Acórdão nº 03303/10.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução14 de Fevereiro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:I RELATÓRIO1. MICTG..., identif. nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 23 de Janeiro de 2013, que, no âmbito da presente acção administrativa especial, julgando procedente a excepção de inimpugnabilidade do despacho de 3/8/2010 (por ser confirmativo do acto de 23/4/2010, que ordenou a demolição da obra de construção de um telheiro), absolveu da instância o MUNICÍPIO de VILA NOVA de GAIA.

*2.

Nas suas alegações, a recorrente formulou as seguintes conclusões: "1ª Já em sede de reposta à excepção invocada na contestação do demandado – o Município de Vila Nova de Gaia – a recorrente, modestamente, suscitava a questão de que o acto de 3 de Agosto de 2010 não é um mero acto confirmativo 2ª Dispõe o artº 51º, nº 1 do CPTA que: “Ainda que inseridos num procedimento administrativo, são impugnáveis os actos administrativos com eficácia externa, especialmente aqueles cujo conteúdo seja susceptível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos.” 3ª Constitui pressuposto da impugnabilidade face ao mesmo é que se esteja perante um acto administrativo.

  1. O conceito de acto administrativo encontra-se definido no artº 120º do CPA, que dispõe que: “Para os efeitos da presente lei, consideram-se actos administrativos as decisões dos órgãos da Administração que ao abrigo de normas de direito público visam produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta” 5ª O conceito material de acto administrativo, nos termos do artº 120.º do CPA, circunscreve-se aos actos de conteúdo decisório.

  2. Ficam de fora desse conceito, a generalidade dos actos preparatórios do procedimento administrativo, também chamados actos de trâmite ou instrumentais.

  3. Por actos de trâmites ou instrumentais são entendidos normalmente as propostas, pareceres não vinculativos, informações entre outros.

  4. No caso concreto, em que o acto administrativo se consubstancia com a decisão e confirmação da demolição mencionada nos autos, não pode ser entendido como actos de trâmite ou instrumentais que não deixa de ter conteúdo decisório, constituindo, assim, uma decisão definitiva ou final sobre o acto de demolição.

  5. O acto aqui impugnado, não obstante a sua natureza confirmativa de decisão administrativa é, por si só, produtor de efeitos externos, e, por isso, é contenciosamente impugnável.

  6. Ensina a jurisprudência e a doutrina, que releva hoje, para efeitos impugnatórios, apenas a eficácia externa do acto administrativo, tornando-se irrelevante, para aferir da impugnabilidade do acto, que ele seja definitivo ou não, lesivo ou não, bem como a sua localização no procedimento (início, meio ou termo).

  7. Qualquer decisão administrativa pode ser hoje impugnável, questão é que o seu conteúdo projecte efeitos jurídicos para o exterior, que tenha eficácia externa, o que é o caso dos autos.

  8. Acto confirmativo tendo vindo a ser entendido como aquele que se limita a repetir um acto administrativo, sem nada acrescentar ou retirar do seu conteúdo. Assim, acto confirmativo não constitui um verdadeiro acto administrativo, limitando-se a manter a definição jurídica constante de um acto anterior.

  9. Em sede de Recurso Hierárquico, a recorrente suscitava várias questões jurídicas que não tinham sido tratadas, apreciadas e fundamentadas em sede de despacho de 23.04.2010 da Vereadora da Câmara de Vila Nova de Gaia, pelo qual foi ordenada a “demolição da construção de um telheiro na continuação do comportamento identificado como cozinha por terem sido realizadas sem a necessária licença administrativa, em cumprimento do disposto no nº 1 do art. 106º do D.L. 555/99, de 16 de Dezembro"; 14ª Não foram tratadas, apreciadas e fundamentadas as questões jurídicas relacionadas com a legalidade (isenção de licença de construção), respeito pelo principio da prossecução do interesse público, protecção dos direitos e interesses dos cidadãos, respeito pelo princípio da igualdade, da proporcionalidade, da boa-fé e finalmente o respeito pelo princípio de que a demolição pode ser evitada se a obra for susceptível de ser licenciada ou objecto de comunicação prévia ou se for possível assegurar a sua conformidade com as disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis mediante a realização de trabalhos de correcção ou de alteração.

