Acórdão nº 78/08 3.9BEBJA de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelCATARINA JARMELA
Data da Resolução19 de Outubro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

*I - RELATÓRIOAgro-……………….., Lda.

, intentou no TAC de Beja acção administrativa comum, sob a forma ordinária, contra o Estado Português, na qual peticionou a condenação do réu no pagamento da quantia de € 188 515,60 - a título de indemnização por danos patrimoniais -, acrescida de juros de mora, à taxa legal, a contar da citação até efectivo e integral pagamento.

Por sentença de 29 de Junho de 2016 do referido tribunal foi julgada procedente a presente acção e, em consequência, condenado o Estado Português no pagamento à autora de € 173 515,60, acrescidos de juros de mora, à taxa legal em vigor, desde a data da citação até integral pagamento.

Inconformado, o réu interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul dessa decisão, tendo na alegação apresentada formulado as seguintes conclusões: «1.ª — O ESTADO PORTUGUÊS impugna a sentença de fls. 1133-1161, que o condenou no pagamento de uma indemnização de € 173.515,60 à autora, por atraso, de quase 13 anos de 16-03-1992 a 08-03-2005 —, na prolação de sentença no âmbito de uma ação sumária de denúncia de contrato de arrendamento rural, limitando-se o recurso ao julgamento da matéria de direito.

  1. — A condenação, afastando expressamente — bem — a aplicabilidade do D.L. n.º 48051, de 21-11-1967, e tendo ainda em conta que, à data do facto, a Lei n.º 67/2007 não fora sequer publicada, fundou a pretensão material da autora direta e exclusivamente no art.º 22.º da Constituição.

  2. — Porém, como se decidiu no acórdão do STA de 09-10-1990 (processo n.º 025101), “o art.º 22.º da Constituição não abrange a responsabilidade decorrente da função jurisdicional” e “o D.L.

    n.º 48051, de 21-11-1967, não abrange a função jurisdicional já que esta não integra a chamada Administração, e os atos judiciais no âmbito daquela função jurisdicional não suportam a qualificação de ´atos de gestão pública´” (sumário, pontos I e IV), entendimento também acolhido, ao menos implicitamente, pelo STJ, em acórdão de 03-12-2009 (proc.º n.º 9180/07.3TBBRG.G1.S1), em cujos termos “em matéria de natureza cível, só com a entrada em vigor da Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro, faz sentido responsabilizar o Estado, por danos decorrentes do exercício da função jurisdicional, mas apenas nos apertados limites da previsão do seu artigo 13.º, e nunca antes, ou seja, com base no articulado do revogado Decreto-Lei n.º 48.051, de 21 de novembro de 1967” (sumário, ponto I).

  3. — Porém, mesmo que se devesse entender que o vocábulo “funções” possui, no contexto da citada norma constitucional, o alcance de abarcar qualquer atividade dos entes públicos, v.g. a jurisdicional, nem daí resultaria espaço interpretativo para fundar nessa norma, sem intermediação da lei ordinária, a atribuição a eventuais particulares lesados do direito subjetivo (público) à reparação de danos emergentes daquela atuação.

  4. — Com efeito, como demonstrou, de modo claro e logicamente irrefutável, MARIA LÚCIA AMARAL na sua tese Responsabilidade do Estado e dever de indemnizar do legislador, a norma do art.º 22.º da Constituição “não existe para atribuir aos privados o direito fundamental à indemnização; não foi consagrada para definir o elenco de condições que fazem nascer o correspondente dever de compensar do Estado. Existe, e foi consagrada, tão[-]somente para acolher um determinado instituto de direito público e para garantir a preservação da sua identidade” (pág. 449).

  5. — Aliás, conferir ao art.º 22.º da Constituição o alcance geral de norma de atribuição direta de situações jurídicas subjetivas geraria uma perplexidade e incongruência intransponíveis na interpretação do n.º 6 do art.º 29.º da lei fundamental, que para os casos de condenação injusta prevê a ressarcibilidade dos causados daí emergente para o cidadão lesado apenas “nas condições que a lei prescrever”, mal se compreendendo que para uma hipótese particular do dever de indemnizar dos poderes públicos se exigisse expressamente a interpositio legislatoris, dispensando-a, contudo, nos casos comuns, apesar de menos densos e caracterizados normativamente.

  6. — A sentença recorrida procedeu a incorreta interpretação e aplicação do art.º 22.º da Constituição, pelo que deve ser revogada e substituída por decisão que decrete a absolvição do Estado, não porque seja tolerável que uma sentença judicial demore 13 anos a ser prolatada, mas porque o Direito vigente à data do facto pura e simplesmente omitia a concessão do direito à reparação por essa omissão censurável.

    ».

    A recorrida, notificada, apresentou contra-alegação de recurso na qual pugnou pela manutenção da decisão recorrida.

    II - FUNDAMENTAÇÃO Na sentença recorrida foram dados como assentes os seguintes factos: «A) A Autora, na qualidade de senhoria, intentou contra VIRGÍLIO …………… e mulher JEREMINIA ……………., na qualidade de arrendatários, uma ação com processo sumário, para denúncia de um contrato de arrendamento rural, que tinha por objeto o prédio rústico denominado "Aos Algarvios", inscrito na matriz cadastral rústica sob o artigo 000 4 da Secção V e o prédio rústico denominado "Herdade dos Algarvios", inscrito na matriz cadastral rústica sob o artigo 0005 da Secção Z, ambos descritos sob a descrição predial nº …, a fls. 145, do Livro B-6 da suprimida (cfr. processo n .

    º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); B) A Autora formulou na dita ação sumária o seguinte pedido: declarar-se que a denúncia do contrato de arrendamento para 1989-01-01, não põe em risco a subsistência económica do Réu, e do seu agregado familiar, tendo para o efeito de se declarar válida e eficaz a denúncia do contrato de arrendamento feita pela Autora, nos termos da alínea b) do artº. 17º da Lei do Arrendamento Rural, condenando-se o Réu a despejar os prédios" (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); C) Em 01/10/1987, deu entrada no TRIBUNAL JUDICIAL DE ALCÁCER DO SAL, a referida ação judicial, sob a forma sumária, tendo sido autuada com o nº (inicial) 188 / 87 (cfr.

    processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); D) Em 15/10/1987, foi proferido despacho ordenando a citação dos Réus (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); E) Em 22/01/1988, foram os Réus naquela ação, regularmente citados (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); F) E, em 02/05/1988, contestaram a ação e deduziram reconvenção (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); G) Em 14/04/1988, a Autora apresentou a Réplica (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); H ) Em 18/05/1988 foi proferido despacho saneador, especificação e questionário (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); I) Em 26/09/1988 foi, o acima referido despacho saneador, objeto de reclamações de ambas as partes (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); J) Na mesma data os Réus apresentaram ainda recurso do despacho saneador, na parte em que julga improcedente a deduzida exceção de caducidade (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); K) Em 17/10/1988 no seguimento de notificação das partes das respetivas reclamações, vieram os Réus responder (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); L) Em 04/01/1989, tendo em atenção a entrada em funcionamento dos tribunais de círculo, foi proferido despacho a determinar a remessa da Ação ao TRIBUNAL DE CÍRCULO DE SANTIAGO DO CACÉM (cfr. processo n .

    º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); M) Em 05/04/1989, foi a ação remetida ao TRIBUNAL DE CÍRCULO DE SANTIAGO DO CACÉM (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); N) Em 06/04/1989, a acima referida ação deu entrada no TRIBUNAL DE CÍRCULO DE SANTIAGO DO CACÉM e foi distribuída e autuada sob o nº 471/89 (cfr. processo n.º 125/10.

    4T2ASL apenso aos autos); O) Em 12/04/1989, foi aberta conclusão (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); P) Em 13/04/1989, foi proferido despacho declarando-se incompetente o TRIBUNAL DE CÍRCULO DE SANTIAGO DO CACÉM (cfr. processo n.º 125/10.

    4T2ASL apenso aos autos); Q) Em 05/04/1990, suscitada a resolução do conflito negativo de competência, o TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA decidiu a questão fixando a competência para julgar a causa ao TRIBUNAL DE CÍRCULO DE SANTIAGO DO CACÉM (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); R) A ação judicial foi então autuada sob o nº 471 / 89 do TRIBUNAL DE CÍRCULO DE SANTIAGO DO CACÉM (cfr. processo n.º 125/10.

    4T2ASL apenso aos autos); S) Em 01/02/1991, foram decididas as reclamações à especificação e questionário, tendo sido aditados dois quesitos (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); T) Em 01/02/1991, as partes ofereceram, meios de prova testemunhal (a Autora, indicou 4 testemunhas e os Réus 10 testemunhas), documental e pericial (sendo que a aí e ora Autora requereu como meio de prova arbitramento por vistoria e exame) (cfr. processo n.º 125/10.

    4T2ASL apenso aos autos); U) Em 25/02/1991, foi ordenada a inquirição por deprecada da 10ª testemunha indicada pela Autora (cf r .

    processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); V) Em 13/03/1991, foi designado o dia 08/04/1991 para a nomeação de perito, o que veio a ocorrer nessa data (cfr.

    processo n.º 125/10.

    4T2ASL apenso aos autos); W) Em 09/04/1991, foi designado o dia 22/04/1991 para o juramento dos peritos e início da diligência, o que também ocorreu, tendo a Autora apresentado os quesitos (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); X) Em 27/05/1991, foi entregue o relatório da perícia colegial efetuada, o qual foi notificado às partes (cfr. processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); V) De acordo com o mencionado relatório pericial, o rendimento líquido anual que os arrendatários retiram da exploração dos prédios arrendados é de € 15.504,38 (quinze mil quinhentos e quatro euros e trinta e oito cêntimos) (cfr.

    processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); Z) Em 05/07/1991, foram as partes notificadas da data da realização da audiência de discussão e julgamento, marcada para 15/11/1991 (cfr.

    processo n.º 125/10.4T2ASL apenso aos autos); AA) Em 09/07/1991, realizou-se a referida deprecada inquirição...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT