Acórdão nº 01424/05.2BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelVital Lopes
Data da Resolução26 de Outubro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE 1 – RELATÓRIO A Exma. Representante da Fazenda Pública, recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela Sociedade Comercial V…, Lda., das liquidações adicionais de IVA e Juros Compensatórios relativas ao ano de 2001, na importância total de 13.929,92€.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo (fls.144).

Na sequência do despacho de admissão, a Recorrente apresentou alegações e formulou as seguintes «Conclusões: 1) O Tribunal a quo julgou procedente a impugnação judicial à margem referenciada, por sentença proferida em 16/11/2015, determinando a anulação da liquidação adicional de IVA e respectivos JC, referentes ao exercício de 2001, no montante global de €13.929,92.

2) Entendeu a FP dever recorrer da mesma, por não poder manifestar concordância com o vertido em tal decisão no que tange à não desconsideração do IVA deduzido nas facturas que os SIT intitularam de falsas.

3) Imputando à sentença nulidade por falta de exame crítico das provas, o que implica a sua falta de fundamentação, nos termos do n.º 1 do artigo 125.º do CPPT e da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, por se nos afigurar, com o devido respeito, que o Tribunal a quo não poderia dar como provados determinados factos, atenta a prova documental e testemunhal carreada para os autos, nem poderia tirar as ilações que tirou dos mesmos, padecendo a sentença recorrida ainda de incorrecta apreciação e valoração da factualidade dada como assente, em deficiente selecção da matéria de facto relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito controvertida, em errónea subsunção da matéria considerada como provada aos comandos normativos contidos no artigo 74.º LGT e no n.º 3 do artigo 19.º do Código do IVA e em incorrecta interpretação e aplicação daquelas mesmas normas, pretendendo a sua revogação e substituição por decisão que considere tal impugnação totalmente improcedente, mantendo na ordem jurídica as liquidações impugnadas.

4) A Meritíssima juiz a quo levou ao probatório, concluindo como matéria de facto apurada e provada no ponto III-A-D) na pág. 9 da sentença, que “Dá-se aqui por reproduzido o teor dos documentos de fls. 34 a 46 dos autos (p.f.) que consistem em facturas, recibos e extractos bancários/cheques, relativos aos fornecedores «M…, L.DA» e «J...»” e no ponto III-A.E) que “O «J...» costumava entregar rolhas e outros derivados de cortiça nas instalações da Impugnante, cfr. prova testemunhal.” 5) E quanto à motivação, invocou que “A factualidade supra referida, foi apurada com base nos documentos juntos aos autos e no Processo Administrativo anexo ao mesmo. Além disso, valorizou-se ainda o depoimento prestado pelas testemunhas inquiridas, designadamente, a testemunha JOÃO..., funcionário da Impugnante há muitos anos, que confirmou de forma credível que viu o «Sr. D…» várias vezes na empresa, a entregar rolhas e outros produtos derivados de cortiça.” - pág. 9 da sentença.

6) Assim, e de acordo com a referenciada peça decisória, os SIT “limitaram-se a concluir, por via de determinados indícios, que os emitentes de facturas existentes na contabilidade da Impugnante, e que titulavam o seu direito à dedução do IVA, não forneceram as mercadorias constantes dessas mesmas facturas, ou quaisquer outras.” – pág. 13 da sentença.

7) No entendimento da sentença ora recorrida, os SIT “nada averigu[aram] quanto à Impugnante em concreto e à sua actividade, usando no relatório factos extraídos de outras inspecções. Acresce que quanto à Impugnante, em concreto, não relatou quaisquer factos que por si só sejam susceptíveis de indiciar o que é pretendido, ou seja, as operações simuladas” – pág. 14 da sentença.

8) E, tal omissão, segundo a sentença ora recorrida, traduz, por parte dos SIT, um incumprimento do “(…) ónus que lhe incumbia de provar a simulação de transacções comerciais, incorrendo, por isso, em erro sobre os pressupostos, o que acarreta a anulação das liquidações impugnadas quanto às correcções relativas à simulação de negócios, por vício de violação de lei, ficando prejudicado, por esse motivo, o conhecimento das restantes questões enunciadas pela Impugnante.” – pág. 14 da sentença.

9) Por outro lado, e segundo o Tribunal a quo, esta incapacidade em demonstrar a falsidade das facturas acima mencionadas, decorre da insuficiência do conjunto de indícios enunciados nas páginas 2 a 6 do RIT constante do PA - cfr.

ponto III.A.B) dos factos provados e pág. 13 da sentença.

10) Ora, na fundamentação da sentença devem ser observados os requisitos previstos nos artigos 123.º e 124.º do CPPT, em conjugação com o disposto nos artigos 607.º e seguintes do CPC.

11) Daqui resulta que “a decisão da matéria de facto carece de ser devidamente fundamentada, em relação a cada um dos factos descriminados”, ou seja, “o tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto como provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através dessa fundamentação, o juiz deve passar de convencido a convincente”.

12) Deste modo, “se o facto for considerado provado, o tribunal deve começar por referir os meios de prova que formaram a sua convicção, indicar seguidamente aqueles que se mostraram inconclusivos e terminar com a referência àqueles que, apesar de conduzirem a uma distinta decisão, não forem suficientes para infirmar a sua convicção”.

13) É entendimento veiculado pelos tribunais superiores que “Nos termos do art. 123.º/2 do CPPT, na sentença o juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões. Esta exigência de fundamentação deve ser aproximada com o disposto no [art. 607.º/4 do NCPC] segundo o qual na fundamentação da sentença o juiz tomará em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito e os que o tribunal colectivo deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer.” 14) Ademais, “Sendo este exame o resultado de uma imposição legal, o juiz não pode deixar de o fazer, sob pena de nulidade da sentença (art.º 125.º/1 do CPPT (…) e 615.º/1, b) do NCPC).” 15) “Assim, a fundamentação de facto não deve limitar-se à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre todos os pontos da matéria de facto.” 16) “(…) quando se tratar de meios de prova susceptíveis de avaliação subjectiva (como sucede com a prova testemunhal) será indispensável, para atingir tal objectivo de revelação das razões da decisão, que seja efectuada uma apreciação crítica da prova, traduzida na indicação das razões por que se deu ou não valor probatório a determinados elementos de prova ou se deu preferência probatória a determinados elementos em prejuízo de outros, relativamente a cada um dos factos relativamente aos quais essa apreciação seja necessária.” 17) “Se preterir o dever de examinar criticamente a prova testemunhal, a sentença enferma de nulidade nos termos do art. 125.º/1 do CPPT [e 615.º/1, b) do NCPC].” 18) Trazendo estes ensinamentos para o caso sub judice, verificamos – no que concerne à matéria de facto provada – o Tribunal a quo seleccionou como factos provados A). e B). a pp. 3 a 8 da sentença os seguintes: “A).

A Impugnante foi objecto de acção inspectiva, relativa ao exercício de 2001, cfr.

[RIT] de fls. 2 a 9 do [PA].

B).

Foi seguidamente elaborado o respectivo Relatório, que se encontra jnto a fls. 2 a 80 do PA, e aqui se dá como integralmente reproduzido, bem como os seus anexos, do qual consta o seguinte: (…)” – limitando-se neste ponto à operação de “cortar e colar”, transcrevendo quase integralmente o RIT, pelo que, nos abstemos de o fazer novamente, por razões de economia processual.

19) Ora, nesta sede, e na esteira do decidido igualmente por tribunais superiores, “A sentença deve ser clara - e não pode deixar de ser – pelo que o juiz tem de encontrar a melhor forma de exposição e articulação, estruturada e lógica, que expresse «claramente» o seu pensamento, sem margem para dúvidas ou ambiguidades que comprometam a sua validade.” 20) ”Na declaração dos factos provados e não provados a obrigação de clareza implica que eles não sejam expostos em «amálgama» indiscriminada, sem nexo lógico ou temporal. E muito menos que tenham conclusões, opiniões, observações ou meros raciocínios.” 21) “A prática de verter nos factos provados todo o conteúdo do relatório da inspecção é uma prática desadequada.” 22) “Por isso, se o juiz entender que o relatório contém factos que uma vez provados relevam para a decisão (o que sucede na maioria das vezes), deverá cuidadosamente seleccioná-los (e só os factos) descriminando-os por alíneas ou números, reflectindo deste modo o dever que a lei impõe às partes na dedução dos factos por artigos (art.º 147.º/2; 552.º/d) CPC e 108.º/1 do CPPT).” 23) Na verdade, é entendido que: “(…) [se tratam de] situações em que o juiz não fixa quaisquer «factos», limitando-se a remeter para os documentos que se encontram no processo, e que contêm os «factos» relevantes.” 24) “Ora, este modo de fixação dos factos provados tem sido objecto de repetida condenação por parte dos tribunais superiores (…) Com esta prática (ilegal) o juiz omite o dever de fixar os factos que julga provados, não os discrimina, como lhe impõe o art.º 659.º/2 CPC (607.º/3 NCPC), ou específica, como exige o art.º 125.º/1 do CPPT.” 25) “Esta prática...

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