Acórdão nº 2938/16.4BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelPEDRO MARCH
Data da Resolução19 de Abril de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório Matondo ..... (Recorrente), cidadão nacional da República Democrática do Congo, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que, na sequência do acórdão deste TCAS de 18.05.2017, veio a julgar improcedente a acção administrativa especial urgente (pedido de asilo) por si proposta contra o Ministério da Administração Interna, Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (Recorrido) e manteve o despacho de 3.11.2016 da Directora Nacional daquele Serviço que considerou infundado o pedido de asilo formulado, bem como o pedido de autorização de residência por protecção subsidiária.

As alegações de recurso que apresentou culminam com as seguintes conclusões: I.

Por acórdão emanado do TCA Sul e transitado foi determinada a tomada de declarações de parte, para o dia 10 de agosto de 2017.

II.

Em sede de audiência para cumprimento do ordenado, o Tribunal a quo determinou que o Autor, porque não estava presente, fora devidamente notificado, como se pode ouvir da gravação da diligência e ler da ata, cfr. fls.

III.

Sobre este despacho, arguiu-se a nulidade da notificação, que mereceu o despacho de fls. do qual o Autor recorreu, por não se conformar com o mesmo, que agora também sobe, como se requer, assim como a sua apreciação, para o qual se remete, e cujas conclusões aqui se dão por reproduzidas, IV.

A 21 de dezembro de 2017 foi elaborada nova sentença, da qual agora se recorre, cuja divergência com a primeira, é a inserção do ponto “II – Instrução Para efeitos de cumprimento de acórdão proferido pelo Venerando TCA Sul procedeu- se à instrução dos autos, mediante realização de diligência, na qual o A. não compareceu, e diligência da qual foi lavrada a competente acta”.

V.

Constatou-se agora que a 28 de agosto de 2017, com a referência SITAF n.º documento 00....., com o registo n.º 5..... deu entrada nos autos o envelope que continha a notificação endereçada ao Autor, que se encontra impoluto, isto é, fechado.

VI.

Facto processual – devolução da notificação – que foi omitido ao patrono do Autor, que só conheceu por compulsação dos autos.

VII.

No envelope, por compulsação direta, não se vislumbra a razão pela qual a notificação foi devolvida, mas constata-se que a mesma não foi entregue ao A. pelo que não pode considerar, como sempre se defendeu, que este foi notificado.

VIII. Face ao exposto, devera ser repetida a tentativa de notificação dado que o A. não faltou, pois não estava notificado.

IX.

Pelo que não foi efetivado o previsto no n.º 2 do art.º 247.º do CPC.

X.

Mesmo a 10 de agosto de 2017 não fosse exigível ao Tribunal ter conhecimento da devolução da notificação dado que esta só ocorreu a 28 de agosto de 2017, contudo a 21 de dezembro de 2017, data da assinatura da sentença, já constava dos autos esta informação.

XI.

Pelo que em nome do dever de gestão processual, previsto no art.º 6.º do CPC, deveria ter o Tribunal marcada nova data para tomada das declarações de parte, mandar repetir a notificação, através de notificação pessoal, como se alegou no recurso retido, após a tradução desta em língua que o destinatário compreenda, para os efeitos do n.º 2 e 3 do art.º 219.º e n.º 2 do art.º 242.º do CPC.

XII.

Pelo que em nosso entender não foi dado cumprimento ao ordenado pelo TCA Sul.

XIII. A prova requerida – declarações de parte – apenas não foi produzida porquanto o A. não foi notificado XIV. A ter sido produzida a prova requerida, pretendia o Recorrente provar o perigo, ainda que em abstrato mas real para todas as pessoas apelidadas de feiticeiras.

XV.

Prova requerida ao abrigo das normas adjetivas aplicáveis e nomeadamente às do processo especial, in casu, nos termos do art.º 111.º, n.º 1 do CPTA: “Sem prejuízo do disposto na alínea c) do n.º 3 do artigo 110.º, o juiz decide o processo no prazo necessário para assegurar o efeito útil da decisão, o qual não pode ser superior a cinco dias após a realização das diligências que se mostrem necessárias à tomada da decisão”.

XVI. Que deverá ser considerada inconstitucional, se interpretada no sentido de à parte/requerente não ser admissível indicar prova, (segundo as regras processuais aplicáveis) e/ou que ao juiz não lhe é exigível pronunciar-se sobre tal requerimento de prova, violando os princípios do Acesso à Justiça e Ao Direito e da Dignidade da Pessoa Humana, em que se baseia o Estado de Direito Democrático, (artºs 1.º, 2,º e 20.º da CRP).

XVII.

Inconstitucionalidade que desde já se invoca e alega, por se tratar de decisão, por omissão, surpresa.

XVIII.

Por outro lado a Douta sentença refere que “E, face à prova produzida nos autos, não se extrai a conclusão da existência de perigo para o A., nem o mesmo logrou provar qualquer situação, actual, e demonstrativa que a esfera pessoal do A. poderá vir a ser afectada por uma situação violadora dos direitos fundamentais, de modo a impossibilitá-lo a regressar ao país de origem e /ou a Luanda donde veio, exceptuando as razões que justificam o facto de se ter deslocado para países onde pensa obter melhores condições de vida, no sentido económico do termo, mas o que não tem qualquer acolhimento no regime jurídico do asilo e /ou da protecção subsidiária mediante concessão de residência por razões humanitárias”.

XIX. Pelo que, pelo menos quanto ao pedido de residência por razões humanitárias, a perseguição objetiva deveria ter sido dada como provada considerando toda a prova documental carreada para os autos.

XX.

Tal prova é de conhecimento oficioso, por se tratar de noticias consideradas sérias e válidas, de resto prova não impugnada pelo requerido SEF e portanto admitida por acordo, (o mesmo valendo quanto ao pedido de asilo), pelo que, também põe em causa a informação 2312/GAR/16 XXI.

Estamos assim, salvo melhor opinião, perante um erro de julgamento.

XXII. Acresce a este erro de valoração de prova que o Tribunal a quo, desvirtua a impugnação especificada pelo Autor quando na sua sentença diz exatamente o contrário.

XXIII.

Não atendeu, nem deu como facto assente as notícias indicadas pelo Autor, e perfeitamente identificadas, podendo ser consultadas na rede informática (internet) em que demonstram inequivocamente o alegado pelo mesmo, como sejam os atropelos sistemáticos e reiterados dos Direitos Humanos, como sejam a perseguição aos “feiticeiro”.

XXIV.

Não atendeu nem entendeu que o recurso às autoridades iria agravar a sua situação.

XXV.

A ACNUR emitiu em Novembro de 1994 um parecer sobre os procedimentos de asilo justos e céleres cujos princípios básicos se enquadram perfeitamente no processo do A. e que se transcrevem: “No interesse dos A.s de asilo e dos estados envolvidos, os procedimentos para a determinação do estatuto de refugiado devem ser justos e céleres. Procedimentos justos, em conformidade com os requisitos da proteção internacional, requerem uma análise cuidada do pedido, por um órgão de decisão devidamente identificado, qualificado, conhecedor e imparcial. Dadas as dificuldades que os legítimos refugiados frequentemente enfrentam na apresentação de provas documentais, e outras, para suporte dos seus pedidos, os A.s de asilo que, na generalidade, são credíveis e cujas declarações são coerentes e plausíveis, devem ter direito ao benefício da dúvida nesses procedimentos. É também essencial que haja uma revisão independente das decisões negativas. Estas garantias são de importância crucial, dado que uma decisão errónea, conduzindo ao reenvio involuntário de um refugiado para uma situação de perigo, pode ter consequências trágicas. A inexistência de garantias suficientes contra o reenvio de refugiados para países onde existe risco de perseguição pode resultar numa quebra do princípio de non-refoulement.” XXVI.

Ora, à luz do disposto no art.º 14.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, “em caso de perseguição, toda a pessoa tem o direito de buscar asilo e de receber o benefício dele em qualquer país”.

XXVII.

Dispõe o artº 7º da Lei nº 27/2008, de 30 de Junho que será concedida autorização de residência por razões humanitárias “aos estrangeiros e aos apátridas a quem não sejam aplicáveis as disposições do artigo 3.º e que sejam impedidos ou se sintam impossibilitados de regressar ao país da sua nacionalidade ou da sua residência...

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