Acórdão nº 00080/03-Coimbra de Tribunal Central Administrativo Norte, 07 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução07 de Junho de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: RECORRENTE: Exmo. Representante da Fazenda Pública.

RECORRIDO: M....

OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pela MMª juiz do TAF de Coimbra que julgou procedente por falta de fundamentação do despacho do Exmo. Diretor de Finanças a impugnação deduzida contra as liquidações adicionais de IVA de 1997 a 2000.

CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES: 1. A Meritíssima Juiz do Tribunal recorrido julgou a presente impugnação procedente por ter entendido haver vício de forma na parte relativa à fundamentação, mais concretamente, no despacho de fixação do Director de Finanças.

  1. A Fazenda Pública não concorda, salvo o devido respeito, com a existência de tal vício.

  2. Para se averiguar da falta ou insuficiência da fundamentação, tem que se ter em consideração o seu destinatário concreto, ou seja, aquele contribuinte a quem o procedimento se dirige ou, pelo menos, fazer apelo ao conceito de homem médio ou bonus pater familia mas colocado perante a situação concreta.

  3. A jurisprudência tem entendido que a concordância com a fundamentação de anteriores pareceres ou informações, pode resultar de uma conexão inequívoca entre documentos, sustentada nos termos neles utilizados, no respectivo conteúdo, na sequência procedimental em que foram emitidos e nos restantes elementos do processo administrativo, pelo que não é imperativa a existência de uma declaração formal expressa.

  4. Não pode aceitar-se que se considere que o impugnante, enquanto destinatário colocado perante a situação concreta, não tenha ficado esclarecido das razões da decisão.

  5. Este já havia participado por várias vezes no procedimento e já tinha tido conhecimento do relatório de inspecção (o qual tinha sido sancionado favoravelmente pelo Director de Finanças).

  6. O despacho em causa é exaustivo, individualizando os factos apurados e descritos no relatório de inspecção que levaram à conclusão de que o apuramento da matéria colectável não era susceptível de ser feito de forma directa.

  7. Nele consta com clareza quais as razões porque não foi atendida a reclamação do contribuinte: as irregularidades detectadas em acção de inspecção não foram justificadas nem contrariadas, de forma objectiva e concreta, pelo contribuinte, nem no pedido de revisão, nem através do seu perito no debate contraditório.

  8. Da sua leitura resulta, de forma inequívoca, também, a remissão expressa para o conteúdo do relatório de inspecção (cfr. § 3.º de fls. 3 e 1.º de fls. 4 do Despacho) – situação permitida por lei (art. 77.º n.º 1 da LGT).

  9. E, por isso, apesar de não haver necessidade de repetir as situações detectadas, em ordem a uma maior clareza da exposição, as situações voltaram a ser indicadas, ainda que de forma sumária.

  10. Muito respeitosamente, não se entende, por isso, porque razão a sentença recorrida acusa o despacho de fundamentação insuficiente e de não concretizar os factos apurados em sede de procedimento tributário.

  11. Também não se compreende por que razão o acusa de não indicar aquilo que “efectivamente é erigido como facto fundamentante da conclusão a que chega”.

  12. O despacho é muito claro: não há um só facto fundamentante, nem tinha que haver, mas vários – todos os nele indicados.

  13. A própria sentença enumera vários factos, para concluir, sem qualquer explicação, não ser “esta uma razão só por si para justificar a aplicação do método indiciário”, i. é, aprecia apenas um dos factos e não se pronuncia, sequer, sobre os restantes indicados.

  14. Como também não é explicado na douta sentença o porquê de ter sido entendido ser o relatório “também ele insuficiente quanto ao modo de eleger factos contributivos para justificar a aplicação do método indirecto (…)”, apesar do mesmo elencar e demonstrar vários factos (acima resumidos no art. 19.º destas alegações).

  15. Ao contrário do que é referido na douta sentença os dois exemplos que foram indicados no relatório (A… e Mário…) serviram para demonstrar a ausência de facturação e não a facturação falsa, sendo que tais exemplos (juntamente com os restantes indicados) demonstram, claramente, a falta de credibilidade da escrita do contribuinte.

  16. No que se refere à quantificação, não se percebe a crítica da douta sentença quanto ao facto do perito da Fazenda Nacional ter reduzido os valores de acordo com o estado de acabamento das obras e não ter aceite, por falta de prova, os valores indicados pelo impugnante em virtude das obras não terem sido alegadamente feitas por si na totalidade.

  17. Não existe qualquer contradição em tal actuação: no primeiro caso, os valores foram reduzidos por se ter observado directamente que o estado de acabamento das obras demonstrava a sua não total conclusão; no segundo caso, e quanto às restantes obras, a não aceitação dos valores indicados pelo impugnante deveu-se à falta de prova da não realização das obras na totalidade.

  18. A douta sentença, para além da existência do próprio relatório, das actas e laudos e do despacho de fixação (os quais transcreve), nada mais dá como provado e o único facto que dá como não provado é o das facturas não titularem serviços prestados, não tomando posição expressa sobre nenhum dos factos relatados em tais documentos, impedindo uma defesa eficaz da Fazenda Pública.

  19. Não se concorda, igualmente, com o entendimento da douta sentença, baseado no testemunho de uma Egenheira Técnica, prestado para uma situação abstracta e ele próprio muito vago (e de duvidosa exactidão), de que o critério de quantificação encerrava relatividade, já que preteriu (sem sequer se pronunciar sobre eles) dois casos concretos, não contraditados pelo impugnante, em que os valores das estimativas e o das obras eram idênticos.

  20. Depois, o facto de, na quantificação operada, o perito da Fazenda Pública ter considerado que o IVA já estava incluído no valor das obras, parece não necessitar de uma explicação expressa, já que, sendo sempre devido, o facto de assim ter sido considerado, foi para que se evitasse a acusação de excesso de quantificação.

  21. No que se refere à acusação de não terem sido presumidos custos, a verdade é que tal questão é irrelevante em sede de IVA (poderia, eventualmente, relevar apenas em sede de IRS), não implicando qualquer excesso de quantificação.

  22. O critério utilizado é objectivo e facilmente sindicável: foram os próprios donos das obras que declararam os valores, apurados por engengheiros, a uma entidade externa e foram utilizados por não ter sido possível o seu apuramento com base na escrita.

  23. Nos termos do n.º 4 do art. 77.º da LGT, a lei apenas exige que se indiquem os critérios, competindo ao sujeito passivo vir demonstrar que os mesmos não são adequados em virtude de provocarem um excesso na quantificação operada (para desconsiderar o critério utilizado, o contribuinte tem que demonstrar que o mesmo é errado, o que não aconteceu).

  24. E recorde-se que, no procedimento de revisão, na parte em que o contribuinte provou existir excesso, a matéria colectável foi corrigida em conformidade.

  25. Finalmente, também não se concorda com a douta sentença quando acusa o despacho de fixação do Director de Finanças de contraditoriedade: analisado o mesmo, verifica-se que adere às conclusões do relatório de inspecção no que se refere aos pressupostos para o recurso a métodos indirectos e quanto à escolha do critério de quantificação. No entanto, porque o contribuinte demonstrou existir excesso nessa quantificação, adere à feita pelo perito da Fazenda Nacional, que teve em conta a prova feita.

  26. Não existe, por isso, fundamentação implícita, nem, do mesmo passo, qualquer ambiguidade ou contraditoriedade no despacho em análise, nem qualquer vício de falta de fundamentação no que respeita ao critério de quantificação.

  27. Ainda que se entenda que a decisão do Director de Finanças possa ter alguma falha, o que só por mera cautela se configura, não será qualquer falta de clareza, qualquer incongruência ou, em particular, qualquer insuficiência que poderá equivaler à falta radical da fundamentação.

    (...) Não bastará, pois, qualquer ambiguidade ou dificuldade de entendimento no conteúdo da declaração para se concluir que falta a fundamentação. Mesmo que a formulação suscite algumas dúvidas, só a obscuridade relativa aos traços decisivos da fundamentação deve relevar, quando não seja possível identificar as razões determinantes do acto ou, pelo menos, o seu núcleo significativo.

    (sublinhado nosso) 29. E, como já acima se referiu, a decisão do Director de Finanças não deixa dúvidas sobre as razões que a determinaram, razão pela qual, e salvo devido respeito, não se concorda com a acusação que lhe é feita de sofrer do vício de falta de fundamentação, pelo que existe erro de julgamento.

    Nestes termos e com o douto suprimento de Vªs Exªs, deve a decisão recorrida ser revogada, com as legais consequências, assim se fazendo, JUSTIÇA CONTRA ALEGAÇÕES.

    O Recorrido contra alegou e requereu ampliação do recurso nos seguintes termos: 1) Vem o presente recurso apresentado pela Fazenda Pública da douta decisão que julgou procedente por provada a impugnação judicial e decretou a anulação das liquidações impugnadas.

    2) Não tem, todavia, razão a recorrente pois os actos de liquidação padecem efectivamente de falta/insuficiência de fundamentação.

    3) A fundamentação é consubstanciada pelo discurso verbalizado pela administração como suporte constituinte da decisão administrativa. Nesta perspectiva, estamos perante uma externação formal das razões de facto e de direito que hão-de ser contemporâneas ou coetâneas da decisão administrativa e constituintes da mesma, não podendo considerar-se como legítimas aquelas que, ainda que porventura, com um sentido integrador do sentido da sua anterior declaração, apenas sejam produzidas e invocadas posteriormente. Numa formulação que traduz apenas a síntese do que a doutrina mais autorizada escreveu sobre a matéria, poderemos repetir que a fundamentação se consubstancia num...

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