Acórdão nº 01571/13.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução13 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1.

G., SPA, instaurou contra o Município (...) e a CMPEA, a presente ação administrativa comum pedindo a condenação dos Réus a pagar à Autora a quantia global de € 39.694.88 (trinta e nove mil seiscentos e noventa e quatro caros e oitenta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora, contados à taxa legal, desde a citação até o seu integral pagamento, com fundamento em responsabilidade civil extracontratual.

Alegou, para tanto, em síntese, que no dia 4 de dezembro de 2010, pelas l5h00m, na Avenida do (...), no (...), em frente ao prédio com o número de polícia 365, ao passar por duas caixas, que ali se encontravam no pavimento do passeio, a uma quota inferior à do resto desse pavimento, sem vedação ou sinalização, a sinistrada, L., não se apercebeu das referidas caixas e enfiou o pé na cavidade por elas formada, tropeçou e caiu abruptamente para a frente, sobre ambas as mãos, fraturando, com essa queda, ambos os pulsos.

A referida L., à data do acidente, era funcionária da Santa Casa da Misericórdia (...), exercendo as funções de chefe de secção, e na sequência da sentença proferida pelo Tribunal do Trabalho no âmbito do processo por acidente de trabalho que ali correu, a autora pagou à sinistrada a quantia de € 22.231,48.

O referido acidente aconteceu devido à existência de um buraco no passeio, que não se encontrava sinalizado, pelo que tudo se ficou a dever à omissão por parte dos demandados dos seus deveres de vigilância, fiscalização, sinalização e prevenção.

*1.2.

Citado, o Réu Município (...) apresentou contestação na qual requereu a intervenção acessória da I., Companhia de seguros, S.A., defendendo-se por exceção, invocando a sua ilegitimidade passiva, e por impugnação, pugnando pela total improcedência da ação.

*1.3.

Citada, a Ré CMPEA apresentou contestação na qual requereu a intervenção acessória da Companhia de Seguros F., S.A. II, e defendeu-se por impugnação, pugnando pela improcedência da ação.

*1.4.

Proferiu-se despacho a admitir a intervenção acessória da I., Companhia de seguros, S.A. e da Companhia de Seguros F., S.A. II.

*1.5.

Citadas, a interveniente F. Companhia de Seguros, S.A.‖ que incorpora as duas seguradoras, contestou a ação, nos termos do articulado de fls. 156 a 162 (processo físico).

*1.6.

Realizou-se a audiência prévia, na qual se proferiu despacho saneador que conheceu da matéria de exceção suscitada, tendo-a julgado improcedente, fixou-se o objeto do litígio e os temas da prova.

*1.7. Realizou-se a audiência final.

*1.8. Em 22 de abril de 2015, o TAF do Porto proferiu sentença que julgou a ação improcedente, constando da mesma o seguinte segmento decisório: «Nestes termos, de acordo com a fundamentação exposta, julgo a presente acção improcedente e, em consequência, absolvo os RR. do pedido.

Custas a cargo da Autora.

Registe e notifique.»*1.9.

Inconformada com o assim decidido, a G.- Companhia de Seguros, S.A, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida, apresentando as seguintes conclusões: «I. Deve ser dado como provado a al. f) dos factos dados como não provados.

II.

É incontroverso que foram os réus que não procederam à reparação do passeio junto das caixas de saneamento e que, em virtude de tal facto, se deu o acidente.

III.

Incumbe aos recorridos o dever de manutenção, fiscalização, conservação e sinalização do pavimento do passeio em causa, por estarem obrigados a realizar actos de gestão pública no espaço rodoviário, conforme o disposto nos art.s. 16º e 26º da Lei 159/99 de 14.09 e art.º 96.º, n.º 1 da Lei 169/99 de 18.09.

IV.

Impendia sobre os recorridos uma presunção de culpa imposta pelo art.º 493º/1 do CC e cabia às mesmas alegar e provar que estão devidamente organizadas, que fiscalizam, com diligência, regular e sistematicamente as estradas e caminhos municipais e que só as particulares circunstâncias do caso concreto, por fortuitas ou absolutamente imprevisíveis, explicam a falta de sinalização, o que tudo não fizeram.

V.

Provados todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, fundamento da causa, não poderiam os réus ser absolvidos.

VI.

A sentença recorrida violou, pois, o disposto no art.s 9º da LRCEE e 493º/1 do CC e 609º/2 do CPC, devendo, como tal, ser revogada e substituída por outra que condene os réus no pedido.

» 1.10.

A F. – Companhia de Seguros contra-alegou, e formulou as seguintes conclusões: «i) Não há qualquer contradição entre os factos provados e dar-se como não provado o facto da alínea F); ii) Não se poderia sequer dar como provado o facto F) sem previamente dar como provado o facto E) em relação ao qual a recorrente se conformou com o seu julgamento como não provado.

iii) Não provou a recorrente factualidade susceptível de permitir que se conclua pela ocorrência de uma omissão ilícita das RR; iv) A presunção de culpa apenas funciona depois de se provar a ocorrência de omissão ilícita; v) Nem sequer provou a recorrente os factos que permitam a qualificação do acidente como de trabalho; vi) Não violou a decisão recorrida nenhuma das disposições invocadas pela recorrente.»*1.11.

O Município (...) contra-alegou, formulando as seguintes conclusões: «A. A douta sentença proferida pelo tribunal a quo e ora colocado em crise pela Recorrente é, a nosso ver, justa, bem fundamentada e inatacável, demonstrando urna aplicação exemplar das normas jurídicas, pelo que deverá ser confirmada por V. Exas.

B. Para sindicar a decisão judicial da lª instância, defende a Recorrente (i) que o facto F) dos factos não provados deveria ter sido dado corno provado e se encontra em contradição com a matéria que consta do ponto 4 dos factos provados e (ii) que a sentença recorrida fez uma incorrecta interpretação do direito, nomeadamente do disposto nos artigos 9º da Lei nº 67/2007, de 17 de Julho e no artigo 609º do Código de Processo Civil.

C. Os factos dados como provados resultam de uma correcta conjugação e interpretação da prova documental junta aos autos, bem assim da prova testemunhal produzida na audiência de julgamento.

D. No local em que ocorreu o sinistro existiam duas caixas a uma quota inferior ao restante passeio.

E. Mas daqui não se pode passar a concluir que toda e qualquer ocorrência no local, geradora de danos para terceiros, possa ser da responsabilidade do Recorrido, atentas as competências e atribuições que o ordenamento jurídico português concede às autarquias locais.

F. O cerne do presente pleito está em saber se o pequeníssimo desnível do passeio situado na Avenida (...), em frente ao prédio como número de polícia 365, nesta cidade (...), foi causa única e exclusiva (ou pelo menos determinante) da queda da sinistrada e se pode ser gerador de responsabilidade do Recorrido, atento o disposto na Lei nº 67/2007, de 17 de Julho.

G. Como muito bem conclui a sentença recorrida proferida pelo tribunal a quo, “o diminuto nível das caixas existentes no dito passeio (bem visível nas fotografias juntas aos autos com a p.i – fls.28 e 29 do processo físico e a que o Senhor Engenheiro J. se referiu como tratando-se de um desnível de 1,5 cm) não se revelou como determinante da queda sofrida pela sinistrada, não constituindo, por si, um facto de risco para segurança das pessoas que por lá normalmente passassem, mesmo sem tomar especial cautela e que exigisse uma pronta actuação, reparando ou até sinalizando a anomalia, de forma alertar o cidadão comum para a possível ocorrência de situações anómalas e causadoras de danos, com as quais não era exigível que contasse” – cfr. pág. 17 da sentença recorrida.

H. O Recorrido não omitiu qualquer dever ou obrigação legal que o coloque na posição de indemnizar a sinistrada e, neste caso concreto de sub-rogação, a própria Recorrente, porquanto não era exigível que tivesse tido outro tipo de actuação.

I. Não se vislumbra a prática de qualquer facto ilícito e culposo, estando deste modo afastados dois dos requisitos fundamentais para accionar a responsabilidade civil do Recorrido e deduzir a consequente pretensão indemnizatória.

J. Importa recordar que a responsabilidade da Administração não é automática, não sendo accionada sempre que se verifique uma ocorrência geradora de danos para um terceiro numa área em que tem competências de conservação ou de manutenção.

K. Nos termos da lei, é sempre necessário constatar a conduta ilícita e culposa da Administração, bem como o nexo de causalidade com os danos causados, o que não sucede de todo no caso em apreço.

L. Pelo que foi acima aduzido e pelos fundamentos constantes da decisão judicial recorrida proferida pelo tribunal a quo, é entendimento do Recorrido que a mesma não merece qualquer reparo, devendo ser confirmada por V. Exas.»*1.12.

A CMPEA- Empresa de Águas do Município (...) contra-alegou, apresentando as seguintes conclusões: «

a) Não há qualquer contradição entre os factos provados e dar-se como não provado o facto da alínea F) b) Não é possível dar como provado o facto da alínea F) sem que se desse também por provado o da alínea E) c) E em relação a este a recorrente conformou-se com o julgamento de “não provado” d) A presunção de culpa pressupõe prova da ocorrência de omissão ilícita e) E o único facto que ficou provado é que existia um ligeiro desnível entre as tampas e o passeio.

f) O que não pode ser gerador de responsabilidade civil, atento o disposto na Lei n.º 67/2007, de 17 de Junho.

g) Como doutamente se concluiu na douta sentença “a quo” “o diminuto desnível das caixas existentes no dito passeio (bem visível nas fotografias juntas aos autos com a p.i – fls.28 e 29 do processo físico e a que o Senhor Engenheiro J. se referiu como tratando-se de um desnível de 1,5 cm) não se revelou como determinante da queda sofrida pela sinistrada, não constituindo, por si, um facto de risco para segurança das pessoas que por lá normalmente passassem, mesmo sem tomar especial cautela e que exigisse uma...

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