Acórdão nº 02595/12.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 21 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução21 de Outubro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório O Centro de Medicina de Reabilitação da Região Centro, no âmbito da Ação Administrativa Comum intentada por CMET tendente à atribuição de indemnização por responsabilidade civil extracontratual, em decorrência dos prejuízos advindos da revogação de despacho de homologação de procedimento concursal a que se havia candidatado e no qual havia ficado classificada em 1º Lugar, e que determinou que tivesse pedido a rescisão do contrato que entretanto mantinha, com o Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro (CHTMAD), inconformado com a Sentença proferida em 21 de janeiro de 2015 (Cfr. 307 a 328 Procº físico), a qual, em síntese, julgou procedente a Ação, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão, em 02/03/2015 (Cfr fls. 338 a 355 Procº físico), proferida em primeira instância, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.

Formula o aqui Recorrente/Centro nas suas alegações de recurso apresentadas, as seguintes conclusões: “A) Conforme se alcança do teor da decisão recorrida o ato praticado pelo ora recorrente é um ato lícito, como se alcança do que consta da discussão da sentença recorrida, pelo que, na sequência desta constatação, entendeu-se que a referida “deliberação como um ato lícito, o que não se pode olvidar é que da sua prolação também podem advir consequências nefastas para o seu destinatário”. B) Desenvolvendo esta ideia, reconhece a decisão recorrida, que a eventual indemnização é a indemnização pelo sacrifício, segundo a terminologia do artigo 16.° da LRC, enunciando os “pressupostos em que assenta a responsabilidade civil do Estado por atos lícitos são os seguintes: (i) a prática de um ato lícito; (ii) para satisfação de um interesse público; (iii) causador de um prejuízo "especial" e "anormal"; (iv) existência de nexo de causalidade entre o ato e o prejuízo” C) Procurando aplicar os referidos critérios ao caso presente, apenas concorda o ora recorrente com a verificação do primeiro requisito enunciado na sentença recorrida, ou seja, que “a prática do ato lícito existe e reconduz-se à prolação da deliberação revogatória de 27/09/2011”.

  1. Porém, existe manifesto erro na interpretação e aplicação da lei mencionada aos presentes autos, nomeadamente os artigos 2º. e 16º. daquele “Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas”.

  2. Porém, deve proceder-se à ampliação da matéria de facto, pois, para além dos factos considerados provados, está desde logo documentalmente provado que a A. celebrou um contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo incerto como técnico especializado para a UEE de autismo e a rentabilizar para o concelho de Ovar, com o Agrupamento de Escolas de Ovar com início a quatro de outubro de dois mil e onze e términus a treze de agosto de dois mil e doze, com um horário semanal de 18 horas e auferindo a remuneração mensal ilíquida de 589,26€, como se alcança do ofício de 17 de Novembro de 2014 enviado pelo Agrupamento de Escolas de Ovar, o qual não foi objeto de qualquer impugnação, tendo sido comprovado pela A. quando confrontada pelo Mº. Juiz com esse documento no seu depoimento de parte, gravado digitalmente, consta do número 00:36:43 a 01:08:55 do CD/DVD original da sessão de julgamento de 6/11/2014.

  3. Está igualmente provado que a A. recebeu prestação de desemprego no valor mensal atual de € 534,30, com data início em 2012-08-14 e termo em 2014-10-22, com base no mail de 19 de Setembro de 2014 enviado pelo Instituto da Segurança Social do Porto, o qual não foi objeto de qualquer impugnação, tendo sido comprovado pela A. quando confrontada pelo Mº. Juiz com esse documento no seu depoimento de parte, gravado digitalmente, consta do número 00:36:43 a 01:08:55 do CD/DVD original da sessão de julgamento de 6/11/2014.

  4. Como refere o Cons. Carlos Cadilha, na sua obra “Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas Anotado” (Coimbra, 2011, nota 2 ao art.º. 16º., pág. 362), “No âmbito desta específica forma de responsabilidade recai o direito ressarcitório por atos administrativos lícitos ou por ações praticadas em estado de necessidade administrativa, a que se referem os nºs. 1 e 2 do artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 48 051, mas também o direito de indemnização por atos políticos ou legislativos que se não enquadre na previsão do antecedente artigo 15.° A interdição de circulação de navios nas águas territoriais ou proibição de acostagem em portos nacionais, nos casos em que não ocorra uma evidente violação das regras do transporte marítimo, o encerramento de postos diplomáticos por motivo de guerra ou de tumulto, ou, no quadro das relações internas, o não reconhecimento de uma situação de calamidade pública (impedindo o acesso das autarquias locais a auxílios financeiros especiais legalmente previstos — artigo 8.°, n.™ 3 e 5, da Lei n.° 2/2007, de 15 de Janeiro) são algumas das situações que poderão configurar, em concreto, a responsabilidade civil pela imposição de sacrifício fora do estrito quadro da relação jurídica administrativa”.

