Acórdão nº 00640/11.2BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelCristina Travassos Bento
Data da Resolução26 de Março de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I.

Relatório …– Reciclagem de Metais, Lda veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou improcedente a presente impugnação judicial, por caducidade do direito de deduzir impugnação.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: 1° - A sentença recorrida é uma autêntica decisão surpresa.

  1. - Desde logo, e no entender da ora recorrente, a sentença do Tribunal recorrido viola o disposto nos art°s 77 n°6 da Lei Geral Tributária e o artº 66 do Código de Procedimento Administrativo 3° - Na verdade, a decisão do indeferimento da reclamação graciosa não foi até hoje notificada à ora recorrente (V. Proc. Administrativo págs. 301 a 357) pelo que o Recurso Hierárquico por esta apresentado em 9-9-2010 foi tempestivo - art° 40 n2 do CPPT e art° 268 n°3 do CRP.

  2. - O Recurso Hierárquico apresentado pela ora recorrente foi tempestivo ainda, porque como decorre da opinião do Exmo.Sr. Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa o art° 40 do CPPT tem de ser lido à luz da exigência constitucional de notificação aos administrados de todos os actos administrativos - art° 268 n°3 da CRP, in CPPT anotado, ano de 2000, pág.244 anotação ao art° 40.

  3. - Aliás no seguimento deste entendimento do Exmo. Juiz Conselheiro foi proferido AC. do STA de 15-12-93 , supra citado, e em que é dito que a data relevante é sempre a do conhecimento pelo interessado da decisão notificando não tendo lugar a presunção prevista na lei.

  4. - O ora mandatário de facto só foi notificado do indeferimento da Reclamação Graciosa em 12-08-2010, pelo que, o Recurso Hierárquico apresentado em 9-9-2010 foi tempestivo - art° 350 n°2 do C.Civil e artº 40 n°2 do CPPT.

  5. - Existe uma terceira razão, no entender da ora recorrente para a decisão do Tribunal recorrido ser alterada e que é a seguinte: a notificação do indeferimento da Reclamação Graciosa efectuada ao ora mandatário judicial, em 12-08-2010, não foi feita através de carta registada com aviso de recepção pelo que se presume que de facto tal carta só foi recebida neste dia.

  6. - No sentido agora defendido pela recorrente veja-se o Ac. STA 0337/08 de 1-10-2008 in BDJUR, supra citado.

  7. - Por último a interpretação que o Tribunal recorrido fez do disposto no art° 38 e 39, ambos do CPPT, viola no entender da recorrente o disposto nos art°s 2, 13, 20 e 268 n°3 todos da Constituição da República Portuguesa o que alega e para os devidos efeitos legais.

  8. - Foi, pois, no entender da recorrente violados no caso concreto com tal interpretação o principio Fundamental do Estado de Direito e os seguintes subprincípios: subprincípio do Estado Constitucional ou da Constitucionalidade, subprincípio da independência dos Tribunais e do acesso à justiça, do subprincípio da prevalência da lei, no subprincípio da segurança jurídica e da confiança dos cidadãos; no subprincipio das garantias processuais e procedimentais ou do justo procedimento, e conforme discriminado na motivação supra referida.

  9. - No subprincípio das garantias processuais e procedimentais ou do justo procedimento, aflorado em diversos preceitos da C.R.P. e segundo o qual a todos é garantido um procedimento justo e adequado de acesso ao direito e de realização do direito.

  10. - Entende ainda, o ora recorrente que para além da referida inconstitucionalidade, a referida decisão padece de nulidade, uma vez que o Tribunal recorrido proferiu decisão cujos fundamentos estão em oposição com a decisão e não se pronunciou sobre questões que deveria ter tomado conhecimento - ( V. Proc. Administrativo apenso fls. 301 a 357) - art° 615 n°1 alíneas b) e) e d) do CPC o que se alega e para os devidos efeitos legais.

  11. - A decisão recorrida violou para além dos preceitos legais supra mencionados os art°s 77 nº6 da Lei Geral Tributária, o artº 66 da Código de Procedimento Administrativo e os art°s 36 a 40, todos do CPPT, o artº 35º nº2 do C. Civil, para além dos artºs 2, 13, 20, 205 e 268 nº3 da Constituição da República Portuguesa e ainda o art° 615 do CPC.

Por todas as razões supras aludidas - itens I e II o presente recurso deverá ser julgada procedente na sua totalidade.

TERMOS em que por todas as razões supra exposta, julgando o presente recurso totalmente, procedente farão V. Exªs. inteira justiça.

A Recorrida, Fazenda Pública, não apresentou contra-alegações.

Após a subida dos autos a este Tribunal Central Administrativo Norte, o Exmo Procurador-Geral Adjunto emitiu Parecer, a fls. 355 e ss, suscitando a questão da incompetência hierárquica deste Tribunal Central Administrativo Norte para a apreciação do objecto do presente recurso, por o mesmo versar matéria exclusivamente de direito, não questionando a Recorrente quaisquer factos, divergindo apenas da aplicação do direito aos factos vertidos no probatório.

Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos vem o processo à Conferência para julgamento.

I.I Do Objecto do Recurso - Questões a apreciar e decidir: Cumpre apreciar e decidir, desde logo, a questão prévia da incompetência em razão da hierarquia deste Tribunal Central Administrativo Norte.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas conclusões das alegações de recurso - artigos 635º, nº4 e 639º CPC, ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281º do CPPT - são as de saber (i) se se verifica a nulidade de violação do princípio do contraditório; (ii) se se verifica a nulidade da sentença recorrida, por falta de fundamentação; (iii) se se verifica a nulidade da sentença por oposição dos fundamentos com a decisão; (iv) se se verifica a nulidade da sentença por omissão de pronúncia; (v) se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento.

  1. Fundamentação II.1. De Facto No Tribunal a quo, o julgamento da matéria de facto foi efectuado nos seguintes termos: “1. – As liquidações em causa nos presentes autos (de IRC de 2006 e 2007) tinham como data limite de pagamento 16/12/2009 – fls. 312 e 313 do PA; 2. – Em 5/4/2010 foi apresentada reclamação graciosa desses actos. Que foi indeferida por decisão de 5/8/2010 – fls. 301 a 355 do PA; 3. – A decisão de indeferimento da reclamação graciosa foi comunicada ao reclamante através do ofício nº 201 164 de 5/8/2010, enviado sob registo postal nº RC514553612PT de 6/8/2010, dirigido ao ainda agora mandatário judicial – fls. 356 e 357 do PA; 4. – Esse objecto postal foi efectivamente recebido pelo destinatário em 12/8/2010 – fls. 226 dos autos; 5. – É costume do mandatário judicial da Impugnante, Dr. F…, que não tem empregados ou colaboradores, gozar férias na primeira quinzena de Agosto e encerrar o escritório durante as férias – 2ª testemunha; 6. – Em 9/9/2010 foi apresentado, por via postal sob registo, entrado na AT em 10/09/2010, o recurso hierárquico da decisão referida em 3 supra – fls. 360 a 369 dos PA; 7. – Em 27/4/2011 o Recurso Hierárquico foi indeferido liminarmente pela AT com fundamento na extemporaneidade do pedido – fls. 371 a 380 do PA; 8. – A decisão do Recurso Hierárquico foi notificada através do ofício nº 200 755, de 9/5/2011 da Direcção de Finanças de Aveiro, remetido sob registo postal de 10/5/2011 – fls. 382 e 383 do PA; 9. – A presente Impugnação foi apresentada no Serviço de Finanças de Ovar em 20/7/2011- carimbo aposto no canto superior direito de fls. 2 dos autos.

II.1.1 Ao abrigo do disposto no artigo 662º, nº1 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 2º, alínea e), e 281º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), acorda-se em alterar o ponto 4 da matéria de facto, e aditar o ponto 9 ao probatório, nos termos que se seguem: 4 - Esse objecto postal foi efectivamente recebido/levantado pelo destinatário em 12/8/2010 – fls. 226 dos autos e reconhecimento da impugnante no artigo 36º da p.i.; 9 – A impugnante constituiu mandatário em 28 de Março de 2010, aquando da interposição da reclamação graciosa das liquidações adicionais de IRC dos anos de 2006 e 2007, em causa na presente impugnação – cfr. folhas 311 do PA.

II.2. De Direito II.2.1 Questão Prévia: Da (in)competência deste Tribunal em razão da hierarquia A questão que cumpre apreciar e decidir, desde já, é a da competência em razão da hierarquia deste Tribunal Central Administrativo para conhecer do presente recurso.

Resulta do disposto no artigo 26º, alínea b) e do artigo 38º, alínea a) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e do artigo 280º, nº 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) que ao Tribunal Central Administrativo, Secção de Contencioso Tributário, compete conhecer dos recursos das decisões dos tribunais tributários de 1ª instância, excepto quando o recurso tiver por exclusivo fundamento matéria de direito, situação em que a competência será da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

Para aferir da competência, em razão da hierarquia, do STA, há que ponderar as conclusões da alegação do recurso e verificar se, as questões controvertidas se resolvem mediante a exclusiva aplicação e interpretação de normas jurídicas, ou se, pelo contrário, implicam a necessidade de dirimir questões de facto, seja porque se discorda das ilações de facto que deles se retiraram, ou porque se invocam factos que não foram dados como provados e que...

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