Acórdão nº 00861/11.8BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução15 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO A. instaurou ação administrativa especial contra a Fundação para a Ciência e Tecnologia, ambos já melhor identificados nos autos, invocando a invalidade do ato desta Entidade de 04.08.2011, que determinou o cancelamento da atribuição de bolsa de doutoramento a que se havia candidatado.

Cumulativamente, pediu a condenação da Entidade Demandada à prática dos atos conducentes à efetivação da bolsa, desde o momento em que esta foi deferida até ao presente, incluindo o pagamento do quantitativo mensal e de todos os encargos.

Por decisão proferida pelo TAF de Aveiro foi julgada improcedente a acção.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões: 1. A sentença recorrida não considerou provados factos que haviam sido pelo A./Recorrente alegados na causa de pedir tal como formulada na Petição Inicial e eram relevantes para o pedido formulado e que se encontravam documentalmente comprovados pelo A./Recorrente, constando também do Processo Administrativo junto aos autos pela Entidade Demandada (documentos 9 e 10 da PI e documentos a fls 44 e 64 do PA).

  1. Atendendo à argumentação de direito defendida pelo A./Recorrente tais factos seriam de primordial importância pelo que se impunha ao Tribunal “a quo”, por força do disposto no artigo 607º nº 4 do CPC, que sobre estes proferisse decisão.

  2. Há assim erro de julgamento quanto à matéria de facto considerada provada porquanto ali deveriam constar, também como provados, os seguintes factos: - Em 1 de Setembro de 2009, o Professor Catedrático J. subscreveu a declaração junta a fls. 44 do PA, de acordo com a qual declarava aceitar a orientação da tese de doutoramento do licenciado J-., no curso de doutoramento em Actividade Física e Saúde promovido pelo Centro de Investigação em Actividade Física e Saúde da Faculdade do Desporto da Universidade do Porto, mais declarando que a eventual acumulação de trabalho na Escola Secundária de (...) não coloca em risco a exequibilidade do plano de trabalhos do curso de doutoramento.

    - Em 10 de Julho de 2010 o Professor Catedrático Doutor J. subscreveu o Parecer junto a fls 64 do PA pelo qual certifica que o Mestre A. se encontra a realizar o Doutoramento e que o programa de trabalhos foi cumprido até à data daquela declaração considerando ser de maior relevância a renovação da Bolsa atribuída pela FCT para o ano de 2010.

  3. Para além do erro quanto à matéria de facto, a sentença recorrida errou quanto à matéria de direito pois aplicou normas legais e regulamentares inaplicáveis ao processo de candidatura e ao contrato de bolseiro do Autor/Recorrente.

  4. Decorre do Edital do concurso (vide ponto 1 dos factos provados) que este se regia pelo Regulamento de Formação Avançada e Qualificação de Recursos Humanos (homologado a 21 de Abril de 2009, publicado a 25 de Abril de 2009, em vigor a partir de 26 de Abril de 2009) e o Estatuto do Bolseiro de Investigação Científica aprovado pela Lei 40/2004 de 18 de Agosto.

  5. Nos termos do disposto no Regulamento de Formação Avançada e Qualificação de Recursos Humanos de 2009, não tendo a atribuição da Bolsa do A./Recorrente sido afastada por razões relativas a deficiente instrução do processo de candidatura e tendo sido efectivamente aprovada, apenas poderia ser recusada se os documentos necessários à celebração do contrato não fossem facultados ou por falta de cabimento orçamental.

  6. Tendo o Autor cumprido todos os requisitos exigidos no Regulamento de atribuição de Bolsa (em vigor em 2009), procedeu-se à assinatura do contrato de bolseiro de investigação.

  7. O contrato de bolsa de investigação assinado em 2009 remete (cláusula segunda e sétima) e considera subsidiariamente aplicável, o Regulamento de Formação Avançada e Qualificação de Recursos Humanos da FCT.

  8. Nos termos do disposto no artigo 12º do Código Civil, o Regulamento de Formação Avançada e Qualificação de Recursos Humanos da FCT para o qual o Edital de concurso e contrato remetem é o Regulamento de Formação Avançada e Qualificação de Recursos Humanos homologado a 21 de Abril de 2009, publicado a 25 de Abril de 2009, em vigor a partir de 26 de Abril de 2009.

  9. Este Regulamento estabelecia no nº 2 do artigo 25º que as funções do bolseiro são exercidas em regime de dedicação exclusiva (nos termos previstos no artigo 5º do Estatuto do Bolseiro de Investigação, aprovado pela Lei nº 40/2004, de 18 de Agosto) devendo ser garantida a exequibilidade do programa de trabalhos.

  10. Admitindo-se no Estatuto de Bolseiro de Investigação que a actividade de bolseiro pode ser cumulada com o exercício de funções docentes, aparentemente sem quaisquer condicionantes, a Recorrida, ao subscrever, homologar e publicitar o Regulamento de 2009 (no nº 2 do artigo 25º) condicionou essa acumulação à garantia da exequibilidade do programa de trabalhos.

