Acórdão nº 00219/04.5BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 21 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução21 de Abril de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: MPPPV veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 16.06.2014, pela qual foi julgada improcedente a acção administrativa comum, na forma ordinária, intentada pela recorrente contra AC-Águas de Coimbra, E.M. e Município de Coimbra, na qual foram chamadas E.P. – Estradas de Portugal, SA, A..., SA e F... Companhia de Seguros, SA, para exigir a responsabilidade civil extracontratual dos recorridos, com vista a obter o pagamento da indemnização de 831.428,25 euros, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pela recorrente, acrescida de juros, calculados à taxa legal, que se vencerem sobre o montante indemnizatório que vier a ser fixado, desde a citação até ao momento do integral e efectivo pagamento desse mesmo montante à autora.

Invocou para tanto que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento da matéria de facto, dando como não provada matéria de facto que se provou e que determina a procedência da acção, ao contrário do decidido; invocou ainda que a decisão recorrida aplicou incorrectamente o artigo 6º nº1 alínea c) do Decreto-Lei nº 352/2007, de 23 de Outubro, dada a sua inconstitucionalidade na interpretação segundo a qual a tabela resultante deste Decreto-Lei aplica-se às perícias posteriores à sua entrada em vigor, perícias essas, de lesões anteriores ao Decreto-Lei nº 352/2007, por violação do artigo 2º, 13º, 18º nº.3 e 20º nº 4 da Constituição da República Portuguesa, o Decreto-Lei nº 341/93, de 30 de Setembro bem como as normas dos artigos 2º nº 1, 4º nº1 e 6º do Decreto-Lei nº 48 051, de 22 de Novembro de 1967, o artigo 483º, nº 1, 487º, 493 e 563º do Código Civil, o artigo 5º nº 1 do Código da Estrada, o artigo 96º da Lei nº 169/99, de 18 de Setembro, o artigo 325º, nº1, do Código de Processo Civil e o artigo 6º do Decreto-Lei nº 227/2002, de 30 de Outubro.

Os recorridos contra-alegaram defendendo a manutenção da sentença recorrida.

O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Foi lavrado projecto de decisão no sentido de julgar ao menos parcialmente procedente o recurso na procedência parcial da acção na parte dirigida contra o Município de Coimbra.

Contra este projecto insurgiu-se o Município de Coimbra – secundado pela AC – Águas de Coimbra – e pela F... Companhia de Seguros, S.A., essencialmente por não se ter provado que integrasse, mercê de um acordo que foi junto aos autos, a rede viária municipal. A autora manteve o que já anteriormente tinha articulado.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1º Salvo o devido respeito, foi incorrectamente julgada a parte final do quesito 1º da douta base Instrutória, onde se perguntava “não existia ali qualquer sinalização estradal destinada a veículos ou pessoas”, na medida que ficou completamente demonstrada a inexistência de sinalização, na data do acidente.

  1. O Tribunal a quo não levou em consideração o facto de o acidente ter ocorrido há 11 anos atrás e a consequente impossibilidade de os depoimentos das testemunhas serem garantidamente seguros (que não o podiam ser), como se o acidente tivesse ocorrido ontem.

  2. Ainda assim foi seguro o testemunho de FFA, que presenciou o acidente, e declarou peremptoriamente e sem margem para qualquer dúvida que passava todos os dias naquele local e que ali não havia qualquer tipo de sinalização de perigo ou de aviso. (CD1, 3:07 a 3:11) 4º E também a testemunha agente da GNR que tomou conta da ocorrência (o Agente VMSG) declarou clara e incisivamente que não havia no local nenhum sinal de trânsito ou de aviso, garantindo “com toda a firmeza” que se ali estivesse qualquer sinal de perigo ou aviso, obrigatoriamente o teria feito constar do auto, o que não fez.

  3. E assim, no próprio documento elaborado pela GNR de fls. 32 e 33 não consta mencionado qualquer sinal de aviso ou perigo naquele local.

  4. Como não se vê qualquer sinal também de aviso ou de perigo nas fotografias de fls. 27 a 29, que todas as partes e todas as testemunhas reconheceram e aceitaram como reproduzindo o local do acidente no tempo em que o mesmo se verificou.

  5. E vê-se também de forma irrecusável que nenhuma das partes e nenhuma outra testemunha afirmou ou demonstrou o contrário do que acima é dito.

  6. Resulta pois claro – e isso se requer – que, alterando e complementando a resposta dada ao quesito 1º da base instrutória, declarem igualmente provado a segunda parte do quesito 1º, isto é que no local do acidente e na data do acidente não existia ali qualquer sinalização estradal destinada a veículos ou a pessoas, avisadora dos perigos emergentes das obras, da água transbordante da caixa de visita/saneamento e da consequente formação de gelo.

  7. Deve também dar-se como provado, ao contrário do que é dito na douta sentença sobre recurso (a fls. 1223) que na ocasião do sinistro ocorria ou acabava de ocorrer, em concreto, o fenómeno descrito em 5 dos factos provados, ou seja que “naquele Inverno, por ignoto motivo, frequentemente águas pluviais ou de superfície entravam no colector de saneamento das águas domésticas que estava a ser intervencionado naquele local e, não tendo por onde sair, pois o colector ainda não estava ligado à rede, transbordavam da caixa de visita ali existente, que é a fotografada no documento nº.1 da PI, saindo e escorregando para a faixa de rodagem, congelando, inclusivamente, sobre a faixa de rodagem, quando a temperatura o permitia”.

  8. Com efeito – e contraditoriamente – o Juiz a quo considerou como provado as comunicações constantes dos pontos 28 e 29 correspondentes aos quesitos 101 e 102 da base instrutória, nomeadamente a comunicação entre a Estradas de Portugal e o seu empreiteiro “R... Construções S.A.” de 13 de Janeiro de 2003 onde consta que “Estão a chegar a esta DE reclamações de utentes, motivadas por situações de águas que atravessam a estrada em zonas ainda não pavimentadas designadamente em Valongo junto à rua da Nº. Sª. da Conceição, que devido às baixas temperaturas que se têm verificado, provocam gelo no pavimento e consequentemente despistes de veículos. Assim no sentido de evitar estes perigos, e garantir as necessárias condições de segurança na circulação, solicita-se que, com urgência, procedam ao encaminhamento das águas superficiais que, especialmente nesses troços que ainda não têm a última camada, tenham tendência de atravessar o pavimento, reforçando a sinalização se for necessário”.

  9. E em resposta a tal comunicação o empreiteiro “R... Construtores S.A.” informa que “Ao Km 13 600 a obra executada por conta dos SMASC deixou “abandonada” no meio da faixa de rodagem uma caixa de visita que permanentemente despeja água para o pavimento. (...)” 12º Assim, dando como factos provados, por meio da prova documental constantes das fls 311 e 312 o Juiz a quo não pode deixar de aceitar, salvo o devido respeito, que aquela água presente na estrada provinha da caixa de visita ali existente e que se demonstra no documento 1 da petição inicial, fls. 27 do processo.

  10. Ora conjugando tal facto provado com a alínea c) dos factos dados como não provados, nomeadamente o de que “as obras referidas em 4 dos factos provados obstruíram temporariamente o curso de águas do regueiro referido nos factos assentes impedindo ou dificultando o normal curso das mesmas, que assim invadiram o colector da rede de saneamento”.

  11. E tendo em conta que o Tribunal a quo considera que o gelo se formava a partir de águas afluídas à faixa de rodagem e que tinha uma de duas proveniências: a caixa de visita, que frequentemente derramava, ou em alternativa, os terrenos limítrofes, nomeadamente a ribeira referida na matéria de facto assente, que saliente-se, se encontrava semi-encanada em manilhas.

  12. Aceitando também que a ribeira não se encontrava obstruída e por isso não ocupava com a sua água a estrada e por outro lado tendo-se dado como provado que existia na estrada água e disso mesmo resulta da comunicação presente no ponto 28 da douta sentença, bem como a comunicação constante do ponto 29 que salienta que nesta zona existia uma caixa de visita que permanentemente despeja água para o pavimento.

  13. Não pode pois deixar de concluir-se que a água que originou o gelo, naquele dia, provinha – só podia mesmo provir – da caixa de visita/saneamento.

  14. E tanto mais que está também demonstrado que o tempo estava bom e sem chuva, facto dado como provado no ponto 3 dos factos provados, e que a ribeira não se encontrava obstruída, ou seja não galgando a estrada, pelo que só é possível concluir por uma e única fonte de proveniência daquela água: a caixa de visita, pertencente aos SMASC, actualmente Águas de Coimbra.

  15. Mas isso resulta também do inequívoco depoimento da testemunha FFA: (CD1 03:24), quando afirmou que o piso estava seco até ali e que a água vinha da tampa de saneamento. Estava a nascer daquela zona à volta da tampa.

  16. E também a testemunha NPPV (CD2 02:39 a 02:41), quando afirmou que da tampa brotava água, e que viu a água a sair dessa tampa. E fazia aquela peliculazinha de gelo.

  17. No dia do acidente, tempo bom, sem chuva, mas com água transbordante da tampa da caixa de visita/saneamento, que formava um pelicula de gelo no pavimento.

  18. Também o facto referido na alínea j) dos factos improvados (fls. 1224), correspondente ao quesito 50 da douta base instrutória, deve ser dado como provado.

  19. Com efeito trata-se de um facto que só a prova testemunhal pode demonstrar. E, neste caso, tais testemunhas, para bem conhecerem este facto, terão obrigatoriamente de ser muito próximas da autora.

  20. E demonstra-o. Diz a testemunha NPPV, se lhe pergunta: (CD2 03:04 a 03:05), ao dizer que a autora toda a vida foi, e só, costureira/modista profissão que aprendeu desde pequena, não...

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