Acórdão nº 90/19.2BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 06 de Junho de 2019
Magistrado Responsável | PAULO PEREIRA GOUVEIA |
Data da Resolução | 06 de Junho de 2019 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO I………., nacional da Guiné Bissau, instalado temporariamente no Centro de Acolhimento de Refugiados, sito na Rua S…… da C……, n.º …, B…, 2695-.... Bobadela, intentou, nos termos do disposto no artigo 37.º, n.ºs 4 e 5 da Lei n.º 27/2008, de 30/06, alterada pela Lei n.º 26/2014, de 05/05, o presente processo urgente contra o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA.
A pretensão formulada ao T.A.C. foi a seguinte: “Ser anulada a decisão do Diretor Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, de 18/12/2018, que considerou inadmissível o pedido de proteção internacional formulado pelo Autor, em 12/11/2018, determinando a sua transferência para Itália; Ser o pedido de Proteção Internacional imediatamente deferido ou, em alternativa, ser a Entidade Demandada condenada a instruir o procedimento, com informação fidedigna atualizada sobre o funcionamento do procedimento de asilo italiano e as condições de acolhimento dos requerentes de proteção internacional em Itália.” Após a discussão da causa, o T.A.C. decidiu anular a decisão proferida a 18/12/2018 pelo Diretor Nacional do SEF, que considerou o pedido de proteção internacional apresentado pelo Autor inadmissível e determinou a sua transferência para Itália, bem como condenar a Entidade Demandada a retomar o procedimento administrativo, em conformidade com o julgado.
* Inconformado, o requerido interpôs o presente recurso de apelação contra aquela decisão, formulando na sua alegação as seguintes conclusões: 1) Resulta evidente que a douta sentença a quo, ao refutar a decisão do recorrente, não deu cumprimento às normas legais vigentes em matéria de asilo, mormente no que respeita ao mecanismo da retoma a cargo, ao qual a Itália, enquanto Estado membro, está vinculada.
2) Outrossim, não é consentânea com a jurisprudência da U.E. e do STA.
3) ln casu, não existe qualquer preterição, designadamente quanto ao referido relatório a que atenta o art. 17.º da Lei 27/2008, porquanto à situação vertente não se aplicam os trâmites procedimentais (comuns) do pedido de proteção internacional previstos na Secção 1 do Capítulo IlI da Lei de Asilo (entre as quais o art. 17.º).
4) Ao invés, é-lhe aplicado o disposto no arts. 36º e segs., ou seja, as disposições do Capítulo IV da citada lei, que regem sobre o procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional.
5) Consequente e vinculadamente, o pedido foi considerado inadmissível e determinada a transferência do recorrido para Itália, Estado-Membro responsável pela análise do pedido, sendo o Estado português apenas responsável pela execução da transferência nos termos dos arts. 29º e 30º do Regulamento de Dublin.
6) Neste contexto, e ao invés da douta sentença, o ato administrativo anulado encontra-se legalmente enquadrado face ao disposto nos comandos imperativos ínsitos na legislação supra invocada, devendo assim ser acolhido, porquanto se mostra irrepreensível.
7) Em suma, entendimento plasmado pelo recorrido conduz à ilegalidade da Sentença, devendo por isso ser revogada.
* O recorrido contra-alegou, concluindo assim: * Cumpridos os demais trâmites processuais, importa agora apreciar e decidir em conferência.
* II – FUNDAMENTAÇÃO II.1 – FACTOS PROVADOS O tribunal recorrido decidiu estar provada a seguinte factualidade: "Texto Integral com Imagem" II.2 – APRECIAÇÃO DO RECURSO Delimitação do objeto do recurso: Os recursos, sendo dirigidos contra a decisão do tribunal recorrido, têm o seu âmbito objetivo delimitado pelo recorrente nas conclusões da sua alegação de recurso - cf. artigos 144º-2 e 146º-4 do CPTA, artigos 5º, 608º-2, 635º-4-5 e 639º do CPC-2013, “ex vi” artigos 1º e 140º do CPTA -, alegação que apenas pode incidir sobre as questões de facto e ou de direito que tenham sido apreciadas pelo tribunal recorrido ou que devessem ser aí oficiosamente conhecidas; sem prejuízo das especificidades do contencioso administrativo - cf. artigos 73º-4, 141º-2-3, 143º e 146º-1-3 do CPTA[1].
