Acórdão nº 1358/08.9BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 08 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelHÉLIA GAMEIRO SILVA
Data da Resolução08 de Maio de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul l – RELATÓRIO CARLOS ................ e MARIA ................, vieram deduzir IMPUGNAÇÃO JUDICIAL contra a liquidação de IRS n.º ................, referente ao ano de 2007 e no montante de € 50.171,44.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por decisão de 22 de março de 2012, julgou procedente a impugnação.

Inconformada, a FAZENDA PÚBLICA, veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões: «I - Visa o presente recurso reagir contra a Douta Sentença que julgou procedente a impugnação deduzida por Carlos ................ e Maria ................, contra a liquidação efectuada em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) do ano de 2007.

II - A fundamentação da sentença recorrida, assenta em síntese no entendimento de que o acto de liquidação deve ser anulado, uma vez a aplicação do artº 43º nº 2 do CIRS é incompatível com o artº 56° do Tratado que instituiu a Comunidade Europeia, sendo que por via do disposto no art° 135º do CPA o acto é ilegal. III - Que, os impugnantes, que são residentes na Austrália, ao alienaram um imóvel localizado em Portugal, não podiam ter sido tributados, sobre a totalidade das mais valias realizadas, nos termos do artº 43° nº 2 do CIRS.

IV - A Meritíssima Juiz sustentou a sua decisão proferida na douta sentença ora recorrida, no acórdão do TJCE, que vem no sentido de que o artº 56° CE, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação Nacional, como a que estava em causa na questão prejudicial, quando essa alienação é efectuada por um residente noutro Estado Membro a uma carga fiscal superior á que incidiria, em relação a esta mesmo tipo de operação sobre as mais valias realizadas por um residente do Estado onde está situado esse bem imóvel.

V - Considerou a Meritíssima Juiz, a liquidação de IRS nula, por considerar ter havido uma violação do Tratado da União Europeia, por estarmos em presença de sujeitos passivos não residentes em Portugal; VI - Os impugnantes, proprietários de uma fracção autónoma do prédio em regime de propriedade horizontal sito no concelho de Oeiras, alienaram a referida fracção em 19/05/2008.

VII - E, assim sendo foram tributados nos termos do artº 43° nº 2 do CIRS. (A contrario sensu) VIII - Uma mais valia realizada por um sujeito passivo residente na Austrália - não residente em Portugal - o valor dessa mais valia não pode ser considerado em 50% mas sim na sua totalidade, interpretação que se infere da referida norma legal a contrario sensu.

IX - A citada norma não viola, nem discrimina os direitos dos não residentes por contraposição aos residentes me Portugal, conforme o decidido na douta sentença.

X - E que os impugnantes não são residentes num Estado Membro da UE, mas são residentes na Austrália.

XI - O Tratado prevê no artº 63° do Tratado da UE (ex art° 56 do TCE), proibições de restrições nos movimentos de capitais entre Estados Membros e entre os Estados Membros e países terceiros, porquanto o artº 65° do Tratado da UE (ex artº 58° do TCE) prevê um salvaguarda que permite aos Estados Membros, em matéria de direito fiscal, que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido; XII - Os Estados Membros da UE, em matéria de Impostos directos (IRS), têm competência para legislar e exercer a sua jurisdição fiscal, de conformidade com as leis tributárias vigentes no seu ordenamento jurídico tributário que no caso de Portugal se rege pelo norma constitucional do nº 1 da alínea i) do art° 165° da CRP (reserva de lei da Assembleia da Republica em matéria fiscal).

XIII - O acto tributário de liquidação é legal porque está em conformidade com as leis tributárias vigente no ordenamento jurídico tributário português, não violando quaisquer princípios ou normas constitucionais nem disposições comunitárias.

XIV - Deverá por tudo o exposto, o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a decisão judicial por padecer a mesma de erro de julgamento de facto e de direito, mormente o artº 43° nº 2 do CIRS.

Termos em que, com mui Douto suprimento de V.Exªs, deverá ser considerado procedente o Recurso e revogada a Douta Sentença, como é de Direito e Justiça PORÉM V.EXªS, DECIDINDO FARÃO ACOSTUMADA JUSTIÇA» »« Os recorridos, CARLOS ................ e MARIA ................, apresentaram as suas contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões: «1.ª A liquidação de IRS anulada pela douta sentença recorrida foi nesta correctamente considerada ilegal, por assentar na observância de um preceito legal (o do n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS) que, ao discriminar entre residentes e não residentes, é contrário ao direito comunitário (artigo 56.0 do Tratado da União), o qual tem de prevalecer sobre o preceito nacional com ele desconforme.

  1. Essa ilegalidade da liquidação subsiste apesar de a discriminação respeitar a cidadãos nacionais portugueses (os ora Impugnantes) residentes em território exterior ao da União Europeia.

    Efectivamente, 3.ª De conformidade com o estabelecido no artigo 12.º (na numeração resultante do Tratado de Amsterdão, correspondendo ao artigo 6.º da versão inicial) do Tratado de Roma, é proibida toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade.

  2. O preceito do n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS, se interpretado no sentido de que os não residentes, ainda que nacionais portugueses, ficam excluídos da restrição da tributação da mais-valia em questão a cinquenta por cento da mesma, é materialmente inconstitucional, por violador do princípio da igualdade, 5.ª Já que, de acordo com esse princípio, acolhido nos artigos 13.º e 14.º da constituição da República, todos os cidadãos são iguais perante a lei e não podem ser prejudicados em razão de nenhum dos factores indicados no n.º 2 primeiro dos artigos mencionados e, designadamente; de situação económica ou condição social.

  3. Os cidadãos portugueses que residam no estrangeiro, «gozam da protecção do Estado para o exercício dos direitos e estão sujeitos aos deveres que não sejam incompatíveis com a ausência do país.» 7.ª Assim, impõe-se a aplicação aos ora Recorridos da mesma regra válida para os cidadãos residentes em Portugal, da sujeição de apenas 50 % da mais-valia apurada à tributação em IRS, pelo que bem foi decidido dever a liquidação em apreço ser corrigida em ordem a que dos Recorridos resulte cobrado apenas o montante correspondente a metade do valor da mais-valia apurada.

  4. A matéria da distinção / discriminação feita no n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS já foi abordada pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA) e pelo Tribunal Europeu das Comunidades Europeias (TJCE), em sentido favorável à presente pretensão dos Impugnantes.

  5. O n.º 1 do artigo 56.º do Tratado de Roma estabelece a proibição de todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros.

  6. No caso dos autos tratou-se, como no decidido no referido Acórdão do TJCE, de uma operação de liquidação de um investimento imobiliário.

  7. Uma tal operação constitui um movimento de capitais, devendo ser tido em conta o princípio comunitário da livre circulação de capitais.

  8. O artigo 56.° CE proíbe todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros, sem prejuízo das justificações previstas no artigo 58.º CE 13.ª A luz do artigo 43 .º do Código do IRS, os não residentes estão sujeitos a uma carga fiscal superior àquela que é aplicada a residentes, encontrando-se, portanto, numa situação menos favorável que estes últimos 14.ª Como já decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo, o facto de se prever uma limitação da tributação a 50% das mais-valias realizadas apenas para os residentes em Portugal, e não para os não residentes, constitui uma restrição aos movimentos de capitais, proibida pelo artigo 56.º CE.

  9. Nos termos do art. 8.º, n.º 4, da Constituição, «as disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático».

  10. Atenta a prevalência, nos termos acabados de referir, do direito comunitário sobre o direito interno, o art. 43.º, n.º 2 do Código do IRS é incompatível com o referido art. 56.º do Tratado da EU.

  11. Assim, o acto de liquidação impugnado padece do vício de violação do referido artigo 56.º do Tratado de Roma.

  12. Esse vício representa ilegalidade, sendo que esta justifica a pedida anulação do acto de liquidação, atento o disposto no artigo 135.º do Código de Procedimento Administrativo.

  13. A luz do n.º 1 do artigo 56.º do Tratado de Roma, não é pelo facto de o produto da liquidação do investimento imobiliário feita ser para transferir, para um "país terceiro", que deixa de ter aplicação a proibição vertida naquele nº 1 do art. 56° do Tratado CE.

  14. Admitindo, porém, que, não residindo os Impugnantes em território da União, lhes não aproveitariam o raciocínio e linha de orientação acolhidos nos Acórdãos do TJCE e do STA citados nesta alegação, ainda assim a impugnação terá de proceder.

  15. Com efeito, o n.º 2 do...

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