Acórdão nº 02837/06.8BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Agosto de 2007

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução13 de Agosto de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO MINISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E ENSINO SUPERIOR (abreviadamente MCTES) e MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (abreviadamente ME), devidamente identificados nos autos, inconformados vieram, cada um, interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 28/02/2007, que deferiu o pedido de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias que havia sido deduzido por F… mediante representação dos seus progenitores M… e A…, identificados igualmente nos autos, e, consequentemente, intimou “… 1.ª entidade requerida (Ministério da Educação) a possibilitar à filha dos requerentes a realização de novo exame na disciplina de Química (código 642), no prazo máximo de 15 dias úteis a contar da notificação da sentença …” e “… 2.ª entidade requerida (Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior) a proceder à criação de uma vaga adicional num dos cursos de medicina a que a filha dos requerentes se candidatou (pela ordem de preferência indicada na candidatura) e a nela colocar a F… desde que esta obtenha, em função da classificação obtida no segundo exame de química realizado, nota de candidatura igual ou superior ao último candidato a esse curso e estabelecimento de ensino na 1.ª fase do concurso nacional de acesso ao ensino superior em 2006 …”.

Formula o 1.º recorrente jurisdicional (“MCTES”), nas respectivas alegações (cfr. fls. 371 e segs.

- paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. Nem o Decreto-Lei n.º 147-A/2006 de 31 de Julho nem o Despacho do Senhor Secretário de Estado da Educação n.º 16078-A/2006 de 1 de Agosto de 2006 foram geradores de restrição de direitos, liberdades ou garantias; b) Privilegiaram-se os factores de segurança e pressupostos de igualdade jurídica, restabelecendo-se a igualdade de oportunidades entre os candidatos da 1.ª fase, desprotegidos dos seus direitos por factores externos, criados pelo próprio Estado e que lhes não eram de forma alguma imputáveis, relativamente aos da 2.ª fase, em nada afectando ou minorando os restabelecendo-se a igualdade de oportunidades entre os candidatos da 1.ª fase, desprotegidos dos seus direitos por factores externos, criados pelo próprio Estado e que lhes não eram de forma alguma imputáveis, relativamente aos da 2.ª fase, em nada afectando ou minorando os direitos destes últimos.

  2. A retroactividade terá o beneplácito constitucional sempre que razões de interesse geral ou de conformação social, como foi o caso, a reclamem …”.

Formula o 2.º recorrente jurisdicional (“ME”), nas respectivas alegações (cfr. fls. 382 e segs. e correcção de fls. 645 e segs.

), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

A - A forma processual utilizada é inidónea para efeitos de tutela das pretensões jurídicas da recorrida, porquanto não estamos em presença de direitos, liberdades ou garantias, nem tão pouco de direitos de natureza análoga.

Sem conceder, e ainda que se entenda que estamos perante um direito de natureza análoga, o certo é que: B - O Decreto-Lei n.º 147-A/2006, de 31 de Julho, e o subsequente Despacho n.º 16078-A/2006, de 2 de Agosto, não são restritivos de direitos, liberdades e garantias.

C - Nestes termos, não lhes é aplicável a proibição de terem efeito retroactivo, como previsto no artigo 18.º, n.º 3, da CRP.

D - A adopção destas medidas legislativas, não pôs em causa os princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica, corolários de um Estado de Direito, visando-se precisamente garantir o princípio da igualdade e do acesso ao ensino superior em igualdade de oportunidades relativamente aos alunos que realizaram o exame de Química (código 642) na 1.ª fase (que foram prejudicados gravemente pelas circunstâncias excepcionais identificadas no Despacho n.º 16078-A/2006, de 2 de Agosto, e que manifestamente não lhes eram imputáveis), relativamente aos alunos que realizaram este exame na 2.ª fase, em nada afectando ou diminuindo os direitos destes últimos.

E - Assim sendo, considera-se que também não foram violados os artigos 2.º, 13.º, 74.º, n.º1, e 76.º, n.º 1, da CRP.

F - A douta Sentença recorrida, ao decidir nos termos do entendimento nela perfilhado, é que ofendeu o estatuído nos artigos 18.º, n.º 3, 2.º, 13.º, 74.º, n.º 1, e 76.º, n.º 1, da CRP …”.

A ora recorrida/(legais representantes) apresentou contra-alegações (cfr. fls. 502 e segs.

) nas quais pugna, por um lado, pela inadmissibilidade do recurso do “MCTES” (falta juízo de censura sobre a decisão judicial recorrida em infracção art. 690.º do CPC) e pela rejeição do recurso do “ME” (ilegitimidade do recorrente jurisdicional Secretário de Estado da Educação - abreviadamente “SEE”) e, por outro, pela improcedência de ambos os recursos e manutenção da decisão judicial recorrida, não formulando, contudo, quaisquer conclusões.

A Mm.ª Juiz “a quo” proferiu despacho a determinar a regularização das alegações produzidas por parte do “Secretário de Estado da Educação” (cfr. fls. 637/638 dos autos) de molde a que nelas figure como recorrente o “ME” e não aquele, despacho esse que não mereceu qualquer impugnação (cfr. fls. 640 e segs.

), tendo o referido recorrente dado satisfação ao ali ordenado através da peça processual inserta a fls. 643 e segs. dos autos.

O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto nos arts. 146.º e 147.º ambos do CPTA veio emitir pronúncia no sentido da improcedência de ambos os recursos jurisdicionais (cfr. fls. 796/801), posicionamento esse que, após contraditório, não mereceu qualquer resposta das partes (cfr. fls. 802 e segs.

).

Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1, al. d) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos recorrentes, e das questões prévias suscitadas pela recorrida/legais representantes que não se mostrem já precludidas, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recurso de ‘revisão’” (cfr. Prof. J. C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 8ª edição, págs. 459 e segs.; Prof. M. Aroso de Almeida e Juiz Cons. C. A. Fernandes Cadilha in: “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, pág. 737, nota 1; Dr.ª Catarina Sarmento e Castro em “Organização e competência dos tribunais administrativos” - “Reforma da Justiça Administrativa” – in: “Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra - Stvdia ivridica 86”, págs. 69/71).

    As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar: I) Das questões prévias da: a) Falta de objecto do recurso jurisdicional deduzido pelo “MCTES”; b) Ilegitimidade activa para dedução do recurso jurisdicional por parte do Secretário de Estado da Educação; II) Se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento quando considerou improcedente a excepção de inidoneidade do meio processual empregue suscitada pelo “ME”, fazendo indevida aplicação do regime decorrente do art. 109.º do CPTA [cfr. conclusão a) do recurso jurisdicional do Ministério da Educação]; III) Se a mesma decisão judicial ao julgar procedente a pretensão da aqui recorrida/legais representantes incorreu em erro de julgamento infringindo o preceituado nos arts. 02.º, 13.º, 18.º, n.º 3, 74.º, n.º 1 e 76.º, n.º 1 da CRP - fundamento material de ambos os recursos jurisdicionais [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].

    Note-se que a questão/pretensão da suspensão de instância suscitada pelo “ME” a fls. 772 e segs. dos autos mostra-se prejudicada quanto ao seu conhecimento porquanto a mesma foi já indeferida por despacho de fls. 786, despacho esse que não mereceu qualquer impugnação.

  2. FUNDAMENTOS 3.1.

    DE FACTO Resultou apurada da decisão judicial recorrida a seguinte factualidade: I) A …, F…, terminou o ensino secundário do Curso Geral do 1.º Agrupamento (área científica) com a média final de 18 valores (183 pontos para efeitos de acesso) e realizou os exames de âmbito nacional nas disciplinas terminais do 12.° ano de escolaridade (equivalentes a provas de ingresso para acesso ao ensino superior público) tendo decidido repartir a realização desses exames finais pelas duas fases, de molde a garantir mais tempo para estudo nas disciplinas conducentes ao ingresso no curso de Medicina.

    II) De acordo com essa sua programação, realizou a prova de Biologia na 1.ª fase, onde obteve a classificação de 181 pontos (na escala de 0 a 200), a prova de Português, onde obteve a classificação de 179 pontos (de 0 a 200) e a prova de Química na 2.ª fase, obteve a classificação de 140 pontos (de 0 a 200), o que lhe permitiu a candidatura ao ensino superior na 1.ª fase de candidaturas, tendo-lhe sido atribuído o número de candidatura 4006; III) Em 13/07/2006, o Secretário de Estado da Educação - SEE de ora em diante - proferiu o Despacho Interno n.º 2 com o seguinte teor: “Tendo em conta que os resultados da 1.ª fase dos exames nacionais relativos aos novos programas de Química (código 642) e de física (código 615) evidenciam um valor médio relativamente baixo e muito inferior ao verificado no ano passado bem como ao verificado este ano nas provas relativas ao programa...

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