Acórdão nº 00935/05.4BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução14 de Setembro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório RPLFC e o Estado Português/Ministério Público, devidamente identificados nos autos, no âmbito da ação administrativa comum, intentada pelo primeiro contra o Estado Português, peticionando, em síntese e designadamente a atribuição do valor correspondente à pensão mensal vitalícia que lhe havia sido atribuída pelo Instituto do Trabalho e Previdência de Angola, perante a Sentença proferida no TAF de Braga em 13 de junho de 2017 que condenou o Estado Português no pagamento de 96.768,88€ a título de danos patrimoniais sofridos, e 15.000€ a título de indemnização por danos não patrimoniais, vieram ambos a recorrer para esta Instância: Assim, formula o Recorrente RPLFC nas conclusões do Recurso apresentado em 25 de julho de 2017, as seguintes conclusões, corrigidas em 26 de julho de 2017: “1ª- No presente processo, o A. demanda o Estado Português alegando que, sendo beneficiário de uma pensão que lhe foi atribuída pelo Instituto do Trabalho Previdência e Ação Social de Angola, em Janeiro de 1969, quando Angola era uma província ultramarina portuguesa e, por isso, território português, dotado de autonomia financeira e administrativa nos termos do respetivo Estatuto Político Administrativo, tal pensão deixou, porém, de lhe ser paga quando regressou à Metrópole, em Junho de 1974 sem que qualquer dos organismos possíveis do Estado tenham aqui assumido a transferência de funções do referido e extinto ITPAS de Angola, porque Portugal não regulou essa matéria aquando da independência de Angola com as autoridades desse país, ou não legislou internamente por forma a estabelecer e definir essa transferência de funções do extinto ITPAS de Angola.

  1. - Em consequência, o A pediu a condenação do Estado Português a, após reconhecer-lhe que lhe fora atribuída a referida pensão, e que a ela teria e tem direito com as atualizações legais, enquanto for vivo, que tal pensão não lhe é paga pelo Estado Português nem por nenhum dos seus órgãos desde Junho de 1974, a informar qual o organismo do Estado Português responsável pelo processamento da pensão e pela reposição da situação devida com respetivos valores retroativos, e no caso de tal organismo não ter sido criado ou de não ser prestada a informação requerida, a condenação do Estado, por omissão do dever de legislar no pagamento das pensões vencidas e vincendas enquanto vivo for e uma indemnização por danos não patrimoniais.

  2. - A douta sentença recorrida, após fixar a materialidade da causa, em sentido coincidente com a alegação do autor, julgou a ação procedente e provada, condenando o Estado Português a pagar-lhe 96.768,88 €, a título de indemnização por danos patrimoniais e 15.000,00 € por danos não-patrimoniais, uma e outra acrescidas de juros moratórios contados da citação até integral pagamento.

  3. - No entanto, tal sentença correta nos seus pressupostos, enferma dos seguintes erros, que o autor catalogou como sendo de escrita, mas que podem vir a ser entendidos como erros de julgamento: A) Em relação às pensões devidas em correspondência com parte dos anos que refere fixou apenas o valor das pensões em singelo, sem considerar como se pedira o índice de atualização, nem os índices de valorização da moeda (como sucedeu quanto aos anos de 1974, 1975, entre outros, tais como 1994, 1995, 1996, 1997, 2000, 2001, 2004, 2006,2007,2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 2016 e 2017); b) Em relação às pensões devidas em correspondência com os anos de 1976 a 1994 considerou apenas um acréscimo resultante da aplicação de um "índice de atualização anual", fixado ano por ano, mas não qualquer "índice de desvalorização da moeda" como também se requerera; c) Não condenou o Estado Português, como devia e também se pedira, a pagar ao autor o valor das pensões que lhe seriam futuramente devidas, após a prolação da sentença, e enquanto vivo for, o que deveria resultar não apenas do pedido formulado mas também da natureza da pensão que tinha carácter vitalício, como se alegou e provou.

  4. - A não se entender que tais erros são apenas de simples cálculo ou escrita, e por isso suscetíveis de correção pela própria Exma. Julgadora, e como tais integráveis no art. 616°, nos 1 e 2 do Código de Processo Civil, devem ser qualificados como nulidades por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615°, n° 1, alínea c) e d) do Código de Processo Civil, de que importa conhecer e reparar com a consequência de dever ser produzida uma nova decisão, com recalculo, nos termos da legislação indicada, e a condenação do réu das pensões revistas, bem como das pensões vincendas, enquanto vivo for, a partir da última considerada (Junho de 2017) e com as devidas correções e atualizações se for caso disso.

  5. - Quanto, porém, em relação às pensões contabilizadas na inicial ou na sentença subsistam dúvidas de enquadramento ou de cálculo devem as mesmas ser fixadas em incidente de liquidação posterior, e eventualmente com recurso a arbitramento, sempre em cumprimento da decisão do STA que determinou a instrução e julgamento do pedido subsidiário, formulado na inicial (a saber: de condenação do Réu, porque o organismo competente para o processamento da pensão foi criado a, por omissão do dever de legislar, pagar ao A. as pensões por esta reclamadas, acrescidas de juros vencidos e vincendos).”*Já o Ministério Público, em representação do Estado Português, apresentou as seguintes conclusões, no Recurso apresentado em 31 de agosto de 2017: “1- O Autor, de acordo com os factos provados na sentença recorrida, desempenhava funções profissionais de gerente agrícola em Nambuangongo quando a fazenda onde estava empregado foi alvo de um ataque armado, evento ocorrido no tempo e local de trabalho, em tudo caracterizável como acidente de trabalho pela legislação à data (1969) – e ainda hoje – existente.

2- A responsabilidade pelo pagamento das pensões e indemnizações decorrentes de acidentes de trabalho é em primeira linha da responsabilidade das entidades patronais.

3- Tal responsabilidade só poderá ser assumida pelo Estado no caso de a entidade patronal do trabalhador sinistrado não poder suportar tal encargo.

4- Sendo a sentença recorrida omissa quanto a este ponto, incorreu numa incorreta aplicação do direito aplicável, ao ignorar na interpretação a que procedeu, sem qualquer justificação, toda legislação existente sobre acidentes de trabalho.

5- Além disso, ficou provado que o Autor recebe, desde o dia 1 de Junho de 1982, uma pensão de invalidez, como consta do seu processo individual elaborado pelo Centro Nacional de Pensões.

6- A qual foi atribuída ao abrigo da Secção V do Decreto nº 45266, de 23 de Setembro de 1963, publicado no Diário do Governo I série, nº 224, e foi calculada em função da respetiva carreira contributiva.

7- Sendo certo que essa pensão não pode ser cumulada com outras pensões decorrentes de acidentes de trabalho – artº 77º nº 1 daquele decreto.

8- Limitação legal que também foi ignorada pela aliás douta sentença recorrida, ao reconhecer ao Autor o direito a uma indemnização por danos patrimoniais decorrentes do não recebimento de uma outra pensão que, a ser devida, sempre se cumularia àquela.

9- Mais: o artº 4º nº 7 do Diploma Legislativo nº 3674 do Governo Geral de Angola – ao abrigo do qual o Autor viu ser-lhe reconhecido inicialmente o direito à pensão - apenas reconhecia a responsabilidade do Fundo de Ação Social no Trabalho em Angola (FASTA) nas situações em que os acidentes sofridos pelos trabalhadores não fossem enquadráveis nos esquemas normais da Segurança Social.

10- Ou seja, será claro que a partir do momento em que ao Autor foi atribuída uma pensão por invalidez, em 1982, e portanto ficou abrangido por «esquemas normais da Segurança Social», deixou de poder invocar a responsabilidade do FASTA, e consequentemente cessou toda a validade da sua argumentação sobre a falta de transferência das responsabilidades deste fundo para uma entidade do Estado Português por via legislativa.

11- O Autor não podia continuar com direito a uma pensão que é destinada àqueles que não estão integrados nos esquemas normais da Segurança Social mesmo depois de estar integrado nos chamados esquemas normais da Segurança Social.

12- E também por essa razão não faria qualquer sentido o Estado Português ser obrigado a criar uma legislação para definir a competência da entidade responsável pelo pagamento ao Autor de uma pensão que não lhe é devida, desde logo porque não a pode cumular com a que passou a receber da Segurança Social a partir de 1982.

13- Assim, a condenação do Réu Estado Português a pagar ao autor uma indemnização com fundamento em omissão legislativa ilícita carece em absoluto de fundamento, e contraria o disposto no artigo 15º nºs 3 e 5 da Lei nº 67/2007, de 31.12 14- Pois a decisão recorrida não atentou devidamente no que se dispõe no artigo 15º nº 5 da Lei nº 67/2007, de 31.12: «A constituição em responsabilidade fundada na omissão de providências legislativas necessárias para tornar exequíveis normas constitucionais depende da prévia verificação de inconstitucionalidade por omissão pelo Tribunal Constitucional.» 15- É inequívoco que a condenação do Estado em responsabilidade por omissões decorrentes do exercício da função legislativa depende sempre da prévia declaração de inconstitucionalidade por omissão por parte do Tribunal Constitucional.

16- Fundamento sobre o qual não encontramos qualquer referência na decisão recorrida, o que constitui igualmente uma inobservância da legislação aplicável.

17- E constitui uma ofensa ao artº 283º da Constituição da República Portuguesa, que consagra que o sistema de fiscalização da inconstitucionalidade por omissão no ordenamento jurídico vigente não é de tipo difuso.

18- Independentemente do anteriormente exposto, o valor da indemnização atribuída ao Autor está calculado de forma exagerada, por ter sido sempre considerado na aliás...

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