Acórdão nº 00465/10.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelAna Patroc
Data da Resolução18 de Outubro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório MEROR interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 20/02/2018, que julgou procedente o incidente de Anulação de venda deduzido pelo Banco B..., S.A.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “I.1.

O conhecimento pela requerente/recorrida da venda, em execução fiscal, da fração autónoma designada pela letra “AU”, correspondente a lugar de garagem, e a data em que esse conhecimento teve lugar constituem factos, de per si, que se revelam fundamentais para a apreciação da verificação (ou não) da exceção perentória de caducidade do direito de ação, cuja inclusão no elenco de factos provados ou não provados não poderia, portanto, deixar de ter lugar.

I.2.

Por conseguinte, forçoso é concluir que a sentença recorrida incorreu na adoção de uma decisão de Direito com base em insuficiência de matéria de facto, o que não pode deixar de implicar consequências jurídicas, nomeadamente determinando a nulidade da sentença – artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c) do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT – o que expressamente se invoca e cuja declaração se requer.

II.A.1.

Ao contrário do que parece sufragar a decisão recorrida, a requerente/recorrida não logrou cumprir o ónus da prova (subjetivo) que sobre si impendia no sentido de demonstrar que apenas tomou conhecimento da nulidade processual invocada em 18.12.2009, com a submissão do Modelo 1 para efeitos de IMI.

II.A.2.

Por via desse facto, limitou-se a demonstrar que, pelo menos naquela data de 18.12.2009, era a requerente/recorrida conhecedora da invocada falta de notificação do despacho que determinou a venda por negociação particular.

II.A.3. Não tendo sido, contudo, capaz de afastar a dúvida razoável acerca do seu conhecimento em momento anterior – nomeadamente, na data da venda –, tal como se lhe impunha, II.A.4. Donde, perante a dúvida irredutível sobre a realidade do facto – não teve conhecimento da venda na data em que teve lugar, mas apenas em data posterior, em 18.12.2009 – que é pressuposto da aplicação da 2.ª parte da norma do n.º 2 do artigo 257.º do CPPT, deve o julgador decidir, até por força da presunção legal, como estando provado o facto contrário.

II.A.5. E, por conseguinte, considerar que a requerente/recorrida teve conhecimento da venda em 03.12.2009, aquando da prolação do despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Porto-2 que determinou a adjudicação do imóvel à recorrente (vide facto julgado provado sob ponto 10. da “Fundamentação” da decisão recorrida).

II.A.6. O que implica, inelutavelmente, reconhecer que o envio da petição inicial deste incidente de anulação de venda, em 05.01.2010 (vide facto julgado provado sob ponto 5. dos factos relevantes para o conhecimento da exceção perentória de caducidade do direito de ação), se revela intempestivo.

II.A.7.

A sentença recorrida incorreu, assim, em erro na interpretação e aplicação do Direito, mormente o disposto no artigo 257.º, n.º 1, alínea c) e n.º 2 do CPPT, e no artigo 350.º do Código Civil, impondo-se a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por outra que julgue procedente a exceção perentória de caducidade do direito de ação.

II.B.1. Considerando que o artigo 886.º-A, n.º 1 do CPC 1961 apenas tem aplicação “quando a lei não disponha não disponha diversamente” e o CPPT dispõe efetivamente de maneira diversa, regulando integral e imperativamente os regimes da modalidade de venda e da venda subsequente à venda por proposta em carta fechada (artigos 248.º, 252.º e 255.º do CPPT) e o valor base dos bens a vender (artigo 250.º do CPPT), constituindo decisões vinculadas por parte do órgão de execução fiscal; II.B.2.

Considerando que o artigo 252.º, n.º 3 do CPPT prevê uma forma de publicidade da decisão sobre a venda por negociação particular e o valor base do bem a vender diferente da determinada pelo artigo 886.º-A do CPC (publicação na Internet, nos termos da Portaria n.º 352/2002, de 03.04.), a qual respeita o direito de participação do credor com garantia real previamente citado (artigo 239.º do CPPT), sobre o qual recai o dever de diligenciar pela prossecução dos seus interesses, acompanhando o processo de execução fiscal; II.B.3.

E considerando ainda, a título adicional, que, em caso de falta de citação do credor com garantia real, prevê o artigo 864.º, n.º 10 do CPC que esta falta não importa a anulação da venda já efetuada, quando “o exequente não haja sido o exclusivo beneficiário”, donde, por apelo a um argumento “a fortiori” e em obséquio à salvaguarda da unidade e a coerência do ordenamento jurídico-fiscal, a falta de notificação posterior da decisão sobre a venda não poderá acarretar tal efeito, na medida em que o bem já se encontra vendido e a adquirente é um terceiro cujos interesses merecem a devida tutela, II.B.4.

Cumpre concluir que a sentença recorrida incorreu em erro na interpretação e aplicação do Direito, mormente o disposto nos artigos 2.º, alínea e), 248.º, n.º 1, 250.º, 252.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3 e 255.º, todos do CPPT, e nos artigos 886.º-A, 864.º, n.º 10 e 904.º, alínea a), todos do CPC 1961, não sendo subsidiariamente aplicáveis ao processo de execução fiscal as normas do CPC relativas à notificação da decisão sobre a venda ao credor com garantia sobre os bens a vender e à audição do credor com garantia real sobre a pessoa do comprador e o preço de venda por negociação particular.

Termos em que, e nos mais de Direito cujo suprimento se impetra a V. Exas., vem pedir-se que se: A) declare verificada a nulidade da sentença recorrida por adotar uma decisão (em matéria de Direito) com base em factos que não constam da matéria de facto dada como provada – artigo 615.º, n.º 1, alínea b) e c), e n.º 4, ambos do CPC, aplicáveis ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT; sem prescindir, se B) revogue o acórdão recorrido por erros de julgamento e, mediante a matéria de facto dada como provada, se substitua por outro que julgue procedente a exceção perentória de caducidade do direito de acção ou, em todo o caso, julgue improcedente a ação de anulação de venda executiva, assim se fazendo Justiça!.”*O Recorrido Banco B..., S.A. contra-alegou, apresentando as seguintes conclusões: “1. A data — 16/11/2009 — da aceitação da proposta da Requerida, tinham já decorrido 18 dias da aquisição da fração pelo Requerente pelo que estar-se-ia já em presença de uma venda de coisa alheia, de uma venda nula.

  1. Em 27/05/2009 o Credor Banco B..., S.A. reclamou, nos termos do art.º 240.° do CPPT os seus créditos garantidos por garantia real.

  2. Não foi o Credor Banco B..., S.A. notificado que a venda não logrou propostas, o que culminou no prosseguimento da execução por si interposta, e que originou a venda prévia, a seu favor, da fração em crise nos presentes A.

  3. Nesse processo executivo (Proc. de Execução n.° 1000/05.9TBMTS) foram citados os eventuais credores, nomeadamente o Serviço de Finanças do Porto 6, não tendo sido reclamados quaisquer créditos referentes a dividas fiscais.

  4. O P.E. prosseguiu para venda na modalidade de propostas em carta fechada, tendo em 28/10/2009 sido aceite a proposta apresentada pelo Banco B..., S.A., tendo sido dispensado do depósito do preço, e tendo em 12/11/2009 liquidado as inerentes obrigações fiscais.

  5. O prazo para a submissão do Mod. 1 do IMI para averbamento da titularidade da fração é de 30 dias, tendo o Requerente submetido o mesmo antes do términus do prazo.

  6. Face à omissão, pelo órgão periférico local, do despacho determinativo da venda por negociação particular, e dos atos subsequentes, apenas com a submissão do Mod. 1 IMI teve o Requerente a oportunidade do conhecimento da venda efetuada no processo de execução fiscal.

  7. Donde, a Anulação da Venda foi apresentada em tempo, improcedendo a exceção perentória de caducidade do direito de ação.

  8. A omissão da notificação da venda por negociação particular inviabilizou a intervenção do, aqui, Requerente, não permitindo que a venda se realizasse por preço mais elevado.

  9. Tanto é que a fração foi vendida no P.E. por 8.906,25€, mas por 7.000,00€ no P.E.F.

  10. Ao não ter sido notificado da modalidade de venda e do valor base dos bens penhorados, o Requerente ficou impedido de tomar posição sobre os mesmos, de influir na venda, com preterição de vantagens manifestas e inequívocas que isso poderia trazer à valorização do bem na venda.

  11. As omissões e irregularidades perpetradas pelo órgão periférico local influenciaram no exame e na decisão da venda efetuada, constituindo uma nulidade nos termos do art.º 201.°, n.° 1 do CPC, que importa a nulidade do ato da venda, bem como dos atos subsequentes que do mesmo dependam.

  12. Não tendo o credor com garantia real sobre o bem vendido sido notificado da venda por negociação particular e do valor base do bem a vender, tal omissão que influiria na decisão da venda, constitui nulidade processual nos termos do art.º 201.°, n.° 1 do CPC, o que determina a anulação de todos os atos processuais subsequentes ao despacho que ordenou a venda por negociação particular, incluindo a venda executiva.

    Termos em que indeferindo o presente recurso, se fará a devida JUSTIÇA!”*O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.

    *Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    *II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa analisar se a sentença recorrida incorreu em nulidade, por insuficiência de matéria de facto, em erro de julgamento ao julgar improcedente a excepção de caducidade do direito de deduzir o incidente de anulação de venda e, ainda, ao decidir anular todos os actos...

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