Acórdão nº 11922/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelNUNO COUTINHO
Data da Resolução12 de Março de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – Relatório Sónia ……………….. requereu providência cautelar contra o Centro de Estudos Judiciários, tendo peticionado fosse decretada providência cautelar de admissão provisória da Requerente a estágio (formação) e subsequente exame no procedimento concursal extraordinário e urgente de formação de administradores judiciais.

Por decisão proferida pelo T.A.F. de Almada, em 30 de Dezembro de 2014, foi indeferida a pretensão cautelar.

Inconformado com o decidido, recorreu a requerente para este TCA Sul, tendo formulado as seguintes conclusões: “I - Na sequência de notificação de despacho de 19 de Junho de 2014 apresentou a recorrente reclamação que incidiu sobre dois dos critérios de avaliação, ou seja experiencia profissional e formação profissional.

  1. Anexou declaração complementar da apresentada com a candidatura, emitida pelo Sr. Administrador de Insolvência.

  2. Quanto ao critério de experiência profissional entendeu que em vez de quatro matérias (contabilidade, fiscalidade, economia e gestão de empresas) deveriam, também, ser valorizadas matérias com Direito Comercial, Direito do Trabalho e Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas.

  3. No que se refere ao 3º factor previsto no art. 12º nº 2.2.1 do Regulamento de Recrutamento de Administradores Judiciais, aprovado pelo DL 134/2013, de 4/10, defendeu que deveriam ser atribuídos 14 valores e não 0,00, como sucedeu.

  4. O Júri do concurso, na apreciação da reclamação entendeu que a declaração complementar era extemporânea VI. e quanto aos critérios de avaliação deferiu parcialmente a reclamação, considerando que da declaração do Sr. Administrador inicialmente apresentada se podia concluir que a requerente tinha experiência em matéria do Código de Insolvência e de Recuperação de Empresas.

  5. Ou seja, em matéria do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas considerou o Júri que a declaração apresentada e subscrita pelo Administrador de Insolvência ao referir "que tem formação como assistente na actividade de administrador de insolvência desde 2 de Fevereiro de 2012 até 31.12.2013..." deveria ser relevada para efeitos do factor de experiência profissional nessa matéria.

  6. Atribuiu, por isso, à requerente a classificação de 12,32 valores.

  7. Não concordando com a deliberação do Júri veio a recorrente instaurar o presente procedimento cautelar e por entender que deve considerar-se: a) que tem experiência profissional em Direito Comercial e Direito do Trabalho; b) que no factor 3º do art. 12º nº 2.2.1 do regulamento devem ser-lhe atribuídos 14 valores e não 0,00 valores.

  8. Entende, também, que a declaração complementar elaborada pelo Sr. Administrador de Insolvência deve ser atendida, na medida em que a reclamação, com a qual foi apresentada, sempre preencherá o conceito de audiência de interessados previsto no art. 100º do CPA. XI. Perfilhando, no essencial, os argumentos do Júri, veio a Sr." Juiz a quo a indeferir, in totto, o procedimento cautelar. XII. Entendemos, contudo, que sem razão. XIII. Em relação à declaração complementar julgou-se que o mesmo era extemporâneo e que "(A) sua junção desrespeitaria frontalmente o principio constitucional da igualdade entre candidatos". XIV. Ora, do Regulamento e nomeadamente do seu art. 11º não resulta, de forma inequívoca que, posteriormente, não possam ser juntos documentos. XV. Diz-se que a candidatura deve ser acompanhada de documentos que comprovem o que consta do "curriculum vitae" XVI. mas não se refere que, posteriormente e nomeadamente em sede de audiência de interessados, não possam ser juntos documentos complementares.

  9. E não se diga que a junção não é permitida por tal ofender o princípio da igualdade entre candidatos.

  10. É que este só seria ofendido se todos os candidatos não pudessem reclamar, ou seja, não pudessem exercer o direito de audiência de interessados.

  11. Acresce que importa saber se, em relação à requerente foi, ou não dado cumprimento à audiência prévia prevista no art. 100º do CPA.

  12. Se se considerar que a reclamação não é uma forma de audiência de interessados, XXI. terá, então de se concluir que a recorrente não foi ouvida sobre a exclusão inicial, sobre a deliberação que lhe fixou a nota de 11,84 e, posteriormente sobre a deliberação que lhe fixou a nota de 12,32 e publicação das respectivas listas.

  13. Ora, o princípio da audiência de interessados assume-se como uma dimensão do princípio da participação a que se refere o art. 8º do CPA e surge na sequência da directriz constitucional consagrada nos nºs 1 e 5 do art. 267º da Constituição da República Portuguesa.

  14. A audiência prévia constitui, pois, um princípio estruturante enquanto manifestação do princípio do contraditório no procedimento administrativo XXIV. E a sua omissão determina a anulabilidade do acto praticado.

  15. E não se diga que, no caso em apreço, a audiência prévia está excluída nos termos do art. 103.º do CPA.

  16. É que, como se refere no Ac. do STA de 11 de Março de 2010 a "(A)dministração não formulou esse juízo de impraticabilidade, nem lhe acrescentou a realização de consulta pública a que alude o art. 103.º, n.0 1, al .c) do CPA, ou, se quer, a afirmação de que tal consulta era impossível".

  17. Porém, no caso de concursos baseados na prestação de "provas públicas" e apresentação do "curriculum vitae", tem entendido alguma jurisprudência, que a exigência constitucional de "participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes dizem respeito" pode ser concretizada de várias formas, sem que seja necessário recorrer à prevista no art. 100º do CPA.

  18. Se trilharmos este caminho, como sucedeu com a decisão recorrida, podemos concluir que o "curriculum vitae" e as reclamações apresentadas são o melhor contributo que a recorrente poderia prestar para a atribuição da nota final.

  19. E, sendo assim, ficou garantido o seu contributo e, consequentemente, cumprido o princípio da audiência de interessados.

  20. Refere-se no Parecer da Procuradoria do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República de 14/02/2002 que "(N)o exercício do seu direito a ser ouvido - a audiência pode ser escrita ou oral - o interessado pode, pois, pronunciar-se sobre as questões que constituem objecto do procedimento, bem como requerer diligências complementares e juntar documentos" - art. 100º, n.º 1 e 3 do CPA. (subl. nosso) XXXI. Logo se se considerar que a reclamação é, também, uma forma de concretizar a audiência de interessados, XXXII. terá de se entender, na linha do parecer citado, que a junção da declaração complementar é tempestiva.

  21. Quanto aos critérios de avaliação, deve ser considerada, ao contrário do decidido, a experiência profissional em Direito Comercial e Direito de Trabalho.

  22. A recorrente exerceu durante mais de quinze anos, ou seja de 2 de Abril de 1996 a 25 de Setembro de 2011, em regime efectivo, funções de Directora Financeira/ Recursos Humanos.

  23. Na deliberação do Júri, acolhida e perfilhada na decisão recorrida, escreveuse: "No que concerne às matérias de Direito Comercial e de Direito do Trabalho, a candidata não pode assumir uma versatilidade nestas matérias com as funções que exerce, as quais foram consideradas em quatro matérias específicas.

    Ter conhecimentos básicos naquelas áreas é substancialmente diferente de ser especialista nessas matérias". (subl. nosso) XXXVI. Por outro lado, escreve-se na sentença recorrida que a declaração da ………….. apenas refere que a requerente "exerce funções de Directora Financeira/ Recursos Humanos" e que a mesma não contém "... qualquer descritivo ou concretização dessas funções, não sendo susceptível de fundamentar a pretensão da requerente, quanto à comprovação do 1º factor”.

  24. Antes de mais não se pode esquecer que os três factores enunciados no art. 12º do Regulamento assentam na experiência profissional dos candidatos.

  25. Ora ter experiência numa matéria não é, como parece resultar da deliberação do Júri, acolhida pela Sr." Juiz a quo, ser especialista nessa matéria.

  26. Ter experiência é ter conhecimentos obtidos pela prática! XL. Por outro lado não podemos ignorar que na mesma deliberação do Júri se escreveu que as funções da recorrente, comprovadas pela declaração da A………. foram consideradas em quatro matérias específicas.

  27. Ou seja, foi entendido que a dita declaração estava suficientemente fundamentada para concluir pela experiência da recorrente "em quatro matérias específicas".

  28. No entanto, sem que se perceba, vem a Sr." Juiz a quo afirmar na sentença recorrida que essa mesma declaração não pode fundamentar a pretensão da recorrente por não descrever e concretizar as funções de Directora Financeira/Recursos Humanos.

  29. Acresce que as funções de Directora Financeira e Directora dos Recursos Humanos estão hoje padronizadas e são do conhecimento público.

  30. Toda a gente sabe que o Director de Recursos Humanos de uma empresa tem, entre outras, funções ao nível do recrutamento, selecção e admissão de funcionários e celebração dos respectivos contratos.

  31. Em termos administrativos é responsável pela gestão e formação dos funcionários, pela transmissão de directrizes para a actualização de contratos, pela listagem de vencimentos e aprovação de mapas de férias, etc...

  32. Ou seja se a recorrente exerceu durante quinze anos funções de Directora dos Recursos Humanos, é óbvio que teve, durante esse período, experiência no domínio do Direito do Trabalho.

  33. O mesmo se diga em relação à categoria de Directora Financeira que desempenhou durante o mesmo período.

  34. O Director Financeiro é hoje o responsável pela administração dos riscos do negócio e pelo planeamento financeiro da empresa.

  35. E, ainda, elemento preponderante na negociação, formalização e celebração de contratos.

  36. Não pode por isso deixar de ter experiência na área do Direito Comercial.

  37. Assim no 1º factor do ponto 2.2.1 do art 12º devem considerar-se sete matérias (as quatro iniciais, acrescidas...

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