Acórdão nº 04948/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 23 de Setembro de 2010

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução23 de Setembro de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

QUERCUS - Associação Nacional de Conservação da Natureza, PALOMBAR - Associação de Proprietários de Pombais Tradicionais do Nordeste, ASSOCIAÇÂO ALDEIA - Acção Liberdade Desenvolvimento, Investigação, Ambiente, Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves - SPEA, FAPAS - Fundo para a Protecção dos Animais Selvagens, GRUPO LOBO - Associação para a Conservação do Lobo e do seu Ecossistema, todas com os sinais nos autos, inconformadas com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa dela vêm recorrer, concluindo como segue: (A) Desde logo, a propósito da existência ou inexistência de título que legitime a construção do AHBS, não deixa de ser curioso que o Tribunal a quo conclua pela existência de um título que legitime a construção do AHBS por considerar que o despacho do Senhor Secretário de Estado do Ambiente, de 29 de Agosto de 2008, consubstancia uma prorrogação da validade da DIA, (B) Quando é a própria Recorrida EDP Produção que, no artigo 2° da sua oposição apresentada em juízo no âmbito de um outro processo que se encontra a correr termos no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, sob o n° 2570/08.6BELSB, 5ª Unidade Orgânica, refere expressamente que o despacho do Senhor Secretário de Estado do Ambiente é "um acto administrativo que reconhece a. validade da DIA relativa ao AHBS pelo prazo de um ano, até 15 de Junho de 2009, e não um acto administrativo que determina a prorrogação da validade da mesma até àquela data".

(C) Por sua vez, analisando todos articulados e requerimentos apresentados pelas ora Recorrentes, ao longo do processo que culminou na sentença recorrida, concluiu-se que os interesses supra-ordenados de ordem ambiental e cultural, a que a sentença se refere, foram mais do que concretizados (cfr. artigos 109º a 148° do requerimento inicial e factos assentes AAA) a JJJ) previstos nas páginas 38 a 42 da sentença recorrida).

(D) Por outro lado, as Recorrentes também não se podem conformar com o entendimento de que não se verifica o periculum in mora porque supostamente o Estado se comprometeu a adoptar todas as medidas de minimização g de compensação consideradas adequadas pela Comissão Europeia.

(E) Isto porque, não basta o Estado Português se comprometer com a adopção de determinadas medidas compensatórjas para que se possa considerar um argumento susceptível de fundamentar a recusa de uma providência cautelar que visa sobretudo proteger as espécies e habitais que existem no Baixo Sabor e que ainda não foram objecto de adequada protecção. É que a adopção efectiva de tais medidas é conditio sine quo non para que a Comissão Europeia admita a violação da Directiva Habitats.

(F) Por outro lado, dos elementos juntos aos autos - a Adenda ao Aditamento ao RECAPE - não se pode concluir que o RECAPE, o Aditamento e a Adenda ao RECAPE prevêem medidas de compensação e de minimização necessárias e adequadas à protecção das espécies e dos habitats existentes no Baixo Sabor, como parece ser esse o entendimento preconizado pelo Tribunal a quo.

(G) Por sua vez, a própria Comissão Europeia reconheceu que o pacote de medidas de compensação e de minimização ainda não estava concluído (nem sequer definiu uma data para tal) na data de 18 de Janeiro de 2008 (cfr. facto assente MM) na página 33 da douta sentença), i.e. numa data posterior à apresentação da Adenda ao Aditamento ao RECAPE.

(H) Nessa medida, cai assim por terra o argumento apresentado pelo Tribunal a quo de que "não resultando da matéria assente a alegada lesão irreversível dos valores ambientais, (...), não tendo sido provado que as medidas adoptadas de minimização, compensação, e os planos de monitorização não sejam adequados a evitar danos irreparáveis", não se verifica o periculum in mora.

(I) No caso em apreço, estamos perante um projecto (AHBS) que se situa num espaço de enorme relevo ecológico, resultante da biodiversidade nele existente, merecendo, por isso, protecção quer nacional como comunitária. Do que se trata na presente providência é, pois, do seguinte: se o projecto do AHBS for executado, todos os habitais e espécies protegidas existentes no local, serão afectados, e sê-lo-ão de um modo irreversível.

(J) Estamos, pois, perante uma situação clara de "facto consumado", no sentido de que caso as obras avancem, sem que haja (como não há) um pacote de medidas de compensação adequado, os interesses ambientais em jogo estarão já irremediavelmente prejudicados.

(K) Face ao acima exposto, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao considerar não verificado o requisito do periculum in mora, violando assim o disposto no artigo 120°, n° l, alínea b), do CPTA.

(L) Por outro lado, ponderados os diferentes interesses nos pratos da balança, apenas se pode concluir, perante os argumentos aqui apresentados, que a balança terá de pender para o lado dos interesses ambientais de protecção de sítios inseridos na Rede Natura 2000 e Zona de Protecção Especial.

