Acórdão nº 6514/02 de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Novembro de 2002 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução05 de Novembro de 2002
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada "N.......S.A." (adiante Impugnante ou Recorrente) veio recorrer para este Tribunal Central Administrativo (TCA) da sentença proferida no Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa que julgou improcedente a impugnação por ela deduzida em 20 de Julho de 2000 contra a liquidação de emolumentos notariais na parte que lhe foi efectuada ao abrigo do art. 5.º da Tabela de Emolumentos Notariais (TEM), anexa ao Decreto-Lei (DL) n.º 397/83, de 2 de Novembro, do montante de esc. 12.393.800$00, pela celebração, em 30 de Dezembro de 1997, de uma escritura pública pela qual reduziu e depois aumentou o seu capital social.

1.2 Na petição inicial a Impugnante, alegou, em síntese, o seguinte: - que os emolumentos cuja liquidação impugna revestem a natureza de imposição sem carácter remuneratório, motivo por que são proibidos por força do disposto nos arts. 10.º e 12.º, n.º 1, alínea c), da Directiva n.º 69/335, de 17 de Julho de 1969, na redacção que lhe foi dada pela Directiva 85/303/CEE do Conselho, de 10 de Junho de 1985; - que «o prazo aplicável para a reclamação não pode deixar de ser o prazo geral da responsabilidade civil extracontratual, regulada nos artºs 483.º e segs. do Código Civil» (() As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, constituem transcrições.

), isto é, de três anos, nos termos do disposto art. 498.º do mesmo código.

Concluiu pedindo a restituição da quantia de esc. 12.393.800$00 e juros de mora contados à taxa legal sobre essa quantia desde a data do pagamento até integral restituição.

1.3 Na sentença recorrida julgou-se a impugnação improcedente com fundamento na intempestividade da mesma. Isto, em síntese, porque aí se considerou que - «Embora seja inquestionável que a sindicada liquidação de emolumentos notariais de 30.12.97 é ilegal, por violação das normas dos art. 10º e 12º, n.º 1 al. e) da Directiva 69/335/CEE», a violação daquelas normas comunitárias, como aliás a violação dos princípios constitucionais de justiça e da proporcionalidade, apenas «geram mera anulabilidade» do acto administrativo-tributário, ao qual «não se [...] aplicam as normas do art. 483º e ss. do CC», motivo por que a sua impugnação teria que ser apresentada no prazo de noventa dias a contar do termo do prazo para o pagamento voluntário, nos termos do disposto nos arts. 123.º, do Código de Processo Tributário (CPT), e 102.º, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT); - «Não há possibilidade de convolação da petição de impugnação para qualquer outro meio contencioso, uma vez que, esgotado o prazo de impugnação judicial e tendo sido efectuado o pagamento, o acesso aos meios contenciosos apenas seria possível na sequência de prévia decisão administrativa proferida em procedimento de revisão do acto tributário»; - «Por isso, tendo a impugnante sido deduzida para além do prazo de 90 dias a contar do termo do prazo de pagamento voluntário e não havendo incompatibilidade entre este prazo e o direito comunitário, ela tinha de ser considerada intempestiva, como foi, em consonância com o preceituado no art. 123º, n.º 1, al. a) do CPT».

1.4 O recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

1.5 A Recorrente alegou e formulou conclusões nos termos seguintes: « 1) O Tribunal ad quem pode entender que os emolumentos são nulos porque feridos de inconstitucionalidade e consequentemente, pode ser objecto de impugnação a todo o tempo, nos termos do disposto no artº 134º do CPA., quando muito limitado pelo prazo de prescrição estabelecido para as obrigações tributárias (artº 48º da LGT).

2) O Tribunal ad quem pode concluir que uma vez que os emolumentos são ilegais, o que já é pacífico na jurisprudência, a sua impugnação possa, pelo menos, ocorrer no prazo do CPPT para a acção de reconhecimento de um direito ou interesse legítimos em matéria tributária, constnate do artº 145º do CPPT, e que é de 4 anos.

3) O Tribunal ad quem pode igualmente suscitar o pedido de decisão prejudicial, ou aguardar pela decisão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, em matéria em tudo idêntica à dos autos, já suscitada por um tribunal português.

Termos em que deve a excepção de caducidade ser julgada improcedente, ou suspensa a instância, de forma a aguardar a decisão da questão prejudicial já suscitada junto do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias».

1.6 Não houve contra alegações.

1.7 Foi dada vista ao Ministério Público, que promoveu que os autos aguardassem a decisão da questão prejudicial referida nas alegações.

1.8 Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

1.9 As questões sob recurso, suscitadas e delimitadas pelas conclusões da Recorrente, são as seguintes: 1.ª - saber se o direito de impugnar o acto de liquidação dos emolumentos notariais já tinha caducado à data da interposição do processo de impugnação, apresentada para além do prazo de noventa dias previsto no art. 123.º do CPT (() Em vigor na data da liquidação - 30 de Dezembro de 1997 - e até 31 de Dezembro de 1999, tendo sido revogado a partir da entrada em vigor do Código de Procedimento e Processo Tributário, que ocorreu em 1 de Janeiro de 2000 (cfr. os arts. 2.º, n.º 1, e 4.º, do Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro, diploma que aprovou este código).

) e no art. 102.º do CPPT (() Já em vigor à data em que a petição inicial foi apresentada.

), o que passa por indagar: - se a eventual ilegalidade da liquidação por ter sido efectuada com base em normas inconstitucionais e violadoras de normas de direito comunitário acarreta a nulidade daquele acto, permitindo a sua impugnação a todo o tempo; - se a impugnação judicial pode ser apresentada dentro do prazo de quatro anos fixado pelo art. 145.º do CPPT para a acção para reconhecimento de um direito; 2.ª - saber se este TCA deve suscitar pedido de decisão prejudicial ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE) ou suspender a instância até que esteja decido o pedido «em matéria em tudo idêntica à dos autos», já formulado por outro Tribunal português.

*** 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO 2.1.1 A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos, que ora se reproduzem, fazendo constar entre parêntesis os respectivos elementos probatórios: a) A Impugnante celebrou, no dia 30 de Dezembro de 1997, no Primeiro Cartório Notarial de Lisboa, uma escritura pela qual procedeu à redução do capital social para mil milhões de escudos e, de seguida, ao aumento do mesmo capital de mil milhões de escudos para seis mil duzentos e cinquenta milhões de escudos (documento de fls. 66 a 85); b) Pela celebração da escritura pública referida na alínea anterior, a Impugnante pagou no Cartório Notarial em causa, em 30 de Dezembro de 1997 (() Em rigor, parece que o pagamento só foi efectuado em 5 de Janeiro de 1998 (cfr. n.º 2 da informação de fls. 95 a 103). No entanto, tal facto não vem posto em causa e, ademais, não assume qualquer relevo para a decisão a proferir.

), a quantia de esc. 12.408.500$00, sendo 12.393.800$00 de emolumentos fixos e variáveis, nos termos do disposto nos artigos 4.º e 5.º da Tabela de Emolumentos do Notariado (documentos de fls. 64 a 65 e 86 a 93); c) A impugnação foi instaurada no dia 20 de Julho 2000 (indicação manuscrita na petição inicial, a fls. 9).

2.1.2 Atento o disposto no art. 712.º do Código de Processo Civil (CPC), consideramos também provado o seguinte facto, com interesse para a decisão a proferir: d) Por despacho de 27 de Dezembro de 2001, proferido no processo de impugnação judicial com o n.º 152/2001 do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa, 3.º Juízo, 2.ª Secção, foi formulado pedido de decisão prejudicial ao TJCE sobre as seguintes questões: « 1. O direito comunitário obsta a que, para as acções de restituição de imposições cobradas em violação do direito comunitário, um Estado-Membro fixe um prazo de caducidade de 90 dias, contados do termo do prazo de pagamento voluntário, por dessa forma tornar excessivamente difícil o exercício do direito de reembolso ? 2. em caso afirmativo, qual o prazo mínimo que se entende compatível com aquela proibição de excesso de dificuldade? 3. ou quais os critérios a utilizar na sua fixação?» (documento de fls. 189 a 192 e 202 a 206).

2.2 DE FACTO E DE DIREITO 2.2.1 A PRIMEIRA QUESTÃO A DECIDIR: O REENVIO PREJUDICIAL A primeira questão que cumpriria apreciar seria a da caducidade do direito de impugnação.

No entanto, porque a Recorrente requereu a suspensão da instância, a fim de se aguardar pela decisão do TJCE sobre as questões que lhe foram colocadas, mediante reenvio prejudicial, «em matéria em tudo idêntica à dos autos» num outro processo de impugnação judicial, haveria que apreciar previamente se há ou não lugar ao referido reenvio, o que justificaria a suspensão da instância.

Note-se que há que averiguar se o reenvio se justifica no caso dos autos e, depois, se as questões a colocar ao TJCE lhe foram já colocadas no âmbito de outro processo.

Por uma questão de comodidade de exposição, embora tendo consciência da prioridade que logra esta questão do reenvio prejudicial, deixamo-la para final.

2.2.2 A CADUCIDADE DO DIREITO DE IMPUGNAR A LIQUIDAÇÃO 2.2.2.1 Na sentença recorrida, o Juiz do Tribunal de 1ª instância, considerando que a petição inicial foi apresentada para além do termo do prazo para a impugnação judicial - prazo esse que...

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