  5. Existe a defesa do interesse público, quando o dano decorre da construção de um viaduto por cima e ao lado de uma casa de habitação, e, de um modo geral, da construção de uma obra que determine a diminuição de valor de um prédio, ou dificuldades no respetivo acesso, bem como se decorre da integração de um prédio em zona de RAN ou de REN, ou decorre da proibição/restrição/limitação de circulação rodoviária imposta a alguém, pelo que tem de haver um interesse público específico para determinada situação concreta que deva ser prosseguido pela Administração Pública ou pelo legislador.

  6. Não é o que acontece com a revogação de ato ferido de ilegalidade, em que se visa obstar a que se consolide na ordem jurídica um ato intrinsecamente ofensivo dessa ordem jurídica, que pressupõe que os atos administrativos sejam legais, ou conformes com as normas legais, como aliás, já foi decidido já pelo Ac. do STA de 11/2/2009, proferido no processo 0217/08, publicitado em http://www.dgsi.pt/jsta, J) Deste modo, a simples revogação de uma anterior deliberação, ilegal e portanto anulável, não traduz a satisfação de qualquer interesse público, que limite os direitos dos cidadãos ou lhe cause prejuízo, pois que, essa limitação ou causa de prejuízos estaria quando muito no anterior ato que definiu os requisitos do ato concreto a praticar.

  7. No caso concreto, o interesse público a prosseguir era a contratação de uma técnica de terapia da fala e o ato revogado era apenas o meio de satisfazer esse interesse, pelo que o ato revogatório da homologação do concurso a que a A. concorreu não visa a satisfação de qualquer interesse público, tal como o pressupõe o artº. 16º. do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado. L) Como refere o acórdão do STA, de 19/12/2012, proferido no processo n.º 01101/12, em www.dgsi.pt/jsta, citado na sentença recorrida, onde se define o que é um dano especial, está é aquele dano que “não é imposto à generalidade das pessoas, mas a pessoa certa e determinada em função de uma relativa posição específica; prejuízo anormal o que não é inerente aos riscos normais da vida em sociedade, suportados por todos os cidadãos, ultrapassando os limites impostos pelo dever de suportar a atividade lícita da Administração”.

  8. A formulação do acórdão é a que resulta da transcrição do texto do artº. 2º. do já mencionado Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e interpretando devidamente aquele artº. 2.º, Só são indemnizáveis os danos ou encargos que incidam sobre uma pessoa ou um grupo, sem afetarem a generalidade das pessoas (dano especial), e que simultaneamente ultrapassem os custos próprios da vida em sociedade e mereçam, pela sua gravidade, a tutela do direito (dano anormal).

  9. Ora, no caso dos autos, os danos reclamados pela A. não são especiais, pois podem ser sofrido por quaisquer pessoas ou cidadãos a quem sejam revogados atos que lhes são favoráveis, mas são viciados por violação da lei, nem são anormais, porque correspondem aos danos que sofreriam todos os cidadãos que perdessem o seu emprego, que apesar da falsa alegação da A., não foi o que ocorreu à A. que conseguiu emprego, poucos dias depois de receber a comunicação da revogação do ato homologatório do concurso em que participou, aberto pelo R.

  10. Consequentemente, atento o disposto no artº. 16º. do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, os eventuais danos sofridos pela A. com a revogação do ato homologatório do resultado do concurso a que se referem os presentes autos, não são danos indemnizáveis, nos termos do artº. 2º. do mesmo Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas.

  11. O nexo de causalidade entre o facto dito lesivo e os danos que se diz que dele resultaram tem de apreciar-se naturalisticamente e só existe causalidade adequada entre um facto e o dano, quando esse facto é adequado naturalisticamente a causar o dano, nomeadamente pela imediatividade entre esse facto e o dano.

  12. Nos presentes autos, o ato dito lesivo foi praticado em 27/9/2011, como resulta do facto provado número 10 e a A. “rescindiu o contrato individual de trabalho que celebrara com o CHTMAD, por requerimento com data de entrada de 05/07/2011 e cessação de funções a 30/07/2011 (cf. fl. 156, frente e verso, e 157 dos autos)”, como se alcança do facto nº. 8 considerado provada.

  13. Para além de faltar a imediatividade, pois um facto ocorrido em 27/9/2011 não tem a virtualidade de causar um dano que se produziu em 5/7/2011 – quase 3 meses antes -, também não existe adequação entre estes dois factos naturalisticamente, pois a causalidade adequada pressupõe que o dano seja causa direta e imediata do ato lesivo, nos termos do artº. 563.º do Código Civil, que consagra a teoria da...

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