Acórdão nº 04216/08 de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelCristina dos Santos
Data da Resolução11 de Novembro de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

T...Açores, Sociedade de Empreitadas, Lda., T...Ediçor – Engenharia SA e T...& Filhos, Lda, sociedades comerciais com os sinais nos autos, inconformadas com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada dela vêm recorrer, concluindo como segue: 1. A proposta das Recorrentes foi excluída por não respeitar uma disposição alegadamente imperativa do Caderno de Encargos, ao abrigo da cláusula 26.3 do Programa de Concurso, porque apresentou um geólogo em vez de um bacharel ou licenciado em engenharia para o exercício de determinadas funções.

  1. No entanto, a cláusula 7.1.3. do Caderno de Encargos não tem natureza imperativa, por um lado porque a cláusula 7.1.13. do mesmo Caderno de Encargos prevê a possibilidade dos técnicos designados para o exercício das referidas funções serem substituídos por outro lado porque a Entidade Recorrida não erigiu em critério ou subcritério de apreciação das propostas a adequação do quadro técnico proposto ou a experiência e qualificações evidenciadas pelos elementos que integram o mesmo.

  2. O carácter de indiferença ou de neutralidade atribuído pela Entidade Recorrida às qualificações do quadro técnico indicado pelos Concorrentes para efeitos de escolha da proposta mais vantajosa impossibilita a qualificação como imperativa da referida disposição do Caderno de Encargos.

  3. Independentemente da declaração constante da proposta das Recorrentes quanto ao elemento indicado para gerir o sistema de Segurança e de Saúde no Trabalho, durante a execução da empreitada esta função sempre teria de ser cometida a elementos cujas qualificações respeitem o referido documento concursal (e contratual).

  4. A decisão sob recurso peca, assim, por assentar no falacioso pressuposto da imperatividade de uma cláusula a que nem a Entidade Recorrida nem a lei confere tal valor.

  5. A não exclusão da proposta apresentada pelas Recorrentes não consubstanciaria a violação do princípio da igualdade de tratamento ou de favorecimento de um Concorrente que, ao contrário dos outros, não respeitou as disposições do Caderno de Encargos.

  6. Pois, no âmbito de um procedimento de formação de contrato, a aplicação do princípio de igualdade de tratamento é delimitada por aqueles aspectos das propostas dos concorrentes objecto de análise pela Comissão de Abertura de Concurso e pela Comissão de Análise de Propostas.

  7. A actividade destas Comissões, a quem cabe propor à Entidade Adjudicante quais os concorrentes que devem ser considerados Aptos, numa primeira fase, e qual a proposta que, por ser a mais vantajosa, deve ser objecto do acto adjudicatório, numa segunda fase, está concatenada pelo âmbito de competência que lhes está legalmente cometido, não lhes sendo permitido debruçarem-se sobre aspectos subtraídos à sua análise e ponderação, sob pena de extravasarem abusivamente a sua esfera de actuação.

  8. Concretamente, a actividade de uma qualquer Comissão de Análise de Propostas está legalmente circunscrita à análise e comparação, para efeitos de atribuição de uma classificação, àqueles documentos que instruem a proposta necessários à avaliação dos critérios e subcritérios de apreciação.

  9. A experiência ou as habilitações do quadro técnico proposto pelos Concorrentes não é, no Concurso dos autos, um elemento a ter em conta para efeitos de escolha da proposta mais vantajosa, pelo que estava vedado à Comissão de Análise premiar ou penalizar qualquer Concorrente com base na informação contida naqueles documentos.

  10. Admitir a proposta apresentada pelas Recorrentes, não obstante a divergência detectada face ao Caderno de Encargos, não constituiria, por isso, qualquer violação ao princípio da igualdade de tratamento ou qualquer manifestação de favorecimento deste Concorrente.

  11. Acresce, que a Entidade Recorrida sempre poderia impor ao Adjudicatário a substituição do técnico indicado na sua proposta por outro com as qualificações referidas na cláusula 7.1.3. do Caderno de Encargos, ao abrigo da cláusula 7.1.13. do mesmo documento, até porque a detectada divergência sempre se teria por não escrita ex vi do disposto na cláusula 13.3. do Programa de Concurso Tipo, publicado pela Portaria 104/2001 de 21 de Fevereiro.

  12. Sendo a cominação legal expressamente prevista para as declarações contidas nas propostas com conteúdo divergente das cláusulas (não imperativas) do Caderno de Encargos que as mesmas se tenham por não escritas, a imposição da substituição do técnico em causa por alguém com as habilitações e qualificações estipuladas no Caderno de Encargos ao abrigo da citada disposição não constitui violação do princípio da intangibilidade ou da imutabilidade da proposta, pois nem a cláusula 7.1.3. do Caderno de Encargos tem carácter imperativo nem a habilitação e qualificação do técnico a quem seria cometida tal função constituía um aspecto a ter em conta na avaliação e comparação das propostas, submetido à análise da respectiva Comissão.

  13. Na ausência de critério ou subcritério de apreciação que incidisse sobre as habilitações e qualificações dos técnicos designados pelos Concorrentes para orientação das obras, a análise destes documentos teria de se subsumir ao disposto no artigo 67.° do RJEOP.

  14. Os documentos relativos às habilitações literárias e profissionais dos responsáveis pela orientação da obra, são exigidos neste Programa de Concurso e na alínea 1) do número l do artigo 67.° do Decreto-Lei n.° 59/99.

  15. Ora, de acordo com o citado diploma, que rege e regula o Concurso Público em apreço, a documentação exigida ao abrigo da citada disposição legal destina-se à qualificação dos Concorrentes, ex vi do disposto no número 5 daquele artigo 67.° do RJEOP, sendo que, de acordo com o disposto no artigo 98.° do RJEOP, esta está cometida à Comissão de Abertura do Concurso. É, portanto, nesta fase do procedimento, que a Comissão se debruça sobre a valia técnica do concorrente face à obra posta a concurso.

  16. Também o Programa de Concurso Tipo, publicado pela Portaria n° 104/2001 confirma esta interpretação, definindo na cláusula 15.7 que os certificados de habilitações literárias e profissionais dos quadros da empresa e dos responsáveis pela orientação da obra (cláusula 15.1 alínea e)) se destinam à avaliação da capacidade técnica.

  17. A cláusula 19.4 alínea c) do referido Programa de Concurso Tipo estipula que para a avaliação da capacidade técnica dos concorrentes, deve ser tida em conta a adequação dos técnicos e os serviços técnicos, estejam ou não integrados na empresa, a afectar à obra.

  18. Em face de tais disposições legais e da inexistente incidência da análise das propostas nos documentos assinalados - por ausência de critério ou subcritério de apreciação que os contemple - apenas se poderá concluir que, pese embora estes documentos tenham instruído a proposta, a sua análise teria de ser efectuada pela Comissão de Abertura do Concurso para efeitos de aferição da valia técnica dos Concorrentes face à obra posta a concurso.

  19. Também a jurisprudência dominante nesta matéria vai no sentido de que a situação erigida pela CAP como causa de exclusão (geólogo versus bacharel ou licenciado em engenharia) é na verdade subsumível ao art.° 98.° do RJEOP e da competência da Comissão de Abertura do Concurso, na qual se esgota.

  20. As Recorrentes foram consideradas "Aptas" pela Comissão de Abertura do Concurso, em 29 de Maio de 2006, na avaliação por esta efectuada ao abrigo do citado art.° 98.° do RJEOP, tendo a respectiva deliberação sido notificada a todos os Concorrentes sem que, qualquer um deles haja deduzido qualquer reclamação ou outra forma de impugnação.

  21. E ainda que considere que tal deliberação da Comissão é inválida por ter sido violado um requisito do processo de concurso, a mesma, por se traduzir num acto constitutivo de direitos notificado às Recorrentes e por o prazo previsto no artigo 141.° do Código do Procedimento Administrativo para revogação de actos inválidos, atentas as datas do Relatório de Qualificação dos Concorrentes (29 de Maio de 2006) e da l.a Revisão ao Relatório de Apreciação das Propostas (8 de Outubro de 2006), já ter escoado, consolidou-se na esfera jurídica das Recorrentes, sanando-se, por decurso do tempo, a sua potencial invalidade.

  22. A competência da CAP é delimitada pelo artigo 100.° do RJEOP e circunscreve-se à análise, comparação e graduação das propostas admitidas face aos critérios de apreciação estabelecidos no Programa de Concurso, o que, aliás, resulta, igualmente da cláusula 26 do Programa de Concurso, sendo-lhe absolutamente vedado ter em consideração, directa ou indirectamente, a aptidão dos concorrentes já avaliada nos termos do art.° 98.° do RJEOP, e muito menos, num momento em que o acto de qualificação era já irrevogável.

  23. A proposta apresentada pelas Recorrentes foi excluída em clara violação de lei e com manifesto prejuízo para o interesse público, pois era a proposta mais vantajosa.

  24. A cláusula 26.3 do Programa de Concurso em que a CAP baseia a proposta de exclusão, que não reflecte, complementa ou explicita qualquer disposição legal, confere à Comissão de Análise das Propostas o poder de propor a exclusão das propostas que violem o disposto no Caderno de Encargos.

  25. Ora, decorre do disposto no art.° 62.°, n.° l do RJEOP que o concurso terá por base um programa de concurso, elaborado pelo dono da obra, de acordo com o modelo aprovado por portaria do ministro responsável pelo sector das obras públicas.

  26. Tal modelo, aprovado pela Portaria n.° 104/2001 de 21 de Fevereiro, não contém qualquer disposição análoga ou que acolha a citada cláusula do Programa de Concurso, nem teria de conter, atento o conteúdo do Programa de Concurso que é estabelecido no artigo 66.° do RJEOP.

  27. No elenco das especificações que deverão integrar o Programa de Concurso previsto no referido art.° 66.° do RJEOP não constam as causas de não admissão de propostas e a alínea f) do n.° l da citada disposição confina expressamente a liberdade de auto-regulamentação dos donos de obra a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT