Acórdão nº 01138/15.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 07 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução07 de Julho de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: Instituto da Segurança Social, I.P. (ISS, IP.) veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do saneador-sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 20.09.2016, pelo qual se julgou extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, em relação ao pedido de anulação do acto em crise; em relação ao demais peticionado, julgou-se a acção procedente, condenando o Réu a readmitir a Autora, com efeitos a 09.02.2015, no seu posto de trabalho na mesma carreira, com as mesmas funções, o mesmo vencimento, assim como à devolução do diferencial de vencimento a que teria direito desde aquela data, nos termos exarados nessa decisão, em acção administrativa especial que MAVFS moveu contra o Instituto da Segurança Social, I.P., com vista a impugnar a deliberação do Conselho Directivo do Réu, de 03.02.2015, que homologou a lista nominativa e a coloca em situação de requalificação, pedindo que seja reintegrada no seu posto de trabalho (que ocupava até 09.02.2015), bem como no pagamento de todas as importâncias retributivas e demais abonos tal como se tivesse estado ao serviço efectivo e respectivos juros de mora.

Invocou, para tanto, no essencial, que foram violados os artigos 245º a 257º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, o artigo 338º nº 1 alª d) do mesmo diploma e os artigos 56º e 267º da Constituição da República Portuguesa; não pode ser concedido, acrescenta, o direito ao diferencial entre as remunerações auferidas pela Autora entre 09.02.2015 e 01.02.2016 porque não corresponderam a uma efectiva prestação de trabalho.

A Recorrida não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal não emitiu parecer.

* Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1. O presente recurso tem como fundamento a errada interpretação dos artigos 251.º e seguintes da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, artigo 338.º da mesma Lei e artigos 56.º e 267.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, bem como os vícios de erro de julgamento, omissão de pronúncia e falta de fundamentação.

  1. O Tribunal a quo, entendeu ter-se verificado uma violação dos artigos 251.º e seguintes da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, fundamentando para o efeito que, a colocação em situação de requalificação, exige sempre um processo prévio de reafectação dos funcionários, devendo a requalificação ser a última ratio do processo de racionalização de efectivos.

  2. Para decidir desse modo, o Tribunal a quo teve em atenção exclusivamente a letra da lei, descurando a necessidade da sua interpretação e destituindo-a de todo e qualquer sentido.

  3. A carreira especial de educadora de infância (que é a carreira da Autora) tem um conteúdo funcional adequado apenas às actividades prosseguidas pelos estabelecimentos integrados, e, no Centro Distrital do Porto (domicílio profissional e necessário da Autora) os estabelecimentos integrados foram gradualmente saindo da gestão do Instituto da Segurança Social, IP., e sendo assumidos por Instituições Particulares de Solidariedade Social, ao abrigo do artigo 23.º, nº 3, da Portaria n.º 135/2012.

  4. Razão pela qual a carreira docente/educador de infância, deixou de ter enquadramento nas actuais competências do Instituto da Segurança Social, IP. e foi determinada a sua extinção e consequente processo de colocação directa na situação de requalificação.

  5. A fase de reafectação que o Tribunal a quo entendeu que devia ter sido aplicada aos trabalhadores que integravam a carreira docente, constituiria in casu um acto inútil e virtualmente impossível, dado estar em causa a extinção daquela carreira (e dos referentes postos de trabalho) no Instituto.

  6. A própria Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público entendeu que, nos casos de extinção de postos de trabalho, os trabalhadores passavam à situação de requalificação sem aplicação de qualquer método de selecção e reafectação, após cumprimento dos artigos 100.º e 101.º do Código do Procedimento Administrativo.

  7. Para que determinada norma seja aplicada e subsumida ao caso concreto, a sua interpretação não se deverá cingir à sua dimensão semântica, devendo-se também procurar o seu verdadeiro sentido e alcance.

  8. A consagração legal da existência de uma fase prévia de reafectação dos trabalhadores, prende-se essencialmente com dois motivos: 1º- relativo à própria Administração Pública enquanto empregadora e entidade gestora dos seus recursos humanos, já que a fase prévia de reafectação permite a justa distribuição dos efectivos, retirando-os de onde não são necessários e reafectando-os, dentro do mesmo organismo, em serviço que careça daqueles trabalhadores, sem necessidade de contratações externas; 2º- referente aos trabalhadores, já que a fase prévia de reafectação lhes poderá assegurar a possibilidade de continuarem no mesmo organismo estatal, em posto de trabalho adequado às suas carreiras, categorias, formação profissional e académica.

  9. In casu, nunca que a existência de uma fase prévia de reafectação permitiria atingir os objectivos que o artigo 256º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas pretende assegurar, já que por um lado o Instituto da Segurança Social, I.P., deixara de necessitar de trabalhadores inseridos na carreira docente, e por outro, aos trabalhadores não lhes poderia ser assegurada a reafectação em posto de trabalho adequado às suas carreiras dentro do Instituto pois que há muito haviam deixado de existir os referidos postos.

  10. A existir esta fase procedimental, apenas constituiria uma formalidade destituída de qualquer sentido jurídico e prático, o que, estando em causa dinheiros públicos, não se poderia consentir.

  11. Os docentes, ao serem colocados directamente na requalificação, puderam ser recolocados em outro organismo do Estado necessitado de trabalhadores com as suas competências, voltando assim, estes funcionários, a exercer funções adequadas às suas carreiras e para as quais investiram na sua formação académica e profissional.

  12. Os únicos postos de trabalho que o Instituto da Segurança Social, I.P., tinha à disposição e nos quais se poderia proceder a uma eventual reafectação de trabalhadores, correspondiam a funções de técnicos superiores (carreira geral) sendo que o Instituto nunca poderia proceder à mobilidade inter carreiras à revelia da vontade da Recorrida.

  13. Já no que tange ao prazo para audiência das associações sindicais, também nos parece que o Tribunal a quo laborou em erro, decidindo de modo pouco acertado, pois apesar de terem sido concedidos apenas dois dias úteis para as associações sindicais se pronunciarem, sempre se dirá que, nos termos do artigo 338.º, alínea d) da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, não se encontra estabelecido qualquer prazo.

  14. No entanto, não se poderá olvidar que as associações sindicais já acompanhavam todo o processo há algum tempo, são sendo, desse modo, “virgens” no assunto e no procedimento que se encontrava a decorrer.

  15. E, nestes casos, deve entender-se que o prazo deve ser o conveniente face à urgência da situação e o suficiente para compreender e poder responder à Administração Pública, não se devendo descorar que os sindicatos já haviam, inclusive, reunido com o Vogal do Conselho Directivo responsável pelo Pelouro dos Recursos Humanos, tempos antes, onde se fez um prévio enquadramento e se tinha informado que o Instituto da Segurança Social, I.P., ia entrar em processo de racionalização, não se vislumbrando, desse modo, que a concessão de um maior prazo, por força do estabelecido no artigo 338.º, alínea d) da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, pudesse fazer diferença.

  16. Assim, estando-se perante um processo especial, seguirá um regime específico e não o regime geral que as associações sindicais alegam que lhes deveria ter sido concedido - o prazo de 10 dias úteis, previsto no artigo 100.º do Código do Procedimento Administrativo, que é aplicável aos procedimentos gerais e não especiais.

  17. E, sempre se dirá que se tivesse sido coarctado o direito de pronúncia, as associações sindicais não se teriam pronunciado como se pronunciaram, sendo as suas pronúncias demonstrativas de que compreenderam o teor da notificação que lhes foi feita, devendo-se considerar que a audiência dos interessados, num processo administrativo especial, foi respeitada.

  18. E, no que tange a eventual reintegração e reconstituição jurídico-laboral, a nossa jurisprudência e doutrina têm-se pronunciado, uniformemente, no sentido de que, na ausência de serviço efectivamente prestado, a Administração não tem o dever de pagar ao funcionário os correspondentes vencimentos ou diferenças salariais, sendo certo que devem ser salvaguardadas as fases que a lei estabeleceu para os trabalhadores em situação de requalificação.

  19. Porquanto o direito à remuneração é um direito sinalagmático (que depende directamente da prestação efectiva de trabalho, salvaguardadas as situações específicas legalmente assinaladas, como sucede no presente caso e de modo faseado).

  20. O que nos levará a considerar que, por tudo o quanto foi alegado, a sentença recorrida fez uma interpretação errada da legislação que aplicou, violando-a da forma como a interpretou, pelo que deverá ser revogada.

  21. Termos em que deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida na parte em que declarou a existência dos vícios apontados.

  22. E deverá, consequentemente, ser o Recorrente Instituto da Segurança Social, I.P. absolvido de todos os pedidos.

    * II – Matéria de facto.

    Ficaram provados os seguintes factos na decisão recorrida, sem reparos nesta parte: 1. A Autora vinha exercendo as funções inerentes à categoria profissional de Educador de Infância, no escalão 9, índice 340 - cfr. documento nº 2 junto aos autos com a petição inicial e...

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