Acórdão nº 12995/16 de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução10 de Março de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Sociedade P............... Ria Formosa – Sociedade para a Requalificação e Valorização da Ria Formosa SA, com os sinais nos autos, inconformada com a sentença cautelar proferida pelo Mm. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé dela vem recorrer, concluindo como segue: A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença de 02/12/2015, a fls ..., que decidiu julgar totalmente procedente o pedido e deferir a presente providência cautelar, com custas a cargo da ora Recorrente.

B. Salvo o devido respeito, a sentença recorrida sofre de erro de julgamento, uma vez que, no processo principal, é evidente a existência de uma cumulação ilegal de pedidos, por violação das regras da competência em razão da matéria, nos termos do artigos 5°, n° 2 e 89°, n° l, al.

a g) do CPTA - o que só por si o que obsta ao conhecimento do mérito - art. 120°, n°l, al.

a b), parte final, do CPTA.

C. Com efeito, os Requerentes identificaram, inequivocamente e a título principal, o objecto imediato da causa principal, que consiste no "reconhecimento do seu direito de propriedade" (art. 150° do R.I.), como também se pode ver no pedido formulado na acção principal (proc. n° 701/15.9BELLE), e como reconhece a própria sentença recorrida (al.

a J) do probatório); pelo que, sendo incontroversa a natureza civil dessa acção principal, deverá forçosamente ser o tribunal civil o competente para a apreciação do pedido formulado na causa principal, nos termos dos artigos 212°, n.° 3, da Constituição, artigo 1°, n°l, e 4°, n°l, al.

a a) do ETAF e o artigo 144° da LOSJ (Lei n° 62/2013, de 26 de agosto), art. 15°, n°l da Lei n° 54/2005, de 15/11 (na redação dada pela Lei n.° 34/2014 de 19/06) e artigo 10°, n°s 3, "a contrario ", do DL n°353/2007.

D. Ao contrário da sentença recorrida, não é verdade que a questão da aquisição do direito de propriedade, por usucapião, surge apenas de forma indirecta, co-mo mera "questão prejudicial", no contexto da análise da validade dos actos.

E. Tendo sido peticionada a título principal, e objecto imediato da causa principal, a questão da propriedade não pode ser considerada como um incidente desta acção, nem tão pouco existe uma relação de prejudicialidade, antes existindo uma cumulação ilegal de pedidos, nos termos supra referidos, o que determina pura e simplesmente a absolvição da instância - art. 5°, n°2 do CPTA.

F. A formulação de um pedido principal, aspirando à condenação de alguém (neste caso à condenação da R) e, por isso mesmo, à obtenção de um caso julgado material, exclui a recondução à facti species do artigo 15°, n°l do CPTA G. A cumulação ilegal de pedidos, por ofensa às regras da competência em razão da matéria, é uma excepção dilatória que obsta ao conhecimento do mérito, de ordem pública e que precede todas as outras, determinante da absolvição da instância, nos termos do artigos 5°, n°2 e 89°, n° l, al.

a g) do CPTA - sem a possibilidade de sanação ou de extensão da competência nos termos do artigo 15°, n° l do CPTA, pelo que a sentença recorrida opera uma errada aplicação da lei.

H. Por outro lado, nos arts. 31° a 43° da Oposição a Recorrente invocou expressamente a questão prévia da ilegitimidade passiva ou preterição de litisconsórcio necessário passivo, porque tal como foi configurada a lide, a presente providência teria de ser proposta contra o Estado, e não (só) contra a Requerida.

I. Com efeito, a acção judicial para dirimir a alegada questão da propriedade ou posse teria de ser proposta contra o Estado, e não (só) contra a Requerida, na medida em que a questão central em causa é a discussão acerca do peticionado "reconhecimento do direito de propriedade", por via da usucapião, sobre aquelas construções e parcelas de terreno pertencentes ao domínio público, nos termos dos artigos 12°, n°l, al.

a a), parte final e 15° da Lei n° 54/2005, de 15/11, a única entidade com legitimidade passiva nessa acção será a pessoa colectiva pública de base territorial a quem pertencer a respectiva titularidade controvertida, ou seja, o Estado Português, nos termos dos artigos 3° e 4° da mesma Lei, alterada pela Lei n°34/2014, de 19/06.

J. Verifíca-se, pois, a preterição de litisconsórcio necessário passivo com o Estado, que possui um legítimo e directo interesse na demanda, nos termos previstos no artigo 10°, n° l e 57° do CPTA, conjugados com o artigo 33°, n°l do C.P.C.

K. In casu, a preterição de litisconsórcio necessário é uma excepção insanável, dada a necessidade de assegurar a identidade subjectiva das partes titulares da relação material controvertida, no procedimento cautelar e na acção principal, sendo inconcebível o decretamento de uma providência cautelar, sem ter sido chamada a defender-se a verdadeira parte titular daquela relação - o Estado.

L. É pacífico na jurisprudência que deve verificar-se uma identidade subjectiva entre as partes do procedimento cautelar e as da acção principal, sendo que o Estado Português também não é Réu na acção principal (n° 701/15.9BELLE), onde igualmente deverá proceder a mesma excepção dilatória, como diz a sentença.

M. A preterição de litisconsórcio necessário passivo do Estado é uma excepção dilatória que obsta ao conhecimento do mérito, determinante da absolvição do pedido, pelo que a sentença violou o art. 120°, n°l, al.

a b), parte final do CPTA.

N. Salvo o devido respeito, a Recorrente considera incorrectamente seleccionada e julgada a matéria de facto, por omissão de selecção e decisão sobre os factos alegados nos artigos 101° a 105°, 111° a 124°, 151°, 154°, 157° a 159°, 298°, 299°, 305° a 309°, 312° a 329° da Oposição, completados com os factos instrumentais resultantes da instrução, manifestamente relevantes para a boa decisão da causa, que devem ser dados como (indiciariamente) provados.

O. Do mesmo modo, a Recorrente considera incorrectamente julgada a resposta "não provado" (a p. 6 da sentença) dada ao facto «b) Os solos de tais terrenos são areais formados no leito por deposição aluvial» (arts. 119° e 120° da Oposição), o que está em manifesta contradição com o facto notório declarado pela sentença (a p. 23, último parágrafo) «sabe-se, por ser do conhecimento geral, sem carecer de alegação ou prova, que a Ilha da Culatra é uma ilha-barreira arenosa, integrada no sistema lagunar da Ria Formosa, em zona sujeita às marés, que se modifica constantemeníe nos seus extremos em virtude da dinâmica dos areais, por acçãodas águas (ondas e correntes de maré)» (i.e., por efeito da deriva litoral - deposição aluvial) - cuja resposta deverá ser alterada para "provado".

P. Além disso, deve ser dada resposta "não provado" aos arts 11°, 12° e 32° do RI.

Q. Os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida são: a. Quanto aos arts. 101° a 105° - por acordo, uma vez que estes factos, que interessam à decisão da causa, constam da fundamentação dos actos suspendendos notificados aos Requerentes, sem que estes os tenham posto em causa nestes autos, cf. does. n°sl a 5 do RJ. e no processo instrutor a fls. 581-902 do Sitaf.

b. Quanto aos arts. 111° a 124°-cf. fls. 214 a 283 e 284 esse 926-987 do Sitaf.

c. Quanto aos arts. 151° e 154° (contraprova dos arts. 11°, 12° e 32° do R.I) - cf. fls. ali concretamente identificadas do processo instrutor a fls. 581-902 do Sitaf.

d. Quanto aos arts. 157° a 159°-cf. requerimento inicial e fls. 581-902 do Sitaf.

e. Quanto aos arts. 298° e 299°, 317° e 319° - cf. DL 92/2008, fls. 320-458 e fls. 576 e ss do Sitaf.

f. Quanto aos arts. 305° a 309°, 312° a 316° - fls. 460-483, e 567 e ss. do Sitaf.

g. Quanto aos arts. 318° a 323° - cf. fls. 320-459, 484-526, 567 ss. e 988 do Sitaf.

h. Quanto aos arts. 324° a 329° - cf. fls. 214-283, 284 e ss., 298 e ss, 320-459, 527, 567 e ss. do Sitaf.

R. A Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. é a entidade pública competente para o cadastro e registo dos bens do domínio público hídrico, nos termos dos arts 9°, n°3 e 20° da Lei n° 54/2005, na redacção dada pela Lei n.° 34/2014, de 19 de junho, do artigo 3°, n°3 do DL n.° 56/2012, de 12/03, e do DL n° 130/2012, de 22/06, que alterou os artigos 7°, n°l e 8° da Lei n° 58/2005, de 29 de Dezembro (Lei da Água)-tendo o doe. a fls.214-283 do Sitaf o valor de documento autêntico, porque exarado pela autoridade pública competente (art. 363°, n°2, C. Civil).

S. Os terrenos da ilha-barreira da denominada ilha da Culatra, aqui em apreço, são efectivamente leitos das águas do mar, na acepção do artigo 10°, n° l, parte final, da Lei n° 54/2005, de 15/11, por as características do solo terem a natureza de areais formados por deposição aluvial, pertencendo ao domínio público marítimo do Estado, nos termos dos artigos l °, n° l, 3°, ala c), e 4°, da mesma Lei.

T. Acresce que, especificamente sobre o núcleo da Culatra (sito na parte interior da mesma ilha-barreira, como evidencia a planta de síntese a fls. 295) identificado como UOPG 4, prescreve o art. 84.°, n°2, al.

a a) do POOC Vilamoura - Vila Real de Santo António, como objectivo: "Manutenção do carácter de dominialidade do domínio hídrico", pelo que, se dúvidas houvesse, o próprio POOC também atesta, como força legal, a dominialidade desta ilha-barreira com o mesmo nome.

U. Com a devida vénia, o princípio da liberdade de julgamento não significa que o juiz é livre para escolher os factos e valorar a prova de forma subjectiva ou arbi-traria, pois que o mesmo está vinculado ao indicado critério de selecção dos factos, bem como à força probatória fixada na lei, designadamente nos artigos 376°, n°l e 358°, n°s l e 2 do C.C., sendo que a livre apreciação das provas não abrange os factos que estejam plenamente provados por documentos ou acordo - artigo 607°, n°5, parte final do CPC.

V. No caso vertente, todos os factos acima indicados estão plenamente provados, por documentos ou acordo - artigo 376°, n°l e 358°, n°s l e 2 do Código Civil.

W. Do processo constam todos os meios de prova, pelo que o Tribunal "ad quem" poderá ampliar e alterar a decisão da matéria de facto - art. 662°...

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