Acórdão nº 08016/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 23 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelPAULO PEREIRA GOUVEIA
Data da Resolução23 de Novembro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I - RELATÓRIO A..., LIMITED, com sede em ..., intentou no T.A.C. de LISBOA um processo cautelar contra INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP (Infarmed), e o MINISTÉRIO DA ECONOMIA E INOVAÇÃO (MEL), indicando como contra-interessada TEVA PHARMA - PRODUTOS FARMACÊUTICOS, LDA, (Teva) Pedindo - a suspensão de eficácia dos actos de autorização de introdução no mercado (AIM) concedidos pelo Infarmed à contra-interessada durante o período de vigência da patente e respectivo CCP 155, que termina em 22 de Fevereiro de 2017 (salvo em caso de prorrogação do CCP 155, em que termina na data indicada na prorrogação) - não abrangendo tal suspensão os actos preparatórios do lançamento no mercado dos medicamentos em causa desde que a eficácia dos mesmos actos fique diferida para o termo da vigência daquela patente e CCP 155 -, sendo para os medicamentos a seguir indicados: - Olmesartan Medoxomilo Teva (10 mg) comprimidos revestidos por película; - Olmesartan Medoxomilo Teva (20 mg) comprimidos revestidos por película; - Olmesartan Medoxomilo Teva (40 mg) comprimidos revestidos por película, sob as designações acima indicadas ou quaisquer que venham a ser as designações destes medicamentos no futuro, incluindo-se a menção de tal suspensão no respectivo website www.infarmed.pt; - a intimação do Infarmed a não autorizar ou não realizar a transferência da titularidade das AIMs concedidas à contra-interessada - da patente e, do CCP 155, que termina em 22 de Fevereiro de 2017, relativamente aos mesmos produtos; - a intimação da DGAE, na pessoa do MEI, a abster-se de, enquanto a patente EP 503 785 e a extensão do seu âmbito de protecção garantida pelo CCP 155 estiverem em vigor, fixar os PVP requeridos ou na iminência de serem requeridos pela contra-interessada, suspendendo o respectivo procedimentos administrativo ou a abster-se de fixar tais preços sem que essa fixação fique condicionada a apenas entrar em vigor na data em que a Patente e CCP 155 caducarem, em 22 de Fevereiro de 2017 (salvo em caso de prorrogação do CCP, em que termina na data indicada na prorrogação), relativamente aos seguintes medicamentos: - Olmesartan Medoxomilo Teva (10 mg) comprimidos revestidos por película; - Olmesartan Medoxomilo Teva (20 mg) comprimidos revestidos por película; - Olmesartan Medoxomilo Teva (40 mg) comprimidos revestidos por película, sob as designações acima indicadas ou quaisquer que venham a ser as designações destes medicamentos no futuro, incluindo-se a menção de tal suspensão no respectivo website www.infarmed.pt.

Após os articulados, o TAC recorrido decidiu julgar os pedidos improcedentes.

Inconformada, a requerente deduz o presente recurso de apelação, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: 1. Tal como resulta dos factos dados como provados, é inquestionável que a Recorrente é titular da patente EP 503 785 e do CCP 155 e que esta Patente e CCP 155 protegem a substância activa Olmesartan Medoxornil, cujos efeitos, nos termos do CCP 155, só caducarão em 22.02.2017.

  1. O INF ARMED concedeu à Contra-Interessada autorizações para introduzir no mercado medicamentos genéricos contendo como princípio activo o Olmesartan Medoxornil.

  2. Resulta dos factos dados como provados e, em particular, do facto de os direitos de propriedade industrial da Recorrente se manterem válidos até 2017, que as AIMs pedidas e obtidas pela Contra-Interessada visam a infracção desses direitos.

  3. A Patente e o CCP 115 conferem ao seu titular o direito exclusivo de explorar a invenção em qualquer parte do território português, o qual se traduz no de impedir que terceiros, sem o seu consentimento, fabriquem, ofereçam, armazenem, introduzam no comércio, importem, vendam, ou utilizem o produto dela objecto nos termos constantes das reivindicações (artigos 101.0 e 32.0 n," 4 do CPI).

  4. O direito de exclusivo emergente da titularidade de uma patente goza das garantias estabelecidas para a propriedade em geral, nos termos do artigo 316.0 do CPI.

  5. Tal como o direito de propriedade privada em geral - e contrariamente ao que foi decidido na decisão recorrida - , é-lhe atribuída específica protecção constitucional, como direito fundamental tendo a natureza de "direitos, liberdades e garantias", beneficiando, assim, do regime constitucional que a estes é aplicável, conforme resulta do art.," 17.0 da Constituição.

  6. Os DPI não podem ser comprimidos em nome do interesse público, em particular, de um interesse financeiro, se tal limitação não for autorizada por lei, o que não acontece no presente caso.

  7. Uma vez que o acto que concede uma AIM de um medicamento é um acto administrativo cujo objecto é o de permitir a actividade de comercialização desse medicamento no território nacional, uma actividade que de outra maneira seria proibida, e, uma vez que resulta também um imposição sobre o titular da AIM: de um dever de realizar precisamente essa actividade, é ilegal, na medida em que viola o princípio da legalidade, i.e., o chamado bloco de legalidade.

  8. O princípio da legalidade contém um comando de obediência à Lei e ao Direito, ou seja, uma total conformidade não só com as leis e os princípios jurídicos que disciplinam especificamente uma certa conduta da Administração, mas também aqueles que constituem todo o ordenamento jurídico.

  9. A ausência dessa conformidade constitui infracção ao ordenamento jurídico e tem como consequência a invalidade da actividade administrativa.

  10. A referência aos DP} no Estatuto do Medicamento não pode ter outro propósito senão o de alertar para a importância desses direitos serem salvaguardados pelo INF ARMED e pelos titulares de AIM.

  11. O Código Comunitário não só não é indiferente à protecção dos DPI, mas prevê a necessidade de os proteger.

  12. A causa de invalidade das AIM sustentada pela Recorrente na acção principal e aqui reproduzida é a natureza ilegal do objecto das autorizações concedidas pelo INF ARMED, por ofender direitos fundamentais e, por constitui uma actividade criminal, e não por constituir uma violação directa da Patente e do CCP 155 ou qualquer dever de investigação do INF ARMED durante a fase de instrução do procedimento de concessão das AIM.

  13. A concessão dos PVPs aos Genéricos Olmesartan também é e seria ilegal nos termos descritos relativamente aos actos de AIM.

  14. O fumus bonus juris existe, nos presentes autos, no seu grau mais elevado, tendo o tribunal a quo considerado o contrário apenas porque fez erradas assumpções e não identificou correctamente a questão jurídica em discussão nos presentes autos.

  15. A questão jurídica que aqui se coloca, é a de saber se, um acto administrativo que concede uma autorização de comercialização de um produto que irá violar uma patente válida e em vigor, é inválido porque ilegal e, por isso, deve ser anulado pelo tribunal, se for concedido pelo INF ARMED- e não, contrariamente ao afirmado pela decisão recorrida, a de saber se o INF ARMED seria capaz de facilmente determinar se os medicamentos em causa violam a Patente e o CCP 115.

  16. Se o tribunal a quo tivesse correctamente identificado a questão legal em discussão, teria concluído, como alegado pela Recorrente no Requerimento Inicial, que as AIMs impugnadas deveriam ser declaradas nulas ao abrigo dos artigos 135.° e 133.°, n." 2 c) e d) do CPA e o MEI condenado a abster-se de emitir os PVPs, uma vez que levantam barreiras administrativas referentes à exploração, pela Contra Interessada, de um produto protegido pela Patente e CCP 115, cuja consequência será permitir a violação de disposições constitucionais (artigos 62.° e 266.° da Constituição), que visam a protecção de um direito fundamental, aí violado, sendo o seu único efeito útil a viabilização de uma prática criminosa por terceiros.

  17. A natureza desses direitos como direitos fundamentais de natureza análoga a "direitos, liberdades e garantias" tem sido pacificamente aceite pela doutrina citada no presente recurso e sistematicamente confirmada pela jurisprudência do Tribunal Central Administrativo Sul.

  18. Consequentemente, a procedência do pedido da Recorrente na acção principal quanto à ilegalidade dos actos impugnados é óbvia, nos termos do artigo 120 n."! a) do CPTA e assim o requisito do fumus bani juris deve considerar-se preenchido.

  19. E se, por qualquer razão, o que apenas se admite sem conceder, este Tribunal de Recurso não considerar que as alegadas ilegalidades são óbvias, deverá pelo menos considerar que não é evidente que a pretensão da Recorrente na acção principal relativamente às ilegalidades das AIMs impugnadas seja infundada, nos termos do artigo 120° n," 1 b) do CPTA, estando, assim, preenchido o requisito do fumus non malus iuris.

  20. O principal objectivo das providências cautelares é garantir a utilidade efectiva da sentença a proferir na acção principal, em linha com o claro dispositivo do n." 1 do artigo 112.° n." 1 do CPTA, sendo o risco primordial a evitar no quadro das providências cautelares o do facto consumado, isto é, o da decisão na acção principal se tomar absolutamente inútil.

  21. Apenas se esse risco não existir dever ser considerado o " dano de difícil reparação".

  22. A concessão dos actos administrativos que a acção principal pretende anular prova que a iminente comercialização dos Genéricos Olmesartan Medoxornil resulta numa situação de facto consumado que tomará a acção absolutamente inútil, tomando imperativo e urgente o decretamento das medidas cautelares adequadas a assegurar a utilidade da decisão da acção principal.

  23. Mesmo que assim se não entenda, o não decretamento desta providência causará danos imateriais e materiais importantes e de reparação difícil ou mesmo impossível.

  24. A comercialização dos Genéricos Olmesartan Medoxornil irá, desde logo, implicar que a Recorrente fique, contra a sua vontade, privada do uso e fruição do exclusivo que constitui o conteúdo essencial do direito de propriedade...

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