. Conforme alegou na sua petição inicial, para o aqui Recorrente, e com todo o respeito por opinião em contrário, os factos essenciais para a contabilização do referido prazo de pendência do seu processo devem compreender não só o os prazos processuais em si mesmos, como ainda devem compreender a actuação por parte de todas as autoridades competentes no âmbito da administração da justiça; 12. Esse não foi, no entanto, o entendimento por parte do Tribunal a quo, que inclusivamente que refere na douta sentença recorrida que «(…)Por fim, se tivermos em consideração que apenas volvido cerca de 1 ano, é que o autor foi àqueles autos arguir a nulidade, não pode o Estado ser responsabilizado por essa demora, pois que é totalmente alheio a qualquer atraso no procedimento de nomeação de advogados oficiosos, por parte da Ordem dos Advogados, no âmbito do acesso ao Direito e aos Tribunais.», o que se não pode aceitar de forma alguma, por não se mostrar consentâneo com o que decorre da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, com o que se estabelece nos artigos 2º e 20º da Constituição da República Portuguesa e no artigo 6º da CEDH; 13. Sem maiores considerações a este propósito, o aqui Recorrente não pode deixar de invocar que se encontra expressamente contemplado no nº1 do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa que «A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos», na medida em que daqui decorre como princípio basilar que a todos deve ser assegurado um normal funcionamento do sistema de administração da justiça, o que deve ser interpretado e aplicado em sentido amplo e não apenas por referência à administração da justiça pelos Tribunais; 14. Este parece ser também o sentido e o alcance da interpretação e aplicação por parte do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem na interpretação e na aplicação do que se estabelece, entre outros preceitos, no artigo 6º da CEDH, pois que como muito bem se refere na douta sentença recorrida, segundo as decisões do TEDH é possível aferir a razoabilidade da duração de um processo com base: na complexidade do processo; no comportamento das partes; na actuação das autoridades competentes no processo; no assunto que é discutido no processo e a importância que o mesmo reveste para o respectivo autor; 15. Resulta, na verdade, difícil conceber e compreender como é que o Tribunal a quo refere na douta sentença recorrida que no artigo 9º do RRCEE se estabelece a ofensa de um direito legalmente protegido resultante de um funcionamento anormal do serviço de justiça mas depois interprete e restrinja este “serviço de justiça” à tramitação de um processo judicial, para efeitos de efectivação da responsabilidade civil do Estado Português, pois que tal é contraditório; 16. A douta sentença recorrida incorre num erro de julgamento ao não considerar preenchidos os pressupostos de natureza cumulativa de que depende a efectivação da responsabilidade civil do Estado Português, violando claramente o que se estabelece no artigo 2º da CRP, no artigo 20º da CRP, bem como no artigo 6º da CEDH, dos artigos 1º, 2º e 4º da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, pelo que deverá ser revogada, em consonância com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, inclusive do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que já condenou por diversas vezes o Estado Português nesta matéria”.
* O Recorrido contra-alegou, apresentando as seguintes conclusões: 1. A presente ação, tal como configurada pelo autor na petição inicial, é uma ação para efetivação de responsabilidade civil extracontratual do Estado por alegados danos decorrentes de demora na tomada de decisão no processo nº 5828/12.6 TDLSB – artigos 54º e 55º da petição inicial.
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A sentença recorrida pronunciou-se, de forma completa, sobre a questão colocada ao tribunal para decisão: a verificação dos requisitos da responsabilidade civil extracontratual do Estado decorrente de atraso na justiça e da consequente obrigação de indemnizar, enumerando-os, avaliando do seu preenchimento e concluindo que, não se verificando o pressuposto da ilicitude, previsto no art.º 9º/1 e 2 do RRCEE, a ação tinha que improceder.
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Ao contrário do invocado pelo recorrente, a leitura da sentença demonstra que foi exatamente o pressuposto da ilicitude que foi analisado de forma mais aprofundada...
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