Acórdão nº 00433/11.7BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 31 de Janeiro de 2014
Magistrado Responsável | Carlos Lu |
Data da Resolução | 31 de Janeiro de 2014 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.
RELATÓRIO J.M.S.A..., devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Aveiro, datada de 08.11.2012, proferida na ação administrativa especial pelo mesmo instaurada contra o “Ministério da Educação” (doravante «ME») e que julgou improcedente a sua pretensão de anulação do despacho do Diretor Regional de Educação do Norte, datado de 31.12.2010, que havia improcedido o pedido de revisão do processo disciplinar intentado contra si e no qual lhe tinha sido aplicada a pena de multa graduada em 250,00 €.
Formula o A., aqui recorrente, nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem [cfr. fls. 311 e segs.
- paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário]: “...
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- A sentença recorrida erra ao concluir que, sendo a AR... aluna do Autor, e tendo o Autor apenas uma turma, então foi o Autor que lhe deu a ordem para varrer o pátio e lavar o chão.
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- Só poderia concluir assim, se o Autor fosse o único professor da turma da AR... - e não era.
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- Como consta do processo, a AR... tinha outra professora em simultâneo com o Autor, tendo mesmo ambos sido denunciados criminalmente por alegadamente a terem mandado varrer o pátio e lavar o chão, como decorre dos documentos extraídos do processo-crime.
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- A sentença recorrida erra ao apontar contradições na declaração de retratação da testemunha O....
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- Não há contradição em dizer que a AR... era uma aluna bastante complicada e de comportamento difícil, e que espontaneamente varria e/ou lavava o pátio, junto da O....
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- Pois uma criança pode ter um comportamento complicado e difícil numa sala de aula, e sentir-se bem a executar voluntariosamente tarefas domésticas, como varrer e lavar, na companhia de uma adulta.
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- Não há contradição em a O... dizer que a aluna vinha para fora da sala e que o professor (o Autor) vinha depois chamá-la para a aula, pois a declarante não tinha que saber a razão por que a aluna saía, nem isso lhe era perguntado.
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- A Administração (e o Tribunal) ou aceitava a nova declaração da testemunha, e manifestamente só tinha que dar provimento ao pedido de revisão, reabilitando o Autor - ou não aceitava, mas também não podia aceitar a sua declaração de 2007, por entender que a testemunha não era credível, pois não é possível considerá-la credível para proferir uma declaração, e não a considerar credível para proferir a outra, de retratação.
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- Pelo que, e quando muito, teria de a desconsiderar em todo o processo disciplinar - o que daria o mesmo resultado: o depoimento da O... não poderia fundamentar a condenação do Autor.
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- A Administração não agiu de boa-fé, pois instrumentalizou um processo movido à O..., para conseguir o desígnio de manter a condenação do Autor, salvando a face de quem o condenou.
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- A Administração (e agora o Tribunal) violou o princípio da racionalidade da decisão, porque ao considerar a declaração da O..., cujo depoimento fora determinante na condenação, como bastante para o início do processo de revisão, não podia agora reduzi-la a nada.
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- A autonomia do processo disciplinar face ao processo criminal só pode ser entendida quanto à qualificação jurídica dos factos, e não quanto à existência dos próprios factos, pois um facto não pode existir num tribunal e não existir noutro, sob pena de grave ofensa à soberania e à credibilidade dos tribunais.
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- Tendo um tribunal judicial declarado que não há indícios de que o Autor praticou um facto, não é legítimo a Administração e outro tribunal declararem o contrário.
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- A Administração (e agora o Tribunal) violou o princípio da justiça, pois não decidiu de forma justa o processo, mantendo uma condenação quando uma testemunha (O...) se retratara e a outra (R...) nada dissera contra o Autor, e portanto apenas baseada no depoimento da menor, mais tarde alterado.
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- A Administração (e agora o Tribunal) violou o princípio in dubio pro reo, pois a anulação do depoimento fundamental da O..., prestado em 2007, e o desfecho do processo-crime só poderia criar, na pior das hipóteses, um estado de dúvida quanto ao modo como os factos ocorreram - e tal dúvida, afetando inexoravelmente a convicção do decisor, teria de reverter na absolvição do Autor.
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- A Administração (e agora o Tribunal) violou o princípio da legalidade do processo e das provas, pois recorreu, para a decisão, a documentos (o processo da O...) que não constam destes autos, dos quais o Autor nunca tomou conhecimento, onde não pôde exercer o contraditório.
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- Ao indeferir o pedido de revisão, a Administração, e agora o Tribunal, violaram e fizeram errada interpretação do disposto nos artigos 6.º, 6.º-A e 9.º do Código do Procedimento Administrativo, do disposto nos artigos 48.º/1 e 72.º da Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro, e do artigo 205.º/2 da Constituição da República …”.
Termina no sentido do provimento do recurso, com revogação da decisão judicial recorrida e procedência da pretensão invalidatória deduzida.
O R., ora recorrido, notificado apresentou contra-alegações [cfr. fls. 370 e segs.
], tendo concluído que: “… A - O R. reitera todos os argumentos afirmados nos anteriores articulados.
B - A decisão disciplinar teve como base toda a instrução feita e, portanto, um círculo fundamentador não limitado a uma inquirição. O que a Sentença afirmou em observância dos seus poderes de exame e de cognição.
C - Finda a revisão disciplinar e novamente inquirida a testemunha M.O.M.A..., não se encontraram razões para alterar a decisão, considerando que a nova declaração não se apresentava com credibilidade suficiente para colocar em crise o que antes aquela afirmara. Mais uma vez, e como não poderia deixar de ser, como a Sentença afirmou em observância dos seus poderes de exame e de cognição.
D - O conteúdo declaratório nunca assumiria imediata força probatória necessária para, sem mais, determinar a procedência do pedido de revisão e o arquivamento dos autos.
E - O decisor agiu corretamente quando, estribado em idêntica conclusão probatória, afirmou a convicção de que a testemunha M.O.M.A... apenas infletiu o sentido das suas anteriores declarações no sentido de permitir a revisão do processo ao aqui A., não conferindo sentido abonatório à inflexão da posição daquela interveniente.
G - Não é passível de crítica o ato que, após impugnação hierárquica, concluiu o procedimento de revisão, mantendo o ato recorrido, afirmando que a contradição dos termos anteriormente testemunhados pela referida trabalhadora não deixara de fazer subsistir as afirmações, quer da aluna envolvida, quer de outros funcionários da Escola. Salientando-se que a base probatória não residiu apenas naquela fonte.
H - A prova não logrou pôr em causa a existência dos factos que enformaram a decisão disciplinar, não se constituindo como meio idóneo para julgar procedente a revisão e, por essa via, invalidar os efeitos da pena disciplinar aplicada.
I - Uma mudança de sentido testemunhado, não se constitui enquanto a novidade que a lei exige.
No âmbito do processo disciplinar a testemunha estaria total e cabalmente em condições de proferir as declarações corrigidas a que agora se quer dar força rescisória positiva.
J - A responsabilidade disciplinar assenta em valores diferentes dos da responsabilidade penal, não valendo, sem mais, um maior crédito da prova aqui aferida. Fundamento que a Sentença a quo não deixou de relevar.
L - Não foram colocados em causa os princípios que informaram a improcedência do pedido de revisão, nomeadamente a boa-fé, a decisão foi conformada pela devida racionalidade na apreciação e no decurso do procedimento, inexistindo qualquer arbítrio, antes uma plena adoção dos critérios legais que iluminam a revisão disciplinar e que conduziram à decisão justa. Factos fundamentadamente afirmados pela douta Sentença.
M - Nunca houve quaisquer dúvidas quanto à imputação subjetiva e à consequente responsabilidade disciplinar a assacar ao aqui recorrente. Não sendo imputável qualquer erro no acréscimo fundamentados da decisão judicial aqui em causa.
N - Não existe erro na imputação contraditória a que se refere a decisão judicial aqui em causa, a invocação é fundamentada da convicção que vê na alteração da posição da trabalhadora M.O.A... falta de credibilidade.
O - A ponderação judicial e a decisão daí adveniente, postas em causa no presente recurso, não encontram razão de abalo nos argumentos aduzidos pelo Recorrente, quer nas invocações de erro, quer nas insistentes alegações a princípios materiais pretensamente ofendidos no procedimento administrativo.
P - É significativo o facto das alegações de recurso não conterem qualquer alusão ao regime de consagrado na lei processual civil, aplicável p.f. do art. 140.º do CPTA.
Q - Nos termos que ficam referidos conclui-se pela improcedência da totalidade dos argumentos constantes do arrazoado e das conclusões do Recorrente, improcedendo os pedidos revogatórios ali constantes. Não se demonstrando, como ficou atrás claro, a violação das normas referidas em síntese na 17.ª conclusão da participação do Recorrente …”.
O Digno Magistrado do Ministério Público (MP) junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso [cfr. fls. 425/425 v.
], pronúncia essa que objeto de contraditório mereceu resposta discordante do recorrente [cfr. fls. 431 e segs.
].
Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.
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DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que, pese embora por um lado, o objeto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos arts. 144.º, n.º 2 e 146.º...
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