Acórdão nº 00627/18.4BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 01 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução01 de Março de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO FN, natural do Uzbequistão, instaurou processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias contra o Ministério da Administração Interna - Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, Direcção-Regional do Centro, ambos melhor identificados nos autos, formulando os seguintes pedidos de condenação do SEF: “ (…) II-A- Adoptar o acto administrativo de atribuição do visto e autorização de residência para o exercício de trabalho subordinado, ao cidadão estrangeiro requerente, II-B- Se abstenha de efectivar a expulsão administrativa («afastamento coercivo»)do requerente, bem como as demais inscrições no sistema de informação Schengen, mormente no que respeita à interdição de entrada pelo período de 3 anos no dito «espaço Schengen».

II-C- CONCRETIZANDO E DETALHANDO AS MEDIDAS SUSBSTITUTIVAS REQUERIDAS: C-1- DE CARIZ NEGATIVO: 1.º Se abstenha de afastar, do território nacional, de modo coercivo, o cidadão Requerente, em virtude do mesmo gozar do direito à liberdade pessoal deambulatória, dentro do território nacional, por força jurídica específica do respectivo DLG posto em causa, bem como do actual regime de “legalização de permanência” posto pelo legislador ordinário para os cidadãos estrangeiros e cujas restrições, sob pena de ofensa ao artigo 15.º da CRP, não podem ser discriminatórias ou desproporcionadas, atento o disposto nos artigos 13.º, n.º 2, e 18.º, n.os 2 e 3, e 272.º da CRP, que gozam de aplicabilidade directa e imediata, vinculando entidades públicas e privadas, proibindo-se a retroactividade e ofensa ao núcleo essencial do direito fundamental, ainda que em contexto de interpretação hermenêutico-jurídico ou, mais precisamente, em contexto de “concordância prática” por concorrência, conflitualidade ou colisão de vários direitos igualmente valorosos e importantes em termos constitucionais ou legais; 2.º Se abstenha de decretar a interdição de entrada em território nacional por um período de três anos; 3.º Se abstenha de inscrever, na Lista Nacional de Pessoas não Admissíveis, pelo período da interdição implementada de três anos em território nacional e, concomitantemente, “Schengen”; 4.º Se abstenha de inscrever, no Sistema de Informação Schengen (SIS), para efeitos de não admissão pelo período de três anos, em cumprimento do artigo 96.º, n.º 3, da Convenção de Aplicação do Acordo Schengen, o Requerente; 5.º Que não lhe sejam imputadas quaisquer despesas, realizadas pelo Estado português, quer no contexto do actual processo de legalização, que não sejam as que expulsão, por inexistir “justa causa” para tal efeito.

C-2- DE CARIZ POSITIVO: 6.º Reconhecer-se, em suma, a legalização da permanência do cidadão estrangeiro Requerente, à luz do actual quadro legal e constitucional, por se verificarem todos os requisitos legal e regulamentarmente impostos e inexistir qualquer razão de ordem criminal ou ligada à necessidade de protecção da ordem pública, bons costumes, salubridade ou saúde pública do Estado Português, assim se emitindo um acto administrativo, substitutivo do SEF de Coimbra, que atribua um VISTO DE RESIDÊNCIA e uma AUTORIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA PARA O EXERCÍCIO DE TRABALHO SUBORDINADO.

7.º Reconhecer-se efectividade aos Direitos, Liberdades e Garantias do cidadão Usbequistanês melindrados ou violados com as decisões administrativas impugnadas, de onde se destacam os direitos à presença de um defensor, à liberdade deambulatória deste cidadão, dentro do nosso país, como lhe afronta outros direitos fundamentais pessoais, como o são a sua dignidade humana e tutela geral da sua personalidade, integridade pessoal e livre desenvolvimento da sua personalidade, protecção legal contra quaisquer formas de discriminação, o direito ao reconhecimento do princípio da equiparação, em matéria de direitos fundamentais, dada a sua qualidade de cidadão estrangeiro, a exigir o reconhecimento “à identidade” dos “DLG´s” mobilizáveis pelos cidadãos nacionais (com excepção do ingresso na Administração Pública, salvo no caso de exercício de funções técnicas, de que Portugal careça) a liberdade pessoal, o acesso ao Direito e à tutela jurisdicional efectiva, célere, justa e equitativa na defesa dos seus direitos fundamentais, o livre acesso e exercício de profissão (de operador de motosserra e outras máquinas de abate de árvores, não abrangida por qualquer resolução de Conselho de Ministros afastadora do contingente global indicativo de oportunidades de emprego reservado à dita profissão), o direito ao tratamento igualitário e à correspectiva não descriminação em função da sua etnia e condição económica, o direito à constituição e protecção da sua família, da paternidade e da maternidade, o direito ao reagrupamento familiar, o direito ao trabalho, o direito à segurança no emprego, o direito à plenitude das garantias de defesas em processo sancionatórios ou ablativos de direitos fundamentais, presunção de inocência, o direito à assistência por defensor e manutenção de status activus processualis defensoris, e o direito ao contraditório em processo administrativo sancionatório fundamentado, leal e justo e a “reserva judicial” em matéria de restrição ou limitação de direitos fundamentais.”*Por sentença proferida pelo TAF de Coimbra foi absolvida da instância a Entidade Demandada.

Desta vem interposto recurso.

*Alegando o Requerente concluiu: I – Os juízes administram a Justiça em nome do Povo português, sendo independentes e, no exercício da sua função jurisdicional, usar de especial reserva, cabendo-lhes, reservadamente, a defesa dos Direitos, Liberdades e Garantias, no contexto de um Estado de Direito Democrático e numa República assente na eminente dignidade da pessoa humana, na construção de uma sociedade justa, livre e solidária, com vista à protecção mais elevada dos direitos fundamentais.

II – A adopção de sentenças pré-elaboradas, à guisa de «cláusulas contratuais gerais», em que se colam pedaços já usados em outras peças, afigura-se desrespeitoso, sobretudo quando se troca a nacionalidade e os elementos de identidade.

III – A celeridade da «Intimação para a defesa de DLG» não se coaduna, sobretudo no caso de improcedência, com uma abordagem “ligeira”, por afrontar a dignidade da pessoa humana cujos direitos fundamentais se pretendiam acautelar e que, com tal decisão, sofre uma segunda lesão.

IV – Contra o estatutária e constitucionalmente previsto o Juiz “a quo” proferiu sentença com o grosseiro e inexplicável erro (inadmissível em contexto de ablação de DLG´s) ao confundir a Guiné-Bissau com o Uzbequistão e, confundir o número do Passaporte do Requerente, com cidadão da Guiné-Bissau.

V – Haverá que notar que a sentença, adoptada pelo Tribunal “a quo”, se afigura ilegal, inconstitucional, anti-democrática e anti-jurídica, visto que, o Tribunal, deve lograr uma fundamentação expressa e acessível, com um critério mais exigente do que nas demais sentenças, devendo considerar as habilitações académicas do destinatário do acto administrativo/sentença por forma a que seja pelo mesmo perceptível.

VI – O juiz para formar a sua convicção, tal não significa um julgamento arbitrário, senão livre arbítrio, sem controlo de legalidade, visto que, em cada processo, apenas haverá uma decisão justa e expressiva protectora dos direitos fundamentais. E, por isso, VII – O presente processo implica, a compatibilização e conformação dos ditos critérios, já que a decisão administrativa de «afastamento coercivo ou de expulsão» de que foi alvo, possui, inegavelmente, NATUREZA SANCIONATÓRIA PÚBLICA.

VIII – Haverá assim, que privilegiar um critério de estrita legalidade, com a prossecução do interesse público, de forma não discriminatória (igualdade), proporcional, justa, imparcial, legal e de boa-fé. Ora, IX – Para que uma sentença esteja fundamentada, de facto e de direito, tem que ser coerente, não contraditória, aderente à normatividade, o que não parece ser o caso, pois a Mma Juiz “a quo”, face aos pedidos formulados no Requerimento de Intimação, alude à sua impropriedade, não obstante, depois, no desenvolvimento da sua ideia, dê conta do modo de implementar o direito do Requerente, quer por meio do recurso a uma providência cautelar, quer por via da condenação ao acto devido, que, contudo, estão expressamente previstos nos pressupostos da intimação.

X – Portanto, a acrescer à peregrinação processual que o Recorrente já efectuou, o Tribunal “a quo” entende que deveria fazer uso de uma providência cautelar de suspensão da eficácia do acto de expulsão ou, ainda, de uma outra providência cautelar, senão mesmo de uma acção especial de condenação à prática do acto devido.

XI – No entanto, o legislador permite que o Tribunal “a quo” tivesse adoptado o que ele diz que o recorrente tem direito a ser adoptado, uma vez que ao longo da sentença, reconhece, inequivocamente, o direito do Recorrente ao visto e autorização de residência, mas, em clara denegação de justiça cautelar e de desrespeito pela lei e CRP.

XII – A despromoção dos direitos fundamentais ao exercício de uma profissão, por parte de um cidadão estrangeiro, em condições similares aos nacionais, afigura-se ilegal, inconstitucional, injusta e passível de atirar o recorrente e a sua grande família para o limbo da miséria, factos que o Tribunal não ponderou para aferição do condicionalismo económico-social e exigências humanitárias.

XIII – Para se considerar que a sentença está fundamentada os fundamentos devem ser claros, coerentes, respeitadores das regras da lógica e racionalidade jurídica; não podendo, no início, afirmar o direito do Recorrente e, depois, no meio e no fim, impedir o exercício dos seus direitos.

XIV – Não se aceita que o Tribunal “a quo” ao abrigo da «reserva judicial», em contexto de restrição, limitação ou protecção dos DLG´s, possa, afoitamente decidir como decidiu atentando aos princípios da proibição de excesso, mínima...

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