Ora, tudo visto, as questões a resolver contra a decisão ora recorrida são as seguintes: - Erro de julgamento, por violação dos arts. 17º e 37º da Lei do Asilo e dos arts. 29º[2] e 30º[3] do Regulamento de Dublin.
Passemos, assim, à análise do recurso de apelação.
* O Tribunal Administrativo de Círculo entendeu o seguinte: “Vem o Autor peticionar a anulação do despacho proferido pelo Diretor Nacional do SEF que considerou o pedido de proteção internacional por si apresentado inadmissível e determinou a sua transferência para a Itália, por ser o Estado-Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional.
Por referência às questões a decidir supramencionadas, são dois os vícios imputados ao ato impugnado que cumpre analisar: vício de preterição de audiência prévia e vício de preterição de diligências instrutórias.
Vejamos.
Do vício de preterição de audiência prévia Foi suscitado oficiosamente o vício de preterição de audiência prévia.
Em resposta, a Entidade Demandada defendeu que o caso dos autos enquadra-se no procedimento previsto nos artigos 36.º e 37.º da Lei do Asilo, não tendo aqui aplicação o artigo 17.º da Lei do Asilo, como foi já entendido no Acórdão do TCAS de 04/10/2018, processo n.º 807/18.2BELSB e Acórdão do STA de 11/01/2019, no âmbito do mesmo processo, tendo o Autor prestado declarações em idioma por si escolhido, de forma a assegurar ao requerente o direito de apresentar os factos em que fundamenta a sua pretensão e cujo Auto de Declarações foi, no mesmo dia, notificado ao Autor, pelo que foram observados todos os dispositivos legais aplicáveis ao caso dos autos.
Vejamos.
O direito de asilo encontra consagração constitucional no artigo 33.º, n.º 8 da CRP, onde se prevê que “É garantido o direito de asilo aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos ou gravemente ameaçados de perseguição, em consequência da sua atividade em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana.
” Em concretização deste preceito constitucional, a Lei n.º 27/2008, de 30/06, alterada pela Lei n.º 26/2014, de 05/05 (que a republicou e comummente designada Lei do Asilo) estabelece as condições e procedimentos de concessão de asilo ou proteção subsidiária.
O artigo 16.º, n.º 1 da Lei do Asilo dispõe que, “antes de proferida qualquer decisão sobre o pedido de proteção internacional, é assegurado ao requerente o direito de prestar declarações na língua da sua preferência ou noutro idioma que possa compreender e através do qual comunique claramente, em condições que garantam a devida confidencialidade e que lhe permitam expor as circunstâncias que fundamentam a respetiva pretensão”.
Os pedidos de proteção internacional consideram-se inadmissíveis quando se verifique qualquer das situações previstas no artigo 19.º-A da Lei n.º 27/2008, de 30/06, competindo tal decisão ao Diretor Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras - cfr. artigo 20.º, n.º 1.
Não se verificando qualquer das circunstâncias previstas neste preceito - ou qualquer das situações consideradas infundadas pelo disposto no artigo 19.º do mesmo diploma –, o pedido deve ser admitido e instruído nos termos dos artigos 27.º e seguintes, tendo em vista a decisão de concessão ou recusa de proteção internacional, por parte do membro do Governo responsável pela administração interna - cfr. artigos 20.º, n.º 4, 21.º, n.º 1 e 29.º, n.º 5.
Dispõe o artigo 19.º-A da Lei do Asilo – sob a epígrafe “Pedidos inadmissíveis”: “1 – O pedido é considerado inadmissível, quando se verifique que: 1 - Está sujeito ao procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional, previsto no capítulo...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO