Acórdão nº 00024/03 de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Setembro de 2006

Magistrado ResponsávelEUGÉNIO SEQUEIRA
Data da Resolução12 de Setembro de 2006
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul: A. O Relatório.

  1. F... - Comércio Horto-Frutícola, Lda, identificada nos autos, dizendo-se inconformada com a sentença proferida pelo M. Juiz do então Tribunal Tributário de 1.ª Instância de Leiria que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem: A. Na douta sentença recorrida, partindo dos factos julgados provados, e do disposto no artigos 92.º n.º 1 e 86.º n.º 4, extraiu o M. o Juiz a quo a conclusão de que o perito indicado pelo contribuinte é o seu representante e a conclusão de que o acordo alcançado vincula os intervenientes.

    1. Ora, o artigo 16.º n.º 1 da LGT refere que "os actos em matéria tributária praticados pelo representante em nome do representado produzem efeitos na esfera jurídica deste, nos limites dos poderes de representação que lhe forem conferidos por lei ou por mandato." C. Ora, um perito não é legalmente um representante. É efectivamente indicado pelo contribuinte. Porém, nem este nem ninguém o designa como representante legal (SIC), pelo que não poderá ser considerado juridicamente como mandatário, e muito menos como um mandatário com poderes de renúncia ao direito de impugnar. Na verdade não está munido de qualquer mandato para tal.

    2. Por isso mesmo, afirmam Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, na sua LGT anotada e comentada em anotação ao artigo 92.º o seguinte: "o sujeito passivo, que não intervém na elaboração do acordo, não está vinculado pelo acordo referido, que poderá impugnar com fundamento em qualquer ilegalidade." E. Ora, a Recorrente não tomou parte no acordo pelo que podia e pode impugná-lo com base em qualquer ilegalidade.

    3. Negar essa possibilidade ofende directamente o disposto nos artigos 18.º e 20.º da Constituição da República Portuguesa pois que tal equivale a denegar à Recorrente o seu direito fundamental de acesso à justiça aos tribunais e a uma tutela efectiva dos seus direitos, direito que não pode ser em qualquer caso restringido.

    4. Se bastasse um simples acordo entre peritos para deitar por terra tudo o mais que no processo se passou, e se o mesmo acordo inviabilizasse qualquer hipótese de impugnação, então nem seria necessária fundamentação, contrariamente ao que a LGT exige no artigo 92.º n.º 4, o que não faz qualquer sentido.

    5. Por isso mesmo, afirmam os mesmos autores acima citados que: "A falta de fundamentação, (...) poderá constituir igualmente fundamento de impugnação por parte do sujeito passivo, já que consubstancia uma ilegalidade susceptível de conduzir à sua anulação." I. Foi o que sucedeu, no caso em apreço - como se constata na p.i. - já que a acta do acordo não fundamenta nem o índice acordado, nem tão pouco a ocorrência do próprio debate contraditório que, de resto nunca existiu.

    6. A LGT apenas prevê que o acordo entre peritos seja vinculativo para a Administração Tributária - cfr. artigo 92.º n.º 5- o que leva a considerar o acordo como não vinculativo para o contribuinte, nomeadamente em sede de recurso.

    7. Em face do exposto é evidente que o artigo 86.º n.º 4. da LGT só pode ser interpretado como restritivo do direito de impugnar nos casos em que o impugnante tenha tomado parte no acordo, o que não sucedeu no caso.

      L. Ainda que assim não se entendesse, o que por mero dever de patrocínio se admite sem, obviamente se conceder, a mesma disposição, no limite, só poderia ser interpretada no sentido de que apenas não poderiam, na impugnação, ser assacados vícios resultantes de erro na quantificação.

    8. Nunca, em qualquer caso, a mesma norma poderá ser interpretada no sentido de, não permitir a impugnação com base em outros vícios como sejam a falta de verificação dos pressupostos de aplicabilidade de métodos indirectos ou a falta, insuficiência ou obscuridade da fundamentação, vícios esses que foram efectivamente invocados na p.i. (Francisco Sousa da Câmara in "problemas fundamentais do Direito Tributário" Vislis 1999 pág. 374 em nota de rodapé n.º 85).

    9. Ora, ao não abordar sequer estas matérias, a douta sentença recorrida é nula atendo o disposto no artigo 125.º n.º 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário.

    10. Acresce ainda salientar que um contribuinte só renuncia ao direito ao recurso se fizer declaração expressa nesse sentido ou se subscrever instrumento formal com essa declaração (artigo 96.º da LGT).

    11. O direito ao recurso contencioso é uma garantia judicial, constituindo uma garantia fundamental de natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias, não podendo ser restringida no seu exercício, sobretudo quando estão em causa meras presunções de renúncia.

    12. Em sede de crítica e no que respeita à matéria de facto apurada não se pode admitir que o M. o Juiz a quo dê por provado que "a impugnante foi notificada para exercer o direito de audição, o que foi devidamente ponderado no relatório de inspecção tributária", pois que, salvo o devido respeito, não vislumbra a Recorrente como se ter dado tal facto por provado tendo em conta que no relatório de inspecção, como a Recorrente referiu nos artigos 60.º a 65.º da p.i., o Fisco respondeu de modo obscuro e mesmo truculento, sendo certo que sobre esta matéria não foram ouvidas testemunhas nem existe uma única linha na douta sentença recorrida destinada a rebater a posição da Recorrente.

    13. Trata-se de matéria que não foi sequer abordada na sentença, o que constitui nulidade da mesma igualmente como se dispõe no artigo 125.º do CPPT.

    14. Não se vislumbra como possa o M. o Juiz a quo ter dado expressamente por não provado - sendo certo que isso teria tido interesse para a boa e justa decisão da causa - que não tenha havido qualquer debate contraditório no âmbito do procedimento de revisão para mais não tendo sequer ouvido as testemunhas arroladas.

    15. Salvo o devido respeito, ao caso importava apurar a veracidade ou não dos factos articulados nos artigos 88.º, 89.º, 90.º, 96.º, 99.º, 100.º, 104.º, e 106.º da p.i. pois que ali se explicou e fundamentadamente os factos e os motivos por que se entende que não houve um debate contraditório.

    16. Acresce que é no mínimo obscuro, por contraditório, que se tenha dado por não provado que não tenha havido qualquer debate contraditório no âmbito do procedimento de revisão, quando, ao mesmo tempo, se dá por provado todo o teor da acta da reunião de peritos resultando desta que, por imposição do perito do Fisco, que é quem nos termos da lei dirige o procedimento, foi excluído da discussão por alegada impossibilidade legal aquilatar da legalidade e justeza do recurso no caso aos métodos indirectos.

      V. Com efeito, como resulta do segundo parágrafo da acta "não obstante terem sido levantadas pelo perito do contribuinte a questão dos pressupostos da aplicação dos métodos indirectos e as correcções técnicas efectuadas, definiu-se por impossibilidade legal que as discussões deste assunto estão fora do âmbito desta comissão".

    17. Do exposto resulta uma vez mais que o próprio pressuposto e legalidade da aplicação de métodos indirectos não foi nunca discutido.

      X. Mais. Resulta claramente demonstrado que não podia ter sido dado por provado o ponto 2 da matéria assente já que não se pode em verdade dizer que tenha sido proposto e aceite a quantificação da matéria tributável com recurso a métodos indirectos. Esse facto apenas será verdadeiro na medida em que se reporte apenas aos serviços da administração fiscal já que a Recorrente nunca aceitou a aplicação de métodos indirectos, desconhecendo a mesma o alcance que lhe pretendeu dar o M. o Juiz a quo.

    18. Ora, salvo o devido respeito, a ausência de discussão dos pressupostos da aplicabilidade dos métodos indirectos, é muito relevante no caso em apreço já que no limite, e a ser confirmada a douta sentença recorrida, será retirada a possibilidade à Recorrente de ver sindicado pelo tribunal um grave erro de facto e de direito que em circunstância alguma se pode dizer que tenha sido objecto de acordo.

    19. Outro facto importante que importava discutir e provar para sustentação da tese perfilhada na douta decisão recorrida - e para mais tendo em conta o supra referido a respeito dos poderes e funções dos peritos - é o de saber se a perita nomeada pela ora Recorrente estava devidamente mandatada, e se tinha poderes bastantes para a vincular a um acordo sem que fosse necessária a presença de um representante legal, e bem assim, para renunciar em nome da ora Recorrente ao poder de impugnar e se tinha conhecimento de que os seus actos implicavam uma renúncia ao direito de impugnar.

      AA. Por fim, seria necessário que o M. o Juiz a quo se pronunciasse sobre a legalidade ou não da posição do perito da Administração Fiscal ao ter excluído da discussão a apreciação dos pressupostos designadamente à...

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