Acórdão nº 1673/11.4BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 30 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelCRISTINA FLORA
Data da Resolução30 de Setembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO G..... E......, SGPS, S.A.

, com os demais sinais nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial por si apresentada, contra o indeferimento do recurso hierárquico interposto do indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra a liquidação adicional de IRC do exercício de 2002.

A Recorrente, apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões: «a. Da análise da argumentação aduzida pela Administração Tributária em sede de inspeção e pela Fazenda Pública em sede de Contestação, constata-se que jamais o indeferimento do pedido de reconhecimento de desvalorização excecional de bens no ativo imobilizado corpóreo foi utilizado como argumento ("facto novo") suscetível de justificar uma nova inspeção, nem tão pouco foi tal justificação (fundamentação) dada à aqui Recorrente; b. A não argumentação dessa situação por parte da Administração Tributária e da Fazenda Pública (ao contrário do que se verificou na sentença recorrida), é justificada, na ótica da Recorrente, por uma razão óbvia: se a Administração Tributária considerava estar perante um facto novo, deveria, em conformidade com o disposto no artigo 63.º, n.º 3 da LGT, ter procedido à abertura de um novo procedimento externo de inspeção, justamente com base nesse (alegado) facto novo - o que não se verificou no caso subjudíce; c. À data da realização da primeira inspeção tributária (2004), a Administração Tributária tinha conhecimento da pendência - e consequente necessidade do conhecimento do mérito - do pedido formulado pela Recorrente em março de 2003, pelo que, estando na esfera da Administração Tributária a apreciação do mérito do pedido de reconhecimento de desvalorização excecional de bens no ativo imobilizado corpóreo apresentado em março de 2003 - pedido, aliás, que, ao abrigo do princípio da decisão, deveria ter sido conhecido pela Administração Tributária no prazo de seis meses (cfr. artigos 56.º e 57.º, n.º 1 da LGT, na redação à data dos factos) -, não poderá aceitar se a argumentação de que a decisão de indeferimento configura um "facto novo"; d. Uma vez que, quer a apreciação do pedido de reconhecimento de desvalorização excecional de bens no ativo imobilizado corpóreo apresentado em março de 2003, quer a fiscalização ao exercício de 2002, encontrava-se na esfera da Administração Tributária, o eventual atraso no conhecimento do mérito do citado pedido formulado pela Recorrente em março de 2003, apenas àquela entidade poderá ser imputável e não certamente ao sujeito passivo que requereu a apreciação do pedido; e. Aceitar-se que um determinado ato consequente a um facto que era conhecido pela Administração Tributária (ou seja, o indeferimento de um pedido), praticado dentro da mesma entidade (a Administração Tributária) possa ser configurado como um "facto novo" e, nessa medida, determinar a admissibilidade da abertura de um novo procedimento inspetivo, será, na ótica da Recorrente, aceitar que a Administração Tributária possa dispor em que momento (e sem cumprimento dos prazos legalmente estabelecidos para o efeito, nomeadamente do disposto nos artigos 56.º e 57.º da LGT) decidirá sobre os pedidos e requerimentos que lhe são apresentados pelos sujeitos passivos, protelando a efetivação das inspeções a seu bel-prazer; f. A ratio que presidiu à redação do artigo 63.º da LGT e que subjaz ao princípio da irrepetibilidade das inspeções é a tutela do sujeito passivo quanto à reapreciação de factos, com exceção dos novos, não se podendo incluir nestes - sob pena de se estar perante letra morta - os factos decorrentes de outros conhecidos pela Administração Tributária e cuja ocorrência desta unicamente depende; g. A decisão de um pedido que a própria Administração devia decidir, não constitui um "facto novo", no sentido de desconhecido pela própria, pois à mesma cabia a sua ocorrência na ordem jurídica .

E se não decidiu antes da primeira inspeção, não pode ser valorado contra o sujeito passivo, sob pena de total inflexão dos princípios norteadores do procedimento tributário de inspeção, para além da violação do artigo 63.º da LGT; h. O facto de a competência para a apreciação do pedido de reconhecimento de desvalorização excecional de bens no ativo imobilizado corpóreo ser da Direção de Serviços do IRC, ao passo que a competência para a fiscalização tributária ser da Direção de Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa não poderá determinar qualquer outra conclusão que não a acima exposta pela Recorrente, na medida em que, estando na esfera da mesma entidade (Administração Tributária), nos termos do artigo 1.º, n.º 3 da LGT, (i) a apreciação do mérito do pedido formulado pela Recorrente em março de 2003 e, ainda, (ii) a abertura do procediménto de fiscalização à Recorrente, terá, forçosamente, de se concluir que o conhecimento do indeferimento do pedido apresentado pela Recorrente apenas em 2006 é imputável à Administração Tributária e, nessa medida, não poderá configurar um "facto novo" suscetível de justificar a abertura de um novo procedimento inspetivo; i. Ainda que se aceitasse que o indeferimento do pedido de reconhecimento de desvalorização excecional de bens no ativo imobilizado corpóreo configura um "facto novo", suscetível de justificar a abertura de um procedimento inspetivo - como entendeu o Tribunal a quo para indeferir a Impugnação Judicial apresentada pela Recorrente, mas que se admite apenas hipoteticamente, mas sem conceder -, a realidade é que, à luz do artigo 63.º, n.º 3 da LGT, o procedimento inspetivo realizado pela Administração Tributária em 2006 teria de ser de natureza "externa" e não de natureza "interna"; j. Atendendo à (alegada) existência de factos novos e, ainda, atendendo à documentação e elementos analisados pela Administração Tributária - como adiante se verá em pormenor -,deveria a Administração Tributária ter procedido à abertura do procedimento externo de inspeção, nos termos do artigo 63.º, n.º 3 da LGT, pelo que, não tendo a Administração Tributária procedido à abertura do supracitado procedimento externo de inspeção - o que, naturalmente, determinou a falta da observância das suas regras específicas (designadamente, a decisão fundamentada do dirigente máximo do serviço) - sendo, antes, utilizado um procedimento que a Administração Tributária designou de "interno", tal situação determina a violação do princípio da irrepetibilidade da inspeção, consagrado no citado artigo 63.º, n.º 3 da LGT que, por seu turno, inquina a liquidação aqui contestada; k. O procedimento inspetivo subjacente à liquidação impugnada trata-se, de facto, de um procedimento inspetivo externo, na medida que não se destinou, única e exclusivamente, a proceder a uma análise formal e de coerência dos documentos, tendo igualmente procedido à verificação da contabilidade e registos contabilísticos e documentos de suporte/listagens da Recorrente, registos esses obtidos numa primeira inspeção realizada ao mesmo exercício (2002) e à qual, por mero procedimento inspetivo interno, a Administração Tributária não teria acesso; l. Atendendo à existência de uma outra ação inspetiva anterior à operada em 2006, em relação ao mesmo sujeito passivo (P……), imposto (IRC) e período de tributação (2002), no âmbito da qual a Administração Tributária teve acesso aos elementos de facto subjacentes ao pedido de reconhecimento de desvalorização excecional formulado pela sociedade e que poderia, se assim quisesse, ter inspecionado e efetuado todas as correções que entendesse serem devidas, não era possível à Administração Tributária ter repetido uma segunda inspeção (materialmente) externa; m. Nessa medida, deverá a sentença recorrida ser revogada por Vossas Excelências e, em consequência, deverá a mesma ser substituída por nova decisão que comtemple a argumentação aduzida pela Recorrente, com todas as consequências legais daí decorrentes, designadamente a declaração de ilegalidade da liquidação ora impugnada, por violação do princípio da irrepetibilidade da inspeção, consagrado no artigo 63.º, n.º 3 da LGT; n. A atuação da Administração Tributária violou, de forma intolerável, o princípio da boa fé a que alude o artigo 10.º do CPA (artigo 6.º-A à data dos factos), ao instaurar e concluir um procedimento inspectivo alegadamente interno, com base (pelo menos, parcialmente) nos elementos contabilísticos e justificativos fornecidos pela Recorrente no âmbito de uma anterior inspeção de que foi alvo (em 2004) e que a expressamente admite ter utilizado e, posteriormente, com vista a justificar (e legalizar) a sua atuação qualificar o procedimento inspectivo como sendo interno; o. Analisando a situação em apreço, verifica-se que a Administração Tributária, aquando da inspeção tributária realizada em 2004 aos exercícios de 2000, 2001 e 2002, recolheu todos os documentos e registos contabilísticos que necessitava (naquele momento e no futuro) e, posteriormente, em 2006, aquando da decisão de indeferimento do pedido de desvalorização excecional utilizou aquela documentação e informação obtida, com vista a efetuar uma (nova) correção da matéria coletável do exercício de 2002, a qual gerou a liquidação ora impugnada; p. Constata-se, pois, que a Administração Tributária recorreu a elementos contabilísticos e de suporte às inscrições contabilísticas a que nunca teria tido acesso naquela fase processual (inspeção de 2006) se não fosse a inspeção tributária realizada em 2004 e, sob a capa de um procedimento inspectivo que qualificou de "interno", procedeu a novas correções à matéria coletável do exercício de 2002, sem atender às formalidades procedimentais exigíveis no âmbito de um procedimento inspetivo externo; q. Conclui-se, portanto, que não obstante a Administração Tributária tenha qualificado o procedimento...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT