Acórdão nº 00867/05 de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Dezembro de 2011

Magistrado ResponsávelBENJAMIM BARBOSA
Data da Resolução07 de Dezembro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL: I – Relatório A...

, B...

e C...

, todos com os demais sinais nos autos, vieram interpor recurso jurisdicional do saneador-sentença que na acção administrativa comum sob a forma ordinária que intentaram no TAF de Sintra contra os ora recorridos Centro Hospitalar de Cascais e D...

, decidiu julgar procedente a excepção peremptória da prescrição do direito de indemnização dos autores quanto ao réu e o absolveu do pedido, e a excepção peremptória da prescrição do direito de indemnização de B...e C...quanto à ré, D..., e a absolveu do pedido. E ainda julgou procedente a excepção de ilegitimidade quanto à ré e ora recorrida D..., absolvendo-a da instância, e julgou improcedente o pedido de condenação do réu, Centro Hospitalar de Cascais e dos autores, por litigância de má-fé.

Em alegações os recorrentes concluem como segue: 1. O tribunal a quo considerou incorrectamente que a data de início da contagem do prazo prescricional é 11.07.1992, isto porque, à contagem deste prazo na presente acção não se aplica o disposto no artigo 306°, n° 1, do CC.

  1. Pelo que, a decisão do tribunal a quo é ilegal porquanto, estando aqui em causa a responsabilidade civil extracontratual, tal momento deve ser delimitado pela regra especial resultante do artigo 498°, n° 1, do CC, e não pela regra geral do artigo 306° do mesmo código.

  2. Neste sentido, e atendendo aos factos tidos por provados na decisão recorrida, conclui-se que o momento a partir do qual se deve iniciar a contagem do decurso do prazo prescricional será 07.03.1996, momento em que os autores tiveram conhecimento, através do Relatório Final da Inspecção Geral de Saúde, dos pressupostos da responsabilidade civil, e respectivo fundamento factual da actuação ilícita da ré D... e do réu Centro Hospitalar de Cascais.

  3. E não é o facto, referido na sentença, de a autora Inês Magro Correia ter denunciado o ocorrido à Inspecção Geral de Saúde em 29.12.1992, onde emite a opinião de que existiu um acto negligente, que altera esta realidade, pois não passa de uma opinião sua, sem suporte factual e sem qualquer rigor técnico ou científico.

  4. Este dado nem tão pouco pode ser tido por confissão uma vez que resulta de um documento junto aos autos e que não foi dado por reproduzido, mesmo que assim não se entenda, tal confrontação só pode ter lugar face à autora Inês Magro Correia e não contra os autores B...e C..., que na altura ainda eram menores e não subscreveram a denúncia.

  5. Pelo que fez-se o que se podia e devia fazer, apresentar uma denúncia ao órgão competente, para o efeito qualificado, e aguardar-se pelo resultado da investigação desencadeada, assim conclui-se que o momento a partir do qual deve ter início a contagem do prazo prescricional é 07.03.1996, devendo a decisão recorrida nessa parte ser revogada e substituída por outra que, em conformidade com o artigo 498° do CC, fixe esta data como o momento a partir do qual a contagem deve ter início.

  6. Em conformidade, conclui-se que no momento em que B...e C...apresentaram os seus pedidos de indemnização, 26.10.1998, os seus direitos não estavam prescritos em relação à ré D....

  7. Mas mesmo em momento anterior, e ao contrário do que afirma a sentença recorrida, existiu em relação a estes dois autores um facto suspensivo da contagem do prazo prescricional, conforme dispõe o artigo 320° do CC, que foi completamente ignorado na decisão do tribunal a quo, o facto de estes autores serem ainda menores aquando da verificação dos factos, B...tinha na altura da morte de seu pai, E..., 16 anos de idade e C...14 anos.

  8. Assim, os autores beneficiam na contagem do seu prazo prescricional da suspensão prevista neste preceito e que foi completamente ignorada na sentença recorrida, o que vem reforçar a necessidade de esta sentença ser revogada e substituída por outra que tenha em conta o estabelecido neste último preceito e que não julgue procedente a excepção da prescrição dos direitos destes autores diante à ré D....

  9. Portanto, não havendo lugar à verificação da excepção peremptória da prescrição invocada pela ré D..., deve, em consequência, a decisão recorrida ser nesta parte revogada e substituída por outra que considere, em conformidade com o artigo 498° do CC, não procedente a excepção peremptória da prescrição face ao autores B...e C....

  10. A decisão recorrida entende também que quando o pedido de indemnização contra o réu Centro Hospitalar de Cascais foi apresentado, em 26.10.1998, já estavam prescritos os direitos dos autores desde 11.07.1992.

  11. Com efeito, pelas razões de facto e de direito supra referidas, segundo o artigo 498°, n° 1, do CC, a data determinante para efeitos da contagem do decurso do prazo de prescrição é a de 07.03.1996, data da emissão do Relatório Final da Inspecção Geral de Saúde, pois só nesse momento tiveram conhecimento dos factos que consubstanciavam os seus direitos e, assim, só a partir desta altura ficaram em condições de o exercer.

  12. Por outro, como já acima se concluiu a propósito da outra ré, existiu em relação aos autores C... e B...um facto suspensivo da contagem do prazo prescricional que foi completamente ignorado na decisão do tribunal a quo, o facto de estes autores serem ainda menores aquando da verificação dos factos, B...tinha na altura da morte de seu pai 16 anos de idade e C... 14 anos, conforme o artigo 320° do CC.

  13. Por fim, é preciso ainda salientar que a responsabilidade sacada a este réu depende sempre da responsabilidade que é imputada à ré D..., e se os autores não estavam cm condições de determiná-la em relação a esta última, também não estava em relação a este último e, por isso, não podiam demandar autonomamente.

  14. Neste contexto, e porque não estava esgotado o prazo de prescrição, a decisão recorrida deve ser substituída por outra que julgue improcedente a excepção peremptória da prescrição arguida por este réu, sob pena de se manter a violação do disposto no artigo 498° do CC.

  15. Na sequência do conhecimento dos factos relatados no Relatório Final da Inspecção Geral de Saúde, foi instaurado processo-crime que correu seus termos nos Serviços do Ministério Público de Cascais sob o processo n° 505/96.6TACSC, tendo, no seu termo, em 06.02.1997, sido promovido Despacho de Acusação, seguido de Instrução, tendo a última decisão respeitante a este processo-crime adoptada em 16.11.2000.

  16. Atentas estas datas assentes, conclui-se que a prescrição dos direitos dos autores B...e C... em relação à ré D... ocorreu na pendência do processo crime, em 11.07.1997 e, do mesmo modo, terá ocorrido em relação aos direitos de todos os autores em relação ao réu Centro Hospitalar de Cascais, em 11.07.1997, no entanto, como reconhece a jurisprudência, a pendência de processo-crime destinado ao apuramento de responsabilidade criminal tanto impede a verificação da prescrição em relação ao arguido, como para as pessoas com mera responsabilidade civil, como sucede com o réu Centro Hospitalar de Cascais.

  17. Assim, conclui-se que a pendência de processo-crime tem, entre outros efeitos, a virtualidade de impedir a prescrição dos direitos dos autores C... e B...em relação à ré D..., e de todos os demandantes e recorrentes em relação ao réu Centro Hospitalar de Cascais, sendo que esta valência foi completamente ignorada na decisão recorrida pois, a prescrição sentenciada nunca poderia ter ocorrido durante a pendência do processo-crime.

  18. Nesta medida, e uma vez mais, conclui-se que decisão recorrida viola o disposto nos artigos 320°, 323°, 326°e 498° do CC e, ainda, o artigo 71° do CPP, devendo ser revogada e substituída por outra que não considere a prescrição dos direitos dos autores diante todos os réus em 11.07.1997, momento em que ainda estava pendente o processo-crime e que só veio a findar em 2000.

  19. Os autores também concluem pela ilegalidade da qualificação da culpa operada pela decisão recorrida, com efeito não se percebe como é possível, perante os factos tidos por assentes, considerar-se que esta actuou com culpa leve, pois a ré violou, desde logo, as normas legais e regulamentares respeitantes à competência para a prática de actos médicos, que lhe estavam vedados por se encontrar em período de estágio.

  20. Esta violação não teve lugar por mero descuido ou desleixo, antes sim de forma consciente, pois a ré bem conhecia as suas limitações regulamentares em relação à prática de actos médicos e à sua impossibilidade de preencher a ficha clínica do falecido, assim, fê-lo com dolo, na modalidade doutrinal de dolo necessário, uma vez que a ré previu certamente como consequência necessária da sua actuação a violação das normas legais e regulamentares da competência para a prática de actos médicos durante o período de estágio e conformou-se com ela.

  21. A ré ainda praticou outro acto ilícito, com efeito, à altura dos factos ainda se encontrava em período de estágio, pelo que não reunia todas as condições exigíveis ao bom desempenho da profissão, concretamente o domínio das matérias e a experiência profissional, para avaliar e analisar sozinha, as situações clínicas.

  22. Facto de que certamente tinha consciência, bem como de que não tinha capacidade, conhecimentos e a experiência profissional para avaliar c analisar sozinha, a situação clínica de E..., desta forma violou as regras da experiência comum com plena consciência, concretamente descorou-se de remeter o falecido a um médico da especialidade, diagnosticou-o sem para tal ter competência, nem conhecimentos, e, mesmo perante os alertas do falecido quanto aos seus antecedentes cardíacos, rematou a sua situação clínica como um problema ósseo.

  23. Desta forma, e atendendo às diversas classificações possíveis da culpa no domínio da responsabilidade civil, a sua actuação enquadra-se como dolosa na modalidade de dolo eventual.

  24. Assim, a decisão recorrida aplicou incorrectamente o disposto nos artigos 487° n° 2, 494° do CC e, ainda, o disposto no artigo 4o, n° 1, do Decreto-Lei n°...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT