Acórdão nº 00671/14.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: LMGPR veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 29.10.2014, pela qual foi indeferido o pedido de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias que deduziu contra a União de Freguesia de S.MAL, pedindo a intimação da requerida “a não promover o funcionamento da casa mortuária” que confina com o seu prédio e, subsidiariamente, a convolação da intimação em providência cautelar, com decretamento provisório, com o mesmo objectivo.

Invocou para tanto, em síntese, que: a sentença recorrida enferma de nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão, uma vez que inexiste qualquer nexo de causalidade entre os fundamentos invocados e a decisão prolatada; enferma também de nulidade por omissão de pronúncia, já que o tribunal a quo não se pronunciou acerca do mérito intrínseco da pretensão da requerente, ora recorrente, tendo-se limitado a julgar a viabilidade de prova dos fundamentos daquela pretensão, violou, os deveres estatuídos no artigo 413.º do CPC (ex vi art.º 1.º do CPTA), ao desconsiderar, de todo em todo, a prova documental produzida pela ora recorrente; e no artigo 110.º, n.º 2 do CPTA, ao ter concluído pela necessidade de prova testemunhal, sem cuidar de promover (oficiosamente), como sempre lhe incumbiria, qualquer diligência nesse sentido; A recorrida apresentou contra-alegações, a defender a manutenção da sentença impugnada.

Foi proferido despacho de sustentação pelo Tribunal a quo.

O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: I- A douta sentença recorrida enferma de manifesta nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, aplicável ex vi art.º 1.º do CPTA, uma vez que inexiste qualquer nexo de causalidade entre os fundamentos invocados e a decisão prolatada; II- Enferma, outrossim, de nulidade por omissão de pronúncia, por força do disposto no art.º 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, já que o tribunal a quo não se pronunciou acerca do mérito intrínseco da pretensão da requerente, ora recorrente, tendo-se limitado a julgar a viabilidade de prova dos fundamentos daquela pretensão; III- Violou, ademais, o tribunal recorrido, os deveres estatuídos nos art.ºs: - 413.º do CPC (ex vi art.º 1.º do CPTA), ao desconsiderar, de todo em todo, a prova documental produzida pela ora recorrente; e - 110.º, n.º 2 do CPTA, ao ter concluído pela necessidade de prova testemunhal, sem cuidar de promover (oficiosamente), como sempre lhe incumbiria, qualquer diligência nesse sentido; * II – Matéria de facto.

1 - A requerente tem inscrito a seu favor, na matriz predial urbana da União de freguesias de S. MAL, sob o artigo 1158, o prédio urbano, destinado a habitação, sito na R...,, no lugar de A... (artigo 12.º do R.I. e 45.º da oposição).

2 - O prédio referido no número anterior confronta, do sul, com o prédio inscrito sob o artigo 1473, em nome da Requerida (artigo 13.º do R.I. e 45.º da oposição).

3 - Em Maio de 2013 a requerida iniciou as obras de construção de uma casa mortuária no referido prédio (artigo 14.º do R.I. e 45.º da oposição).

4 - Em 29/11/2013, a requerente instaurou um procedimento cautelar de embargo de obra nova contra a antecessora da requerida, que corre termos pelo extinto 5.º Juízo Cível de Coimbra, sob o n.º 3837/13.7TJCBR, indeferido por sentença de 26/8/2014 (artigos 21.º do R.I. e 45.º da oposição, e 23.º do R.I.).

* III - Enquadramento jurídico.

  1. As nulidades da sentença.

    1.1. A nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão.

    A contradição a que alude alínea c) do n.º 1, do art.º 615º do actual Código de Processo Civil (alínea c) do n.º 1, do art.º 668º do anterior Código de Processo Civil), aplicável por força do disposto no artigo 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, é uma incongruência lógica ou jurídica.

    Esta incongruência lógica ou jurídica pode traduzir-se numa oposição entre os fundamentos e a decisão ou nos fundamentos entre si (os necessários para a decisão) ou no próprio conteúdo decisório em si mesmo. A razão de ser da nulidade é, em qualquer dos casos, a mesma: não se pode aproveitar, de todo, uma sentença cujo sentido lógico ou jurídico não se pode alcançar.

    Ver neste sentido o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 10.11.2005, no processo n.º 01051/05.

    A nulidade aqui prevista pressupõe um vício lógico de raciocínio; “a construção é viciosa, pois os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto” - Alberto dos Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984, reimpressão, p. 141: “nos casos abrangidos pelo artigo 668.º, n.º 1, c), há um vício real no raciocínio do julgador: a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente” - Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, p. 690; “se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença” - Lebre de Freitas e outros, Código de Processo Civil Anotado, volume 2.º, p.670).

    Como diz Alberto dos Reis, obra citada, nas páginas 130 e 141, convirá notar que “a contradição entre os fundamentos e a decisão nada tem a ver, seja com o erro material – contradição aparente, resultante de uma divergência entre a vontade declarada e a vontade real: escreveu-se uma coisa, quando se queria escrever outra –, seja com o erro de julgamento – decisão errada, mas voluntária, quanto ao enquadramento legal ou quanto à interpretação da lei; o erro material e o erro de julgamento não geram a nulidade da sentença, como sucede com a oposição entre os fundamentos e a decisão, mas, tão-só, e apenas, a sua rectificação ou a eventual revogação em via de recurso”.

    “Não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável…” - Antunes Varela, obra citada, página 686.

    No caso concreto a decisão recorrida mostra-se, desde logo de um ponto de vista estritamente lógico, impassível de censura.

    Em resumo entendeu-se na decisão recorrida que a simples alegação de que foi dada a utilização como casa mortuária a um prédio...

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