Acórdão nº 00203/06.4BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 06 de Março de 2015
Magistrado Responsável | Rog |
Data da Resolução | 06 de Março de 2015 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: O Estado Português veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, de 29.10.2012, pela qual foi julgada parcialmente procedente a acção administrativa comum, na forma ordinária, intentada por LRG para pagamento de uma indemnização de 22.781,34 euros, por efectivação de responsabilidade civil extracontratual.
Invocou para tanto que a decisão recorrida violou o disposto no artigo 6° do D. Lei n° 48051 de 21/11/1967 e nos artigos 342° e 493º n°1 do Código Civil.
O recorrido contra-alegou defendendo a manutenção do decidido, pese embora reconheça lapso na norma aplicada, do disposto no artigo 493.º n°1 do Código Civil, quando se mostra aplicável ao caso o disposto no artigo 491º do mesmo Código.
*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1.° A responsabilidade civil do Estado por actos ilícitos de gestão pública prevista no artigo 2.° do D. Lei n.°48051 de 21 de Novembro de 1967 depende da verificação cumulativa dos pressupostos da responsabilidade civil geral: o facto, a ilicitude, a imputação 2.° São ilícitos os actos jurídicos que violem normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis e os actos materiais que infrinjam estas normas e princípios ou ainda as regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração - artigo 6.° do D. Lei 48051.
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A culpa, como elemento subjectivo da responsabilidade, é o nexo de imputação ético-jurídica que liga o facto (ilícito) a vontade do agente, sendo aferida em concreto, em face da acção ou omissão, segundo a diligência de um bom pai de família, ou, no caso da responsabilidade civil dos entes públicos, segundo a diligência esperada de um funcionário ou agente típico (artigos 4.°, n.°1 do D. Lei 48051 e 487.° do C. Civil) 4.° Na sua contestação o Réu Estado Português sustentou a inexistência de ilicitude e culpa e fê-lo porque a instituição escolar cumpriu integralmente o seu dever de vigilância, limitada à dotação do pessoal existente, não lhe sendo razoável exigir que para o efeito dispusesse de um quadro de auxiliares em número equivalente (ou sequer aproximado) ao dos alunos, por forma a acompanhá-los de perto em todas as deambulações pelas instalações escolares.
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Logo, não se pode concluir que impendesse sobre os funcionários, docentes, não docentes ou responsáveis da escola um especial dever de se encontrarem presentes nas precisas circunstâncias de tempo e lugar apontadas, de molde a obstar à consumação da agressão, a qual não era antecipadamente previsível, nem era exigível que o fosse, por ter resultado de um quadro factual, súbito, inesperado e intempestivo.
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Não lhes sendo, por isso imputável qualquer falta de zelo, negligencia ou diligencia devida, não tendo o Réu Estado Português infringido qualquer disposição legal.
7,° Para condenar o Réu Estado o M.mo Juiz invoca em largas considerações e referências o artigo 493.° do C. Civil.
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Diz o artigo 493.° n.°1 do C.Civil que" Quem tiver em seu poder coisa móvel ou imóvel, com o dever de a vigiar e bem assim quem tiver assumido o encargo da vigilância de quaisquer animais responde pelos danos que a coisa ou os animais causarem, salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua".
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Porém, salvo o devido respeito, o artigo 493º do C. Civil não tem aplicação no caso em concreto.
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Com efeito, tal artigo apenas regula a situação de culpa in vigilando por danos provocados por coisa à guarda.
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O artigo 493º, n.°1 do C. Civil encerra uma" Presunção de culpa" impendente sobre quem tem o dever de vigilância que importa uma inversão da regra geral em matéria de prova, no tocante à incidência do ónus respectivo, passando este a correr por conta do R. que assim teria que alegar e provar " que nenhuma culpa houve da sua parte; que empenhou toda a diligência para obviar a produção dos danos " ou que estes" se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua".
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Ora, não sendo de aplicação ao caso o mencionado normativo, falece o raciocínio operado na douta decisão recorrida, assente na existência da " presunção " e na decorrente inversão da regra geral em matéria da prova plasmada no artigo 342.° do C. Civil.
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Ora, era ao Autor que competia alegar e fazer prova dos factos constitutivos do seu direito, designadamente, que os danos cujo ressarcimento reclama ocorreram causalmente porque quem detinha o dever de vigilância, no tomou todas as providências adequadas à não produção da agressão de que foi vítima.
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Ou seja, competia ao Autor alegar e fazer prova da culpa do R. e do nexo de causalidade entre a (putativa) conduta omissiva deste e o resultado.
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A verdade é que nem o Autor alegou factualidade a tanto tendente, nem por conseguinte, necessária e logicamente, logrou obter a prova respectiva.
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Com efeito, a materialidade fáctica dada como provada não permite um exercício substantivo que desagúe no preenchimento dos referidos requisitos constitutivos (culpa e nexo de causalidade) do direito a indemnização e da obrigação de indemnizar por parte do Réu Estado Português.
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Falecem, pois, os requisitos da responsabilidade civil extracontratual do Estado em re1ação ao Estado Português, violando assim a douta sentença o disposto no artigo 6.° do D. Lei n.°48051 de 21/11/1967 e artigos 342.° e 493.º n.°1 do C. Civil.
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Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, com a consequente absolvição do réu ESTADO PORTUGUÊS do pedido.
* II – Matéria de facto.
A decisão recorrida julgou provados os seguintes factos, sem reparos nessa parte: 1. O autor, LRG, nasceu no dia 17/07/1988, na freguesia de M..., concelho de CD, o qual à data da propositura da acção era menor, e é filho de DMG e MFCR, seus representantes legais.
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No ano lectivo de 2002/2003, o autor estava matriculado e frequentava o 9º Ano de Escolaridade, Turma "A", da Escola EB 1,2,3 de M..., sita na freguesia de M..., concelho de CD.
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Nesse mesmo ano, na mesma Escola, estava matriculado e frequentava também o 9º Ano de Escolaridade, Turma "C", FSLC.
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O referido FSLC, nasceu no lugar de M... – CD em 14/3/1988, e é filho de...
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