Acórdão nº 5153/01 de Tribunal Central Administrativo Sul, 23 de Abril de 2002

Magistrado ResponsávelGomes Correia
Data da Resolução23 de Abril de 2002
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

RELATÓRIO Acorda-se, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo: 1.- Os Recorrentes com os sinais dos autos, recorrem da sentença proferida pelo Mmº Juiz do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Setúbal que julgou improcedente a impugnação por eles deduzida contra a liquidação oficiosa de IRS dos anos de 1990, 1991 e 1992, terminando as suas alegações formulando as conclusões seguintes: I- O contrato de suprimentos é documento, autêntico, foi junto aos autos e não foi objecto de impugnação; II - Não consta na aludida sentença qualquer ponto 4. por isso não sabe a ora recorrente, se seria nesse ponto que estaria a resposta à questão formulada pelo Meritíssimo Juiz. Resposta esta, aliás, que, salvo o devido respeito e melhor opinião, deveria ter sido dada pela Administração Pública, pois só a ela competia fazer prova plena de que tais compras não eram reais, mas fictícias.

III - A testemunha G..., afirmou que o Senhor R..., pagou a mercadoria à vista, e a sociedade emitiu cheque para pagamento do IVA, pré - datado a 60 dias; IV - No ponto 4. l., 2° § da sentença, afirma-se que na contabilidade da ora recorrente não constam notas de encomenda, qualquer correspondência emitida ou recebida, recepção de mercadorias adquiridas, fichas de armazém com controle de movimentação de existências, ou documentos inerentes ao transporte de mercadorias.

V - Salvo o devido respeito e melhor opinião, as notas de encomenda a serem arquivadas não o seriam na contabilidade. Na contabilidade arquivam-se facturas e recibos.

VI-A correspondência recebida e expedida, igualmente não tem como local próprio de arquivo as pastas de contabilidade.

VII - O mesmo se diga em relação aos outros documentos que o Tribunal "a quo" encontra "em falta" na contabilidade da sociedade R..., Ldª.

VIII - Tais documentos não passam de indícios que careciam de confirmação por recurso a outros meios de prova. Nomeadamente, pela análise da estrutura de custos da ora recorrente, no sentido de averiguar se na respectiva contabilidade foram debitados os valores correspondentes às quantidades de cortiça adquiridas por esta forma, e mencionadas nas facturas/recibos.

IX - Os peritos da fiscalização tributária, tinham, como dever de ofício, proceder a uma análise contabilística da ora recorrente, no sentido de apurar se o volume de vendas foi coerente com o volume de compras, por exemplo.

X - Tinham, por dever de ofício, de proceder a uma aturada análise de custos de mercadorias consumidas e vendidas por comparação com as mercadorias adquiridas, e que constavam dos documentos próprios, isto é, as facturas e os recibos.

XI - Nada disso, porém, foi feito, e tal competia à Administração Pública, que, como é óbvio, também não provou nem podia provar, a tese que apresentou em Tribunal.

XII - Esta, limitou-se a produzir um relatório vago e impreciso em que se tecem considerações, opiniões e em que se tiram ilações que prejudicam a recorrente.

XIII - Dos elementos carreados para os autos e não impugnados pelo Digno Representante da Fazenda Pública, resulta que a Sociedade C..., Lda existe fisicamente, tendo, inclusivamente, um dos seus representantes legais sido notificado para uma das execuções que corre termos no Porto.

XIV - A existência física da C..., Ldª, encontra-se provada nos autos, por documento autêntico e não foi impugnado, logo terá forçosamente que produzir os efeitos que a lei lhe atribui.

XV- Igualmente, os documentos juntos de folhas 137 a 201, não foram objecto de impugnação, pelo que, forçosamente, terão que ser tidos em conta, como meio de prova, pois foi aceite pela contraparte.

XVI - São, aliás, os próprios funcionários de Finanças que, referem o facto de "aquando da fiscalização ter sido referido pelo legal representante da sociedade impugnante, que a matéria prima adquirida à C..., Ldª lhe tinha sido oferecida à porta pelo representante da firma fornecedora".

XVII - Sempre foi essa a afirmação do Senhor G...e tal foi confirmado pelas testemunhas arroladas e ouvidas nos autos.

XVIII - Segundo a fiscalização Tributária, da contabilidade não resulta a existência de compromissos por solver. Logo, não haveria lugar a empréstimos. Porém, tais compromissos existiam e foram solvidos pelos pagamentos "à vista" feitos pelo sócio G....

XIX - Na contabilidade da sociedade existiam e existem facturas e recibos comprovativos das aquisições.

XX - A mercadoria foi descarregada no seu armazém, conforme testemunhos produzidos nos autos.

XXI - A douta sentença de que ora se recorre, peca por contradição entre a matéria que dá como provada e as conclusões a que chega.

XXII- Foram contabilizados os suprimentos feitos pelo sócio G..., como contrapartida dos pagamentos de mercadorias efectuados a C..., Ldª.

XXIII - Tais reembolsos foram declarados para efeitos fiscais.

XXIV - Os fornecimentos feitos pela C..., Ldª, estão titulados no processo por facturas emitidas por aquela sociedade e juntos aos autos a fls. 20.

XXV - As facturas são os documentos próprios para fazer prova da existência de compras de mercadorias.

XXVI - A sociedade G..., Ldª contabilizou como compras a C..., Ldª, os valores constantes de fls. 18 e 19 de 1989 e 1991; XXVII - Da contabilidade da sociedade não constam quaisquer notas de encomenda, qualquer correspondência emitida ou recebida, recepção de mercadorias adquiridas, fichas de armazém com controle de movimentação de existências ou documentos inerentes ao transporte das mercadorias, nem tinham que constar, pois são meros indícios e não meios probatórios com força plena; XXVIII - As quantias creditadas ou depositadas a favor do sócio resultaram de empréstimos que este fez, ao abrigo do contrato de suprimentos, documento autêntico junto aos autos, e que se destinaram a solver os compromissos representados pelas compras feitas a C..., Ldª; XXIX - O ónus da prova cabia única e exclusivamente à Administração Fiscal, a qual não logrou provar os factos que o Meritíssimo Juiz "a quo" entende encontrarem-se por provar; XXX - Não é à impugnante, ora recorrente que compete provar que fez as compras, mas sim à administração fiscal que estas são fictícias, o que não provou como resulta de todos os depoimentos transcritos nos autos. Antes pelo contrário.

XXXI - Perante estes factos, não se pode concluir que : "....estamos perante uma fuga fiscal premeditada, organizada e voluntária, de elevados montantes...." C) - Decidindo como decidiu, o meritíssimo Juiz "a quo", violou, entre outros, os seguintes preceitos legais: Artigos 342°, 362°, 363°; 371° e 392° do C.C.; Artigos 490° n° 2; 653° n° 2; 668° n° l c) do C.P.C.; Artigos 134° n° 2, 142° e 144° n° 1° do Código de Processo Tributário e ainda o artigo 13° da Constituição da República Portuguesa, pôr discriminação na análise da prova produzida pela Administração Fiscal em detrimento da prova testemunhal produzida pelos recorrentes.

Por isso, Deve a presente sentença ser revogada, por ser manifesta a violação de lei, e, consequentemente ser a impugnação julgada procedente por provada, com as legais consequências.

Só assim se fará Justiça! Não houve contra - alegações.

O EMMP emitiu parecer no sentido de que o recurso merece provimento por fundamentação distinta da expressa na sentença.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

* 2.- Com base nos elementos dos autos entendeu o Mº Juiz « a quo» que emerge a seguinte factualidade: 1.- Os impugnantes são sócios da sociedade G..., , Lda., sociedade que exerce a actividade de transformação e comercialização de artigos de cortiça e foi objecto de uma acção de fiscalização que resultou no relatório junto de fls. 16a 35, que concluiu pela aplicação de correcções técnicas.

  1. - Trata-se de uma sociedade de características familiares, constituída em 1986, na qual são sócios o Sr. R..., esposa e dois filhos.

  2. - As vendas cresceram de 172.503.000$00 em 1988 para 355.126.000$00 em 1991.

  3. - O resultado líquido de 1989 foi um prejuízo de esc: 899.000$00.

  4. - O resultado líquido de 1990 foi um lucro de esc. 2.090.000$00.

  5. - O resultado líquido de 1991 foi um lucro de esc: 22.678.000$00, formado em cerca de 90% pôr mais valias de alienação de imobilizado.

  6. -A empresa não distribui lucros.

  7. - O sócio R... efectuou os seguintes suprimentos: 31/12/1988, esc: 18.000.000$00, 1989, 31/12/89, esc: 8.000.000$00, 31/12/90, esc: 84.317.000$00, 31/12/91, esc: 72.000.000$00.

  8. - Em 31/12/89 passaram a existir prestações suplementares de capital no montante de esc: 10.000.000$00, reforçados com esc: 15.000.000$00 a partir de 2/12/92.

  9. Após exame à escrita da sociedade não foram aceites como custos os valores de esc: 49.448.000.00, referentes ao ano de 1990, 20.000.000.00 referentes ao ano de 1991 e de esc. 17.063.000.00 referentes ao ano de 1992.

  10. -Esses valores contabilizados como custos foi considerado pela inspecção não corresponderem a quaisquer transacções efectuadas entre a sociedade e C..., Ld.ª.

  11. - 0s valores de esc. 20.000.000.00 e de 1.700.000.00, este referente ao exercício de 1992 e aquele ao exercício de 1991, foram depositados na conta pessoal do sócio da sociedade, aqui impugnante R....

  12. - Os valores de esc. 49.448.000.00 e de esc. 15.363.000.00, este referente ao exercício de 1992 e aquele ao de 1990, foram contabilizados como suprimentos do sócio da sociedade, o aqui impugnante, por contrapartida dos pagamento efectuados a C..., Lda.

  13. -Estes valores foram incluídos nos rendimentos dos impugnantes e nos anos a que diziam respeito.

  14. -Para os fornecimentos de C..., , Lda., existe um conjunto de facturas, discriminado a fls. 19 dos autos.

  15. - Para pagamento das facturas discriminadas a fls. 19 foram emitidos um conjunto de cheques à ordem de C..., Lda., que coincide apenas com o valor do IVA devido.

  16. - Os demais valores em pagamento foram contabilizados ou por créditos de depósitos à ordem ou por créditos da conta suprimentos do Sr. G..., ou foram emitidos cheques que foram levantados pôr...

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