Acórdão nº 00268/18.6BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Agosto de 2018
Magistrado Responsável | M |
Data da Resolução | 03 de Agosto de 2018 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: RECORRENTE: Autoridade Tributária e Aduaneira RECORRIDO: MROM OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pela MMª juiz do TAF de Aveiro que julgou procedente a reclamação deduzida pelo recorrido contra o despacho proferido em 10/1/2018 pelo Chefe do Serviço de Finanças de São João da Madeira que lhe indeferiu o pedido de isenção de prestação de garantia.
CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES: A.
A sentença proferida pelo TAF de Aveiro, em 17/04/2018, que julgou procedente a reclamação deduzida pelo aqui Recorrido do despacho de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia no âmbito do processo de execução fiscal n.º 0167201701025546 e apensos, deve ser revogada e substituída por Acórdão que anule a referida decisão.
B.
O Tribunal a quo entendeu que a Administração Tributária não demonstrou a existência de “fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado”.
C.
A sentença recorrida enferma de vício de erro de julgamento quanto à matéria de facto e direito, resultante da equívoca apreciação da prova produzida nos autos, não se conformando a Fazenda Pública com a interpretação e conclusão daquele douto Tribunal, que entende ser contrária ao regime da isenção de prestação de garantia previsto nos artigos 52.º, n.º 4 da LGT e artigo 170.º do CPPT.
D.
Com efeito, dos factos levados às alíneas J, L e N do probatório o Tribunal a quo não poderia concluir que não foram recolhidos fortes indícios de que a situação de insuficiência ou inexistência de bens é da responsabilidade do interessado. Pelo contrário.
E.
É patente da leitura integral da fundamentação do despacho reclamado, que o que levou ao indeferimento do pedido de isenção de prestação de garantia foi o não preenchimento do terceiro pressuposto cumulativo, dado que, foram recolhidos fortes indícios de que a situação de insuficiência ou inexistência de bens é da responsabilidade do interessado.
F.
Com efeito, o órgão de execução fiscal reconhece ao longo de todo iter cognitivo e valorativo, existir uma “manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido”.
G.
No que concerne à alienação do imóvel do revertido, aqui Recorrido, não pode aceitar-se que o Tribunal a quo, depois de admitir que a mesma possa consistir num indício da intenção de frustrar o seu património pessoal ao pagamento dos créditos tributários, possa concluir, que ainda que tal negócio não se tivesse realizado, mesmo assim o ora Recorrido, encontrar-se-ia numa situação de manifesta falta de meios económicos.
H.
Ora, a Fazenda Pública entende que tal fundamentação não parece razoável, e não tem acolhimento na lei, uma vez que o pressuposto cumulativo em causa visa sancionar uma atitude comportamental, competindo à AT apenas reunir “fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado”.
I.
Não relevando para esse efeito a quantificação/valorização dos bens que o interessado possa ter dissipado.
J.
Com a ressalva do sempre devido respeito, não se nos afigura correto o juízo efetuado pela Meritíssima Juiz a quo relativamente à não contestação pelo órgão de execução fiscal, quer do valor patrimonial tributário (238.280,00€), quer do valor de venda (238.000,00€), quando na verdade, a mera referência à descrição do circunstancialismo em que ocorreu a alienação em causa, inclusive a própria similitude entre o preço praticado e o VPT, de per si, constitui um forte indício que tal negócio não teve outro propósito que não fosse a dissipação patrimonial do revertido e consequente frustração dos créditos tributários.
K.
Assim, no entendimento da Fazenda Pública, o Tribunal a quo aplicou manifestamente mal o direito ao caso, existindo por isso necessidade de uma melhor aplicação do direito consentânea com a lógica jurídica que se impõe à resolução do caso em apreço.
L.
Fazer depender o requisito da demonstração de fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado, de qualquer quantificação ou valorização dos bens eventualmente dissipados, afastaria desde logo comportamentos culposos e de impossível quantificação, tais como gestão danosa ou outras práticas altamente censuráveis, de quantificação ou valorização praticamente impossíveis, abrindo um campo imensurável de incerteza e instabilidade na aplicação da norma, podendo mesmo resultar em situações de profunda injustiça social e desvirtuar os fins tidos em vista pelo legislador.
M.
A aceitar-se o decidido, a mesma realidade fáctica aplicada, por hipótese, a um contribuinte cujo montante da dívida exequenda e acrescido coubesse dentro do valor líquido do património dissipado (livre de ónus e encargos), ou seja, com uma dívida substancialmente inferior à verificada no caso sub judice, não permitiria a concessão da isenção de prestação da garantia! N.
Segundo o raciocínio da Meritíssima Juiz a quo só existiria culpa pela insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido, quando o valor dos bens dissipados fossem de valor suficiente para saldar a quantia exequenda e acrescido, o que, com o devido respeito, não se pode aceitar.
O.
Destarte, a interpretação expressa na sentença recorrida é injusta e intolerável, e a ser seguida podia mesmo constituir um prémio a quem deve mais, ou por outro lado uma penalização para quem deve menos! P.
Entendeu igualmente o Tribunal a quo não relevar para efeitos de apreciação da culpa do aqui recorrido, a alienação do imóvel inscrito na matriz predial urbana da freguesia e concelho de São João da Madeira sob o artigo 7301, realizada pela sociedade devedora originária em 03/04/2017, em condições que indiciam a prática do crime de frustração de créditos, p. p. no artigo 88.º, n.º 1, do RGIT, e evidenciadas no despacho que indeferiu o pedido de isenção de prestação de garantia, em virtude do pedido de dispensa ter sido formulado pelo aqui Recorrido, e não pela sociedade devedora originária.
Q.
Ora, com a devida vénia, e em sentido contrário à argumentação expendida pelo Tribunal a quo, a Fazenda Pública entende que para efeitos de apreciação de culpa do interessado pela situação de “manifesta falta de meios económicos”, é de todo pertinente e útil, aferir do comportamento do Recorrido enquanto gerente da devedora originária dada a relação intrínseca existente.
R.
Tanto mais que, in casu, o que o órgão decisor quis evidenciar foi a atitude comportamental do interessado, quer na sua esfera patrimonial particular, quer na esfera patrimonial da devedora originária, enquanto gerente e responsável pelos seus atos de gestão, descortinando-se nesta parte também erro de julgamento do Tribunal a quo.
S.
Com efeito, não nos podemos distanciar do facto de estarmos a falar de dívidas tributárias liquidadas na esfera jurídica da sociedade MR, Lda, ente jurídico cujo destino estava entregue ao aqui Recorrido, nomeadamente quanto à decisão de afetar (ou não) património societário para garantia das referidas dívidas, e que são essas mesmas dívidas que, por falta de pagamento e por força do instituto da reversão, estão agora a ser exigidas ao aqui Recorrido.
T.
Não se acompanha igualmente o juízo formulado pela Meritíssima Juiz a quo relativamente ao imóvel alienado pela devedora originária, quando conclui que aquele nunca poderia relevar para efeitos de apreciação da culpa do ora Recorrido, dado que o mesmo se encontrava onerado.
U.
Pois, mesmo que tal observação nos pareça resultar novamente num equívoco interpretativo de que o terceiro pressuposto depende da valorização/quantificação/liquidez dos bens dissipados, tal conclusão padece de um défice instrutório, pois que a Meritíssima Juiz a quo não dispôs dos elementos necessários para quantificar o valor líquido do bem dissipado.
V.
Cabia ao Tribunal a quo, ao abrigo do princípio do inquisitório e da descoberta da verdade material que se encontrava obrigado a observar, ordenar diligências adicionais de prova, sendo essencial a nosso ver, a análise de certidão permanente atualizada do imóvel, bem como, notificar o Recorrido para apresentar comprovativo do montante efetivamente pago ao credor hipotecário, ou oficiar os beneficiários da hipoteca voluntária.
W.
Outrossim, entende a Fazenda Pública que se mostra pertinente juntar nesta instância de recurso uma certidão permanente atualizada, o que se requer nos termos consentidos pelo n.º 1 do artigo 651.º do CPC, por se tornar necessária face à decisão do Tribunal a quo.
X.
E da análise atenta a tal certidão, e seu conteúdo, resulta que sobre o imóvel identificado na alínea L) dos factos provados não se encontra pendente qualquer hipoteca voluntária, pelo que, considerando os poderes deste Tribunal de recurso, quanto à modificabilidade da decisão de facto (artigo 662.º do CPC) a Fazenda Pública requer que a al. M) dos factos provados seja corrigida, de modo a fazer constar o seguinte teor: M) Sobre o prédio urbano a que se alude na alínea que antecede não se encontram pendentes quaisquer ónus ou encargos (cfr.
certidão permanente atualizada).
Y.
Desse modo, o Tribunal a quo incorreu em erro crasso, ao dar por assente tal factualidade baseando-se em certidão permanente desatualizada e convenientemente junta pelo Recorrido.
Z.
Por último, no que engloba à redução acentuada do salário a partir de agosto de 2017 de 3.800,00 € para 557,00€, conclui a Digníssima Juíza a quo, que a decisão do indeferimento do pedido de isenção de prestação de garantia, não se debruçou sobre o propósito do recorrido em inviabilizar uma eventual penhora do salário, entendendo ainda assim que atendendo ao elevado valor da quantia exequenda e acrescido, o salário nunca seria apto a assegurar o pagamento dessas quantias.
AA.
Sobre esta matéria, note-se que o órgão de...
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