Acórdão nº 01661/06.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 06 de Novembro de 2015
Magistrado Responsável | H |
Data da Resolução | 06 de Novembro de 2015 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO Autora e ora Recorrente: MJMBCM Ré e ora Recorrente: Unidade Local de Saúde de M..., SA Vêm interpostos recursos da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou parcialmente procedente a supra identificada acção administrativa comum com a condenação da Ré nos seguintes pedidos: “
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Condenar a R. á adopção das condutas necessárias a fim de integrar efectivamente a A. nas equipas de apoio ao serviço de urgência, conferindo-lhe o exercício pleno da inerente função”; “G) Condenar a R. a adoptar as condutas necessárias a fim de assegurar que a A. no exercício das suas funções possa proceder á selecção de reagentes e equipamentos”; “J) Condenar a R. a adoptar as condutas necessárias a fim de assegurar à A. que no exercício das suas funções seja admitida a cooperar em protocolos de estudo e investigação, bem como a participar em acções de formação promovidas pela R. ou por terceiro, e em que esta participe através dos seus médicos ou farmacêuticos com grau de especialistas”; quanto ao pedido L), condenar a “Ré a pagar à Autora a quantia de € 15.000,00”; quanto ao pedido H), condenação da “Ré apenas a admitir a participação da Autora no planeamento e elaboração dos programas do serviço”; finalmente, julgou “improcedente o demais peticionado”.
O objecto do recurso interposto pela Autora é delimitado pelas seguintes conclusões da respectiva alegação(1): “
A) Os pressupostos e consequências da responsabilidade civil extracontratual encontram-se previstos no artigo 483º do código civil, e os pressupostos e as consequências da responsabilidade extracontratual do estado no exercício da função administrativa estão previstos da Lei 67/2007.
B) No caso em apreço, encontra-se presente toda a cadeia de pressupostos que integram a responsabilidade civil extracontratual geral e do estado e demais entes públicos: o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
C) Quando a U.L.S. de M..., excluiu A. do serviço de urgência, praticou um facto voluntário, consubstanciado numa ação livre e consciente perpetrada pelos seus legais representantes.
D) Este facto foi ilícito, porque contrário às disposições legais imperativas constantes do regime legal da carreira dos técnicos superiores de saúde dos serviços e estabelecimentos do Ministério da Saúde, prosseguindo um fim não permitido pela ordem jurídica - a discriminação injustificada de profissionais com habilitações e competências equivalentes.
E) Violou, assim, o direito subjectivo da A. a serem-lhe reconhecidas por um organismo público as habilitações profissionais legalmente estabelecidas, malogrando a utilidade que a mesma podia e devia ter tirado desse direito através da sua integração do serviço de urgência da U.L.S. DE M... em condições equiparadas aos médicos patologistas.
F) A atuação da U.L.S. DE M... é culposa, na modalidade de dolo necessário, já que apesar de sabedora de que violava a lei, esta entidade persistiu em fazê-lo aceitando e admitindo as consequências ilícitas da sua conduta, com total desfaçatez e convencimento de impunidade.
G) Este ato ilícito e culposo da U.L.S. DE M... teve como consequência direta e necessária uma multiplicidade de danos, decompostos nos múltiplos prejuízos infligidos na esfera jurídica da A., um dos quais é constituído pelo lucro cessante decorrente da frustração do acréscimo remuneratório que a A. normalmente teria auferido se não tivesse sido excluída do serviço de urgência.
H) A responsabilidade civil extracontratual é geradora do dever de indemnizar, e o conteúdo desse dever encontra-se previsto no artigo 564 do Código Civil, e no artigo 3º da Lei 67/2007, de 31/12, compreendendo “os danos patrimoniais e não patrimoniais, bem como os danos já produzidos e os danos futuros, nos termos gerais de direito”.
I) De acordo com o disposto no artigo 556 do Código Civil, o dever de indemnizar emergente da responsabilidade civil é primordialmente cumprido através da reconstituição natural e só, caso não seja possível, através da indemnização por mero equivalente.
J) No caso em apreço, a A. foi afastada do serviço de urgência por um ato ilícito, culposo e danoso da U.L.S. DE M..., pelo que sobre esta recai a obrigação de a indemnizar pela remuneração de que a primeira foi privada por não ter sido autorizada a integrar a urgência.
K) A ser adotada a formulação negativa da teoria da causalidade adequada, seria à U.L.S. DE M..., qua competiria ter provado que, só em virtude de circunstâncias anómalas e excecionais, o afastamento do serviço de urgência facto poderia, em concreto, causar aquela perda remuneratória, o que claramente não sucedeu.
L) Por outro lado, a ser adotada a formulação positiva da teoria da causalidade adequada, caberia à A. provar que a exclusão do serviço de urgência constitui uma condição necessária daquela perda remuneratória, e é normalmente capaz de a produzir, o que, claramente, sucedeu.
