Acórdão nº 00839/09.1BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelCarlos de Castro Fernandes
Data da Resolução27 de Maio de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:* I – A Representação da Fazenda Pública (Recorrente), veio interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, pela qual se julgou procedente a impugnação que A., Lda.

(Recorrida) deduziu contra a liquidação adicional de IRC do exercício de 2007.

No presente recurso, a Recorrente formula as seguintes conclusões: 1.

Salvo melhor opinião, no entender da recorrente, na douta decisão em recurso, o Tribunal a quo julgou incorrectamente a matéria de facto e, corrigida como se espera a decisão de facto, o Tribunal a quo violou o artigo 58º-A, nº2, artigo 129º, nº1, ambos do CIRC e o artigo 350º, do CC (Código Civil) por remissão do artigo 2º, aliena d), da LGT (Lei Geral Tributária) 2.

Para a recorrente, o Tribunal a quo (a) julgou incorrectamente o ponto 4 dos factos provados da douta sentença em recurso e (b) podia e devia ter dado como facto provado que a recorrida também recebeu, em 2005, aquando da celebração e assinatura do contrato promessa de compra e venda dos lotes de terreno para construção, € 25 000,00 (sinal).

  1. O ponto 4 dos factos provados da douta decisão em recurso foi incorrectamente julgado pois a Escritura Pública não demonstra, isto é, não prova o preço efectivo e real de transmissão da propriedade sobre bens imóveis.

  2. A Escritura Pública demonstra, tão só, que os seus outorgantes declararam certo e determinado preço perante o Notário pelo que o Tribunal a quo não podia julgar como facto provado, no referido ponto 4, que o preço foi de € 96 517.00 5.

    € 96 517.00 foi o preço declarado perante o Notário.

  3. Assim, entende a recorrente que o ponto 4 dos factos provados da douta sentença em recurso foi incorrectamente julgado pois a Escritura Pública só pode provar o preço declarado perante o Notário e não o preço efectivamente pago e recebido, respectivamente, pelo comprador e vendedor dos lotes de terreno para construção.

  4. Entende ainda a recorrente que dos elementos escritos, assinados e apresentados pelo recorrido e que se encontram nos autos, conjugados ou não com a regra da experiência comum, resulta que, aquando da celebração do contrato promessa de compra e venda dos lotes de terreno para construção, em 2005, a recorrida recebeu € 25 000,00 (sinal).

  5. Pela cláusula segunda do contrato promessa datado de 26 de Outubro de 2005 de fls. ..., pelo artigo 4º e 5º do requerimento apresentado em 21 de Abril de 2008 para efeito do artigo 129º, do CIRC de fls. ..., a recorrida confessou o pagamento que recebeu, de € 25 000,00 (vinte e cinco mil euros), na data de celebração e assinatura do contrato promessa.

  6. Os referidos documentos de fls. ... (contrato promessa) e fls. ... (requerimento), todos assinados pela recorrida, demonstram quanto ao pagamento faseada do preço de transmissão da propriedade sobre os bens imóveis, a existência de um pagamento em Outubro de 2005 com a celebração e assinatura do contrato promessa de € 25 000,00.

  7. Nenhum dos talões de deposito de fls. ..., fls. .... e fls. ... dos autos, diz respeito a 2005 (Outubro) e, em consequência, ao pagamento que a recorrida confessou que recebeu em 2005, por cheque, com a assinatura do contrato promessa (€ 25 000,00).

  8. Mais, atento o objecto de transmissão de direito de propriedade (6 lotes de terreno para construção), atento o valor dessa transmissão (declarado e/ou VPT), atenta a existência de contrato promessa e atenta a duração do contrato promessa (superior a 2 anos) não é verosímil que a recorrida não tenha recebido sinal, isto é, certa e determinada quantia como principio e início de pagamento.

  9. Salvo melhor opinião, para a recorrente, atenta a regra da experiencia comum, ninguém se vincula expressamente a vender bens imóveis de elevado valor (6 lotes de terreno para construção) e fica expressamente comprometido a assinar o contrato definitivo decorridos 2 anos ou mais, celebrando e assinando contrato promessa, sem receber, nesse momento, sinal e principio de pagamento.

  10. A recorrida também recebeu sinal, nunca inferior a € 25 000,00 em 2005 com a celebração e assinatura do contrato promessa (Outubro de 2005).

  11. Assim, entende a recorrente que da douta decisão em recurso deveria constar como facto provado que, em 2005, com a celebração e assinatura do contrato promessa de compra e venda dos lotes de terreno para construção, a recorrida também recebeu € 25.000,00 como sinal e principio de pagamento.

  12. Corrigida, como se espera, a douta decisão do Tribunal a quo sobre a matéria de facto, entende a recorrente que não se encontra afastada a presunção do artigo 59º-A, nº2, do CIRC (eventualmente conjugado com o artigo 129º, do CIRC).

  13. O artigo 59º A, n2, do CIRC estabelece a presunção de que o valor de alienação onerosa de direito reais sobre bens imóveis é, no mínimo, o do respectivo VPT (valor patrimonial tributário) 17.

    A presunção do artigo 59º A, nº 2, do CIRC pode ser ilidida mediante prova em contrário.

  14. Para ilidir a presunção legal em referencia – e bem assim, qualquer presunção tantum juris – não basta a mera contraprova destinada a colocar o facto presumido em dúvida, sendo necessário demonstrar com prova bastante e irrefutável que o facto presumido não se verificou.

  15. Da conjugação do artigo 58º A, n º2, com o artigo 129º, nº 1, ambos do CIRC, resulta que competia à recorrida ilidir a presunção legal, provando o valor que efectivamente recebeu pela transmissão dos lotes de terreno para construção e que alegou ter sido o declarado na respectiva Escritura Pública.

  16. Para a recorrente, atenta a matéria de facto provada que consta da douta decisão recorrida e que se espera venha a ser corrigida e aditada com o presente recurso, a recorrida recebeu, para alem do valor declarado naquela Escritura Pública (igual à soma dos talões de depósito de fls. ..., fls. ... e fls. ...), pelo menos, mais € 25 000,00.

  17. Para a recorrente, não foi ilidida a presunção e demonstrado plenamente que o valor efectivo e real de transmissão dos lotes de terreno foi, como defendeu nos presentes autos, o declarado na respectiva Escritura Pública.

    Termina a Recorrente pedindo que seja dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida.

    A Recorrida apresentou contra-alegações, nelas concluindo que: 1.

    A escritura de compra e venda, celebrada em 03/08/2007, é um documento autêntico, cuja força probatória (plena) só pode ser elidida com base na sua falsidade (art.º 372º, n.º 2, do Código Civil); 2.

    Caducou, assim, o direito à dedução desse incidente, em virtude de ter sido ultrapassado o prazo de 10 dias após o conhecimento pela recorrente (com a citação para a presente acção) desse documento, bem como do conhecimento do contrato-promessa de compra e venda (cfr. art.s 546º CPC, em conjugação com o n.º 1, do art.º 544º, ambos do C.P.C. e 547º, n.º 2, em conjugação com o n.º 2, do artigo anterior, também do CPC, aplicável “ex vi” do art.º 2, al. e), do CPPT); 3.

    A pretendida falsidade desse documento é, aliás, uma “questão nova” que não foi objecto de pronuncia por parte da douta sentença recorrida; 4.

    Como os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova (cfr., entre outros, art.º 685º-A do CPC), deve o presente recurso ser, neste âmbito, liminarmente rejeitado; 5.

    Constitui uma autêntica falácia, a alegação da recorrida, de que pelo facto de a prestação (€25 000 00) ter sido depositada no ano seguinte (04/01/2006) ao da celebração do contrato de compra e venda (26/10/2005), isso significaria a existência desse pagamento, para além do valor que consta da escritura; 6.

    O atraso desse depósito não representa qualquer alteração ao preço global (€ 96.517,00) constante da escritura, que corresponde à soma das prestações acordadas.

  18. A 1ª prestação de €25.000,00 não tem um tratamento diferente, como se fosse um “sinal” de natureza diferente, das restantes prestações; 8.

    Presume-se que têm carácter de “sinal” todas as quantias (ou seja todas as prestações acordadas) entregues pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço (art.º 441 do Código Civil), devendo ser imputados na prestação devida (art.º 442º do mesmo Código); 9.

    Aliás nenhuma das prestações acordadas foi paga nas datas referidas no contrato-promessa nem a celebração da escritura respeitou a data prevista nesse contrato; 10.

    O atraso nos pagamentos resulta do facto de à data do contrato-promessa (26/10/2005) a promitente-compradora de 43% dos lotes em causa não ter ainda a garantia de também comprar a outrem os restantes 57%, uma vez que só lhe interessava adquirir a propriedade plena de tais lotes; 11.

    Assim, ficou suspensa a assinatura desse contrato, até ser obtida, pelo promitente-comprador, essa garantia, o que só aconteceu cerca de 2 meses depois, nessa medida dilatando a data de pagamento das prestações acordados; 12.

    Atenta a matéria de facto relativa ao processo de revisão, constante do ponto 8 dos factos provados da sentença recorrida, tinha a Administração Fiscal todos os elementos para questionar os pagamento efectuados em ordem a demonstrar que o preço da escritura era inferior ao preço normal de mercado; 13.

    Da fundamentação do acto tributário nada consta nesse âmbito, sendo que, tratando-se de lotes de terreno, não pode invocar-se – como, aliás, consta da douta sentença recorrida – “custos de construção”; 14.

    Igualmente a fundamentação (por remissão) do Senhor perito da Administração Tributária, de que seria irrelevante a disponibilização das contas bancárias, por poder haver outros movimentos financeiros não reflectidos nessas contas, não tem a menor sustentabilidade; 15.

    Não examinando essas contas, na altura e no tempo devido, vir agora, em sede de recurso, invocar um (eventual) pagamento, que não estaria reflectido nessas contas, consubstancia manifesta má fé processual; 16.

    A FP deduz, assim...

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