Acórdão nº 00479/13.0BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução23 de Setembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO.

AMBF, residente na Rua…, inconformado, interpôs recurso jurisdicional da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, em 31 de julho de 2014, que no âmbito da ação administrativa especial que intentou contra o ESTADO PORTUGUÊS, representado pelo MINISTÉRIO DA DEFESA NACIONAL e contra o EXÉRCITO PORTUGUÊS, absolveu as entidades demandadas da instância dando por verificada a exceção da ilegitimidade passiva do Estado Português, a exceção dilatória inominada por falta de pressupostos processuais previstos no art.º 73.º do CPTA e a exceção da caducidade do direito de ação.

**O Recorrente alegou e formulou as seguintes conclusões: « 1º Existem erros, confusões e obscuridades quanto aos factos assentes indicados com as letras E e J, e uma clara contradição na fundamentação jurídica, entre os argumentos utilizados e a decisão, quanto à ilegitimidade passiva do Recorrido Estado Português, o que implica a nulidade da sentença posta em crise nos termos do artº 615º, nº1, al.c), do NCPC, ex. vi artº 1º do CPTA.

  1. Ao recusar pronunciar-se sobre os vícios e ilegalidades que inquinam tanto o Despacho nº 275/2012, de 3 de dezembro, do Ministro da Defesa Nacional, como o ato administrativo que dele derivou e foi produzido pelo Exército Português, o Tribunal a quo mais não fez do que denegar ao Recorrente a justiça a que, constitucionalmente, tem direito.

  2. Ao Tribunal a quo foram apresentadas para conhecimento e decisão questões de relevante importância jurídica, quais sejam as ilegalidades cometidas pelos Recorridos como se segue: - Princípio da Proteção da Segurança Jurídica e da Proteção da Confiança dos Cidadãos - violação do artº 2º da CRP e os artigos 6º e 6º- A, do CPA; Responsabilidade do Estado e demais entidades públicas por ações ou omissões de que resulte violação dos direitos (…) ou prejuízo de outrem - violação do artº 22º da CRP; subordinação dos órgãos e agentes administrativos à CRP e à lei - violação do artº 266º, nº2 da CRP; violação do artº 268º, nº3 da CRP e dos artigos 66º, alíneas b) e c), 68º, nº1 e 70º - vícios da notificação do ato administrativo ao Recorrente e ausência de fundamentação expressa e acessível.

  3. Recusando conhecer do mérito da causa, aderindo integralmente às teses dos Recorridos, que invocaram a exceção de ilegitimidade passiva do Estado Português, a exceção dilatória inominada, por falta de pressupostos processuais previstos no artº 73º do CPTA e a exceção de intempestividade da ação proposta, no que se reporta ao ato impugnado, o Tribunal a quo viola claramente o Princípio do Favorecimento do Processo (ou pro actione) na Justiça Administrativa, um dos princípios mais importantes do Processo Administrativo.

  4. Tendo o ato administrativo impugnado (decorrente do Despacho do Recorrido MDN), sido produzido pelo Recorrido Exército por questões orçamentais, em que expressamente são invocadas normas da Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2013 (concretamente o artº 27º), o Estado Português é parte interessada na (im)procedência da ação.

  5. O Estado Português é também parte na relação material controvertida, nos termos e para os efeitos do artº 10º, nº1 do CPTA.

  6. Decidindo pela ilegitimidade passiva do Réu Estado Português o Tribunal recorrido violou o artº 10º, nº1 do CPTA, conjugado com o artº30º do NCPC (26º no CPC à data da propositura da ação), ex vi artº 1º do CPTA.

  7. O diferimento da apresentação do pedido de declaração de ilegalidade, com força obrigatória geral, do Despacho nº 275/2012, de 3 de dezembro, do Ministro da Defesa Nacional, aguardando a verificação da recusa em três casos concretos, inviabilizaria a cumulação do pedido, em tempo, de anulação do ato administrativo praticado com base no despacho impugnado (nos termos do artº 58º, nº2, al. b), exponenciando os efeitos negativos produzidos sobre os AA.

  8. O Recorrente tem direito, como todos os cidadãos, nos termos do artº20º, nº4 da Constituição da República Portuguesa, a uma Justiça que deve ser exercida em prazo razoável, devendo ser evitados mecanismos geradores de demoras desnecessárias.

  9. Não deve a falta de um requisito para a declaração da ilegalidade da norma administrativa, com força obrigatória geral (desaplicação da norma impugnada em três casos concretos), impedir que o Tribunal conheça do mérito da causa e produza uma boa e justa decisão, numa situação de claro prejuízo para o Recorrente.

  10. Não constituindo a norma impugnada (despacho do Recorrido MDN) uma mera orientação aos Ramos das Forças Armadas, mas antes uma ordem para recálculo dos complementos da pensão de reforma (assim foi entendido e invocado pelo Recorrido Exército), a sua eficácia repercutiu-se de forma mediata na esfera jurídica do Recorrente, porque sustentou um ato administrativo produzido pelo Recorrido Exército Português, que veio violar o seu direito à estabilidade da respetiva pensão de reforma, também afetada pela aplicação da Contribuição Extraordinária de Solidariedade.

  11. Não ocorre, de tal forma, qualquer exceção dilatória quanto ao pedido formulado pelo Autor, de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, do despacho impugnado.

  12. Tendo sido invocada pelo Recorrente a invalidade na forma de nulidade, do ato administrativo impugnado, o Tribunal a quo tinha a obrigação de conhecer do mérito da questão em juízo, sob pena de violar o artº 133º, alíneas d) e f), do CPA, conjugado com o artº 58º, nº1 do CPTA, o que acabou por acontecer, porque a impugnação de atos nulos não está sujeita a prazo.

  13. Por outro lado, o requerimento apresentado pelo Autor nos serviços do Recorrido Exército Português, nos termos em que se fundamenta e pelo pedido expresso, ao contrário do que e sustentado na sentença de que se recorre, é um recurso hierárquico em forma e em substância, na medida em que foi respeitado o regime previsto no artº 169º do CPA.

  14. Constituindo um recurso hierárquico, em que foi pedido ao Recorrente Exército o reconhecimento da nulidade do ato administrativo impugnado (com todas as implicações legais decorrentes), o requerimento apresentado pelo Recorrente, a 31-01-2013, suspendeu o prazo de três meses para impugnação contenciosa.

  15. Não tendo havido decisão do Recorrido Exército, na forma legal de deferimento/indeferimento, o prazo para apresentação de recurso contencioso, suspenso em 01/02/2013 em consequência da apresentação do recurso hierárquico, retomou o seu decurso em 03/04/2013, por força do regime previsto no artº 105º, nº 4 do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, que prevê um prazo de dois meses para decisão sobre recurso hierárquico.

  16. O Recorrente estava em tempo para apresentar a presente ação, no mínimo, até 12/06/2013.

  17. A presente ação é sempre tempestiva, nos termos e para os efeitos do artº 58º, nºs 1 e 2, alínea b), esta conjugada com o artº 59º, nºs 1e 4, ambos do CPTA.

  18. Quando propôs a presente ação o Autor tinha o seu Direito de ação em condições de ser exercido, e não caducado, pelo que não há lugar à aplicação dos artigos 288º, nº1, alínea e), 493º, nº2 do CPC (em vigor à data) e artº 89º, nº1 , alínea h) do CPTA.

  19. A sentença posta em crise está ferida de ilegalidade porque viola: - Princípio do Favorecimento do Processo (ou pro actione) na Justiça Administrativa; - O artº 20º da CRP, uma vez que a sentença constitui uma verdadeira denegação da justiça ao Recorrente; - O artº 10º, nº1 do CPTA, conjugado com o artº30º do NCPC (26º no CPC à data da propositura da ação), ex vi artº 1º do CPTA; - O artº 133º, alíneas d) e f), do CPA, conjugado com o artº 58º, nº1 do CPTA; - artº 105º, nº 4 do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, aprovado por Dec lei nº236/99, de 25 de junho; - artº 58º, nºs 1 e 2, alínea b), esta conjugada com o artº 59º, nºs 1e 4, ambos do CPTA.» Termina requerendo o provimento do recurso.

    **O Recorrido Estado Português, representado pelo Ministério Público, contra-alegou, enunciando as seguintes CONCLUSÕES: «1.º Defende, o Recorrente, que a douta decisão ora posta em crise, pecou por consubstanciar uma decisão formal em detrimento do conhecimento do mérito da causa, enfermou de erro de julgamento e de contradição entre os argumentos e a decisão, no que se refere à excepção da ilegitimidade passiva do Réu Estado Português.

  20. Conclui, assim, que a decisão (saneador-sentença) se mostra inquinada de nulidade, pedindo a sua revogação, e a substituição por outra que, ou ordene a remessa dos autos ao tribunal a quo, para prosseguir a instância, ou proceda ao seu conhecimento de mérito.

  21. Invocando, prima facie, o Autor, que a douta decisão, aqui em apreço, está ferida de ilegalidade, desde logo porque se recusou a conhecer do mérito da causa, aderindo às teses dos Réus no que respeita à procedência das excepções aduzidas, violando claramente o princípio do favorecimento do processo (pro actione), um dos princípios mais importantes do processo Administrativo, importa registar que a aplicação do princípio pro accione pressupõe, sempre, que existam duas possibilidades ou opções em termos de decisão, o que no caso não sucede, pois, apenas sempre se verifica uma única possibilidade, com inerente apoio na lei.

  22. Pelo que, e ao contrário daquilo que alega o Recorrente, não se mostra violado o invocado principio "pro actione".

  23. De igual forma inexiste qualquer contradição entre os argumentos e a decisão, no que tange à ilegitimidade passiva do Réu Estado Português, laborando, o Demandante, nesta sede, em manifesto erro e confusão conceptual, desde logo, na identificação da entidade demandada, com a agravante de atribuir a incumbência da representação do Estado ao Ministério da Defesa Nacional, 6.º Decorre do artigo 219.º da CRP que é ao Ministério Público que compete representar o Estado, sendo esta, aliás, uma das suas atribuições estatutárias (artigo 1.º e 3.º n.º 1, alínea a) dos Estatutos do M.P.) 7.º Porém, nos...

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