Acórdão nº 00411/04 de Tribunal Central Administrativo Sul, 31 de Março de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelCristina dos Santos
Data da Resolução31 de Março de 2005
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Carlos ......, com os sinais nos autos, inconformado com a sentença cautelar proferida pelo Mmo. Juiz do tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra dela vem recorrer, concluindo como segue: 1. Determina o artigo 120.º do CPTA, n.° 1, al. a) e b), que a providência requerida é adoptada a) quando seja evidente a procedência da pretensão a formular no processo principal, designadamente por estar em causa a impugnação de acto manifestamente ilegal e/ou b) quando haja fundado receio da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão a formular nesse processo; Da manifesta ilegalidade do acto 2. Ora, na presente providência cautelar, foi indicada a manifesta ilegalidade do acto, reportando-se nomeadamente ao relatório da Instrutora do Processo Disciplinar, mediante diversos argumentos que o Recorrente se escusa a repetir.

  1. Sucede que o Tribunal recorrido não julgou evidente a manifesta ilegalidade do acto, fundamentalmente "na medida em que na deliberação Impugnada foram feitas apreciações sobre cada um dos factos constantes da nota de culpa, e confrontados com a defesa apresentada pelo requerente, concluindo a Instrutora, e a deliberação suspensa, que perante os factos provados, a sanção a aplicar era de pena de inactividade de um ano pela sua gravidade, nos termos do art. 25.º do E.D." 4. Porém, quanto à manifesta ilegalidade do acto, a autoridade administrativa apenas se pronunciou sobre a resposta à Nota de Culpa (uma vez que se limitou nesta matéria a transcrever o relatório) e já não aos argumentos aduzidos em sede de recurso, apesar de semelhantes.

  2. Conclui-se que não só a autoridade administrativa não impugnou os factos invocados pelo Recorrente, como também o Tribunal os não apreciou, pois limitou-se a invocar que lhes foi dada resposta - o que não aconteceu, e ainda que tivesse acontecido implicaria sempre uma apreciação, ainda que perfunctória ou preliminar, do mérito da contestação.

  3. Assim, a sentença recorrida é nula por ausência de fundamentação (art, 668.°, n.° 1, al. b) do CPC), devendo a questão ser apreciada em sede de recurso, com os fundamentos já arguidos, e com os que se seguem, nos termos do art. 149.°, n.° 1 do CPTA.

    Da inconstitucionalidade do acto 7. A deliberação subjacente aos presentes autos, na parte em que aplica ao Recorrente a pena de inactividade graduada em um ano substituída pela perda da pensão por igual tempo, conforme é referido no Parecer AJ/UTL/16/2004 da Assessoria Jurídica da Reitoria, baseia-se no disposto no artigo 15.° do Estatuto Disciplinar que estabelece que "para os funcionários e agentes aposentados as penas de suspensão ou inactividade serão substituídas pela perda da pensão por igual tempo" 8. Ora, a aplicação da perda de pensão nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 15.° do Estatuto Disciplinar é uma clara e insustentável violação do principio da dignidade humana contido no princípio do Estado de Direito, que resulta das disposições conjugadas dos artigos 1.°, 63.°, n.° 1 e 3 e 72.°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP).

  4. Com efeito, a CRP, no seu artigo 63.°, n.° 1, consagra como direito fundamental o direito à segurança social, referindo no n.6 3 da mesma disposição que "o sistema de segurança social protege os cidadãos na doença, velhice, invalidez, viuvez e orfandade, bem como no desemprego e em todas es outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho" (realçado nosso), "tratando-se, como se trata, dos mais elementares direitos à sobrevivência" (J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.' edição revista, pág, 63; realçado nosso).

  5. Aliás, o respeito pelo direito fundamental à segurança social, em cumprimento do disposto na CRP, encontra variadas consagrações, tanto em legislação vária, como na jurisprudência do Tribunal Constitucional.

  6. Já estabelecia o artigo 45.° da Lei n.9 28/84, de 14 de Agosto, que "as prestações devidas pelas instituições de segurança social são impenhoráveis e intransmissíveis1', o artigo 68.º da Lei 17/2000, de 8 de Agosto, que "as prestações dos regimes de segurança social são parcialmente penhoráveis nos termos da lei gerar, o mesmo dispondo o artigo 73.° da Lei n,° 32/2002, de 20 de Dezembro, que se encontra actualmente em vigor.

  7. E o mesmo decorre do disposto no Código de Processo Civil, no que se refere à execução para pagamento de quantia certa. Com efeito, nos termos do artigo 824.°. n.° 1, alínea b), do CPC, são impenhoráveis "dois terços das prestações periódicas pagas a titulo de aposentação ou de outra qualquer regalia social, seguro, indemnização por acidente ou renda vitalícia, ou de quaisquer outras pensões de natureza semelhante", sendo que o juiz pode, nos termos do n.° 4 do artigo 824.° do CPC, isentar de penhora tais rendimentos, tendo em conta "essas necessidades do executado e do seu agregado familiar".

  8. Ou seja, entende o legislador do CPC que dois terços de tais rendimentos (nos quais se incluem as pensões por aposentação) até ao limite máximo de três salários mínimos correspondem ao estritamente necessário para garantir aos executados uma existência condigna, significando que, uma vez mais, o legislador teve a preocupação de salvaguardar o direito fundamental à segurança social eonstitucionalmente consagrado.

  9. E se, no âmbito dos processos de execução para pagamento de quantia certa, o CPC estabelece a referida impenhorabilidade é porque a Constituição a isso obriga. Ora, tal preocupação não foi atendida aquando da elaboração do artigo 15." do Estatuto Disciplinar, o que, além de inconstitucional, atenta contra os mais elementares ditames morais.

  10. Acresce que o respeito pelo direito fundamental à segurança social decorre igualmente da jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre esta matéria: o próprio artigo 63.° dá CRP 'poderá, desde logo, ser interpretado como garantindo a todo o cidadão a percepção de uma prestação proveniente do sistema de segurança social que lhe possibilite uma subsistência condigna em todas as situações de doença, velhice ou outras semelhantes. [...] Mas, ainda que não possa ver-se garantido no artigo 63º da Lei Fundamental um direito a um mínimo de sobrevivência, é seguro que este direito há-de extrair-se do principio da dignidade da pessoa humana, condensado no artigo 1.° da Constituição" (In Acórdãos do Tribunal Constitucional, 19.° volume, pág. 515), sendo que tal ideia já resultava igualmente do Acórdão n.° 232/91 do Tribunal Constitucional.

  11. Face ao exposto, conclui-se que a deliberação ora sindicada, ao aplicar ao Recorrente o disposto no artigo 15.° do Estatuto Disciplinar, e, em consequência, ao estabelecer a perda de pensão por um ano, coarcta, pelo referido período, um direito fundamental que a todos é garantido pela Constituição - não garantindo sequer ao Recorrente o mínimo dequado e necessário para uma existência condigna (ou até mesmo para a sua própria sobrevivência) - viola as normas constitucionais que se referem à tutela do valor supremo da dignidade da pessoa humana.

  12. Acresce que o artigo 72.°, n,° 1 da Constituição estabelece também que as pessoas idosas têm direito â segurança económica e a condições de habitação e convívio familiar e comunitário que respeitem a sua autonomia pessoal e evitem e superem o isolamento ou a marginalização social.

  13. Em decorrência da manifesta inconstitucionalídade do artigo 15,° do Estatuto Disciplinar, e tendo em conta o facto de a deliberação ora sindicada se basear no Parecer AJ/UTU16/2004 da Assessoria Jurídica da Reitoria, que aplica o artigo 15º do Estatuto Disciplinar, acolhendo o conteúdo do mesmo, aplicando ao Recorrente, enquanto aposentado, a pena de perda de pensão por um ano, em substituição da pena de inactividade graduada em um ano, a referida deliberação é nula, nos termos do disposto na alínea d) do artigo 133.° do Código do Procedimentos Administrativo, por ofender o conteúdo essencial de um direito fundamental.

    Da falta de quorum 19. Nos termos do disposto no artigo 28.°, alínea a), do Regimento do Senado (aprovado em 11 de Abril de 1991, com as alterações introduzidas na reunião do Senado de 26 de Outubro de 1995), e no n.° 2 do artigo 27.°, o exercício do poder disciplinar relativamente às infracções disciplinares praticadas por docentes é da competência de uma Subsecção da Secção dos Assuntos Disciplinares do Senado.

  14. Nos termos do n.* 3 do artigo 27.° do Regimento do Senado, "a subsecção a que incumbe a matéria disciplinar relativa a docentes e funcionários não docentes é composta pelos Presidentes dos Conselhos Directivos e pelos representantes de outros docentes e dos funcionários não docentes", sendo presidida, nos termos do n.° 4 da referida disposição, pelo Reitor, "podendo delegar no Vice-Reitor membro da Secção".

  15. Ou seja, e tendo em conta que a Universidade Técnica de Lisboa é composta por sete escolas (Faculdade de Medicina Veterinária, Instituto Superior de Agronomia, instituto Superior de Economia e Gestão, Instituto Superior Técnico, Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, Faculdade de Motricidade Humana e Faculdade de Arquitectura), e tendo ainda em conta o disposto nos números 1, 3 e 4 do artigo 27." do Regimento do Senado, concluímos que a subsecção responsável pela matéria disciplinar relativa a docentes é composta por 29 elementos, a saber: (i) pelo Reitor que preside à subsecção, nos termos do n.° 4 do artigo 27,° do Regimento do Senado, (M) pelos (sete) Presidentes dos Conselhos Directivos das Escolas que compõem a Universidade Técnica de Lisboa, nos termos do n,° 3 do artigo 27.° do Regimento do Senado, (iii) pelos (sete) representantes de outros docentes, nos termos dos n.°s 1 e 3 da referida disposição, (iv) e pelos (catorze) representantes dos funcionários não docentes, ainda nos termos dos n.°s 1 e 3 do...

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