Acórdão nº 00297/10.8BEMDL-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 24 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução24 de Março de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório O Ministério da Saúde, devidamente identificada nos autos, no âmbito da Ação Administrativa Comum intentada pelo Município de Mirandela, tendente á condenação do Ministério da Saúde e da ARS Norte a “criar condições legais e práticas necessárias para a manutenção do estatuto de urgência médico-cirúrgica ao Serviço de Urgência da Unidade Hospitalar de Mirandela”, não se conformando com o Despacho proferido em 4 de julho de 2013 (!!) que o condenou no pagamento de 4UCs como litigante de má-fé, nos termos do então Artº 456, nº 2 alínea a) do CPC (Atual Artº 542º CPC) por dedução de “pretensão cuja falta de fundamentação não ignorava”, veio recorrer do mesmo jurisdicionalmente, e em separado, em 11 de novembro de 2016, concluindo: “A. A decisão que condena o recorrente em litigância de má-fé é passível de críticas – e daí a interposição do presente recurso – antes de mais, e atenta a sua natureza prejudicial, ao recorrente não foi permitida a defesa face à acusação de litigância de má-fé, isto é, foi decidido sem o exercício do princípio do contraditório, o que configura uma interpretação do então art.º 456º do CPC desconforme à Constituição.

  1. Foi o recorrente condenado em litigante de má-fé, sem audiência prévia e sem o exercício do contraditório, uma vez que o recorrente não foi notificado no sentido de se pronunciar acerca da possibilidade de uma decisão nesse sentido.

  2. Com o n.º 3 do artigo 3 do CPC, o legislador determinou a proibição da prolação de decisões surpresas.

  3. Ora, no caso em apreço, a condenação do recorrente como litigante de má-fé, com implicação da sua mandatária na mesma, embora seja de conhecimento oficioso, é uma questão de direito importante para o recorrente e a sua mandatária, bem como uma lesão moral suscetível de afetar gravemente a dignidade pessoal e profissional daquele que a sofreu, pelo que se justifica que aos interessados no juízo de censura seja assegurado o exercício da contradição perante o tribunal.

  4. Pelo que, e face a facto de não ter sido dado conhecimento ao recorrente da intenção de vir a ser condenado em litigante de má-fé, constitui a decisão ora recorrida como uma decisão-surpresa, com violação do princípio de contraditório e dos princípios constitucionais, nomeadamente, os constantes do art.º 18 e 20º, devendo a presente decisão ser declarada nula, ao abrigo do art.º 201 do CPC, com todas as legais consequências.

  5. Verifica-se, ainda, erro de julgamento, uma vez que a conduta do recorrente não tem justificação para a sua condenação em litigante de má-fé. Com efeito, para a condenação em litigante de má-fé, exige-se que o procedimento do litigante evidencie indícios suficientes de uma conduta dolosa ou gravemente negligente, pelo que se torna necessário que a parte tenha procedido com intenção maliciosa ou com falta das precauções exigidas pela mais elementar prudência ou previsão que deve ser observada, o que não é claramente o caso em apreço.

  6. A decisão ora recorrida julgou que a mandatária da ora recorrente, apesar de ter sido nomeada ao abrigo do art.º 11º, n.º 2, 2.ª parte, não se lhe aplica as normas do Estatuto da Ordem dos Advogados, nem tão pouco a jurisprudência do seu Conselho de Deontologia, nomeadamente, aqueles que foram invocados no requerimento apresentado pela mandatária do recorrente, uma vez que o representante do A. Município de Mirandela, também foi nomeado ao abrigo do mesmo dispositivo legal.

    Face a tal facto, entende o Meritíssimo Juiz a quo que sendo a mandatária trabalhadora que exerce funções públicas, está obrigada ao dever de prossecução do interesse público, ao dever de obediência e aos deveres de assiduidade e pontualidade concluindo que a falta da mandatária “… carece de justificação porque tem especiais deveres que a lei não prevê em relação aos Advogados…”.

  7. O preceituado nos artigos 11º n.ºs 1 e 2 do CPTA revela que é obrigatória a constituição de advogado nos tribunais administrativos, e que é equiparado o patrocínio por advogado à representação em juízo por licenciado em direito com funções de apoio jurídico”, ou seja, é a consagração do “princípio da igualdade das armas” que é um dos elementos essenciais de um processo equitativo.

    I. Pesa ainda que a co-parte do aqui recorrente, Administração Regional de Saúde do Norte, IP, é patrocinado por advogado, o que face ao mencionado preceito legal, obriga aos licenciados em Direito com funções de apoio jurídico, leia-se mandatário do Município de Mirandela e mandatária do ora recorrente, à observância dos mesmos deveres deontológicos e bem assim ao cumprimento dos deveres processuais a que se encontra sujeito, por força das normas do processo que obrigam o mandatário da ARS Norte, IP.

  8. E só assim poderia ser uma vez que os especiais deveres elencados no despacho ora recorrido, e que correspondem ao dever de prossecução do interesse público, ao dever de obediência e aos deveres de assiduidade e pontualidade e que obrigam a mandatária do ora recorrente, não o são para com o Tribunal, mas somente com a sua entidade patronal. Na verdade, tais deveres, e a eventual violação dos mesmos, constituem matéria da competência própria e exclusiva da Administração em sede do poder disciplinar corolário do poder de direção.

  9. Não podendo o tribunal, porque não tem competência nessa matéria, aferir da violação de tais deveres funcionais na relação de trabalho da mandatária do ora recorrente para com a Administração, mormente com o Ministério da Saúde, para fundamentar a sua decisão em condenar o recorrente como litigante de má-fé por não ter comparecido a mandatária à audiência de julgamento, isso apesar daquela ter informado o Tribunal com dois dias de antecedência do facto de se encontrar doente.

    L. Independentemente, de ser aplicado o art.º 11º, n.º 2 do CPTA, ou não, à ora mandatária, cumpriu esta o disposto no n.º 5, do art.º 155º do CPC. Tal comunicação destina-se à desconvocação atempada dos outros intervenientes processuais, logo que o mandatário tenha conhecimento da circunstância que o impossibilita de comparecer, o que aconteceu.

  10. Está demonstrado nos autos face à cota aberta pela funcionária judicial a 17.06.2013, a fls. 196, que a mandatária do ora recorrente encontrava-se doente desde 12.06.2013, isso apesar de se encontrar a trabalhar “pelo menos até às 16.15 de Quarta-Feira”.

  11. Face à informação da funcionária judicial, de fls. 196, constata-se que a mandatária estaria a 17.06.2013 (segunda-feira) doente, ou seja, desde 12.06.2013, segundo esclarecimento da funcionária do Ministério da Saúde, entidade patronal da mandatária do ora recorrente, com a indicação de ainda não ter apresentado baixa ou atestado médico uma vez que teria 5 dias para o fazer.

  12. Ou seja, o despacho ora recorrido não esclarece, se o Meritíssimo Juiz a quo entende que a informação fornecida pelo Ministério da Saúde é falsa, ou se...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT