Acórdão nº 177/18.9BECTB de Tribunal Central Administrativo Sul, 23 de Abril de 2020
Magistrado Responsável | VITAL LOPES |
Data da Resolução | 23 de Abril de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL 1 – RELATÓRIO M………………………., LDA.
, melhor identificada nos autos, notificada da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de IVA de períodos de 2013 e a liquidação adicional de IRC do ano de 2013, e respectivos juros compensatórios, tudo no valor de €90.497,38, vem interpor recurso jurisdicional para este Tribunal.
A Recorrente juntou alegações, que termina com as seguintes conclusões: «A. A Sentença incorre em erro de julgamento quando dá como provados os factos enunciados nos números 26, 40, 46 e 59 da matéria dada como provada, através de documentos que não integram o processo administrativo; B. A Mma Juíza deu como provados os factos números 26, 40, 46 e 59, em virtude de ter admitido fundamentação à posteriori dos actos de liquidação do IVA; C. A Sentença enferma de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615º do CPC, dado não se ter pronunciado sobre a falta de fundamentação invocada na PI quanto às liquidações de IVA; D. A fundamentação sobre o quantum das liquidações adicionais de IVA apenas ocorreu com os documentos apresentados, em audiência de inquirição de testemunhas, pela Fazenda Publica, e que não podia ser admitida pela Mma Juíza; E. Ressalvando o enorme respeito e reconhecimento de mérito da Mma Juíza, notória, sempre se dirá que existiu parcialidade da Mma Juíza quando admite a junção de documentos oficiais antes de conhecer o seu teor e quando convida o Digníssimo Representante da Fazenda Pública a juntar o documento ao processo; F. A prova testemunhal carreada para os autos pela testemunha da Fazenda Pública e pela Testemunha R............., contrariam na totalidade os factos enunciados nos números 26, 40, 46 e 59 da matéria dada como provada; G. A Sentença Recorrida dá como factos não provados os indicados em A) e B), quando a prova testemunhal produzida pela testemunha da Fazenda Pública e pela Testemunha R............. dá como provada a reunião existente e o pedido de regularização das operações incorrectamente registadas na contabilidade; H. A Mma Juíza não ponderou, para decidir, não só os documentos juntos à impugnação judicial como não atendeu à prova testemunhal carreada para os autos pela testemunha da Fazenda Pública e pela Testemunha R............., que declararam, sob compromisso de honra, que tinha existido uma reunião, na qual foi solicitada a rectificação das situações que não estavam correctas; 1. A Sentença recorrida face aos depoimentos da testemunha da Fazenda Pública e do Senhor R............. concretamente transcritos e levando em consideração os documentos juntos, devia dar como provada a matéria alegada em 42º, 43º, 44º, 47º, 48º, 49º, 51º e 62º da PI, a saber: - O recorrente rectificou a contabilidade antes de iniciada a acção de fiscalização, tendo, aquando do início da acção de inspecção, apresentado o balancete que evidenciava a realidade económica financeira da sociedade; - O balancete analítico do ano de 2013 disponibilizado à Autoridade Tributária aquando do início da acção de inspecção, era o documento que reflectia com exactidão a contabilidade da ora recorrente.
- As obras que o recorrente inicialmente havia registado em proveitos/réditos, e que não foram realizadas, foram correctamente reclassificadas para a conta de diferimento de proveitos - 282911321; - Para efeitos do apuramento do quantum da liquidação de IRC impugnada concorreram os valores registados na conta 282911321, no valor de € 343.981,76, referente a obras que não foram iniciadas nem realizadas nesse exercício; J. O facto dado como não provado A), deveria ter sido reformulado, n a medida em que a testemunha E............., confirma que, ela própria, o seu colega e a coordenadora, reuniram com o contabilista (Senhor R.............) e solicitaram a regularização das falhas da contabilidade e da tributação, mormente, com urgência na situação do reembolso do IVA dos 60.000 euros; K. Os factos dados como não provados C), D), E), F), G) e H), deveriam ser dados como provados, na medida em que, reiteradamente foi declarado pela testemunha R............., que a contabilidade analisada pela AT não correspondia à contabilidade que a recorrente enviou para a inspecção tributária, e que os custos/gastos e proveitos/réditos que não haviam sido realizados foram, sem excepção,expurgados da contabilidade.
L. Os factos dados como não provados C), D), E), F), G) e H), e a decisão adaptada ferem o teor do artigo 39º da LGT, segundo o qual: "Em caso de simulação de negócio jurídico, a tributação recai sobre o negócio jurídico real e não sobre o negócio jurídico simulado." M. O depoimento da testemunha R............., em conjugação com os documentos juntos aos autos, permitiria considerar provados os fatos articulados em 74º, 75º, 80º, 81º, 82º, 86º, 90º, 91º, 101º, 102 e 105º da PI, logo dar como provados, os factos, que a Mma Juíza, deu como não provados em 1), J), K), L) e M).
