Acórdão nº 04534/08 de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelRogério Martins
Data da Resolução18 de Dezembro de 2008
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência os juízes do Tribunal Central Administrativo Sul: O INFARMED interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, de 3 de Setembro de 2008, a fls. 1854-1937, pela qual foi deferido o pedido cautelar de suspensão de eficácia, deduzido pelas sociedades E ... LTD. e Laboratórios P ..., L.DA.

, contra os actos de Autorização de Introdução no Mercado emitidos a favor das Contra-Interessadas A ..., S.A. e outras.

Invocou para tanto que a sentença recorrida incorreu em erro de análise jurídica ao julgar improcedentes as excepções de incompetência do Tribunal (em razão da matéria e territorial) e ao julgar procedente o pedido de suspensão.

As Contra-Interessadas A ..., S.A. e outras, interpuseram também, cada uma por si, recursos desta sentença.

Invocaram para tanto que a sentença é nula por omissão de pronúncia, padece de deficiência no julgamento da matéria de facto e, em todo o caso, incorreu em erro de interpretação e aplicação do disposto no art.º 120º, n.º1, al. b), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, ao caso concreto.

Contra-alegaram as sociedades Recorridas, defendendo a manutenção do decidido na 1ª Instância.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

Pronunciaram-se as Recorridas sobre este parecer, mantendo no essencial a sua posição inicial.

*Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

* São as seguintes as conclusões das alegações do Recorrente INFARMED e que definem o objecto do seu recurso: 1ª Andou mal o Tribunal ao conceder as medidas cautelares de suspensão de eficácia dos actos AIM.

  1. O Tribunal territorialmente competente para apreciar a providência cautelar dos autos era o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, e não o Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa.

  2. Ao julgar improcedente a excepção de incompetência territorial, o Tribunal a quo violou a regra processual contida no art. 16° do CPTA, normativo que impõe a regra geral em matéria de competência territorial. Tal regra determina que a competência seja aferida em função da sede do autor ou da maioria dos autores, sendo também aplicável às providências cautelares por via do n.° 6 do art. 20° do CPTA.

  3. Os tribunais administrativos são incompetentes para julgar a presente providência porquanto esta se destina essencialmente a garantir os eventuais direitos de propriedade industrial das Requerentes, agora Recorridas, a decisão acolhida na sentença violou a al. e) do art. 494.°, art. 101.° do CPC, aplicáveis ex vi o disposto no artigo 1.° do CPTA e o art. 7.° do ETAF.

  4. Ainda em matéria de excepção, impunha-se ao tribunal julgar procedente a legitimidade activa, porquanto as Requerentes, ora Recorridas, não fizeram parte do procedimento de concessão de AIM. Note-se que tal procedimento não é multipolar, devendo desenvolver-se exclusivamente entre requerente do procedimento e a Administração.

  5. Não se encontram verificados os requisitos previstos para o decretamento de providência ao abrigo da al. b) do n.° 1 do art. 120° do CPTA.

  6. O Tribunal a quo entendeu que se verificava o fumus boni iuris. Com o devido respeito, mas o Tribunal a quo não vislumbrou que o cerne da providência em causa reconduz-se aos direitos de propriedade industrial, e que não sendo estes susceptíveis de violação pela prática de AIM, mas apenas e só, com a efectiva comercialização, então, nenhuma razão assistirá à Requerente, não se encontrando verificada a aparência de direito exigida nos termos da al. b) do n.° 1 do art. 120° do CPTA.

  7. Acrescente-se que a decisão em causa ao considerar verificado o fumus boni iuris, viola também as disposições do Estatuto do Medicamento (Decreto-Lei n.° 176/2006), na medida que a responsabilidade pela introdução no mercado dos medicamentos respeita, única e exclusivamente, aos titulares de AIM. Ao INFARMED cabe, apenas, assegurar a verificação da eficácia e segurança dos medicamentos, não existindo qualquer norma que imponha qualquer verificação quanto à questão dos direitos de propriedade industrial dos requerentes de AIM ou de terceiros (cfr. art. 14°, 19°, 20°, 25° do Estatuto do Medicamento).

  8. No caso sub judice, não lograram as Recorrentes fazer prova do periculum in mora, prova essa que se diga ser impossível, visto que os prejuízos que invocam não resultam directamente dos eventuais actos administrativos a proferir, mas antes da efectiva comercialização dos medicamentos. E isto aplica-se quer ao fundado receio da constituição de facto consumado, quer ao fundado receio da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal.

  9. O fundado receio tem de ser real, logo baseado em factos trazidos aos autos, que como resulta da matéria assente, não resultam provados.

  10. É necessário que exista uma causalidade adequada entre o acto em causa, e a verificação efectiva de fundado receio dos prejuízos invocados. Admitir o contrário, seria totalmente descabido, possibilitando que as providências tutelassem situações não directamente resultantes dos actos em análise.

  11. Quaisquer prejuízos que a Recorrente possa vir a sofrer terão sempre a sua "causa adequada" na comercialização dos medicamentos genéricos visados, e não, obviamente, na concessão de qualquer AIM, ou de quaisquer actos do INFARMED.

  12. A decisão em causa não se baseia em quaisquer factos concretos naquilo que respeita aos prejuízos, mas meras extrapolações de experiência comum, que adiante-se, não se afiguram verosímeis. Com o devido respeito, sempre se dirá que na providência sub judice não é susceptível de ser julgada por experiência comum.

  13. A decisão parte de um pressuposto absolutamente errado, é que a AIM não é por si susceptível de causar prejuízos à Requerente. Atentemos a este propósito no Acórdão do Tribunal central Sul, de 28 de Fevereiro de 2008, proferido no âmbito do recurso jurisdicional n.° 3222/07,"(...) ao INFARMED, através de emissão de uma Autorização de Introdução no Mercado, apenas cabe controlar, no essencial, a qualidade e a segurança do medicamento, como resulta do disposto no art. 25° do Estatuto do Medicamento. O facto de as ora Recorrentes perderem negócio, a consumar-se, não resulta da Autorização de Introdução no Mercado, da responsabilidade do INFARMED e em matéria da competência dos tribunais administrativos, mas da conduta das Contra Interessadas, eventualmente violadora dos direitos de propriedade industrial, resultantes de Patente, matéria alheia à jurisdição dos Tribunais Administrativos.

    Isto sendo certo que a concessão de uma Autorização de Introdução no mercado não prejudica a responsabilidade, civil, ou criminal, do titular dessa autorização ou do fabricante (cfr. n° 4 do art. 14° do Estatuto do Medicamento).

    Neste contexto também não se pode dizer que as Recorrentes ficam livres de comercializar os genéricos em apreço." 15ª E o citado Acórdão avança ainda com outro argumento que é assertivo na censura da sentença recorrida, "Por outro lado, ainda que se admitisse a possibilidade de criação de uma situação de facto consumado derivada da situação do INFARMED, teríamos de concluir de igual modo não existir a possibilidade de produção de prejuízos de difícil reparação para as ora Recorrentes. Na verdade o cálculo dos prováveis prejuízos - tanto patrimoniais como morais - não reveste especial dificuldade. ", pelo que também por aqui sempre estaria afastada a verificação do periculum in mora.

  14. Neste sentido, vejam-se ainda os Acórdãos proferidos no sentido idêntico, do Tribunal Central Administrativo Sul, nos processos n.° 3247/07, de 28 de Fevereiro de 2008, n.° 3881, de 19 de Junho de 2008, e mais recentemente, no processo n.° 3992/08, de 25 de Agosto de 2008.

  15. Ao julgar o periculum in mora como verificado, o Tribunal a quo violou a al. b) do n.° 1 do art. 120° do CPTA.

  16. Por último, ainda que o Tribunal considerasse verificados os requisitos necessários para a concessão das medidas cautelares, sempre teria de fazer a ponderação de interesses, resultando esta indubitavelmente em favor do interesse público, visto que os actos em causa não são susceptíveis de afectar qualquer direito fundamental, pelo que se concluirá pela violação do n.° 2 do art. 120° do CPTA.

  17. Face ao exposto, deve a douta sentença recorrida ser revogada dada a errada interpretação quanto ao direito aplicável, que ditava que fossem considerados como não verificados os requisitos da concessão da providência cautelar, levando assim à improcedência da mesma.

    Conclusões da Recorrente M..., S.A.

    : 1. Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1, do artigo 120. °, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, a adopção das providências cautelares depende da existência de um fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente pretenda ver reconhecidos no processo principal (periculum in mora), o que as recorridas não demonstraram minimamente nos presentes autos, contrariamente ao decidido na douta sentença de que se recorre.

    1. O Decreto-Lei n.° 176/2006, de 30 de Agosto, distingue claramente a autorização de introdução no mercado (Secção I, Subsecção I, Secção I, Capítulo II) da comercialização do medicamento (Secção I, Capítulo IV), cabendo, apenas, ao INFARMED, através da atribuição de autorização de introdução no mercado, controlar, no essencial, a qualidade, a segurança e a eficácia do medicamento.

    2. Embora o acto de atribuição de autorização de introdução no mercado constitua um pressuposto essencial e indispensável à comercialização de um medicamento, as autorizações de introdução no mercado dos medicamentos genéricos contendo Donepezil como substância activa não prejudicam, sequer, potencialmente, as recorridas, pois, os prejuízos, a existirem, surgiriam, apenas, no momento da respectiva comercialização, pelo que os prejuízos alegados pelas recorridas não são...

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