Acórdão nº 00563/14.3BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 31 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução31 de Maio de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório OMMF, com os demais sinais nos autos, veio propor ação administrativa especial, ao abrigo do art.º 48.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20/11, contra o MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, e CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, na qual peticionou: a) que seja reconhecido o acidente ocorrido em 24/10/2012 como acidente de trabalho, condenando-se os RR. “à prática do ato administrativo devido, em substituição, revogando o despacho de indeferimento do pedido de qualificação como acidente de trabalho, e ainda que o Ministério da Justiça seja condenado à prática de um novo ato que qualifique o referido acidente sofrido pela Autora como acidente de trabalho nos termos do artigo 7.º n.º 1 do DL 503/99 de 20 de novembro e artigo 8.º n.º 1 e 2 da Lei 98/2009 de 04 de setembro, com as legais consequências”; b) que se proceda “à atribuição do subsídio de elevada incapacidade permanente, nos termos do artigo 37.º do DL 503/99 de 20 de novembro, desde 19/04/2013, a ser atribuído pela R. Caixa Geral de Aposentações acrescido de juros, à taxa legal até integral pagamento”; c) que se promovam os “respetivos abonos das diferenças de vencimentos, nomeadamente os subsídios de refeição e os suplementos de caráter permanente, desde 01/10/2012 até 01/01/2014 no valor de € 2.465,93 (dois mil quatrocentos sessenta cinco euros e noventa e três cêntimos) faltando contabilizar os restantes meses uma vez que a A. não tem os recibos de vencimento, nos termos do artigo 6.º e 15.º do DL 503/99 de 20 de novembro”; d) que se proceda “à atribuição do Subsídio por assistência de terceira pessoa, nos termos do artigo 16.º e 36.º do DL 503/99 de 20 de novembro, a ser atribuído pela R. Caixa Geral de Aposentações”; e) que se proceda “à atribuição do Subsídio para readaptação de habitação, no valor de € 2.872,26 (dois mil oitocentos setenta dois euros e vinte seis cêntimos), nos termos do artigo 36.º do DL 503/99 de 20 de novembro – Cfr. Doc. n.º 18”; f) que se proceda à “atribuição de pensão anual e vitalícia e atualizável no montante de € 15.399,17 (quinze mil trezentos noventa nove euros e dezassete cêntimos), a pagar adiantada e mensalmente até ao 3.º dia de cada mês, correspondendo cada uma das prestações a 1/14 da pensão anual, sendo a prestação correspondente ao subsídio de Férias e de Natal paga, respetivamente, nos meses de maio e de novembro, acrescendo juros de mora à taxa legal desde o vencimento até integral pagamento, nos termos do artigo 34.º DL 503/99 de 20 de novembro, a ser atribuído pela R. Caixa Geral de Aposentações”.

*A Autora, inconformada com a decisão proferida no TAF de Coimbra em 6 de março de 2019, através da qual a Ação foi julgada improcedente, veio em 25 de março de 2019, recorrer da decisão proferida, na qual se conclui: “1. Vem o presente recurso interposto da douta Sentença de fls. (…) do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou a ação administrativa especial improcedente, e em consequência decidiu absolver os RR. dos pedidos deste com base que: “… veio a concluir-se que o ato impugnado - decisão da Subdiretora-Geral da Administração da Justiça, proferida em 30/07/2013, nos termos da qual foi determinada a não qualificação da ocorrência de 24/10/2012 como acidente de trabalho - não padece de qualquer vício de ilegalidade, devendo ser mantido na ordem jurídica, o que determina não só a improcedência do pedido de impugnação e de condenação à prática do ato devido (de qualificação como acidente de trabalho), como também, forçosamente, a improcedência dos demais pedidos condenatórios relativos ao pagamento das prestações e subsídios no Decreto-Lei n.º 503/99, de 20/11, porque dependentes da prévia qualificação do evento como acidente de trabalho/em serviço, o que não se verifica.” 2. O Tribunal a quo deixou de considerar, inúmeras provas documentais, nomeadamente, o relatório do dano psíquico, onde foram prestadas as declarações da recorrente OF, entre outros documentos, onde demonstram a situação clínica da autora, antes do evento traumático, e documentos onde de uma forma concreta indiciavam que a autora sofreu um verdadeiro acidente de trabalho.

  1. Pelo exposto, salvo o devido respeito deve-se considerar que a Sentença recorrida viola o disposto no artigo 615.º n.º1 al. b) do CPC.

  2. Assim, os requisitos formais de admissibilidade da impugnação da decisão de facto, mormente os constantes do artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) e c), do CPC, têm em vista, no essencial, garantir uma adequada inteligibilidade do objeto e alcance teleológico da pretensão recursória, de forma a proporcionar o contraditório esclarecido da contraparte e a circunscrever o perímetro do exercício do poder de cognição pelo tribunal de recurso.

  3. A decisão judicial ora posta em crise, que teve por base uma incorreta valoração da prova e, até mesmo prova inexistente ou insuficiente.

  4. Nesse sentido, na contestação apresentada, ao enunciar o objeto da sua defesa, o Recorrido, não juntou qualquer prova (documental ou testemunhal), nomeadamente, atas, ou outro documento que comprove que efetivamente iria um outro elemento ajudar a ora aqui recorrente, assim resultando incumprido o assinalado ónus.

  5. Face ao exposto, a decisão judicial recorrida incorre em nulidade nos termos do artigo 615.º, n.º 1 alínea c) do CPC, violou, por erro de interpretação de direito e de facto, os artigos 572.º do CPC, ex vi artigo 1.º CPTA, artigos 341.º e 342.º do Código Civil, pois as provas revelam um sentido e a decisão recorrida extrai ilação contrária, incluindo quanto à matéria de facto provada.

  6. Defende a recorrente, igualmente, que na decisão recorrida existe contradição entre a fundamentação de direito face à matéria de facto que foi dada como assente, pretendendo assacar à decisão do Tribunal a quo, o vício de nulidade devido a contradição entre os fundamentos de facto e de direito.

  7. Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al. c), do C.P.Civil, é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.

  8. Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artigo 154.º, nº.1, do CPC.

  9. Entende a recorrente que face a estas dúvidas, a sentença é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível, é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes.

  10. Neste caso não se sabe o que o juiz quis dizer, no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos. É evidente que em última análise, a ambiguidade é uma forma especial de obscuridade. Se determinado passo da sentença é suscetível de duas interpretações diversas, não se sabe ao certo, qual o pensamento do juiz.

  11. A decisão só é, assim, obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível e ambíguo, quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes e/ou sentidos porventura opostos.

  12. Ou seja, a nulidade só poderá ser atendida no caso de se tratar de vício que prejudique a compreensão da decisão judicial [despacho/sentença/acórdão] e de se apontar concretamente a obscuridade ou ambiguidade cuja nulidade se pretende ver declarada.

  13. Ora, no presente caso, estamos perante uma sentença obscura e ininteligível, o que determina nos temos do artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, ex vi artigo 1 do CPTA, a sua nulidade.

  14. Ora, a questão fulcral que importa apreciar é a de saber se o AVC sofrido pela recorrente (que lhe determinou a atribuição de uma incapacidade permanente global de 70%) se ficou a dever a um acidente de trabalho.

  15. E julgamos que a resposta, in casu, só pode ser positiva, face á matéria dada como provada nos presentes autos, apenas podemos concluir que a recorrente logrou provar, como lhe competia, a ocorrência de um qualquer evento verificado por ocasião do trabalho ou com ele relacionado causador do AVC e das lesões e sequelas de que ficou portadora. Ou seja, a recorrente provou que o AVC e as lesões sofridas ocorreram por causa de intervenção exterior (evento súbito exterior ao lesado).

  16. Entendeu o tribunal a quo por conseguinte, pela inexistência, no caso dos autos, de um acidente de trabalho ou em serviço, pelo que nada há a apontar à decisão aqui impugnada, que não qualificou o AVC sofrido pela A. como acidente de trabalho, sendo a mesma de manter, por se mostrar conforme às disposições legais aplicáveis.

  17. A decisão não explica nem tinha de explicar a hipótese colocada, por se ignorar se a recorrente sofreu, ou não, outras situações e nem se saber se as condições externas foram, ou não, semelhantes às verificadas quando ocorreu o acidente, sendo que, em todo o caso, os acidentes não ocorrem em condicionalismos predefinidos. São, por natureza, inesperados.

  18. Ora, conforme face à matéria de facto dada como provada, não restam qualquer dúvidas que de facto, a recorrente exerceu a sua atividade no ambiente de grande stress e pressão, bem como ficou demostrado que de facto face à diminuição dos funcionários judiciais, houve também aqui um aumento brutal de serviço.

  19. Já Carlos Alegre, refere que a doutrina aponta como características do acidente naturalístico tratar-se dum evento exterior à constituição orgânica da vítima, em geral súbito e que causa uma ação lesiva sobre o corpo humano.

  20. No entanto, continua este autor, esta caracterização está longe de ser completa, pois “nem o acontecimento exterior direto e visível, nem a violência são, hoje, critérios indispensáveis à caracterização do acidente. A sua verificação é extremamente variável e relativa, em muitas circunstâncias. Além disso, a causa exterior da lesão tende a confundir-se com a causa do acidente de trabalho, num salto lógico, nem sempre evidente”.

  21. Por isso, sustenta este autor que a violência não constitui, a não ser como critério subsidiário, uma característica...

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