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A Mma Juíza dá como não provado que tenha sido vendida a viatura, mas deu como provado que a recorrente não comprou a viatura. Importa assim indagar como se dá como não provada que não se vendeu uma viatura que por sua vez se dá como provada que não foi adquirida. Logo, supostamente, a recorrente vendeu o que não comprou! O. O facto não provado elencado em N), deveria, salvo melhor opinião, ser considerado como facto provado, atentas as declarações da testemunha que, com conhecimento directo e pessoal, conhecia a realidade aqui suscitada.
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O dispositivo não é claro, objectivo e principalmente esclarecedor do julgamento realizado, e sobretudo elucidativo do valor que as liquidações impugnadas sucumbiram e qual o valor das liquidações que se mantêm. Mais, é contraditório.
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A Sentença enferma, nos termos dos artigos 615.º alínea d) e nº 2 do 608.º, do CPC, de nulidade por excesso de pronúncia, dado que o pedido formulado na PI não se coaduna com o julgado.
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Atento o dispositivo da Sentença, onde se indicam os valores alegadamente anulados, a percentagem de condenação de custas está errado, na medida em que, sendo o valor da acção de 90.497,38 EUR e o valor de IRC anulado pela Sentença teria que ascender, no mínimo, a 18.367,88 EUR, então, e sem considerar o IVA alegadamente anulado pela Sentença, o decaimento nunca poderia ser inferior a 20%.
Uma vez que a sentença padece de erro de julgamento no âmbito da valoração da prova produzida e na aplicação do direito e bem assim de omissão e excesso de pronúncia, deve ser dado provimento ao recurso e consequentemente ser revogada a sentença recorrida, com todas as consequências legais, nomeadamente a anulação total das liquidações impugnadas, assim se cumprindo a Lei e de fazendo Justiça.» A Recorrida Fazenda Pública não contra-alegou.
A Exma. Senhora Procuradora-Geral-Adjunta emitiu mui douto parecer em que conclui no sentido da improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, cumpre decidir.
2 – DO OBJECTO DO RECURSO Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação do Recorrente (cf. artigos 634.º, n.º4 e 639.º, n.º1 do CPC), são estas as questões que importa resolver: (i) se a sentença enferma de nulidade por omissão de pronúncia dado não se ter pronunciado sobre a falta de fundamentação das liquidações de IVA invocada na P.I.; (ii) se enferma de nulidade por excesso de pronúncia na medida em que o julgado exorbitou o pedido formulado na P.I.; (iii) se o dispositivo da sentença se apresenta obscuro e contraditório com o julgado; (iv) se a sentença incorreu em erro de julgamento na medida em que deu como provados os factos vertidos nos pontos 26, 40, 46 e 59 da matéria assente com base em documentos que não integram o processo administrativo; (v) parcialidade da Mmª. Juiz a quo dado ter diligenciado e aceite a junção de documentos oficiais pela Fazenda Pública sem antes se inteirar da pertinência do respectivo conteúdo; (vi) erro de julgamento da sentença ao dar como não provados os factos contantes dos pontos A) a M) do probatório e ao não dar como provados os factos alegados nos artigos 42 a 44, 47 a 49, 51 e 62 da P.I.; (vii) a percentagem de condenação em custas não é proporcional do decaimento das partes.
3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Em 1ª instância, deixou-se consignado em sede factual: 1. Em 30.09.2013 a Impugnante emitiu, em nome da “S………………, Lda.”, a factura n.º 10/80, no valor de 24.600,00 EUR (IVA incluído), com a descrição “Produção de prateleiras em madeira, circuito de iluminação e estrutura em ferro. Transporte incluído até ao destino. “Bens/serviços colocados à disposição do adquirente nesta data.” – cfr. factura de fls. 19 do processo administrativo.
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Em 03.10.2013 foi elaborado o documento intitulado “Acordo mútuo de rescisão de serviços”, que aqui se dá por reproduzido, para o efeito de “rescisão e quitação, por mútuo acordo entre o prestador de serviços “M............ Lda” (…) e o requisitante dos mesmos, a empresa, “S………………….. Lda”, (…) referente aos trabalhos de produção prateleiras, circuito de iluminação e estruturas em ferro destinados à estruturas para stand da Feira S. Mateus – Viseu, e constantes da Factura n.º 10/80 de 30-09-2013 em anexo, uma vez que os mesmos não foram efectuados de acordo, e em perfeitas condições com o contratualizado.” – cfr. fls. 18 verso do processo administrativo.
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O documento melhor identificado no ponto anterior do probatório só está assinado pelo legal representante da Impugnante – cfr. fls. 18 verso do processo administrativo.
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Em 03.10.2013 a Impugnante emitiu a nota de crédito n.º 10/5, em nome de “S…………………., Lda”, no valor 24.600,00 EUR (IVA incluído), com a descrição “Anulação da fatura 10/80 de 30.09.2013 por rescisão” – cfr. nota de crédito de fls. 18 do processo administrativo.
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A Impugnante emitiu a factura n.º 10/26, em...
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