Acórdão nº 93/04.1BEFUN de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Maio de 2020
Magistrado Responsável | DORA LUCAS NETO |
Data da Resolução | 14 de Maio de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório O Ministério da Finanças, ora Recorrente, interpôs recurso jurisdicional do acórdão do Tribunal Administrativo do Funchal, que decidiu julgar parcialmente procedente a ação contra si intentada por J...
, e consequentemente: i) Anulou o ato impugnado, por violação dos princípios da boa-fé e da proteção da confiança, que consubstanciam o vício de violação de lei; e, conhecendo do pedido indemnizatório, ii) Condenou o Ministério das Finanças a pagar ao A. a quantia de € 25.421,75, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a data de citação até integral e efetivo pagamento Nas alegações de recurso que apresentou (fls. 707 e ss. do SITAF), culminou com as seguintes conclusões: «(…) I. Vem o Recorrente pôr em causa o Douto acórdão que o condenou a pagar a quantia de €25.421,73, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% porque, na sua opinião, aquele enferma das seguintes nulidades: omissão de pronúncia e erro na interpretação dos factos e consequente enquadramento legal.
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Quanto à primeira questão do erro na interpretação dos factos e consequente enquadramento legal, entende o Recorrente que a matéria trazida aos autos, correctamente interpretada, impõe uma decisão diversa, na medida em que as conclusões retiradas na sentença deveriam conduzir logicamente não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto. Existindo, por isso, um vício no processo lógico de construção da sentença.
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Senão veja-se: entendeu, e bem, o Douto Tribunal quando decidiu que a ilegalidade formal da proposta, ou seja, a sua apresentação extemporânea face ao prazo definido no procedimento consubstancia um fundamento válido para a não adjudicação, concluindo que o Autor nunca adquiriu direito à celebração do contrato em causa nos autos. No entanto, ao mesmo tempo, indemniza o Autor pelos danos que não teria se tivesse celebrado o contrato, como se fosse titular de qualquer expectativa legítima de vir a ser contraente. Que não tinha, residindo aqui o erro lógico.
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Ao assim decidir, a Douta sentença é incongruente com as conclusões que ela própria retira, enfermando de contradição insanável, e acaba por. tutelar expectativas que não poderiam existir, uma vez que o procedimento pré-contratual, que foi anulado, não seria nunca apto a produzir consequências jurídicas resultantes de expectativas legítimas que um concorrente teria. Muito menos de alguém que não chegou a sê-lo.
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No que toca à segunda questão, da omissão de pronúncia, entende o Recorrente que o Douto Tribunal a quo não se pronunciou sobre algumas questões oportunamente alegadas e que, a fazê-lo, a decisão teria necessariamente; de ter sido diversa.
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Em primeiro lugar, não se pronunciou sobre a (i)legitimidade da Autoridade Tributária e Aduaneira para, neste momento, representar em juízo os interesses da Região Autónoma da Madeira (RAM) nos presentes autos, em função do disposto no n° 1 do art° 8° do Decreto-lei n° 18/2005 de 18/01, que atribuiu à RAM poder tributário próprio. Pelo que a entidade competente para patrocinar um eventual recurso seria a Direcção Regional dos Assuntos Fiscais da RAM, que deveria ter sido notificada da Douta sentença, que não foi. Devendo esta omissão ser suprida, para os devidos efeitos.
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Em segundo lugar, a Douta decisão é também omissa, porque não considerou as causas de mérito justificativas de suspensão do procedimento e que, por esta via implicariam que não pudessem ser considerados como violados quaisquer princípios de boa-fé ou de confiança: - A entrada em vigor da Deliberação do Conselho de Ministros n° 7-B/2002 de 26 de Abril de 2002; - O novo Despacho do SEAF proferido em 04/05/2004 que determinou que se aguardasse a transferência de competências da DGCI para a RAM, sendo que qualquer novo procedimento seria já autorizado pela Região e não pelos Serviços Centrais da DGCI; ! - O facto de o SEAF ter anulado o procedimento pré-contratual em circunstâncias que encontraram cabimento na previsão da alínea b) do art°58° do regime geral constante do Capítulo I do Decreto-lei n° 197/99 de 8 de Junho, pelo que o despacho não seria anulável por vício de forma, estando legalmente enquadrado; 8. Em suma, a Douta sentença nada disse sobre a questão de que a desistência do procedimento adjudicatório se deveu a razões ligadas à inconveniência e mesmo à impossibilidade administrativa do SEAF autorizar a continuação do procedimento de arrendamento.
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Tivesse a Douta sentença apreciado estas questões, não poderia nunca considerar como violados quaisquer princípios de boa-fé ou de confiança, na medida em que existiram razões legais e de mérito para que a suspensão ocorresse. Em virtude desta omissão de apreciação, considera a Douta sentença (e acórdão confirmatório), erradamente, que o acto de suspensão do procedimento não foi fundamentado.
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Em terceiro lugar, a decisão é omissa porque não considera o argumento da entidade requerida de que o então Autor deveria efectivamente ser indemnizado, não em função do valor de uma renda resultante de um contrato de arrendamento, mas do valor de um depósito, nos termos dos art°s 1185° e s.s do Código Civil.
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Sobre esta questão, o Tribunal nada diz. Sendo que a sua apreciação era fundamental para chegar a um eventual valor de indemnização que remunere justamente o então Autor pelo depósito de um cofre num espaço em bruto, inacabado. Nesta parte, a Douta decisão, por omissão na apreciação de argumentos, é totalmente infundada e, a manter-se este valor, a indemnização enriquece, sem causa, o então Autor que recebe um valor, astronómico e totalmente desadequado, sem adesão nem à realidade dos factos nem do Direito.
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Em quarto lugar, ainda no que toca ao valor da indemnização, a Douta sentença é também omissa porque quanto ao valor remanescente da indemnização (3.421,75 pela elaboração do projecto de arquitetura, decoração e execução das instalações durante o período de tempo em que o cofre permaneceu nas mesmas, ou seja durante í 1 meses), a decisão posta não se pronunciou sobre a questão da idoneidade dos documentos apresentados: não há nenhum documento de suporte da transacção financeira.
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Deverá, por isso, considerar-se que não existe qualquer nexo causal entre, o acordo feito entre o Autor e o então Chefe do SF de Santana e os danos alegados relativamente a despesas de adaptação, que também por não estarem provados, não são imputáveis ao Recorrente. Não podendo por isso o Recorrente ser condenado no pagamento da; quantia de €3.421,75 a título de indemnização por danos patrimoniais, na medida em que o Autor não logrou demonstrar nenhuma lesão patrimonial correspondente.
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Decorrendo daqui que não estão preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil extra-contratual, pelo que também quanto a esta matéria deveria improceder o peticionado, a partir da correcta apreciação dos argumentos da entidade recorrida.» A Recorrida, cabeça de casal da herança de J..., contra-alegou, concluindo como segue: «(…) 1. Só uma leitura desatenta ou distorcida da douta sentença pode justificar a alegação de omissão de pronúncia e errada interpretação dos factos.
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A omissão de pronúncia não ocorre por o Tribunal não acatar a argumentação da parte vencida, é necessário que, em face do sentido da decisão, tenha feito tábua rasa de factos que deveria ter apreciado e não apreciou, o que não sucede no caso em apreço.
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Com efeito, todas as questões relevantes e com interesse para a boa decisão da causa foram apreciadas e decididas, quer do ponto de visto dos factos, quer do ponto de vista do direito.
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Os factos, alias, foram quase na totalidade dados como assentes no despacho saneador.
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O tribunal introduziu mais um quesito simples...
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