Acórdão nº 00320/09.9BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório O Município F...

e o Contrainteressado JMCLF, no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada pelo Ministério Público, tendente, em síntese, a obter a anulação de Despachos identificados que determinaram o pagamento ao contrainteressado de despesas judiciais relativas ao Processo nº 49/00.3JABRG, inconformados com o Acórdão proferido em 15 de Outubro de 2013, que julgou precedente a ação, anulando os despachos que haviam autorizado o pagamento das referidas despesas judiciais por parte do Município, vieram interpor recurso jurisdicional da referida decisão, proferida em primeira instância e em coletivo, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga.

Formula o aqui Recorrente/Município suas alegações de recurso, apresentadas em 19 de Novembro de 2013, as seguintes conclusões (Cfr. Fls. 533 a 540 Procº físico): “1ª A questão que ora se levanta prende-se apenas com a interpretação da alínea o) do nº1 do artigo 5º e do artigo 21º da Lei nº29/87, na parte referente ao momento em que as autarquias locais podem suportar (pagar) as despesas «provenientes de processos judiciais em que os eleitos locais sejam parte, desde que tais processos tenham tido como causa o exercício das respetivas funções (o que no caso em apreço nem sequer está em discussão) e não se prove dolo ou negligência por parte dos eleitos»; 2ª Não se tendo o legislador afadigado a pronunciar-se expressamente acerca do momento em que devem ser feitos esses pagamentos, o artigo 21º da Lei nº29/87, quando conjugado com a alínea o) do nº1 do artigo 5º da mesma lei, deve ser interpretado no sentido de permitir que os órgãos autárquicos competentes decidam, em face das circunstâncias de cada caso concreto ─ designadamente da situação económica do eleito local, das verbas envolvidas, da complexidade e da consequente duração do processo ─ se os pagamentos em causa podem ser autorizados antes de haver uma sentença transitada em julgado, desde que, dando-se o caso, fique expressamente consagrado no despacho autorizativo que todas as verbas pagas terão de ser restituídas, se a final vier a ser dado como provado que houve dolo ou negligência do eleito local; 3ª Essa é a interpretação que resulta do enunciado linguístico (elemento gramatical) da alínea o) do nº1 do artigo 5º e da Lei nº29/87, que confere expressamente a todos os eleitos locais o direito a «apoio nos processos judiciais que tenham [e não que tenham tido] como causa o exercício das respetivas funções»; 4ª Assim como é a que resulta do enunciado linguístico (elemento gramatical) do artigo 21º da mesma lei, quando considera que «Constituem encargos a suportar pelas autarquias respetivas» as despesas em causa e quando se refere aos «processos em que os eleitos sejam parte» e não aos processos em que os eleitos tenham sido parte; 5ª. A interpretação que o douto acórdão do TAF de Braga faz das normas em apreço não respeita, de facto, a expressão verbal do citado artigo 21º, desde logo, porque, ao utilizar, na sua formulação linguística, a expressão «sejam parte», esse artigo deixa claro que os pagamentos em causa podem ter lugar antes dos respetivos processos judiciais terem terminado; 6ª Sendo o fim visado pela alínea o) do nº1 do artigo 5º e pelo artigo 21º da Lei nº 29/87 (a sua ratio legis) o de conferir garantia e segurança aos eleitos locais, permitindo-lhes defenderem-se nos processos em que se vejam envolvidos por causa do exercício das suas funções, a interpretação que o douto acórdão de que agora se recorre faz dessas normas viola a sua razão de ser (a sua ratio legis), porque implica que, pelo menos em certas situações, como no presente caso, esse apoio só possa ser realmente dispensado aos eleitos locais que tenham uma situação económica que lhes permita ir suportando, durante vários anos, as despesas do processo, até que finalmente (in casu passados mais de onze anos) haja uma sentença transitada em julgado; 7ª. Ou seja, para além do elemento gramatical (o texto ou a letra da lei), também o elemento racional ou teleológico (a ratio legis) afasta a interpretação que o douto acórdão do TAF de Braga fez do artigo 21º do Estatuto dos Eleitos Locais; 8ª Por outro lado, uma interpretação como aquela em que se funda o douto acórdão do TAF de Braga conduziria, em muitos casos, a um resultado de todo inaceitável: só poderiam aproveitar da garantia e da segurança que é conferida pela alínea o) do nº1 do artigo 5º e pelo artigo 21º da Lei nº29/87 os eleitos locais que tivessem capacidade económica para poderem ir suportando, ao longo do processo, todas as muitas despesas resultantes da sua defesa; 9ª Para além disso, uma tal interpretação conduziria a uma discriminação ─ em razão da sua situação económica ─ dos eleitos locais que não tenham meios de fortuna nem rendimentos que lhes permitam ir pagando, ao longo dos anos as despesas em causa, discriminação essa que é claramente violadora do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição; 10ª Em outras pronúncias, o legislador tem consagrado expressamente soluções condizentes com a interpretação que o Município de F... faz das duas referidas disposições do Estatuto dos Eleitos Locais (cfr., v.g., a alínea d) do nº1 e nº3 do artigo 4º do Regulamento das Custas Processuais e o artigo 33º da Lei nº2/2004, de 15 de Janeiro, com a redação que lhe foi dada pela Lei do Orçamento do Estado para 2009); 11ª Os atos agora impugnados são válidos, não sofrendo do vício que lhes é imputado pela sentença do TAF de Braga; 12ª Ao ter interpretado da forma como interpretou a alínea o) do nº1 do artigo 5º e o artigo 21º do Estatuto dos Eleitos Locais, o douto acórdão de que agora se recorre incorreu em erro de julgamento, o que o levou a considerar, salvo o devido respeito, erradamente procedente a presente ação administrativa especial e, consequentemente, a anular indevidamente os atos administrativos nela impugnados.

Nestes termos e nos demais que serão superiormente supridos, deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional, devendo ser revogada a douto sentença do TAF de Braga e julgada improcedente a ação administrativa especial que foi instaurada pelo Ministério Público.” Formula o aqui Recorrente/Contrainteressado suas alegações de recurso, apresentadas em 25 de Novembro de 2013, as seguintes conclusões (Cfr. Fls. 547 a 575 Procº físico): “1. Ao contrário do que sustenta o Tribunal a quo na sentença ora recorrida, os despachos dos Exmo. Senhor Vice-Presidente da Câmara Municipal de F..., proferidos entre 19 de Março de 2008 e 4 de Dezembro de 2008, que, ao abrigo do artigo 21.º do Estatuto dos Eleitos Locais [Lei n.º 29/87, de 30 de Junho], autorizaram o pagamento, ao Contrainteressado ora Recorrente JMCLF, do montante global de EUR 63’018,00, relativo a despesas judiciais verificadas no âmbito do Processo n.º 49/00.3JABRG, que corre termos pelo 2.º Juízo do Tribunal Judicial de F..., não viola a Lei e, por conseguinte, não merece anulação.

  1. Pelo contrário, a sentença recorrida, ao decidir da forma como o fez, viola não só o citado artigo 21.º do Estatuto dos Eleitos Locais [Lei n.º 29/87, de 30 de Junho], bem assim como os artigos 20.º, n.º 1, 32.º, n.º 2 e 13.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.

  2. O Recorrente discorda veementemente da forma como o Tribunal a quo interpretou o quadro legal aplicável e o subsumiu à factualidade apurada, facto que motiva o presente recurso.

  3. Com efeito, assente a matéria de facto, dir-se-á, no tocante ao mérito da ação, que a interpretação que o Tribunal recorrido empresta ao artigo 21.º do Estatuto dos Eleitos Locais [Lei n.º 29/87, de 30 de Junho] e plasma na sentença que ora se escrutina é manifestamente errada, ilegal e violadora dos mais elementares princípios constitucionais, como se pretende demonstrar. COM EFEITO, 5. A alínea o), do n.º 1, do artigo 5.º da Lei n.º 29/87, de 30 de Junho, com as alterações que lhe foram introduzidas pelas Leis n. º 97/89, de 15 de Dezembro; n.º 1/91, de 10 de Janeiro; n.º 11/91, de 17 de Maio; n.º 127/97, de 11 de Dezembro; n.º 50/99, de 24 de Junho; n.º 86/2001, de 10 de Agosto; n.º 22/2004, de 17 de Junho e, finalmente, n.º 52-A/2005, de 10 de Outubro, dispõe o seguinte: «1. Os eleitos locais têm direito, nos termos definidos nas alíneas seguintes: (…) o) O apoio nos processos judiciais que tenham como causa o exercício das respetivas funções;» [nosso relevo].

  4. Por seu turno, o artigo 21.º do mesmo diploma legal, epigrafado «Apoio em processos judiciais» dispõe que: «Constituem encargos a suportar pelas autarquias respetivas as despesas provenientes de processos judiciais em que os eleitos locais sejam parte, desde que tais processos tenham tido como causa o exercício das respetivas funções e não se prove dolo ou negligência por parte dos eleitos» [nosso relevo].

  5. Como decorre das normas acima transcritas, para que uma autarquia local possa satisfazer os encargos decorrentes do apoio em processos judiciais de que beneficiam os eleitos locais é necessário o preenchimento cumulativo de dois requisitos: O requisito objetivo de que o processo tenha tido como causa o exercício das funções e o requisito subjetivo e negativo de que se não prove dolo ou negligência por parte dos eleitos.

  6. Em bom rigor e como refere a sentença recorrida, o que se discute na presente lide é a questão do momento do apuramento e pagamento das despesas que, por força da sobredita norma, constituem encargo do Município Réu.

  7. Para uma melhor inteligência do espírito que imbuiu a elaboração desta Lei, importa, certamente, recuar ao momento da sua feitura, exercício que, por certo, o Tribunal a quo se olvidou de fazer.

  8. A Lei n.º 29/87, de 30 de Junho, tem por base o projeto de Lei n.º 403/IV, subscrito por P.S.D., P.S., P.C.P., C.D.S. e M.D.P./C.D.E. e versa sobre o Estatuto dos Eleitos Locais. O referido projeto de Lei, elaborado por...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT