Acórdão nº 07541/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 02 de Abril de 2014
Magistrado Responsável | ANA CELESTE CARVALHO |
Data da Resolução | 02 de Abril de 2014 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.
RELATÓRIO R……. – Valorização e ………………, SA, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, datada de 16/12/2010 que, no âmbito do processo de injunção instaurado contra a A.D.C. - …………….
, absolveu o réu do pedido e julgou improcedente o pedido de condenação da Autora em multa por litigância de má-fé e ainda, julgou improcedente o pedido indemnizatório formulado pela Ré, absolvendo a Autora.
Formula a aqui Recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 394 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que se reproduzem: “1 - Os pontos 4º, 6° e 8º da fundamentação de facto da sentença devem ser modificados, atento o regime jurídico dos Decretos-Lei n.º 294/94 de 18/11 e n.º 319-A/2001 de 10/12, bem como os documentos juntos a fls. 104 e seguintes (facturas), 340 a 342 e 346 e seguintes (documentos juntos em audiência).
2 - Nos termos dos arts. 685º-B, n.º 1 e 712º, n.º 1, ais. a) e b) do CPC, ex vi art. 140º do CPTA, a matéria do ponto 8º da fundamentação de facto da sentença deve ser dada como provada em termos inversos, isto é, deve ser dada como provada a existência de um contrato relativo à entrega de RSU produzidos no concelho da Covilhã, devendo, em conformidade ser alterados pontos 4º, 6º, devendo a matéria correspondente do requerimento injuntivo (arts. 10º e 11º ser dada como integralmente provada).
3 - A matéria constante dos artigos 4º, 5º e 8º do requerimento inicial, bem como dos artigos 66º a 74º,inclusive, da réplica, deve ser dada como provada, nos termos dos arts. 685º-B, n.º 1 e 712º, n.º 1, als. a) e b) do CPC, ex vi art. 140º do CPTA.
4 - O que se requer considerando conjunta e concretamente todos os documentos juntos aos autos, particularmente os documentos juntos a fls. dos autos (nomeadamente, docs. juntos a fls. 104 e seguintes (facturas), 340 a 342 e 346 e seguintes (documentos juntos em audiência), bem como atenta a confissão e falta de impugnação pela Recorrida relativamente à matéria constante de tais pontos.
5 - A sentença recorrida violou os artigos 490º, n.º 2 e 659º, n.ºs 2 e 3 do CPC, pelo que deve ser revogada.
6 - A Recorrida ao usufruir, durante anos, dos serviços prestados pela Recorrente, sabendo as condições em que os mesmos são prestados, está a aceitar tais condições, ao menos tacitamente, tal como releva dos actos materiais praticados pelas partes, a que o Tribunal, incompreensivelmente, não atribuiu relevância, mas que demonstram que estas se comportam de acordo com a relação jurídica de entrega e recepção de RSU.
7 - Nos termos do artigo 219.º do Código Civil, a falta de redução a escrito de um contrato não significa a sua inexistência ou a sua nulidade, a menos que para ele seja expressamente exigida a forma escrita, sendo que do DL n.º 294/94, de 18 de Novembro não resulta a obrigatoriedade de reduzir a escrito o contrato a celebrar entre a concessionária e os utilizadores do serviço multimunicipal de tratamento de resíduos sólidos urbanos.
8 - O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, tendo violado as disposições do Decreto-Lei n.º 294/94, de 16 de Novembro, bem como o art. 219º do Código Civil, devendo, com tais fundamentos, ser a sentença recorrida revogada.
9 - O Tribunal a quo julgou nulo o contrato, sem se ter pronunciado quanto às consequências automáticas e ex lege dessa nulidade, pelo que a sentença recorrida padece de omissão de pronúncia, sendo, como tal, nula, nos termos do art. 668º, n.º 1. al. d) do CPC.
10 - Os fundamentos invocados na sentença recorrida (nulidade do contrato) conduzem a uma decisão diferente da tomada, pelo que a sentença é, ainda, nula nos termos do art. 668º, n.º 1. al. c) do CPC, desta feita por contradição entre os fundamentos e a decisão, a qual deverá ser declarada por este Venerando Tribunal, revogando-se, assim, a sentença em crise.
11 - Pois que, mesmo a considerar-se o contrato nulo, a Recorrida fica obrigada a pagar à Recorrente, nos termos do n.º 1 do artigo 289.º do Código Civil, o valor peticionado, respeitante às facturas por pagar, bem corno os juros, tal corno é jurisprudência pacífica (cfr., por todos, o citado Acórdão do STA de 30/l 0/2007).
12 - O Tribunal a quo violou o disposto no n.º 1 do artigo 289.º do CC, devendo, com tal fundamento, ser a sentença recorrida revogada e substituída por Acórdão que, nos termos do art. 149º do CPTA, julgue a acção totalmente procedente e condene a Recorrida no pedido.
13 - O que a sentença na realidade faz, é negar tutela jurisdicional à situação da Recorrente, o que constitui, aliás, uma violação do direito fundamental de tutela e uma interpretação inconstitucional das regras sobre a prestação dos serviços de tratamento e valorização de RSU pela concessionária do sistema multimunicipal, que, para os devidos efeitos, expressamente aqui se deixa arguida.
14 - Se por outra via não for possível, a Recorrida sempre deverá ser condenada a pagar à Recorrente o equivalente em termos monetários ao seu enriquecimento sem causa, por remeter para esta o tratamento dos seus RSU.
15 - A Recorrente efectivamente prestou, a solicitação da Recorrida, o serviço discriminado nas facturas em causa nos autos, as quais foram atempadamente remetidas à Recorrida, que as recebeu, sem nunca as ter devolvido à Recorrente, sendo que as respectivas datas de vencimento há muito que passaram, encontrando-se a respectiva obrigação de pagamento vencida, pelo que o valor peticionado pela Recorrente é-lhe devido pela Recorrida, bem corno os juros de mora à taxa comercial, até efectivo e integral pagamento, devendo ser esta condenada no respectivo pagamento.”.
* A ora Recorrida, notificada, veio contra-alegar, formulando as seguintes conclusões (cfr. fls. 525): “A) O suposto contrato em que a Recorrente assenta a causa de pedir e o pedido que deduziu é nulo por falta de forma: artigos 184º, 185º, n.º 1 e 3, alíneas b) e 133º, todos do CPA; B) Assentando a causa de pedir e o pedido deduzido nos autos no dito contrato e sendo o mesmo, atenta aquela nulidade, inexistente, está vedado à Autora exigir o cumprimento de uma obrigação resultante desse contrato; C) Posto isto, a douta sentença proferida nos autos é correcta, tanto na forma como no conteúdo, não enfermando de nenhum dos vícios que lhe são apontados pela Recorrente e nem violando nenhuma das disposições legais que esta invoca terem sido violadas, pelo que deve ser mantida.”.
* O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artº 146º do CPTA, emitiu parecer no sentido do provimento do recurso.
* Colhidos os vistos legais foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II.
DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artºs. 660º, nº 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, nº 1, todos do CPC, ex vi artº 140º do CPTA.
As questões suscitadas resumem-se em determinar se a sentença incorre em: 1. Erro de julgamento de facto, quanto aos pontos 4º, 6º e 8º da fundamentação de facto e por deverem ser aditados os factos constantes nos artºs 4º, 5º, 8º e 66º a 74º da réplica, incorrendo a sentença em violação dos artºs 490º, nº 2 e 659º, nºs 2 e 3, ambos do CPC [conclusões 1 a 5]; 2. Nulidade por omissão de pronúncia, por o Tribunal ter julgado o contrato nulo, mas não extrair as consequências dessa nulidade e ainda por contradição entre os fundamentos e a decisão, por os fundamentos invocados na sentença conduzirem a resultado diferente [conclusões 9 e 10]; 3. Erro de julgamento de direito, quanto ao julgamento de falta de contrato entre as partes, em violação do D.L. nº 294/94, de 16/11 e dos artºs 219º e 289º, nº 1 do CC, quanto ao regime de nulidade do contrato ou, quando assim se entender, quanto ao regime do enriquecimento sem causa [conclusões 6 a 8 e 11 a 15].
III.
FUNDAMENTOS DE FACTO O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos: “1. A Águas ……………, S.A. firmou com o Estado Português um acordo escrito em 27.07.2003, que designaram por “contrato de concessão”, constando da sua cláusula 1.ª, n.º 1 que: “o concedente atribui à concessionária, em regime de exclusivo, a concessão de exploração e gestão, do sistema multimunicipal de triagem, recolha selectiva, valorização e tratamento de resíduos sólidos da Cova da Beira (adiante designado por sistema), criado pelo Decreto-Lei n.º 319-A/2001, de 10 de Dezembro” (cfr. doc. n.º 12 junto aos autos em complemento do requerimento inicial que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
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A Ré, enquanto entidade que gere e explora a recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos no concelho da Covilhã, entrega à Águas …………., S.A., nos locais por esta indicados, os resíduos sólidos urbanos e equiparados gerados na sua área e por si removidos e transportados.
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A Águas do …………. S.A. emite facturas com periodicidade mensal, até ao 5.º dia útil do mês seguinte àquele que respeitam as entregas de resíduos sólidos urbanos e equiparados gerados na sua área e por si removidos e transportados.
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A Águas do …………… S.A. presta à Ré serviços de recolha e valorização de resíduos sólidos urbanos, com vista à sua valorização e destino final, tendo procedido à emissão de facturas pelo valor de € 50/72/tonelada pela prestação desses serviços à Ré.
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A Águas do ……… S.A. emitiu e enviou à Ré, que as recebeu, as seguintes facturas: - Factura n.º…………., de 31.07.2007, relativa à recepção e valorização, em Julho de 2007, de 1 685,390 toneladas de resíduos sólidos urbanos, com vencimento em 30.09.2007, no valor de 93 296,45€; - Factura n.º ………, de 31.08.2007...
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