Acórdão nº 477/14.7BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução12 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SECÇÃO DO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I- RELATÓRIO Jorge ………… e Susana ………….., vêm recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente toda a matéria de excepção, o pedido de condenação do requerente como litigante de má fé e determinou a emissão do competente mandado judicial, a autorizar a entrada de trabalhadores do município da A.............. no domicílio dos requeridos, sito na Av …………….., nº 4, 3º Esq, na A.............., para averiguar eventuais situações de ilegalidade urbanística, de higiene ou de segurança pública.

Na alegação os recorrentes formulam as seguintes conclusões: “Introdução I - O Município da A.............., no âmbito de um procedimento administrativo relativo à emissão de ruídos e putativamente ilegais decorrentes da realização de obras, requereu contra o Requerido a emissão de um mandato judicial para entrada no seu domicílio (simultaneamente sua casa de morada de família, seu escritório e domicílio de advogado há aproximadamente 20 anos - documentos juntos com a contestação e articulado supra e os agora juntos sob o nºl a nº35), a fim de alegadamente fiscalizar uma operação urbanística.

II - O mecanismo processual, utilizado para o efeito, foi criado pelo nº2 e nº3 do artigo 95º do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, sobre que incidiu a declaração de inconstitucionalidade proferida no Acórdão Nº195/2016 do Tribunal Constitucional em 13/04/2016, publicado no Diário da República, na Série, em 23/05/2016, que o Tribunal a quo considerou não se aplicar por não se tratar do domicílio dos Requeridos.

III - O recurso objecto mediato destas alegações resulta da discordância pelos recorrentes do Douto Saneador - Sentença, ipsis verbis decisão de 16/07/2015, que determinou a emissão do mandato judicial.

Mas vejamos as nulidades, as ilicitudes, ilegalidades e inconstitucionalidades seguintes: Das nulidades • A forma processual IV) O Tribunal a quo, quando realizou a inspecção judicial ao local, concluiu que o mesmo não era o domicílio dos Requeridos, pelo que estes deveriam ter sido absolvidos da instância, por inapropriação do meio ou da forma processual utilizada para o efeito.

Se assim não se entender A inconstitucionalidade V) A Lei Nº110/99 de 3 de Agosto, ao abrigo da qual foi elaborado o Decreto-Lei Nº555/99 de 16 de Novembro (RJUE) não autorizou o Governo a legislar em matéria de Direito, Liberdades e Garantias nomeadamente no âmbito das restrições do direito à inviolabilidade do domicílio, que é reserva de competência legislativa do Parlamento, nos termos da alínea b) do nº1 do Art. 165° da C.R.P..

VI) O direito a inviolabilidade de domicílio e a reserva da intimidade da vida privada está plasmado, respectivamente, no Art. 34° e no Art.26° da C.R.P..

VII) O nº2 e nº3 do art. 95º do RJUE (onde se prevê a emissão de mandato judicial para permitir que o funcionário municipal responsável pela fiscalização de operação urbanística possa entrar nos domicílios sem o consentimento dos titulares do direito), porque limita o direito à inviolabilidade do domicílio e afecta a reserva da intimidade da vida privada são preceitos inconstitucionais porque não encontram suporte normativo no supra referida autorização legislativa.

VIII - Assim, atento a inconstitucionalidade orgânica, que aqui se argui, com as legais consequências, devem, desde já, os Requeridos ser absolvidos.

Se assim não se entender, ad cautelam e sem prescindir IX) No Procedimento Administrativo que concluiu pela necessidade da emissão de mandato judicial não participaram os Requeridos, não se procedeu a um juízo esclarecedor da necessidade de entrada no domicílio e é incompetente o titular do órgão municipal responsável pelo pedido de emissão de mandato judicial.

As omissões/nulidades Se assim não se entender e sem prescindir X - O Tribunal a quo proferiu decisão final mas não produziu a prova (v.g. testemunhal) solicitada pelos Requeridos, tendo erradamente concluído não ser necessário a emissão de juízo da legalidade e do mérito da decisão administrativa objecto mediato destes autos.

XI - Por outro lado, não emitiu qualquer juízo sobre a competência da pessoa/titular do cargo que ordenou a abertura de procedimento e decidiu da necessidade de acesso ao Tribunal.

XII - Estas omissões ao ritualismo judiciário e de construção da sentença não se mostram supridas nem reparadas e impedem a parte, que não deu causa às mesmas, de conhecer as decisões incidentes sobre os seus pedidos.

Se assim não se entender, ad cautelam e sem prescindir A decisão ilegal XIII - O Município deduziu o pedido de mandato judicial para entrada no local de residência e escritório do requerido sem que este (e a sua mulher) tivesse(m) sido ouvido(s) no procedimento administrativo ou pelo menos sem que alguém da parte da Entidade administrativa os tivesse contactado ou tivessem sido notificados (v.g. abordados pessoalmente ou por escrito, v.g. correio registado ou outro) para autorizarem ou para que fosse agendada a realização de acção de fiscalização (ou sequer a entrada) no local.

XIV -Assim, é nulo o procedimento administrativo objecto mediato destes autos e ilegal a decisão que visa a entrada no domicílio, consequentemente, inexiste o "titulo" para a presente acção, tomando a P.I. ininteligível, nula e ilegal.

XV - Ademais, no Saneador - Sentença, considerou-se que o Município da A.............. é detentor de interesse processual e que dispõe de legitimidade activa sem que este pressuposto processual tivesse sido alegado pelo requerente.

Da fundamentação XVI - O Tribunal a quo indeferiu os pedidos de impugnação documental e a produção de prova testemunhal, por, erradamente, considerar que não lhe cabe apreciar a legalidade nem o mérito da decisão administrativa de ordem a acção de fiscalização, e que, mercê da posição das partes e da inspecção judicial , os autos permitem fixar os factos e proferir a sentença.

XVII - Porém, na matéria de facto dada por assente existem factos que, no mínimo, são controvertidos, pelo que daquela devem retirar-se: a) "... D) Em resposta, os serviços do requerente informaram que no dia 12.9.2012 dois agentes da polícia Municipal se tinham deslocado ao local e instado o requerido a abrir a porta para que fosse possível a fiscalização da obra, não tendo o mesmo permitido a entrada – ver fls. 9 do paa ... ".

b)" ... J) Sempre sem êxito porque o acesso ao interior foi-lhes sempre negado - ver fls. 14 do paa . .... ".

XVIII - Entretanto, está errada a fundamentação desta decisão, porquanto o julgador não pode utilizar o processo administrativo, maxime fl. 9 e fl. 9 verso, fl. 14 e fl. 14 verso, porque nestes documentos (de suporte da decisão de fixação de matéria de facto) inexistem expressões que permitam fixar como verdadeira a referida matéria, pois o que os documentos dizem é o seguinte: a) "... No entanto ao chegar à citada fração, não foi detetado qualquer tipo de ruído e não foi possível efetuar a fiscalização da obra porque ninguém abriu a porta ..."(cfr. fl. 1 e fl. 1 verso do Doc. nº4 junto com a P.l. ou, como referido pelo Tribunal na sentença, fl. 9 e fl. 9 verso do paa).

b) " ... em algumas das deslocações, foi notório a presença de pessoas no interior da fracção, mas que em caso algum abriram aporta ..."(fl. 1 e fl. l verso, do Doc nº6, junto com a PJ. ou, como referido pelo Tribunal na sentença, fls. 14 e 14 verso, do paa).

XIX - O Tribunal a quo não proferiu decisão sobre o mérito nem sobre a legalidade da decisão administrativa e não apôs o "visto" nem proferiu "juízo de forma" da compatibilidade/admissibilidade da decisão administrativa (que ordena a realização da acção fiscalizadora), pelo respeito das garantias dos Administrados visados pela acção fiscalizadora, que, como já se referiu, é nulidade que aqui se argui, com as legais consequências.

XX - A doutrina, a propósito desta matéria em anotação do acórdão do Tribunal Constitucional nº 145/2009 (1ª secção de 24/03/2009) diz-nos que "…o juiz controla a conformidade da decisão .../... administrativa no caso do mandato judicial - tendo por base alguns parâmetros jurídicos que permitem afirmar a não violação de prescrições e exigências de ordem pública No entanto, nunca serão os mesmos parâmetros que estiveram subjacentes à tomada de decisão administrativa, mas apenas aqueles que demonstram que a decisão foi proferida e será executada no respeito dos mais basilares direitos dos destinatários da actuação da Administração.

De entre os parâmetros, apontamos os seguintes: i. A garantia da participação do particular no âmbito dos procedimentos administrativos ou, pelo menos, tratando-se de acções de fiscalização, ao abrigo do art.º 95º do RJUE, a garantia de uma solicitação esclarecedora da necessidade de entrada no domicílio ii. A confirmação da competência para ordenar a realização da diligência (7)…/… (6) Normalmente, esta solicitação será feita de maneira pessoal e directa. No entanto, pode suceder que não se chegue sequer a conseguir contacto pessoal com o residente no edifício ou na fracção Neste caso, será suficiente, para que o mandado possa ser requerido, a prova do envio de carta registada com aviso de recepção com a indicação da data da realização da diligência para q morada em causa e a constatação da impossibilidade de realização desta (sublinhado nosso).

(7.) Nem sempre esta competência será indiscutível, como sucede com a possibilidade de delegação da competência para decretar medidas de tutela da legalidade, reconhecida legalmente ao Presidente da Câmara Municipal (art. 102º, nº1 do RJUE.A jurisprudência penal tem, a este propósito, afirmado que se trata de uma competência indelegável (cfr. Ac. Da relação do Porto de 6 de Dezembro de 2006, proferido no processo 04/5798, e Ac. Do tribunal da relação de Guimarães de 30 de Junho de 1008, proferido no processo 741108-1), enquanto que o Supremo Tribunal Administrativo afirmou...

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