Acórdão nº 1306/13.4BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Abril de 2018
Magistrado Responsável | JOS |
Data da Resolução | 19 de Abril de 2018 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SECÇÃO DO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I- RELATÓRIO O Ministério das Finanças-AT, vem interpor recurso da sentença proferida em 22-09-2017, a qual julgou procedente a acção e condenou a AT à prática do ato devido, de informar ao Serviço de Execuções Fiscais do Município de Oeiras do domicilio actualizado dos executados (e data de alteração, se for o caso), em sede de processos de execução fiscal municipal e em caso de óbito dos mesmos, a informar a respectiva data com indicação dos herdeiros/cabeça de casal e respectivos domicílios fiscais.
A rematar as suas alegações, formulou as seguintes conclusões: “a) Não se reconhece ao MO apesar de integrar a administração tributária para aplicação das normas da LGT e CPPT, as mesmas atribuições e competências que a autorize legalmente a aceder à base de dados da AT. b) A recolha de dados pessoais pela AT não tem a finalidade de identificar os cidadãos perante toda e qualquer entidade administrativa. c) Conforme se defende, para a cessação do dever de confidencialidade na cooperação legal da AT com outras entidades públicas, na medida dos seus poderes, previsto na al. b) do n.° 2 do artigo 64.° da LGT, é necessário a consagração na lei de poderes gerais de acesso por entidades públicas, conforme dispõe a alínea b) do artigo 6.° da Lei da Protecção de Dados Pessoais. Nestes termos e nos demais de direito deverá esse Douto Tribunal conceder provimento ao presente recurso pois o entendimento preconizado pela sentença do Tribunal "a quo" viola a lei substantiva, colidindo com os princípios constitucionais previstos no artigo 26.°, 35.° e 266° da CRP.” Contra-alegou o Autor, concluindo como segue: “1.ª O Ministério das Finanças, R. e ora Recorrente, vem interpor recurso da mui douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo em 22.09.2017, que julgou procedente a presente ação administrativa especial! e, em consequência, condenou a Entidade Pública Demandada, à prática do ato devido, em concreto, de informar o Serviço de Execuções Fiscais do Município de Oeiras do domicilio atualizado dos executados (e data de alteração, se for o caso) em sede de processos de execução fiscal municipal e no caso de óbito dos mesmos, a informar a respetiva data com indicação dos herdeiros/cabeça de casal e respetivos domicílios fiscais. 2.ª O douto Tribunal a quo entendeu que quanto à questão fundamental a resolver nos presentes autos, não assistia razão ao Réu Ministério das Finanças, porquanto no caso concreto além de o Município Recorrido integrar a Administração Tributária para efeitos da aplicação da LGT e, consequentemente, também do seu artigo 64.g, o Ministério das Finanças não podia igualmente recusar a prestação da informação e elementos solicitados já que os mesmos não se encontram abarcados pelo dever de sigilo ou confidencialidade fiscal previsto naquele artigo 64.2 da LGT. 3.ª Não se conformando com o doutamente decidido, o Recorrente sindicou o juízo formulado pelo Tribunal a quo por considerar que a decisão proferida não interpretou, nem aplicou corretamente a lei substantiva, colidindo assim com os princípios constitucionais previstos nos artigos 26.º, 35.° e 266.º da CRP. 4.ª Em resumo, o Recorrente continua a impetrar o entendimento de que no caso concreto está em causa a prestação de informação coberta por sigilo fiscal abrangido pelo artigo 64.ª da LGT e que, por isso, está obrigada a guardar sigilo sobre a situação tributária dos contribuintes e demais elementos de natureza pessoal a que tenha acesso, sendo necessária a consagração na lei de poderes gerais de acesso a esses dados por entidade públicas, pelo que a douta Sentença, ao não sufragar de igual entendimento, violou a lei substantiva, mormente, a Lei n.º 67/98, de 26 de outubro (Lei da Proteção de Dados Pessoais), relativa à proteção de dados pessoais. 5.ª Ora, ao contrário do alegado pelo Recorrente, a douta Sentença proferida fez uma correta interpretação da realidade factual e jurídica, interpretando corretamente a lei aplicável ao caso subjudice. 6.ª A interpretação do ora Recorrente quanto ao objeto do litígio é manifestamente contrária ao teor da própria lei, num claro erro quanto aos pressupostos de direito pois confunde e generaliza situações ao ponto de "radicalizar" o dever de sigilo fiscal tornando inútil a própria utilização do normativo que o prevê! 7.ª Não se compreende, nem sequer se encontra justificado, o facto de o R., ora Recorrente, entender que o A. MO é uma entidade terceira à AT para efeitos do cumprimento do dever de sigilo previsto no art.s 64.º da LGT, desde logo porque, como bem refere o legislador no artigo 1.º, n.ºs 2 e 3 da LGT, as autarquias locais (como é o caso do A. Município de Oeiras, ora Recorrido), enquanto "entidades públicas legalmente incumbidas da liquidação e cobrança dos tributos" (neste caso, tributos locais) são, concomitantemente com as demais entidades a quem essa competência é atribuída, parte integrante da administração tributária para efeitos de aplicação das leis tributárias, mormente, da LGT (e do seu art.º 64.º). 8.ª É, pois, incontestável que o Serviço de Execuções Fiscais da Câmara Municipal de Oeiras é parte integrante da Administração Tributária tal como o Ministério das Finanças também é, não fazendo pois qualquer sentido que uma entidade integrante da AT negue dados a outra entidade também componente dessa mesma Administração! 9.ª Os dados facultados pelos contribuintes à AT são, com efeito, dados por aqueles disponibilizados para cumprimento das suas obrigações fiscais, onde igualmente se incluem os tributos administrados pelas autarquias locais (a administração tributária autárquica integra a administração tributária do Estado). 10.ª De resto, de acordo como princípio da publicidade dos atos (cfr. art.º 19.º da LGT) o domicílio fiscal do sujeito passivo da relação tributária é, para a entidade de direito público titular do direito de exigir o cumprimento das obrigações tributárias, uma informação pública e de comunicação obrigatória por aquele sujeito passivo à administração tributária (que, por conseguinte, deverá poder ser consultada e transmitida aos vários órgãos que compõe, nos termos do art.º1º, n.º3 da LGT, a administração tributária). 11.ª Assim, de acordo com o referido n.º 3 do art.º 1º da LGT ex vi n.º4 do art.º 238.º da CRP, é ilegal e inconstitucional a recusa do Recorrente em prestar as informações solicitadas pelo órgão de execução fiscal do Recorrido, não podendo colher abrigo o entendimento do Recorrente que o Serviço de Execuções Fiscais do MO é uma entidade terceira à administração tributária (que, de resto, está em clara contradição com os mencionados normativos). 12.ª Tal assim é que tanto a reserva da intimidade da vida privada como o dever de sigilo fiscal não podem (nem devem) ser absolutos e muito menos indiferentes ao dever de cooperação entre as várias instituições do Estado, sobretudo quando está em causa o cumprimento de competências legalmente previstas, como cobrança coerciva de tributos devidos por determinado munícipe. 13.ª Ora, de acordo com o art.º 64.º da LGT o dever de sigilo cessa (de imediato e vinculadamente) quando houver um dever de cooperação legal da administração tributária com outras entidades públicas, na medida dos poderes legais dessas entidades, como é, aliás, o caso dos presentes autos. 14.ª Face ao exposto e aplicando ao caso concreto a exceção prevista na al. b) do n.º 2 do art.º 64.º da LGT, o dever de sigilo das Finanças Locais (em concreto, do Serviço de Finanças de Oeiras; 2) teria obrigatoriamente que cessar por força do dever de cooperação que aquela edilidade tem, no caso em análise, para com o Serviço de Execuções Fiscais do MO, pois que a informação requerida pelos serviços competentes do MO é essencial para o cabal cumprimento das respetivas funções de cobrança dos tributos em dívida, sendo mais do que imperioso garantir o exercício dessas competências, atenta a necessidade de cobrança das dívidas existentes ao Estado/Município. 15.ª Por outro lado a informação requerida em momento algum colide com os direitos legalmente protegidos dos sujeitos passivos envolvidos, não se podendo afirmar que está em causa o núcleo essencial de direitos fundamentais tutelados pelo sigilo fiscal previsto no artigo 64.º da LGT, pois que tal núcleo apenas respeita a elementos particularmente íntimos e privados do cidadão sujeito ao procedimento, e já não outros elementos públicos sem qualquer caráter íntimo, como os solicitados pelos Serviços do Recorrido, ao quais nada têm que ver com o nível de riqueza do cidadão visado e muito menos com a sua situação tributária particular. 16.ª O que vale por dizer que não pode proceder o entendimento do Recorrente de que a douta Sentença proferida violou a lei substantiva, mormente, a Lei n.º 67/98, de 26 de outubro (Lei da Proteção de Dados Pessoais), porquanto, não se pode confundir o conceito amplo de dados pessoais previsto naquela Lei com o conceito do artigo 64.°, n.º1 da LGT, que é muito mais reduzido conforme supra exposto. 17.ª Acresce que no caso concreto, não estão a ser violados quaisquer princípios norteadores do tratamento de dados pessoais, já que o pedido de informação em causa é lícito e legitimo e é efetuado em total respeito pelo princípio da boa-fé, da proporcionalidade e da cooperação, sendo que os dados pretendidos têm uma finalidade determinada, são adequados, pertinentes e não excessivos. 18.ª Não pode, pois, valer o entendimento do Recorrente no sentido de que está a ser violada a Lei da Proteção de Dados Pessoais, quando, claramente, o âmbito de aplicação do dever de sigilo previsto no art.- 64.º da LGT é muito mais estrito que o previsto naquela Lei. 19.ª Aliás, é de acordo com o estipulado no art.º 1º, n.º 3 da LGT, e, bem assim, do dever de cooperação entre as entidades públicas, que o Recorrente devia nortear a sua conduta, possibilitando o cumprimento do interesse público ao invés...
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