Acórdão nº 01031/08.8BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Fevereiro de 2015
Magistrado Responsável | Frederico Macedo Branco |
Data da Resolução | 11 de Fevereiro de 2015 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório A M - Produção e Comércio de Peixe Lda.
devidamente identificada nos autos, no âmbito da ação administrativa comum, intentada originariamente pela, contra a EP – Estradas de Portugal SA tendente a obter uma indemnização, em resultado “de obras levadas a cabo na ponte de G... (FF....), no rio M....” e que terão obstruído o braço sul do mesmo “afetando a piscicultura da autora”, inconformada com a Sentença proferida em 29 de Maio de 2013, no TAF de Coimbra, na qual a ação foi julgada improcedente, veio interpor recurso jurisdicional.
Formula a aqui Recorrente/M nas suas alegações do Recurso Jurisdicional apresentado em 7 de Outubro de 2013, as seguintes conclusões (Cfr. fls. 2975 a 3061 Procº físico).
“a) a Mma. Juiz a quo deu excessivo e inusitado relevo a um estudo, encomendado e efetuado a posteriori pela WW Consultores e ao depoimento do seu sócio gerente, Engª. AV, segundo o qual a oclusão do canal, com a redução das passagens de água, de sete para uma, teria provocado apenas uma diminuição de 2% da entrada de água do mar; b) o modelo matemático desse estudo desconsiderou ou ignorou, por completo, a particularidade da dinâmica estuarina, em que existem dois fluxos de sentido contrário (enchente e vazante), tendo tudo calculado como se existisse um único fluxo de enchente; c) ora, esses dois fluxos reciprocamente se influenciam, pois que, neste estuário - que é um delta de enchente -, a enchente é mais rápida (cerca de duas horas) e bastante mais forte - é uma onda mareal - do que a vazante; d) de facto, a enchente é uma corrente contranatura, pois que sobe, vencendo o declive normal do leito do rio e o sentido do curso deste, uma força muito superior à da vazante, daí resultando que haja um desfasamento entre as marés no estuário, em relação às marés, no Porto da FF....; e) ora, com a oclusão, isso fazia com que as marés, em contraciclo, e cingidas a uma única e estreita passagem, se opusessem na mesma, provocando graves alterações dos campos de corrente e da vorticidade, levando a que a vazante não se concluísse; f) daqui resulta evidente que a diminuição da quantidade de água a entrar (e, obviamente, a sair) fosse muito superior a 2%; g) também o aumento da velocidade no único canal mantido aberto, resultante do seu aprofundamento, provocava o levantamento de sedimentos e, consequentemente, a sua ressuspensão na coluna de água; h) a não “lavagem” bidiária, pela vazante, sobretudo na metade direita do estuário, onde se situa a piscicultura da autora; i) e igualmente resultavam, pela dificuldade da vazante, tempos de residência dos poluentes muito superiores; j) tudo isto foi exaustivamente explicado e demonstrado pelos Doutores MP e JR, que não apenas descreveram os fenómenos teoricamente, como relataram o que verificaram, in loco, tendo, também, o veterinário do IPIMAR, Dr. AD, explicado o que verificou, quanto à água; k) assim, deveriam os pontos 10, 17 e 25 da B.I. ter tido respostas de “Provado” e os pontos 4.º a 7.º, 11, 12 e 18 ter tido as seguintes respostas: “4.º e 5.º - Provado apenas que a obstrução do braço sul do rio M...., diminuindo a sua largura normal e o número de passagens da água, por baixo da Ponte, reduziu muito as trocas de água e a “lavagem” do leito que se faria na vazante, pelo que a água salgada que entraria por aquela abertura para o referido braço sul, por efeito das marés, banhando a Ilha da M... e abastecendo as suas pisciculturas (incluindo a da A.), sofreu grave deterioração de qualidade, em virtude do aumento significativo de sedimentos e matéria em suspensão na água do estuário; 6.º e 7.º - Provado apenas que, como resultado do fecho ou oclusão de seis dos sete locais de passagem da água, entre os pilares da antiga ponte, o volume de trocas de água diminuiu significativamente na margem direita, a montante da ponte da G..., e o nível de preia-mar tornou-se insuficiente, nas pisciculturas da margem direita, para efetuar com segurança, com água marinha, a renovação de água das mesmas; 11 e 12 - Provado apenas que, ainda em consequência das obras e do estrangulamento provocado pelo fecho de seis das sete passagens, passaram a ocorrer fluxos mareais em contraciclo, em que, a montante, a maré se mantinha ainda a vazar, enquanto, a jusante, ela já enchia, assim levando a que, quando a enchente avançava, de novo, se confrontava na ponte da G... com a vazante atrasada de montante, fazendo subir o nível da água, elevando o declive entre os dois setores.
18 - Provado que houve uma significativa redução da renovação de água a montante da ponte”.
l) com estas alterações, as respostas dadas aos pontos 49 e 51, porque remissivas, ficarão necessariamente alteradas com a simples alteração daquelas para que remetem; m) também a resposta ao ponto 53 da B.I. deveria ter sido, pura e simplesmente, de “Provado”, pois que, como foi taxativamente referido pelo veterinário do IPIMAR foi também essa me n) já as respostas aos pontos 100, 114, 116 e 117 só poderiam ser de “Não Provado”, devendo agora ser alteradas em conformidade; o) o ponto 31 deveria ter tido resposta de “Provado que o seu peso estimado seria de, pelo menos: Tanque 1 - 7.144,300 Kg; Tanque 2 - 6706,600 Kg; Tanque 3 - 6607,700 Kg; Tanque 4 - 4166,300 Kg; Tanque 5 - 4830,600 Kg; Tanque 7 - 2594,100 Kg; Tanque 8 - 5403,100 Kg; Tanque 10 - 4569,000 Kg; Tanque 11 - 1829,200 Kg.”; p) na verdade, a testemunha MR, pessoa que efetua todo o trabalho administrativo da A. e, assim, compila todos os dados de compras, vendas e outros, fazendo mapas do peixe existente em cada tanque, respondeu com pleno conhecimento de causa e de forma clara, explicando a forma como, por estimativa, chegou aos valores, em quilogramas, do peixe existente em cada tanque, a partir dos dados (em unidades de peixes) das aquisições efetuadas - tendo em conta o crescimento e aumento de peso dos peixes - e das vendas, entretanto, feitas; q) os valores por ela referidos são superiores àqueles, porque teve em conta um peso unitário estimado de 550 gramas, enquanto o alegado na P.I. - e levado ao ponto 31 - pressupusera uma média de 450 gramas por peixe; r) existindo nos autos todos os documentos relativos às compras e, também, os das vendas, conjugado com a explicação plausível, credível da testemunha, não contrariada por nenhuma outra, do facto de os pesos por ela referidos serem superiores aos alegados, não haveria que dar o ponto 31 como não provado mas, apenas, confinar os valores/pesos aos alegados e constantes da B.I.; s) os presentes autos são o resultado da grosseira violação pela R. e sua empreiteira, de normas legais que, informadas pelo princípio da precaução, se destinam a precaver, a prevenir, a evitar danos, em vez de os reparar, exigindo, assim, a prévia Avaliação de Impacto Ambiental; t) nas impressivas palavras de LFCA, trata-se de “induzir o titular da obra a não preferir a condenação ao ressarcimento do dano ambiental à adoção de medidas corretivas, economicamente mais onerosas, impostas no âmbito do procedimento de avaliação de impacto ambiental”; u) essa omissão (dolosa, diga-se), essa ilegalidade é determinante ad ilicitude, uma vez que estamos, claramente, dentro do âmbito de proteção da norma e do círculo de interesses protegidos pela mesma; v) verificado o facto ilícito, culposo, estranhamente a Mma. Juiz a quo veio, porém, a entender não existir nexo de causalidade entre o facto e o dano; w) ora, segundo a teoria da causalidade adequada, na formulação negativa de Enneccerus/Lehmann, consagrada no art. 563 do Código Civil, um facto só não é condição do dano quando, “segundo a sua natureza geral, era de todo indiferente para a produção do dano e só se tornou condição dele, em virtude de outras circunstâncias extraordinárias, sendo portanto inadequada para este dano”; x) os factos provados - quer os já provados, quer, por maioria de razão, com o acréscimo dos que se espera venham a ser dados como tal - evidenciam que as obras da ponte, levadas a cabo em violação de lei expressa, alteraram toda a dinâmica do estuário, todas as condições de circulação da água, gerando, e em particular na margem direita do braço sul - onde se situam a piscicultura da autora e a de AF -, a existência de mais elevados tempos de residência dos poluentes, a ressuspensão na coluna de água, de sedimentos levantados pelo acréscimo de velocidade no (único) canal deixado aberto, a persistência de finos, que tendem a depositar-se nas guelras dos peixes, colmatando-as, asfixiando-os; y) tais condições impediram a A. de renovar a água dos tanques em condições satisfatórias, tendo causado um acréscimo de matéria orgânica que levou ao desenvolvimento de bactérias que infetaram os peixes e foram causadoras da sua morte; z) também a água que a A., em desespero, terá metido, com elevada suspensão de finos, foi apta a colmatar-lhes as guelras e, consequentemente, provocar infeções e asfixia; aa) os próprios peixes mortos potenciaram o aumento de matéria orgânica nos tanques, causadora das infeções e da morte; bb) a causa da morte foi, portanto, quer o acréscimo de matéria orgânica na água dos tanques - como expressamente consta do Relatório do IPIMAR, relativo aos peixes da piscicultura de AF -, gerador de uma infeção nas brânquias por Ambiphyra, em resultado de a água não ter sido renovada como deveria, devido às (más) condições criadas pela obra, quer a acumulação de finos nas brânquias dos animais - resultante da pouca e má água que a autora, ainda assim, conseguiu meter nos tanques -, colmatando as guelras e matando diretamente os peixes, ou deixando-os num estado de fadiga e debilidade, campo privilegiado de ataque das bactérias, como a Ambiphyra; cc) como bem se diz no Ac. TCAN de 25.1.2013, “o nexo de causalidade entre o facto e o dano pode ser indireto, isto é, subsiste o nexo de causalidade quando o facto ilícito não produz ele mesmo o dano, mas é...
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