M) Nesta conformidade, qualquer que seja a perspetiva doutrinal perfilhada, sempre a U.L.S. DE M... estaria obrigada a ressarcir a A. pela perda remuneratória emergente do seu afastamento do serviço de urgência.
N) O dano é pecuniário, e suscetível de cálculo aritmético através dos valores remuneratórios pagos pela U.L.S. DE M... à A. e inscritos na sua declaração anual de rendimentos para efeitos fiscais, da legislação aplicável ao pagamento do trabalho extraordinário, e da matéria assente.
O) Os montantes exatos desta perda remuneratória não são determináveis, à presente data, porquanto só em parte se encontram vencidos, dependendo direta necessária e aritmeticamente das retribuições laborais periodicamente auferidas pela A., e da data em que a U.L.S. DE M... repuser a legalidade a que foi condenada pela douta sentença recorrida, pelo que deve a sua liquidação ser relegada para execução de sentença, nos termos prescritos no artigo 661, nº 2 do Código de Processo Civil.
P) Residualmente, e caso pugne pela impossibilidade do apuramento da medida a diferença entre a real situação patrimonial da A., a que existiria se ela não tivesse sido impedida pela U.L.S. DE M... de integrar o serviço de urgência, o que só por mero dever de patrocínio se concede, sempre teria que ser arbitrado um valor indemnizatório de acordo com as regras da equidade.
Q) O que se deixa expressamente alegado, para todos os devidos e legais efeitos.
TERMOS EM QUE DEVERÁ SER DADO PROVIMENTO AO RECURSO AGORA INTERPOSTO E REVOGADA A DOUTA SENTENÇA PROFERIDA, ASSIM SE FAZENDO A HABITUAL E SÃ JUSTIÇA.
”.
O objecto do recurso interposto pela Ré é delimitado pelas seguintes conclusões da respectiva alegação: 1. “Vem o presente recurso da douta sentença de fls..., que julgou a presente acção parcialmente procedente, por provada, condenando em consequência a Ré, ora Recorrente (I) à adopção das condutas necessárias a fim de integrar efectivamente a Autora nas equipas de apoio ao serviço de urgência, conferindo-lhe o exercício pleno da inerente função; (II) à adopção das condutas necessárias a fim de assegurar que a Autora, no exercício das suas funções, possa proceder à selecção de reagentes e equipamentos; (III) a admitir a participação da Autora no planeamento e elaboração dos programas do serviço; (IV) à adopção das condutas necessárias a fim de assegurar à Autora que, no exercício das suas funções, seja admitida a cooperar em protocolos de estudo e investigação, bem como a participar em acções de formação promovidas pela Ré ou por terceiro, eme que esta participe através dos seus médicos ou farmacêuticos com grau de especialista; (V) Ao pagamento de indemnização à Autora, a título de danos não patrimoniais, no montante de 15.000 €.
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Resulta da prova produzida nos presentes autos que, no Serviço de Patologia Clínica do Hospital PH, onde a Autora exerce as suas funções, também exercem funções vários profissionais de saúde, inseridos em três carreiras profissionais diferentes: médicos, técnicos superiores de saúde e técnicos de diagnóstico e terapêutica.
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No que respeita à categoria de Especialista, a Lei confere legitimidade aos Médicos ou aos Farmacêuticos, habilitados com o grau de especialista conferido pela respectiva Ordem profissional, para validarem resultados de exames.
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A Lei reconhece, assim, paridade entre as duas carreiras profissionais, exigindo apenas que os profissionais sejam providos com o grau de especialista, devidamente reconhecido pela Ordem dos Médicos ou pela Ordem dos Farmacêuticos.
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Neste sentido, quer ao Médico, quer ao Técnico, são reconhecidas as mesmas valências/capacidades profissionais para exercerem funções nos serviços laboratoriais das unidades de saúde, enquanto Especialistas.
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A Lei apenas nos diz que nos Serviços de Laboratório, e enquanto especialistas, podem exercer funções, quer médicos, quer técnicos; 7. A Lei já não equipara, para todos os demais efeitos, as habilitações académicas, científicas e profissionais dos médicos e dos técnicos; 8. Na verdade, a diferenciação técnica existente entre o médico e o técnico, não permite que este último substitua aquele: o médico possui conhecimentos técnico-científicos desconhecidos para o farmacêutico, e vice-versa.
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Por outro lado, a Lei apenas refere que, neste tipo de serviços, podem exercer funções de especialista um médico ou um técnico, mas não diz que, obrigatoriamente, devem ser atribuídas tais funções quer a um, quer a outro, em exclusivo.
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Assim sendo, existindo no serviço médicos e técnicos com habilitações para exercerem as ditas funções, caberá à Ré e à Direcção do Serviço, organizarem o funcionamento do próprio serviço, distribuindo as tarefas pelos profissionais que entenderem, desde que os mesmos possuam habilitações para tanto.
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Se os médicos (patologistas) têm competência para o efeito, a respectiva escolha para exercerem funções no Hospital enquanto Especialistas – quer no Serviço...
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