  11. Atendendo ao momento em que apresentou a candidatura não ser possível o pedido de equiparação a bolseiro para o ano lectivo 2009/2010, o Recorrente comprovou por declaração do orientador de doutoramento que o exercício de funções docentes não punha – nem pôs - em causa a garantia da exequibilidade de trabalhos.

  12. O cancelamento da bolsa – após a sua concessão e assinatura do contrato - apenas poderia resultar do não cumprimento da exequibilidade dos trabalhos do programa de doutoramento (artigo 25º nº 2 do Regulamento de 2009), da prestação de falsas declarações sobre matérias relevantes para a concessão da bolsa e/ou da violação grave ou reiterada dos deveres do bolseiro constantes do regulamento (2009) e do Estatuto do Bolseiro de Investigação (artigos 25º, 34º e 37º do Regulamento de 2009 e artigo 17º do Estatuto de Bolseiro de Investigação).

  13. Tendo o Autor cumprido o que lhe era exigido pelo artigo 5º da Lei 40/2004 de 18 de Agosto e pelo Regulamento de Formação Avançada e Qualificação de Recursos Humanos homologado a 21 de Abril de 2009 (publicado a 25 de Abril de 2009) nada mais sendo legal ou regularmente exigido, 15. Os preceitos legais a que na sentença se aludem são os constantes do Regulamento de 2010, 2011 e 2012 os quais não se encontravam em vigor nem à data da candidatura do recorrente nem da assinatura do contrato (neste enforque o nº 3 do artigo 25º do Regulamento transcrito na sentença encontra-se plasmado, apenas e somente, no Regulamento publicado em 7 de Junho de 2010 e no Regulamento 2011), 16. Pelo que mal andou a entidade recorrida e a sentença proferida pelo Tribunal “a quo” ao aplicar o disposto em normas regulamentares que só a posteriori vieram a obter consagração regulamentar.

  14. E também mal andou a sentença recorrida ao fazer valer o primado do aproveitamento dos actos em detrimento da garantia da audiência de interessados a que aludia o artigo 100º do CPA em vigor ao tempo.

  15. Com efeito, sendo a falta de audição prévia do candidato, nos casos consagrados no artº 21 nº 2 do Regulamento de 2009 e artigo 100º do CPA (na sua anterior redacção), um vício de procedimento susceptível de conduzir à anulação da decisão final que vier a ser tomada, 19. apenas se admitiria a decisão preconizada pelo Tribunal se o sentido da decisão da Recorrida se mantivesse inalterado, concluindo-se, sem margem para dúvidas face à sua manifesta evidência legal, que o acto em causa não poderia ter outro conteúdo decisório.

  16. Tendo a Recorrida, sem qualquer fundamentação legal ou fáctica, alterado o sentido da sua decisão e utilizando para esse efeito a invocação de normas regulamentares temporalmente inaplicáveis, não se pode deixar de concluir que a decisão final não poderia ser considerada segura, certa ou sequer evidente, pelo que também mal andou a sentença recorrida ao invocar o princípio do aproveitamento dos actos em detrimento do direito de audiência prévia e do principio do contraditório legalmente estabelecido no artigo 100º do CPA (então vigente).

  17. E ao não aplicar as normas regulamentares constantes do Regulamento e Formação Avançada e Qualificação de Recursos Humanos 2009 e Lei 40/2004 de 18 de Agosto, o que fez em clara violação do disposto no artigo 12º do Código Civil e dos princípios da legalidade, boa-fé e igualdade consagrados nos artigos 266º nº 2 da Constituição da República Portuguesa e artigos 3º, 5º e 6º-A do Código de Procedimento Administrativo (à data em vigor), duvidas não podem resultar que o tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento devendo a sua decisão anulada e substituída por outra que anule o acto praticado pela recorrida com a consequente condenação à prática do acto legal e regularmente devido Nestes termos e nos que se suprirá, deve o presente recurso jurisdicional merecer provimento pois só assim se fará, Justiça A Entidade demandada juntou contra-alegações, concluindo: 1.ª - O Tribunal a quo julgou bem ao não considerar as declarações constantes a fls. 44 a 64 do PA, até porque mesmo que as tomássemos como verdadeiras e o A. conseguisse executar ambas as atividades – de docência e investigação - a lei não permite tal acumulação, pelo que se revelaria inútil a sua análise e em nada alteraria a decisão sobre os pontos da matéria de facto.

    1. - Não pode ser assacado ao ato administrativo em crise a violação dos princípios da legalidade, igualdade e boa-fé, sendo que este cumpriu escrupulosamente as normas regulamentares e legais aplicáveis – artigo 25.º Regulamento de Bolsas, artigo 5.º do Estatuto do Bolseiro de Investigação Científica e art.º 4.º da Portaria n.º 841/2009.

    2. - Já o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, no processo n.º 00291/12.4BEAVR, se pronunciou sobre esta questão.

    NESTES TERMOS, E NOS DEMAIS DE DIREITO QUE ESSE TRIBUNAL SUPRIRÁ, DEVERÁ A SENTENÇA RECORRIDA SER MANTIDA.

    O MP, notificado ao abrigo do disposto no artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.

    Cumpre apreciar e decidir.

    FUNDAMENTOS DE FACTO Na sentença foi fixada a seguinte factualidade: 1. Em data não...

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