Acórdão nº 01699/07 de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Abril de 2007

Magistrado ResponsávelJOSÉ CORREIA
Data da Resolução24 de Abril de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam nesta Secção do Contencioso do Tribunal Central Administrativo Sul: I-RELATÓRIO I - M..., com os sinais identificadores dos autos, impugnou judicialmente a liquidação de IRS relativo ao ano de 2001.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa indeferiu liminarmente a petição inicial com fundamento na caducidade do direito de impugnação.

Inconformado com tal decisão, o impugnante interpôs o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: 1a - A sentença ora recorrida, que rejeitou liminarmente a impugnação judicial da liquidação de IRS em causa nos presentes autos, é nula por configurar uma verdadeira decisão surpresa.

2a - Os art e 266° ambos do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi a alínea e) do art. 2° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, impõem ao tribunal que convide as partes a exercer o contraditório e a pronunciarem-se sobre qualquer questão de facto ou de direito pertinente para a decisão da causa.

  1. - O ora recorrente alegou expressamente no art. 4° da petição inicial que só havia sido notificado da liquidação em crise no dia 3 de Janeiro de 2006, apresentando disso mesmo documento comprovativo.

4a - O tribunal recorrido ignorou absolutamente tal facto e desconsiderou os elementos carreados para o processo.

5a - Independentemente dos prazos apostos nas notas de cobrança pelas autoridades administrativas, o prazo voluntário para liquidação dos tributos só começa a contar-se depois de válida notificação.

6a - Quanto ao IRS, esse prazo é de 30 dias corridos, nos termos conjugados dos arts. 102° e do art. 140° do respectivo código.

7a - No presente caso, o prazo para pagamento voluntário da liquidação em crise terminou no dia 2 de Fevereiro de 2006, conforme se demonstra pela consulta do n.° do registo da liquidação no portal dos CTT.

8a - Por ser assim, nos termos do art. 102° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o primeiro dia do prazo de 90 dias fixado na lei verificou-se no dia 3 de Fevereiro de 2006.

9a - Impugna-se portanto o constante da alínea A) do probatório da sentença na parte em que refere um prazo de pagamento voluntário distinto.

10a - Consequentemente, os 90 dias concedidos pela lei esgotaram-se apenas no dia 3 de Maio de 2006, data da entrada da presente impugnação judicial cm juízo, pelo que a mesma é tempestiva.

Termos em que entende que deve o recurso merecer provimento, com todas as consequências legais, Não houve contra-alegações.

O EPGA emitiu o seguinte parecer: "Numa situação semelhante à dos autos, decidiu este tribunal: "O artigo 3° do CPC no seu n° 3 preceitua que «o juiz deve observar e fazer cumprir ao longo de todo o processo o principio do contraditório não lhe sendo lícito salvo caso de manifesta desnecessidade decidir questões de facto e de direito mesmo que de conhecimento oficioso sem que as partes tenham a possibilidade de sobre elas se pronunciarem Em princípio um caso de indeferimento liminar por intempestividade de propositura de acção é um daqueles casos em que nos parece ser manifestamente desnecessário ouvir as partes já que o autor tem perfeito conhecimento do que alegou e quando e o réu não chega a sofrer qualquer prejuízo com a absolvição da instância daí decorrente e no processado se não devem praticar actos desnecessários.

Mas isto que nos parece ser manifesto tem excepções como é o caso dos presentes autos (Acórdão 07060/02 de 2004.20.04.).

Isto é, uma vez que o autor alegou na petição inicial factos que obstariam à intempestividade na propositura da acção, não deveria ter sido proferido indeferimento liminar sem o ouvir.

Verificar-se-ia, pois, a nulidade a que o recorrente se reporta nas suas alegações.

Por outro lado, se bem que o documento de fls. 90 não faça prova plena de que o recorrente foi efectivamente notificado no dia três de Janeiro, à falta de outra prova, nomeadamente do "Aviso de Recepção", não se pode, prefunctoriamente afirmar que não foi notificado na data que o recorrente invoca. Consequentemente, o prazo de pagamento voluntário podia não ter sido o que se refere no despacho recorrido.

Torna-se, pois, necessário averiguar a data exacta em que o recorrente foi notificado. Pelo que somos de parecer que o recurso merece provimento." Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos.

* 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DOS FACTOS Na decisão recorrida fixou-se a seguinte tela factual, com a fundamentação que dela consta: A) O impugnante foi notificado da liquidação adicional de IRS n° 20055004480454, datada de 17-12-2005, relativa ao exercício de 2001, no montante de €1.164,77, com data limite de pagamento voluntário de 3O-1-2006 (cfr. documento de cobrança a fls. 36 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido); B) A petição inicial da presente impugnação judicial deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa via fax, ali recebido no dia 3-5-2006 (cfr. folha de rosto da petição inicial, a fls. 3 dos autos).

* 2.2. - DO DIREITO Atentas aquelas conclusões e a factualidade fixada e que se reputa a relevante, vejamos qual a sorte do recurso em que a questão a decidir é a de saber: A) -se a decisão recorrida é nula por configurar uma verdadeira decisão surpresa; B) -se deve ser admitido o documento junto com as alegações de recurso; C) -se a decisão a errou quando refere que a data limite de pagamento voluntário era a de 3O-1-2006 quando o prazo para pagamento voluntário da liquidação em crise terminou no dia 2 de Fevereiro de 2006, conforme pretende demonstrar o recorrente através da consulta do n.° do registo da liquidação no portal dos CTT, da qual resulta que, para os efeitos do art. 102° do Código de Procedimento c de Processo Tributário, o primeiro dia do prazo de 90 dias fixado na lei verificou-se no dia 3 de Fevereiro de 2006 e, assim, os 90 dias concedidos pela lei esgotaram-se apenas no dia 3 de Maio de 2006, data da entrada da presente impugnação judicial cm juízo, sendo a mesma é tempestiva.

Assim: a)- Da nulidade da decisão recorrida por configurar uma verdadeira decisão surpresa (conclusões 1ª 2ª): Para rejeitar liminarmente a impugnação fundamentou o Mº Juiz o seguinte: "Dispõe o artigo 102°, n° i do CPPT que «o. impugnação será apresentada no prazo de 90 dias contados a partir dos factos seguintes: a) Termo do prazo para pagamento voluntário das prestações legalmente notificadas ao contribuinte; (...)» O prazo de impugnação judicial é peremptório, substantivo ou de caducidade e de conhecimento oficioso, pois os direitos do Estado consubstanciados em actos tributários são direitos indisponíveis (vd. Cons. Jorge Lopes de Sousa, CPPT Anotado, Vislis, 2003, pág. 459).

Sendo prazo de caducidade, esta só é impedida pela prática, dentro do prazo legal, do acto a que a lei atribui efeito impeditivo daquela (artigos 298°, n° 2 e 331°, n° i do Código Civil), não valendo as regras relativas aos actos processuais, em que se inclui as dos n°s 5 e 6 do artigo 145° do CPC (vd. neste sentido, obra citada, pág. 181 e, entre outros, o Acórdão do STA, de 4-7-2001, Rec. 25789, in www.dgsi.pt).

O decurso do respectivo prazo de caducidade extingue o direito de impugnação judicial, devendo a respectiva petição inicial ser indeferida liminarmente com esse fundamento.

Quanto à forma de contagem deste prazo, há que atender ao disposto no n° 1 do artigo 20° do CPPT, remissivo para o artigo 279° do Código Civil.

Assim, o prazo para apresentação de impugnação judicial é contínuo, correndo seguidamente, sem qualquer interrupção ou suspensão, transferindo-se para o primeiro dia útil subsequente, quando termine em Domingo, dia feriado ou férias judiciais.

Como resulta da matéria de facto provada, o termo do prazo para pagamento voluntário da liquidação objecto da presente impugnação ocorreu em 30-1-2006 (cfr. alínea A) do probatório).

Contados 90 dias para deduzir a impugnação judicial, nos termos atrás expostos, aquele prazo terminou em 2-5-2006, pelo que, tendo o impugnante apresentado a petição inicial de impugnação em 3-5-2006,a mesma é intempestiva." Veio o recorrente arguir a nulidade desse despacho liminar de rejeição com fundamento em que, em violação dos art e 266° ambos do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi a alínea e) do art. 2° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que impõem ao tribunal que convide as partes a exercer o contraditório e a pronunciarem-se sobre qualquer questão de facto ou de direito pertinente para a decisão da causa, não foi notificado para se pronunciar sobre a intempestividade da impugnação, pelo que a decisão terá sido proferida com preterição da audição do recorrente, do contraditório e do fair trial, existindo "decisão surpresa".

Ora, é manifesto que o despacho recorrido decidiu fundado em excepção peremptória, e é verdade que a mesma foi verificada oficiosamente, sem que ao recorrente fosse dada oportunidade de sobre ela se pronunciar.

O artigo 3°, n° 3, do Código de Processo Civil é plenamente aplicável em processo judicial tributário e tem como finalidade declarada evitar, proibindo-as, as denominadas decisões - surpresa, sendo que o despacho recorrido constitui, precisamente, uma decisão - surpresa.

Assim, caso não seja dada possibilidade ao Recorrente de se pronunciar sobre um facto decisivo para a decisão recorrida, o despacho em...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT