Acórdão nº 01939/20.2BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 21 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução21 de Maio de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO F., residente na Avenida (…), instaurou processo cautelar contra o Município (...), com sede na Avenida (…).

Fá-lo na sequência da notificação do despacho proferido pelo vereador da respetiva câmara municipal que indeferiu o pedido de informação prévia apresentado em 23.10.2019.

Solicitou a adoção das seguintes providências: A título principal a) nos termos do disposto n a alínea q), do n.º 2, do artigo 2.º, n.º 1 e alíneas d), e) e i), do n.º 2, ambos do artigo 112.º, e n.º 1, do artigo 120.º, todos do CPTA, regular-se provisoriamente a situação jurídica emergente do PIP que o autor apresentou, reconhecendo-se cautelarmente a sua situação jurídica subjectiva, enquanto beneficiário dos direitos e faculdades emergentes do disposto no artigo 17.º do RJUE, por via do deferimento tácito da impugnação administrativa que apresentou no dia 4 de setembro de 2020, no processo n.º IP-EDI -3/2019 do réu, autorizando-se o autor a iniciar o procedimento de licenciamento de obras nos termos do n.º 3 do artigo 17.º do RJUE, e intimando-se o réu a respeitar no mesmo os efeitos decorrentes do deferimento do pedido de informação prévia a que se reporta aquele seu processo n.º IP -EDI -3/2019; Ou, subsidiariamente b) no caso de se entender que não se verificou o deferimento tácito da impugnação administrativa que o ora autor apresentou no dia 4 de setembro de 2020, no processo n.º IP-EDI-3/2019 do réu, ou que deste deferimento tácito resultam efeitos distintos do deferimento tácito do PIP, designadamente por se manter na ordem jurídica o acto notificado ao autor no dia 24 de agosto de 2020, deverá, nos termos do disposto na alínea q), do n.º 2, do artigo 2.º, n.º 1 e alíneas a), d), e) e i), do n.º 2, ambos do artigo 112 .º, e n.º 1, do artigo 120.º, todos do CPTA, ser suspensa a eficácia do acto notificado ao ora autor a 24 de agosto de 2020, e regulada provisoriamente a situação jurídica emergente do PIP que o ora autor apresentou, reconhecendo-se cautelarmente a situação jurídica subjectiva do autor, enquanto beneficiário dos direitos e faculdades emergentes do disposto no artigo 17.º do RJUE, por via do deferimento daquele PIP, autorizando-se o autor a iniciar o procedimento de licenciamento de obras nos termos do disposto no n.º 3, do artigo 17.º do RJUE, e intimando-se o réu a respeitar no mesmo processo de licenciamento os efeitos decorrentes do deferimento do pedido de informação prévia a que se reporta aquele seu processo n.º IP -EDI -3/2019.

” Por sentença proferida pelo TAF de Braga foi julgado totalmente improcedente o processo cautelar e recusado o decretamento das providências.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Requerente formulou as seguintes conclusões: 1.ª Considerando-se, como se considerou na decisão recorrida, que “sendo legítima a apresentação, pelo requerente, do requerimento referido em 40 dos factos indiciariamente provados, na medida em que o subdelegante tem poder para substituir ou anular o ato do subdelegado, ao abrigo do CPA”, deve considerar-se que tal requerimento constitui uma impugnação administrativa, sob pena de, dum passo, se considerar legítima a apresentação de um pedido que visa a substituição da decisão que o antecede, por outra que lhe seja favorável, e, doutro passo, aquilo ser considerado um legítimo nada.

2.ª Considerando-se, como considerou a decisão recorrida, que a alínea a), do n.º 1, do artigo 184.º, do CPA, consagra o direito dos interessados de “impugnar os atos administrativos perante a Administração Pública, solicitando a sua revogação, anulação, modificação ou substituição”, e considerando-se, como considerou a decisão recorrida, que “o pedido inserto a final do requerimento poderá corresponder à previsão da parte final da norma”, sendo inequívoco, assim, que o requerente pediu ali a revogação e substituição do acto prévio, que tal pedido é legítimo, e que a entidade a quem o requerimento foi dirigido tem o poder de revogar o acto ali em crise, por ter sido praticado por um alegado delegatário daquele (n.º 2, do artigo 49.º, do CPA), tal requerimento não pode deixar de ser considerado uma impugnação administrativa, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 114.º, do RJUE.

3.ª A isto não obsta a circunstância de inexistir norma especial a permitir a impugnação, porque o que deve é procurar-se norma que o proíba, e não existe, motivo por que se considerou aquele requerimento legítimo.

4.ª De resto, a norma existe, pois que, como sustenta André Folque, na obra citada na motivação, e apesar da redacção menos feliz, “o n.º 1, do artigo 199.º, do no novo Código admite, mais amplamente do que possa parecer, os recursos administrativos ali enunciados, compreendendo o recurso para o delegante, desde que assistido por poderes de supervisão e no perímetro do mesmo corpo orgânico (cf alínea a), ou seja, da mesma pessoa colectiva”.

5.ª É que sempre como se refere o autor citado: se o delegante tem o poder de avocação, nos termos do disposto no n.º 2, do artigo 49.º, o que não constitui um poder de competência simultânea, tendo em conta, de resto, que se o delegante revogar um acto do delegado, este não pode, de seguida, rever a revogação ou anulação por outro acto; se a delegação não constitui uma forma de representação, antes uma licença ou habilitação, que permite a alguém a prática de actos para os quais, sem ela, não teria permissão ou incumbência legal, licença que é pessoal e condicionada; se o delegante tem poderes de supervisão sobre os actos do delegado, nos termos do disposto no n.º 4, do artigo 169.º; então mal se compreenderia que os interessados não tivessem esse instrumento de impugnação administrativa; 6.ª É que, sempre como aponta o mencionado autor, “dispondo o delegante de poderes de supervisão sobre os atos do delegado e este, por seu turno, sobre os atos do subdelegado, o recurso administrativo especial, a ser interposto e apreciado no âmbito de uma delegação de poderes, sempre caberia já na previsão concernente «ao órgão da mesma pessoa colectiva que exerce poderes de supervisão». (alínea a), do n.º 1, do artigo 199.º)”, acrescentando que “neste pressuposto, o enunciado autónomo do n.º 2, seria absolutamente inútil, um pleonasmo, não fora a primeira norma conter o requisito dos dois órgãos serem da «mesma pessoa colectiva».

” – cf página 37-38 7.ª Finalmente e acompanhando o autor citado, a expressão, posta no n.º 1, do artigo 199.º, dos “casos expressamente previsto na lei”, “só indirectamente se refere ao recurso, pois de forma imediata ela incide em casos”, como o “de órgãos com poderes de supervisão expressamente estatuídos relativamente a actos [...] de outro órgão da mesma pessoa colectiva e fora das relações de hierarquia;”, como é o caso da delegação de poderes.

8.ª Enfim e como detalhado na obra vinda de referir, deve ser entendido que se mantém em vigor na nossa ordem jurídica o chamado recurso delegatório, que, mesmo na linha de raciocínio da sentença, não poderá deixar de ser considerado, do mesmo modo, uma impugnação administrativa para efeitos daquele mesmo artigo 114.º do RJUE.

9.ª A acrescer ao que refere o autor que acompanhamos, não podemos deixar de lembrar os princípios gerais – impreteríveis – da decisão e o da legalidade da actuação da administração, como consagrado no n.º 1, do artigo 13.º, do CPA, e n.º 1, do artigo 3.º, respectivamente; 10.ª Ora, se o autor apresentou, em 4 de Setembro de 2020 e como referido em 40 dos factos provados, um requerimento dirigido ao Sr. Presidente da Câmara, formou-se naquele órgão o dever legal de o decidir.

11.ª Por outro lado, se a administração deve obediência à lei e ao direito, então o Sr. Presidente da Câmara, tendo o poder de anular, revogar ou substituir o acto praticado pelo delegado, tem o dever de actuar em obediência à lei e ao direito, pelo que, caso o acto do delegado seja ilegal (e é), tinha (e tem) o Sr. Presidente da Câmara o dever de o revogar e substituir, por a tal o obrigar o princípio da legalidade, como, de resto, tem sido reiteradamente afirmado pelo tribunais superiores, em matéria de pedidos de revisão oficiosa de actos tributários – justamente com base nos princípios do direito administrativo.

12.ª Assim e em resumo, tendo sido dirigido, ao Sr. Presidente da Câmara Municipal, um requerimento peticionando a revogação e substituição de um acto prévio, praticado por um vereador ao abrigo de uma alegada delegação de poderes, tendo o pedido sido, assim, dirigido a entidade com poderes para o fazer, e com o dever de o decidir em conformidade com a lei e o direito, não se poderá concluir de outra forma que não a de que existiu de facto uma impugnação administrativa para efeitos do artigo 114.º do RJUE, e que a mesma não foi decidida no prazo legal para o efeito, formando-se um deferimento tácito, o que constitui boa aparência desse direito formado na esfera jurídica do aqui autor.

13.ª A sentença recorrida violou, por isso, as normas dos artigos 114.º, do RJUE, em conjugação com o disposto na alínea a), do n.º 1, do artigo 199.º, alínea a), do n.º 1, do artigo 184.º, n.º 2, do artigo 49.º, n.º 4, do artigo 169.º, n.º 1 do artigo 13.º e n.º 1, do artigo 3.º, todos do CPA, pelo que se deverá, ao contrário do decidido, concluir-se pela verificação de fumus boni iuris, no que respeita à providência requerida a título principal.

AINDA SOBRE A IMPUGNAÇÃO ADMINISTRATIVA 14.ª Por fim, e mesmo que nada do que se disse fosse de acolher, o que não se concebe, sempre a pretensão revogatória e substitutiva do acto prévio, de indeferimento expresso do PIP, se acaso se considerar que foi dirigida ao órgão errado, não pode ter-se como um nada.

15.ª Sendo manifesta a dedução de uma pretensão revogatória e substitutiva do acto prévio, a consequência a retirar, da circunstância (que não concebemos), de ter sido dirigida ao órgão errado, seria a aplicação do n.º...

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