Acórdão nº 02201/07.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Fevereiro de 2016
Magistrado Responsável | Frederico Macedo Branco |
Data da Resolução | 05 de Fevereiro de 2016 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório A Rede Rodoviária Nacional REFER EP, devidamente identificada nos autos, no âmbito da ação administrativa comum, intentada contra o Município de Vila Nova de Gaia, na qual peticionou, em síntese, a atribuição de indemnização de 829.827,47€, em resultado da “demolição de prédios de que o A. era titular”, inconformada com a Sentença proferida em 25 de Janeiro de 2011 no TAF do Porto, na qual a ação foi julgada “improcedente”, veio interpor recurso jurisdicional da mesma, em 3 de março de 2011 (Cfr. fls. 362 a 403 Procº físico).
Formula a aqui Recorrente nas suas alegações de recurso as seguintes conclusões (Cfr. fls. 399 a 403 Procº físico): “I- Entende a Autora e ora recorrente REFER que o sentido da sentença parece inaceitável, com preterição de princípios insertos em disposições legais de carácter imperativo que excluem a aplicação do RJUE - Regime Jurídico de Urbanização e Edificação aos bens imóveis em causa, integrados no DPF- Domínio Público Ferroviário; II- Desde logo, na parte em que assume o princípio da aplicação direta das regras dos Regulamentos Camarários aos bens do DPF, sob tutela da Administração Central do Estado e fora das fronteiras do território autárquico.
III- E se colhessem as razões de salubridade pública invocadas na Sentença recorrida, falta ria fundamentação no correspondente Regulamento Camarário - Regulamento Municipal de Resíduos sólidos e Urbanos e de Limpeza Pública do Município de Vila Nova de Gaia - no(s) ato(s) administrativo(s) promovido(s) pela Ré; IV- Em qualquer dos casos, circunstâncias que tornariam nulo e de nenhum efeito, por essa via, o(s) ato(s) administrativo(s)( tomada de posse administrativa e demolições levadas a efeito pela Ré ) com as inerentes consequências, no que tange, designadamente, à responsabilidade civil; V- As razões de salubridade pública e segurança das pessoas, a que o Meritíssimo Juiz a quo alude ¯ justificando a aplicabilidade do RJUE, não podem ser trazidas à colação, porquanto não são invocadas no procedimento camarário, nem pelas partes; VI- E se o fossem teriam sede em violações ao Regulamento Municipal de Resíduos Sólidos Urbanos e de Limpeza Pública do Município de Vila Nova de Gaia, e não no RJUE; VII- Tendo em conta o âmbito de aplicação, quer da Lei Especial (DL 276/2003, de 4 de Novembro), que estabelece o novo regime jurídico dos bens do DPF, quer da Lei Geral RJUE (DL 555/99, de 6 de Dezembro, com a redação dada pelo DL 177/2001, de 4 de Junho), deveria dar-se cumprimento ao disposto no art.° 8.° do Código Civil.
VIII- Reconhecendo-se em consequência, que o Domínio Público Ferroviário não integra o território da Autarquia e que as regras aplicáveis são as regras previstas no primeiro diploma supracitado (DL276/2003); IX- E relevado, em aplicação sucedânea e na especialidade, o disposto na alínea d) do a° 1 do art. 7° do RJUE, declarando a incompetência da Autarquia para aplicar, fiscalizar ou instruir procedimento administrativo contra a A. REFER, fora do seu território, com base numa norma também não aplicável em função da MATÉRIA; X- Andou mal o Tribunal a quo ao concluir pela aplicabilidade do n°3 do art. 89° e 107° do RJUE, não abrangendo, como anteriormente se explanou, os imóveis em causa (objeto de demolição), porquanto a A. recorrente tem natureza de pessoa coletiva de direito público, conforme art. 2° DL 104/97 de 29 de Abril; XI- E nos termos do art. 1° do DL 276/2003, os bens que pertencem à infraestrutura ferro viária, integram o domínio público ferroviário (consagrado no art. 84° da CRP), nomeadamente os imóveis destinados ao serviço e alojamento do pessoal ferroviário, de acordo com a al. e) do art.1°, n°1 daquele regime; XII- A Ré, com a sua atuação, desafetou um bem do domínio público da função para a qual estava adstrita, contrariando o disposto nos arts. 24° e seguintes do DL 276/2003 e art. 165° n°1 al. v) da CRP (reserva relativa da competência legislativa); XIII- Entende a Autora, ora recorrente, ter o Tribunal a quo violado, para além do mais, o seu dever de obediência à Lei e de respeito pela uniformidade na sua aplicação e interpretação, que o art° 8° do Código Civil impõe; XIV- E que deveria ter declarado a desconformidade das notificações proferidas pela autarquia, visto que no Procedimento Administrativo é referido que os bens são propriedade da REFER e na Sentença são reconhecidos os mesmos bens como pertencentes ao DPF, como decorre do disposto no n.º 1 do art.° 6° do DL 276/2003.
XV- Assim sendo, deve ser declarada a nulidade do procedimento e como tal a ilegalidade do ato administrativo, nos termos do art.° 133° do CPA e demais aplicável, com as consequências daí emergentes, nomeadamente, em termos de responsabilidade civil por ato ilícito.
XVI- A douta decisão recorrida, para concluir, como concluiu, pela aplicação do RJEU, mormente os arts. 89 n°2 e 3, 106° e 107°, aos bens incluídos no DPF, viola, claramente, as normas contidas no DL 276/2003.
XVII- O regime excecional sobre o qual o Meritíssimo Juiz a quo constrói a sua teoria — que o RJUE se aplica no DPF, nomeadamente por razões de ordem de salubridade pública, não colhe, uma vez que este normativo visa apenas garantir o normal desenvolvimento das atividades ferro viárias, obviando a interferências de terceiros; XVIII- A falta de fundamentação no Regulamento Municipal de Resíduos Sólidos Urbanos e de Limpeza Pública do Município de Vila Nova de Gaia, do(s) ato(s) administrativo(s) promovido(s) pela R. CMVNG torna-o(s) também nulo(s) , com as correspondentes consequências em termos de responsabilidade civil; XIX- Foram assim violadas, para além do mais, as normas atrás citadas, - aI. e) do art° 1° n°1, do art.° 6° n°1 e do art° 24° e seguintes todos do DL 276/2003, de 4 de Novembro, alínea d) do n.º 1 do art. 7°, n° 2 e 3 do art. 89° 106° e 107° todos do RJUE (DL 555/99, de 6 de Dezembro, com a redação dada pelo DL 177/2001, de 4 de Junho), art. 2° DL 104/97 de 29 de Abril, bem como o art° 8° do C.Civil , artº 133° do CPA e arts. 84° e 165° n°1 al.v) da CRP. Nestes termos E nos demais de direito que Vossas Excelências, mui doutamente, suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, por via dele, a sentença recorrida, que determinou a improcedência da ação interposta, ser revogada e substituída por outra, em sentido oposto, que condene a Ré CÂMARA MUNICIPAL DE VILA NOVA DE GAlA, no pedido, com as legais consequências, assim se fazendo JUSTIÇA” O Recurso Jurisdicional foi admitido por Despacho de 15 de Março de 2011 (Cfr. fls. 417 Procº físico).
O Recorrido/Município, veio a apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 6 de maio de 2011, nas quais concluiu (Cfr. Fls. 431 e 433 Procº físico): “A - Nas suas, aliás doutas, alegações, a recorrente restringe a matéria em discussão à questão da aplicabilidade ou não do RJUE aos bens integrados no domínio público ferroviário, único ponto em que a recorrente discorda da douta sentença em crise e, por consequência, uma questão a dirimir; B - O recorrido concorda inteiramente com a decisão do Tribunal a quo sobre esta questão, pois o RJUE aplica-se em todos os pontos e a todos os bens imóveis, com exceção das matérias que são expressamente excluídas; C - Não é admissível a junção do documento, por não se verificarem os pressupostos dos arts. 706º e 524º do C.P. Civil D - Em todo o caso, tal documento é irrelevante, por se tratar de decisão de Tribunal Criminal sobre a competência para instaurar processos de contraordenação e não sobre a competência para verificar o cumprimento de regras urbanísticas; E - A recorrente invoca uma questão nova, dizendo que o ato é inválido por não estar fundamentado no Regulamento Municipal de Resíduos Sólidos e Urbanos e de Limpeza Pública de Vila Nova de Gaia; F - Sendo esta uma questão nova, não pode agora ser apreciada por este Venerando Tribunal; G - Ainda que assim não fosse, não teria fundamento a posição da recorrente, pois a insalubridade não está definida em tal Regulamento, que apenas rege diversas questões relativas à deposição de resíduos e outras questões conexas, bem como a punição em caso de infração; H - O recorrido alegou sempre que a demolição tinha dois fundamentos: mau estado de conservação dos prédios e insalubridade causada pela situação, matérias invocadas previamente, que o Tribunal a quo utilizou - e bem - na fundamentação do seu raciocínio; I - Só estão excluídos da aplicação do RJUE os prédios em relação aos quais exista norma expressa nesse sentido, o que não sucede com os bens do domínio público ferroviário; J - Pelo contrário, quer o preâmbulo do RJUE, quer o DL 246/2003 indicam que tal regime se aplica a esses prédios, com as exceções expressamente previstas; L - O recorrido não desafetou do domínio público os imóveis demolidos, limitou-se a demolir prédios velhos, insalubres e em risco de ruína, que representavam um grave problema de insegurança e de insalubridade; M - Foi a recorrente, com a sua inércia, que tornou os edifícios totalmente inaptos para qualquer utilização, pública ou privada, e tornou inevitável a sua demolição; N - O DL 276/2003 não institui qualquer regime especial que se sobreponha ao RJUE, inexistindo a violação do art. 8º do C. Civil; O - Por todo o exposto é forçoso concluir que o RJUE se aplica aos bens que integram o domínio público ferroviário, salvo as exceções expressamente previstas; P - Não havendo ato ilícito, não pode o recorrido incorrer em responsabilidade civil extracontratual; Q - Tanto mais que também não se verificam os demais pressupostos de que a lei faz depender a obrigação de indemnizar ao abrigo desse regime; R - Pois não existe culpa do lesante, não existe dano e não existe nexo de causalidade; Termos em que se deve o recurso ser julgado totalmente improcedente, sendo mantida a decisão de 1ª Instância, assim fazendo V. Exas, como habitualmente, inteira...
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