(M) Ora, chegados à conclusão que o RECAPE, o Aditamento ao RECAPE, e a Adenda ao Aditamento ao RECAPE não prevêem as medidas de compensação adequadas e necessárias à protecção da biodiversidade existente no Baixo Sabor, é sem dúvida preferível que as obras sejam adiadas por mais alguns meses do que destruir irreversivelmente habitats e espécies, muitos dos quais em vias de extinção, essenciais para um ambiente ecologicamente equilibrado e para uma sadia qualidade de vida.

(N) Não existem interesses públicos que contra tal circunstancialismo ditem a construção a todo o custo e para já do AHBS, especialmente quando estão previstas no PNBEPH, seis Barragens que irão ser construídas na bacia hidrológica do Douro (onde se situa o AHBS), e cinco das quais contemplam o mesmo tipo de técnica que se pretende no AHBS - designadamente a capacidade de bombagem de água para montante, através, nomeadamente, do uso de energia eólica.

(O) Ao considerar que os interesses ambientais de protecção de sítios inseridos na Rede Natura 2000 e Zona de Protecção Especial não devem prevalecer nos presentes autos, o Tribunal recorrido violou o disposto no n.° 2 do artigo 120.°doCPTA.

* A Recorrida EDP - Gestão de Produção de Energia SA contra-alegou, concluindo como segue: 1. De modo inaceitável, as Recorrentes transformam a afirmação, contida na douta sentença recorrida, de que não resultou «indiciariamente assente a alegada lesão irreversível dos referidos valores ambientais, não obstante ter ficado indiciariamente assente que o local de nidificação do único casal de cegonhas negras a nidificar na região do Baixo Sabor irá ficar submerso e consequentemente destruído, uma vez que as crias migram para outras zonas, onde poderá eventualmente ocorrer a nidificação» em algo bem diferente, a saber, a genérica imputação à douta sentença recorrida do entendimento segundo o qual «com a construção do AHBS, os habitais e as espécies que existem no local onde o mesmo irá ser construído, únicos no contexto nacional e comunitário, irão ficar destruídos».

  1. A douta sentença recorrida não merece qualquer censura ao decidir que não se verifica no caso dos autos o requisito do periculum in mora, previsto no artigo 120°, n° 1, alínea b), do CPTA, o que só por si determina a não concessão das providências requeridas.

  2. São infundados e, em qualquer caso, não provados, os argumentos usados pelas Recorrentes para infirmar o disposto no artigo 120°, n° 2, do CPTA, nos termos do qual «a adopção da providência será recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados, em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que poderiam resultar da sua recusa», devendo concluir-se, também quanto a este ponto, que a douta sentença recorrida não merece qualquer censura.

    * Com dispensa legal de vistos substituídos pela entrega das competentes cópias aos Exmos. Senhores Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão, em conferência - cfr. art° 707° n°s 2 e 3 CPC ex vi art° 140° e 36° n° 2 CPTA.

    * Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade: (A) - Pela Resolução do Conselho de Ministros n.° 4/96, de 28 de Dezembro, que aqui se considera integralmente reproduzida, foi decidido "acelerar os estudos existentes relativos a outros projectos de aproveitamento hídrico e energético no Douro Superior e seus afluentes, como o objectivo de possibilitar a construção de uma nova barragem que possa cumprir funções hídricas e energéticas semelhantes às atribuídas à barragem de Foz Côa (...)"- cfr. fls. 204 dos autos; (B) - No seguimento dos citados estudos, foi decidido que a referida barragem seria implementada na parte terminal do Rio Sabor, nos municípios de Alfândega da Fé, Macedo de Cavaleiros, Mogadouro e Torre de Moncorvo - cfr. acordo das partes; (C) - Entre 1996 e 1999 foram elaborados o Estudo Prévio e o Estudo de Impacte Ambiental ("EIA») relativos ao Aproveitamento Hidroeléctrico do Baixo Sabor ("AHBS"), tendo o EIA dado entrada nos Serviços da Direcção Geral do Ambiente ("DGA") em 2 de Novembro de 1999 - cfr. acordo das partes; (D) - A Direcção Geral do Ambiente cometeu ao Instituto Nacional da Água ("INAG") a responsabilidade pelo Processo de Avaliação de Impacte Ambiental e ao Instituto da Promoção Ambiental ("IPAMB") a responsabilidade pela consulta pública - cfr. acordo das partes; (E) - Seguidamente foi nomeada a Comissão de Avaliação de Impactes Ambientais (CAIA"), composta pelo INAG, Instituto da Conservação da Natureza (1CN'), da Direcção Regional do Ambiente do Norte (DRA/Norte") e IPAMB - cfr. acordo das partes; (F) - O processo de Avaliação de Impacte Ambiental ("AIA") ficou concluído em Abril de 2000, com emissão de parecer final da Comissão de Avaliação ("CA") sobre o EIA do AHBS, no âmbito do qual propôs a reformulação do EIA; (G) - Face ao Parecer Final da CA, o Secretário de Estado do Ambiente, por despacho datado de 19 de Abril de 2000, determinou a necessidade de reformulação desse EIA - cfr. acordo das...

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