  10. A Administração, em sede de Recurso Hierárquico, foi confrontada com novos elementos de ponderação, que, no modesto entender da recorrente, deveriam conduzir à revogação do Acto Administrativo, constante do despacho de 23.04.201.

  11. A não apreciação das questões jurídicas que foram colocadas à Administração em sede de Recurso Hierárquico constitui uma omissão da fundamentação, que se impunha como acto confirmado para se tornar em acto confirmativo 17ª Aliás neste sentido, Acórdão nº 0997/06 de Supremo Tribunal Administrativo, 19 de Junho de 2007 e Acórdão nº 045909 de Supremo Tribunal Administrativo, 07 de Fevereiro de 2002".

*3.

Notificadas as alegações, apresentadas pela recorrente, supra referidas, veio o recorrido Município de Vila Nova de Gaia apresentar contra alegações que assim concluiu: "1.

O valor da presente demanda foi fixado por sentença em € 1.000,00 (mil euros).

  1. Dado que a decisão recorrida não se subsume em nenhuma das previsões do nº 3 do artigo 143º do C.P.T.A., nem do nº 2 e 3 do artigo 678º do C.P.C., é irrecorrível nos termos do disposto no nº 1 do artigo 142º do C.P.T.A.

  2. Na verdade, considerando, por um lado, o valor da causa e o critério da sucumbência e, por outro, que a decisão recorrida não se enquadra em nenhuma das previsões legais que admitem recurso independentemente do valor da causa e da sucumbência, somos forçados a concluir que o recurso interposto pela Recorrente é ilegal e deverá ser rejeitado.

  3. Não obstante, considerando que o objecto do recurso é balizado pelas conclusões apresentadas pela Recorrente, facilmente se apreende que nenhuma ilegalidade ou irregularidade substancial ou formal é assacada à sentença sob censura.

  4. Com efeito, a Recorrente confrontada agora com a decisão que lhe é desfavorável vem interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal “a quo” limitando-se, em sede de recurso, a insistir nos fundamentos já aduzidos na petição inicial para infirmar o que foi decidido em conformidade com os factos provados.

  5. Conforme expendido na sentença em crise, a impugnação administrativa dos actos dos vereadores tem de ser entendida num quadro de uma relação hierárquica imprópria ou de falsa hierarquia, dado que o exercício da função administrativa pelos vereadores, não se enquadra numa relação de supra-infra ordenação, própria da hierarquia.

  6. Por isso, o despacho da Vereadora proferido em 23.04.2010, era imediatamente passível de impugnação contenciosa, pois, trata-se de um acto administrativo com eficácia externa, que produziu directamente efeitos na esfera jurídica da Autora.

  7. Daí que o recurso hierárquico interposto daquela decisão da vereadora sempre era meramente facultativo.

  8. Assim, na situação sub judice o acto impugnado - decisão proferida em 03.08.2010, pelo Presidente da Câmara Municipal, em sede de “recurso hierárquico impróprio” - é um acto meramente confirmativo do anterior despacho da vereadora e, nessa medida, irrecorrível, inimpugnável.

  9. Inexiste, por isso, qualquer fundamento legal para a revogação da sentença ora em crise, porquanto não ocorre qualquer causa que justifique a anulação daquele aresto.

  10. Tendo em consideração a matéria dada como provada e a fundamentação da sentença recorrida, pode-se concluir que o Tribunal “a quo” bem andou, fazendo a correcta interpretação e enquadramento legal dos factos, mormente, no que respeita à invocada excepção da inimpugnabilidade do acto.

  11. Em suma, é inegável que o Tribunal “a quo” decidiu como se impunha, inexistindo qualquer erro de apreciação ou de julgamento, nada havendo a censurar na sentença recorrida, pelo que deverá improceder o presente recurso".

    *4.

    O Digno Procurador Geral Adjunto, neste TCA, notificado nos termos do art.º 146.º n.º 1 do CPTA, pronunciou-se, nos termos...

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